sexta-feira, 13 de maio de 2016

Bombos e bombas no festival



Uma vez mais, um artigo sobre as vibratilidades das mentes intranquilas que, vasculhando nos propósitos feministas da igualdade entre os sexos, coisa do passado mas sempre actual - sobretudo para a juventude recentemente desperta para  tais vibratilidades, com o afã proselitista e o orgulho de quem terá descoberto a pólvora, por ser muito explosiva - decidiram que a atribuição a um genérico masculino de uma característica que também é pertença da mulher se tornava de uma exclusividade machista (falocrática, em jeito de erudição), ofensiva no caso do cartão e no caso do cidadão. É claro que o humor jorrou, de parelha com a indignação, e este artigo de Nuno Pacheco é prova de um e outra, na referência à graça do discurso enfático de Ricardo Araújo Pereira, ou dos argumentos de forte crítica de Nuno Pacheco:

O sexo das palavras
Público, 22/04/2016
Se o ridículo matasse, Portugal estava constantemente pejado de cadáveres. Não bastava a tolice do acordo ortográfico, tolice aliás que o Bloco de Esquerda abraça estoicamente, voltámos agora à mais tola e inútil das cruzadas: a da chamada “linguagem inclusiva”; o contrário da linguagem “sexista” e “discriminatória” onde se diz pais, irmãos, avós, primos, etc. Tudo discriminatório, naturalmente. Ora foi com base em tal pressuposto que, num momento de particular inspiração, o BE propôs que o Cartão de Cidadão passe a chamar-se Cartão de Cidadania. Talvez porque Cartão de Cidadão e Cidadã fosse demasiado comprido. Ricardo Araújo Pereira, no Governo Sombra, já caricaturou devidamente esta paranóia correctiva. Disse ele, imaginando um discurso bloquista: “Portugueses e portuguesas, estamos aqui reunidos e reunidas porque estamos todos e todas preocupados e preocupadas com a questão dos desempregados e desempregadas”. Pois. Mas mesmo assim não chegava. Era preciso nuns casos começar com o masculino e noutros com o feminino, para não ofender ninguém. E havia que olhar inquisitorialmente para outras palavras, muitas, milhares, que enchem livros, dicionários e gramáticas, antros de desigualdades com masculinos e femininos por todo o lado, olhem para criança (e não há o crianço?), para membro do partido (haverá a membra?), para polícia ou guarda (deveria haver o polício e o guardo?)… E então a toponímia? Ah, mas aqui imperam as “mulheres”: vejam a rua, a praça, a avenida, a travessa, a calçada, a estrada, a auto-estrada, enquanto para os “homens” sobra o beco, o largo, o passeio, o boqueirão! Querem mesmo acabar com a linguagem “sexista”? Acabem com o Português. Porque ele, que é língua no feminino e idioma no masculino, está impregnado de sexo por tudo quanto é letra. É que até o Bloco soa no masculino. Deveria ser Bloc@? Ou Bloca?

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