segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Um conto de Natal optimista

O livro de Vasco Graça Moura “As mais belas histórias portuguesas de Natal”, presente do meu sapatinho da quadra, inspirou-me a criatividade, mas transformarei modestamente a minha história em simples conto de uns 2000 caracteres – os necessários para acesso à coluna dos leitores da nossa imprensa – com ressalvas, embora, já que muitos deles - caracteres - são eliminados, em jeitos de história antiga.
O meu presépio contaria com, deitado nas palhinhas do nosso desconforto, um Primeiro Ministro salvador do mundo – o nosso, naturalmente, lusitano, mais desgraçado de todos dentre Enganim e Cesareia - rodeado, a uma banda, pela Senhora Mãe do mesmo Reino de bem-aventurança, (“Ilha da Purificação”, segundo rótulo de um tal Cavaleiro de Oliveira), a Senhora Ministra da Educação, mãos postas em adoração ao “Menino”, ciente do seu domínio nas vias esfrangalhadas da nossa educação, e a outra banda, o preocupado Governador de um Banco nacional, ciente das palavras mágicas “Venha a nós o vosso Reino, mais na Terra do que no Céu" (daí o ar, em perfeito antagonismo com a serenidade de São José), todos os três munidos dos bons princípios para atingirem os bons fins. Nós outros, o povo em redor, óptimos substitutos do rebanho das ovelhas, vacas e burros, adorando o nosso “Senhor”, com os Reis Magos (não, necessariamente, apenas os três guiados pela estrela, que também as estrelas proliferaram), empunhando as vitualhas da sua mesa, obtidas, sob os insultos rosnados no inv/ferno da nossa incapacidade ou do nosso descontentamento invejoso ou repugnado, por processos que o Menino Jesus da Belém antiga não aceitaria, mas que o Menino das palhinhas do nosso “Curral de Moinas” não se importará de aceitar.
Ele sabe que, com a distribuição das benesses ao seu rebanho de “bem-aventurados”, será não nosso mas dele, o Reino dos Céus, embora o que conte, para ele, seja, de facto, o da Terra. Na próxima legislatura.
O Reino dos Céus continuará a ser para nós outros, segundo a promessa.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O país da mentirinha

Aqui há uns mesitos, a banca fez constar que obtivera lucros fabulosos. Muitos milhões de euros. Aquilo foi bom para dar confiança a todos nós que não somos da banca, e nos limitamos à pia do lava-loiça – a nossa banca diária - para chafurdar na vasilha do alimento. Chafurdámos com mais entrain ao receber a boa nova dos lucros fabulosos da banca, julgando que nos dizia respeito, e até nos atrevemos a compor os pratos com mais requinte e dispêndio, diante da nossa banca habitual, atidos ao lema de que também temos direito ao sol nascente.
Afinal, o governador de uma das bancas vem agora com ar de anjo manso de quem não tem culpa, embora um pouco soturno de quem sabe que o mal é só para nós outros que não somos governadores, garantir que estamos à beira da recessão e que 2009 nos será muito desfavorável. Desfizemos o requinte e regressámos ao esfregão. Entretanto, descobriram-se mais fraudes, na banca, e até – ó céus! – ouvimos falar no desfazer de matrimónios, por via de distribuir melhor os lucros pessoais, não fosse o diabo tecê-las. Mais uma mentirinha para a governação de quem pode e sabe governar-se.
O próprio governo também é pouco escrupuloso. São as combinações de reuniões com os sindicatos – dos professores, por exemplo - que resultam em nada, porque tudo, nas intenções dos governantes é mentirinha, fraude, engano, troça. E nós, bem troçados e escarrados como lorpas, aqui estamos a continuar a ouvir e ler as mentirinhas de quem já não sabe distinguir o Bem do Mal, o Falso do Verdadeiro, os compromissos assumidos e o seu não cumprimento, só atentos às estatísticas do bem-vestir.
Temos ou não temos o absoluto direito e o honrado dever de entristecer e até de enrubescer com a vergonha de sermos como somos? Releiamos o nosso imortal Eça e a sua “Campanha Alegre”, tão parecida já, nos figurantes parlamentares aí descritos, com os de hoje, alargados, para mais, estes, a tantos outros domínios de figuração...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

As imagens da nossa fragilidade

O nosso Presidente da República deu festa no seu Palácio. Aos filhos dos tropas que estão longe a defender os povos estrangeiros. Parece que estão a cumprir um dever, e a dar provas de muita coragem, disse o nosso P.R. Disse-o e repetiu-o, fez um discurso recheado de amor pelos filhos dos papás que defendem o bom nome da nossa pátria com o seu sacrifício, embora se diga que tal sacrifício seja actualmente da ordem do voluntariado bem abonado. Fez um discurso aos filhinhos e filhinhas dos papás, e antes de se acenderem as luzes da linda árvore de Natal contou-se do dez ao zero, o que nós cá em casa também acompanhámos e batemos palmas no final.
O senhor P. R., todavia, homem da velha guarda, jamais usou o termo filhotes. Isso está bem para a nova guarda, e assim fez a jovem jornalista ao entrevistar os meninos, falando para os telespectadores, cheia de facúndia, nos filhotes dos papás heróis lá fora. Os filhotes dos papás e das mamãs. Pouco tempo antes tínhamos visto, no tempo de antena, muitos pássaros e alguns filhotes mortos remetendo para a necessidade de salvaguardar as espécies ornitológicas com os filhotes incluídos, claro.
Achei a imagem da senhora jornalista muito bonita e recheada de ternura pelas espécies. Filhotes para aqui e ali, hoje em dia é de bom tom usar essa imagem de fragilidade, que nos aproxima da natureza inteira, nos seus comportamentos. O sexo variado e sem peias como entre os mais animais, os nudismos paralelos aos dos ditos, os filhotes dos humanos, tais como os dos mais animais... Vivemos numa época de solidariedade universal e de fragilidade e ternura humanas com cada vez maior amplitude. Será que os filhotes se sentirão felizes com a designação que, ao aproximá-los dos outros animais, lhes retira o carisma da ternura realmente humana?
Será que a instabilidade comportamental de tantos meninos hoje em dia não parte já desse tratamento de elegância social desumanizante?

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Com papas e bolos

Dizem as sondagens que os partidos de esquerda estão em ascensão. De facto assisti ontem a uma profusão de punhos cerrados, que me fez reviver outros tempos, noutras esferas do globo. Eram os discursos profusos em promessas de dirigentes de partidos africanos, aos seus povos explorados por odiosos exploradores. Alcançada que foi a pretendida governação, os generosos dirigentes enterraram as promessas e trataram de se safar bem, nas hecatombes surgidas nos, agora seus, povos, explorados sem protesto.
Com a liberdade alcançada nesta esfera do globo, forjaram-se aqui partidos, que experimentaram governar democraticamente, na tolerância e até no multipartidarismo, como disseram. Mas foi pura peta, o que sucedeu realmente, foi que cada um lutou sempre pelo bolo inteiro. Tivemos ajudas, todavia. Da União Europeia, com que construímos as estradas e fechámos as linhas férreas e os trabalhos de lavoura inúteis.
Entretanto, cada um ia roendo a sua parte do bolo, em calamitosa e progressiva demonstração de que mais do que os povos a quem se promete, todavia, fartura de papas e de bolos, o que se observa, nestes povos como o nosso - de iliteracia perfeitamente aproveitada pelos que lhes fazem as promessas - o que se observa, tal como nas esferas do globo supracitadas, é a generalização dos escândalos e das corrupções, seja nos políticos, nos administrativos bancários, judiciais e tutti quanti. E desemprego. E despedimentos. E fome. E desrespeito.
E chegou a vez de mais um homem sério prometendo fartura para os votos. Os apoiantes são muitos, uns já caturras, outros jovens, que ainda não sabem distinguir, ou que também já visionam hipóteses de boa sobrevivência futura, muitos os de punho cerrado, em suma. E os chefes, homens sérios, aproveitam a consternação geral instalada por um governo vaidosamente prepotente, para se indignarem contra os capitalismos gerais, apologistas que são da terra/bolo a quem os trabalha. E assim se enganam os tolos. De punho erguido.