segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Como uma aparição


O meu marido, que está sempre a par das notícias, mostrou-me hoje, com um ar radiante, um jornal Online  - Observador.pt – gratuito, ao que parece, e onde Vasco Pulido Valente assenta, senhor absoluto nos seus considerandos críticos, mestre com um peso de sabedoria e de humor que apetece venerar, ainda que por vezes dele se discorde na sua olímpica displicência, como se não tivesse nascido do mesmo barro daqueles que parece desprezar. Fizera falta, todos estes meses de “sabática”. Ao que parece, voltaria para o Público, mas por enquanto não sucedeu.
Vi, pelo seu ar de descoberta, quanto  também o meu marido sentira a sua falta, pois se outras escritas aprazíveis vão alimentando o nosso equilíbrio diariamente, o certo é que ninguém substitui ninguém, na questão da personalidade literária e todos fazem parte dessas emoções diárias para quem se vai recreando e reagindo “tant bien que mal” aos nossos “instantes galhardos”, geralmente vividos no sobressalto e no suspense de uma empatia muitas vezes reticente.
Enquanto as estruturas oficiais jornalísticas o permitirem, continuarei, pois, guardando no meu blog estes nacos de  prosa de Pulido Valente, como uma formidável arma de desmistificação dos nossos tantas vezes absurdos comportamentos, mais ou menos visíveis, que os textos críticos desmascaram. De forma poderosa, os de Vasco Pulido Valente.

Vasco Pulido Valente
Observador, Jornal online
31/10/16

Segunda-feira
Não há dia em que não apareçam por aí super-portugueses de pescoço dobrado para Marcelo lhes pendurar um colar qualquer. Ultimamente foram o “menino de ouro” do futebol, Renato Sanches, condecorado em Itália com este nobre título; Jorge Moreira da Silva, um senhor do PSD que a OCDE resolveu nomear director-geral; e uma selecção de mulheres que ganhou não sei o quê. Até Jaime Nogueira Pinto publicou um livro chamado “Cinco Homens que Abalaram o Mundo”, em que patrioticamente incluiu Salazar, quando se pode escrever a história da Europa desde o século XVII para cá sem mais do que umas páginas (poucas) sobre Portugal.
Dizem os políticos que o culto dos super-portugueses, desproporcionado e tolo, serve para encorajar a ralé que por aqui miseravelmente se arrasta a grandes cometimentos, que a seu tempo salvarão a Pátria. Não ocorre a ninguém que as maiores façanhas nacionais não passam de um murmúrio que só ouve uma minúscula parte da humanidade e não têm o menor efeito fora do pequeno país que por má sina nos calhou. Pelo contrário, os super-portugueses animam o indígena a viver vicariamente a glória alheia ou a fugir de cá a sete pés. Afinal Ronaldo joga no Real Madrid, Mourinho treina o Manchester United e António Guterres não é secretário da Associação 25 de Abril.
Terça-feira
Marcelo, segundo ele próprio confessou, tinha muita curiosidade em conhecer Cuba e o assassino que os cubanos por lá conservam e que há 50 anos usava o nome de Fidel Castro. Não devemos tirar estes prazeres ao nosso Presidente, mesmo sem saber qual é a nossa política externa — para além evidentemente da ocasional caravana de mendicantes a pedir uma esmolinha por amor de Deus — e quem a faz.
Quarta-feira
Passei a tarde de ontem a ler o livro de Sócrates, “O Dom Profano – Considerações sobre o carisma”. Que dizer da coisa, senão que o próprio autor chega ao fim de 152 páginas (letra grande, mancha larga) sem, confessadamente, saber ao certo, ao certo, do que está a falar? Aparte isso, Sócrates, como era de esperar, usa a técnica do aluno cábula e sem ideias. “O Dom” dele é de parafrasear e comentar meia dúzia de cavalheiros respeitáveis (Weber, Cassirer, Kojève e por aí fora) e citar dezenas de outros por empréstimo, ou seja, porque já vinham citados no pouco que ele leu. Este método iria inevitavelmente acabar por produzir uma enormíssima trapalhada: repetições, contradições, despropósitos e vacuidades, com muito erro pelo meio e algumas sentenças de Sócrates, que roçam o vexatório. Apesar dos recados políticos e de um ou outro disfarçado aceno a um público imaginário, não se percebe por que razão o indivíduo escreveu este livro. Sonhará ele ainda vir a ser o “líder carismático” do futuro? Suspeito que sim.
Quinta-feira
Gostava de lembrar à dra. Manuela Ferreira Leite e a outros filósofos com grande vocação moralista que o ordenado de alguns jogadores de futebol e de alguns gerentes de bancos não é comparável. Os gerentes de bancos têm para mostrar ao mundo quatro ou cinco fraudes de uma dimensão heróica e o estado miserável do sistema financeiro português. Os jogadores de futebol ganham bom dinheiro aos respectivos clubes e valem por si mesmos num mercado internacional. Só por pedantismo e cegueira se pode lamentar, com um escândalo de classe média letrada (coitada dela!), o que ganham Ronaldo, Nani, ou Pepe.
Sexta-feira
O dia inteiro com Elena Ferrante, “Os Romances de Nápoles”. Depois falaremos.
Sábado

Um primeiro-ministro (alegadamente), um ministro e uns tantos chefes de gabinete e de “adjuntos” foram acusados de se ornamentar com títulos académicos que, de facto, não tinham. Isto não se compreende. Primeiro porque há por aí milhares de licenciados e centenas de doutores que comprovadamente não sabem ler, nem escrever e que não servem nem para caixas de supermercado. Segundo, porque o exercício de cargos políticos não exige (e seria absurdo que exigisse) qualquer habilitação formal. A explicação da mascarada curricular da pobre plebe que hoje rodeia os governos, de esquerda ou de direita, é outra. Antigamente, na média burguesia letrada toda a gente conhecia toda a gente desde o liceu ou da faculdade. Agora, o pequeno universo das profissões, da universidade e da política está cheio de aventureiros, cuja única família e o único vínculo são os bandos de que fazem parte e, quando por acaso vêm à superfície, esses produtos da oportunidade e da desordem precisam de uma qualquer desculpa “respeitável” para continuar pacificamente as suas maquinações.

domingo, 30 de outubro de 2016

Saber às pinguinhas 1- Geografia


A estratégia seguida por alguns professores de pôr os alunos em confronto com uma síntese de questões como matéria a fixar para os seus testes, parece-me engenhosa para os meninos, pelo menos os menos aplicados - tal como o era a fogueira para os que se aqueciam “à roda dela” segundo a informação de Paulo de Carvalho - e que assim verificariam o que “custa a liberdade”. De facto esses questionários-síntese formam maneira tão expressiva como outra qualquer, embora menos lírica, de os meninos irem adquirindo as bases do seu saber - da sua fogueira - e da sua autonomia para uma cidadania efectiva. Meninos que hoje, em grande parte, tomam a escola como um espaço apenas de prazer – ou aborrecimento - e rebeldia, desinteressados de todo da tal “fogueira”, mais virados, talvez, para os incêndios constantes da selva que os adultos e alguns meninos também, vão criando no verão, meninos que mal necessitam do fogo do saber, introduzido, embora, este, muitos séculos antes de Cristo, nos costumes, por muito que o Rousseau,  já dos primórdios da Revolução Francesa, confiasse na inteligência do seu Emílio, para obter o seu conhecimento, a partir de experiências por ele próprio, Emílio, vividas. Mas o Emílio pertencia a uma classe economicamente estável, com direito a preceptor, e a ensino individual, não se passa isso agora, com os muitos Emílios de variadas espécies pululando nas muitas e variadas escolas, embora as minhas orientadoras de estágio tentassem impor-nos, pelos anos setenta, a teoria de que todos os saberes se equivalem e que os saberes dos meninos eram tão importantes como os saberes que os adultos tinham por obrigação transmitir-lhes e que eram, aliás, os que se exigiam nos testes e nos exames, por isso eu nunca pude perceber como era possível ter-se tempo para atender aos saberes dos alunos, a não ser naquilo em que eles se cruzavam com as matérias pontuais.Creio que essas teorias das minhas orientadoras de estágio não vingaram, pois pude seguir o meu percurso docente segundo o meu próprio critério de honestidade intelectual, que julgo que é ainda o da maioria dos docentes, verdadeiros heróis dos novos tempos.
Por isso, sinto gratidão pelos professores que, depois de explicarem as matérias dos seus cursos, enviam um conjunto de questões para serem trabalhadas para os testes, com indicação das páginas.
Com a Geografia, por exemplo, assim aconteceu, neste primeiro período, como auxiliar dos alunos, sobretudo dos menos aplicados.
Foram as seguintes as questões de Geografia para o 1º teste do 8º ano, informações a que não damos, geralmente,  atenção, e nos despertam memórias ou  que nos passaram ao largo, e, afinal, até nos servem a nós de recreio. A nós, adultos.

Assim, foram estas as questões para o teste de Geografia do 8º ano, postas pela respectiva professora, segundo o Manual  Geodiversidades – População e povoamento. Actividades económicas (da DE: Didáctica Editora):
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Ver páginas 10, 11 e 12:
1ª: Entidade responsável pela realização dos recenseamentos  em Portugal:
R: INE :Instituto Nacional de Estatística.

: Objectivos da realização dos recenseamentos:
R – Investigar características da população – idades, sexos, competências, profissões, situação socioeconómica – para se detectarem as deficiências estruturais a fim de se poder planear o ordenamento do território, ou seja, a reconstrução nas áreas de Saúde, da Educação, da Assistência Social…

Periodicidade da realização dos recenseamentos:
R: São decenais, isto é, realizam-se de dez em dez anos.

4- População mundial – número de habitantes:
R: Sete mil milhões (7 000 000 000) em 2012.

5- O que é demografia:
R: É a Ciência que estuda a população.
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Páginas 12, 13 e Caderno Diário:

1- Conhecer as fórmulas de cálculo e saber calcular:
Do crescimento natural:
a) – taxa de crescimento natural
b)- taxa de natalidade
c) taxa de mortalidade
d) Taxa do crescimento efectivo

R- Indicadores demográficos são as variáveis que interferem na evolução populacional (=demográfica) de uma dada região – país, continente. Ou seja: natalidade, mortalidade, imigração, emigração:

Natalidade: número de crianças (nados-vivos) que nascem numa dada região durante um ano.
Mortalidade: Número de óbitos (= mortes) que ocorrem numa dada região durante um ano.
Imigração: Número de pessoas que entram  (se instalam) numa região durante um ano.
Emigração: Número de pessoas que saem duma região durante um ano.

Para comparar a Natalidade ou a Mortalidade entre regiões temos que relacionar esses indicadores com a população total dessa região. Chama-se a isso taxa ( de natalidade /mortalidade)

Fórmula para se obter a TN:   (Natalidade / População total) X 1000 (o traço / significa traço de fracção).

Fórmula para se obter a TM: (Mortalidade / População total) X 1000.            (»»)

- A diferença entre o número de nascimentos e o número de mortes  designa-se por saldo fisiológico ou crescimento natural.
- Quando a Natalidade é superior à Mortalidade (N>M), o saldo fisiológico é positivo. A população pode aumentar. Quando é inferior (N), o saldo f. é negativo. A população pode diminuir. Quando a Natalidade é igual à Mortalidade  (N=M) o saldo fisiológico ou crescimento natural é nulo.

Mas  o crescimento real ou efectivo da população não resulta apenas do saldo fisiológico ou crescimento natural (diferença entre N e M), mas também do saldo migratório (= diferença entre o número de imigrantes e o de emigrantes) anual.

- O crescimento efectivo ou real é a soma do saldo fisiológico com o saldo migratório.
Assim:
Natalidade - Mortalidade = saldo fisiológico
Imigração – Emigração = saldo migratório.
        
Crescimento efectivo ou real (CE):  (N-M)+(I-E)

Exemplo para Portugal:
População total: 10 700 000 habitantes
Natalidade : 105227
Mortalidade: 117 087
Saldo Migratório : 31 226

1 - Calcular:
- Taxa de Natalidade:
R: (105 227/ 10 700 000) X 1000 = 9,83%       ( /= traço de fracção)
 - Taxa de Mortalidade:
R: (117 087/ 10 700 000) X 1000= 10,9%             (  »»»)

2- Classificar em positiva, negativa ou nula a taxa de crescimento natural de Portugal:
R: TCN:   9,83 – 10, 9 = - 1, 87%.       TCN negativa

3- Calcular o Crescimento Efectivo de Portugal:
R:
CE= (N-M)+(I-E)
105227 - 117 087 + 31 266 = - 11860 + 31 266= 19.406
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Págs 18 e 19:
Como varia a natalidade no tempo e no espaço
Ler Esquema 3 (pág. 19)
1- Porque são baixas as Taxas de Natalidade nos países desenvolvidos:        
R:- Factores que explicam os baixos valores da TN nos países desenvolvidos são:
1.1- Difusão das técnicas de planeamento familiar.
1.2- O desejo da de elevar o seu nível de vida.
1.3 – A participação da Mulher no mundo do trabalho. (Fica sem tempo para se dedicar aos filhos).
1.4Os elevados custos com os filhos – alimentação, educação, saúde, etc.

2- Porque são elevadas as Taxas de Natalidade nos países em desenvolvimento?
R: Factores justificativos das altas Taxas de Natalidade nos países em desenvolvimento são:
2.1- Desconhecimento ou recusa dos métodos de planeamento familiar.
2.2- Casamentos em idades precoces.
2.3- Os filhos considerados fonte de trabalho e rendimento familiar.
2.4Taxas elevadas de analfabetismo (que implicam o desconhecimento do controle dos nascimentos).
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Pág. 21: O Que é necessário para a renovação das gerações

1- (Saber o Índice Sintético de Fecundidade e o Índice de Renovação das Gerações):
1º Definição de Taxa de Fecundidade: é o número de nascimentos por cada 1000 Mulheres em idade fecunda (dos 15 aos 49 anos)

2- Como se explica a diminuição da taxa de fecundidade nos países desenvolvidos?
R: Factores de diminuição da T.F.:
1- Planeamento familiar e uso de contraceptivos;  2- Idade tardia do casamento ou da união de facto. 3- Aumento da participação da mulher no mercado de trabalho. 4 - Elevadas despesas com a educação dos filhos.

2º: Definição de  Índice sintético de Fecundidade: é o número de filhos que, em média, cada mulher tem durante o seu período de fertilidade (dos 15 aos 49 anos).

Significado de: Índice de Renovação das Gerações: Para que uma  geração seja renovada é necessário que cada mulher tenha mais do que 2 filhos, ou seja, um índice sintético de fecundidade igual ou superior a 2, 1.

- O ISF na maioria dos países europeus está abaixo do nível mínimo necessário para a renovação das gerações.
- Portugal viu cair o ISF desde há 50 anos de 3,1 (em 1960) para 1,32 em 2011.
Págs 22 e 23:
Como varia a mortalidade no tempo e no espaço

 Ler os esquemas 5 e 6 para saber:
1- Porque são baixas as taxas de Mortalidade  dos países desenvolvidos
2- A que se deve a descida da mortalidade nos países pobres a partir de 1950

R1- Nos países desenvolvidos a taxa de mortalidade começa a descer progressivamente a partir do séc. XIX, acompanhando os avanços técnicos, sociais e médicos, ao contrário dos países em desenvolvimento, em que só a partir de meados do século XX começou a diminuir bastante devido a ajudas alimentares e médicas internacionais dos  países desenvolvidos, obtendo assim melhoria das condições de vida.
Assim:  A diminuição da TM nos países desenvolvidos deve-se a:
1º   Desenvolvimento da medicina e uso de vacinas; 2º - Desenvolvimento de hábitos de higiene e condições de saneamento básico. 3º - Melhoria na alimentação. 4º- Melhoria das condições habitacionais 5º- Melhoria das condições laborais e de segurança no trabalho.
A diminuição da TM nos países em desenvolvimento deve-se a:
Ajudas alimentares e apoios médicos Internacionais, uso mais frequente de vacinas e antibióticos, melhoria das condições de saneamento, recurso a insecticidas para o combate de pragas.

Págs 24 e 25: Quais as áreas com maior e menor crescimento natural
Analisar os gráficos 21, 22 e o Esquema 7:

- Os países com taxas de crescimento natural mais elevadas situam-se em África e em algumas regiões da Ásia e da América Latina. (TN muito alta; TM a diminuir)
Os países com taxas de crescimento mais baixas localizam-se  na Europa, na América do Norte e no Centro e Norte da Ásia.

-Os gráficos da figura 21 representam a evolução da taxa de crescimento nos países desenvolvidos : crescimento natural nulo até início do s. XVIII. TCN elevada até meados do séc. XX. A partir de 1960, com a diminuição das Ts. de N e M, o crescimento é nulo.
-Nos países em desenvolvimento o crescimento nulo até meados do séc. XIX, mortalidade e natalidade correspondendo-se em quantidade. A partir de meados do s. XX, com a diminuição da taxa de mortalidade dá-se a explosão demográfica.

O esquema 7 aponta, em confronto, a evolução da taxa de crescimento natural nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento, a partir do século XIX até 2000:

1800: TCN baixa ou nula em ambos os casos; 1850: alta/baixa; 1900: alta/baixa; 1950: baixa/média; 2000: baixa/alta, as primeiras referentes aos países desenvolvidos as segundas aos países em desenvolvimento.

sábado, 29 de outubro de 2016

Viagem sem módulo


Um Público bastante rico em informação, o de 20 de Outubro, e vários artigos que gostaria de fixar, desde o May Way de Teresa de Sousa, parafraseando Sinatra em trocadilho, na revelação da política conservadora, “mais nacionalista e menos liberal” de Theresa May do que a dos seus antecessores Thatcher e Cameron, a frase de Theresa May «A autoridade da legislação da EU neste país acabou para todo o sempre» encimando o seu texto, em epígrafe, deixando prever consequências, talvez funestas para todos, do Brexit. Na página Ciência dois artigos sobre o contributo para a ciência das explorações de Marte e não só, anterior ao insucesso do módulo Schiaparelli, com fotografias alusivas. Transcrevo a introdução do segundo – Um planeta mais aconchegado” de Tiago Hormigo – no que consigo captar do Público:
Um planeta mais aconchegado
TIAGO HORMIGO 
19/10/2016 - 22:59
O teste do demonstrador de aterragem Schiaparelli e a entrada da Trace Gas Orbiter na órbita marciana são de importância assinalável para a ESA. No primeiro caso, procura-se validar tecnologias de entrada, descida e aterragem para o rover ExoMars 2020. No segundo, além de a Europa se ter tornado na feliz proprietária do maior satélite artificial de Marte, dotou-se também de uma nova infra-estrutura de comunicações e de observação do planeta, com impacto no médio e longo prazo…..

O Público impede a leitura e transcrição integral dos seus artigos, mas consegui transpor na íntegra e sem esforço o de João Miguel Tavares, que segue, sobre o eclipse de Mário Nogueira das marchas e discursatas arruaceiras, que João Miguel Tavares justifica como vénia ao partido que lhe comanda e assegura o esforço, geralmente pouco educado, soltando doestos contra os governos da política contrária à dos parceiros governativos de hoje, o que o faz encolher-se agora, a mando do chefe, de boas relações e até mesmo parceiro do actual Prime Minister. João Miguel Tavares explica-o bem:

O desaparecimento de Mário Nogueira
20/10/2016 –
Isto demonstra que o sindicalismo português é pura encenação. 

Paulo Baldaia escreveu há dois dias um artigo onde perguntava pelo abduzido Mário Nogueira, que mais parece ter tirado sabática neste início de ano lectivo, deixando-nos órfãos do seu bigode e da sua ira. Cito o director do Diário de Notícias: “O ano escolar começou na perfeição? Não. Ainda assim, os problemas foram em número reduzido e rapidamente resolvidos? Não. Então o que se passa para os sindicatos estarem tão caladinhos?” Esta só não é a pergunta do milhão de dólares porque a resposta está escarrapachada à frente do nosso nariz. Os sindicatos estão caladinhos porque a sua primeira fidelidade não é para com os seus sindicalizados, nem para com as escolas onde os seus professores trabalham. A sua primeira fidelidade é para com o PCP. Se o dono os manda fechar a boca, eles fecham. Donde, fechada está e caladinhos estão.
Outros são obrigados a falar por eles. Aconteceu no Liceu Pedro Nunes, que encerrou portas na terça-feira, em protesto contra a falta de funcionários. Há duas pessoas a servir 350 almoços diários, dizem. A Escola de Canelas, Vila Nova de Gaia, está, segundo o Expresso, a funcionar “a meio gás” pelas mesmas razões. Idem para o agrupamento Gil Vicente, em Lisboa. O curioso é que quem visitar o site da Fenprof encontra vários textos a denunciar “insuficiências” e “pré-rupturas”. O tom do site e dos artigos não mudou muito. O que mudou radicalmente foi o número de intervenções do mediático Mário Nogueira – e, por consequência, o peso dos protestos do sector da Educação no alinhamento dos telejornais.
Esta situação oferece-nos duas lições preciosas, tenhamos nós olhos para as ver e boca para as comentar – a primeira sobre os sindicatos, a segunda sobre a comunicação social. Comecemos pelos sindicatos e pelo grande mérito da solução de governo inventada por António Costa: trazer para o arco da governação o Bloco de Esquerda e, sobretudo, o PCP. É certo que eles insistem em manter um pé dentro e outro fora, mas aí o abraço de Costa tem-se revelado eficaz – ninguém se pôs ao fresco. Qualquer português reconhece na actual solução de governo o envolvimento do PCP e respectivas consequências a nível sindical, com uma diminuição acentuadíssima da conflitualidade social, que antes era intensamente produzida por sindicatos da CGTP, sobretudo na educação e nos transportes. Veja-se o Metro de Lisboa: nunca havíamos assistido a uma queda tão acentuada na qualidade do serviço e não há uma greve para amostra.
Isto demonstra que o sindicalismo português é pura encenação. Já toda a gente sabia que a CGTP era menos uma agremiação de sindicatos do que um braço político do PCP, mas agora está demonstrado para além de qualquer dúvida razoável. Quando o governo voltar a ser de direita e os sindicatos voltarem a sair à rua, iremos todos lembrar-nos da sabática do senhor Mário Nogueira, o homem que no seu monopólio sindical nunca vai à 5 de Outubro sem passar primeiro pela Soeiro Pereira Gomes.
A segunda lição a tirar daqui é para a comunicação social portuguesa e para o seu estado de dependência das fontes institucionais, sejam elas gabinetes ministeriais, agências de comunicação ou sindicatos. O alinhamento do Telejornal não pode estar dependente das iniciativas da Fenprof: se Mário Nogueira fala as escolas estão mal, se ele está calado as escolas estão bem. É mais do que tempo de os media começarem a sair para a rua e definir a sua própria agenda, deixando para o Avante! a agenda do PCP.

https://s.publico.pt/NOTICIA/1748033 https://s.publico.pt/pcp/1748033 https://s.publico.pt/cgtp/1748033 https://s.publico.pt/fenprof/1748033 https://s.publico.pt/mario-nogueira/1748033 https://s.publico.pt/professores/1748033 https://s.publico.pt/sindicatos-de-professores/1748033 https://s.publico.pt/antonio-costa/1748033 https://s.publico.pt/sociedade/1748033 https://s.publico.pt/educacao/1748033 https://s.publico.pt/opiniao/1748033 

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Quem sabe se um dia…


Não sei se cá as televisões portuguesas têm programas de entrevistas a jovens portugueses com sucesso nos seus jovens empregos conseguidos através do “Emprego Jovem. Já vi programas a jovens portugueses empregados no estrangeiro, pretexto para se ir conhecendo as terras onde se fixaram e os respectivos costumes e dando algumas indicações do seu próprio êxito. Creio que passavam na RTP. Mas eu gostaria mesmo é de conhecer o que se passa por cá, sempre de coração nas mãos, no receio do futuro dos nossos continuadores. Ao procurar na Internet o artigo que tem por título «O Orçamento nem-nem»  encontrei  a seguinte notícia que me chamou a atenção: “Há cada vez menos “nem-nem” em Portugal”, a respeito do desemprego jovem em Portugal, e na Europa, que parece ter baixado, graças a uma medida de apoio da EU, e que transcrevo, juntamente com o Perfil da Comissária Europeia Marianne Thyssen, que parece gostar do nosso país:

1º texto:
«Apesar do desemprego jovem continuar mais alto em Portugal do que na média da União Europeia, o número de jovens portugueses que não têm emprego nem estudam (os chamados “nem-nem”) tem vindo a cair e até está abaixo da média europeia.
Em entrevista ao Expresso, a comissária Marianne Thyssen, que vem na quinta-feira ao nosso país em visita oficial, elogia Portugal por ter “agarrado o desafio”».
A percentagem de “nem-nem” portugueses, jovens entre os 15 e os 24 anos que não têm emprego nem estudam, está a diminuir. De acordo com o estudo divulgado na tarde desta terça-feira pela Comissão Europeia (CE) sobre desemprego jovem, a taxa de “nem-nem” chegou a estar acima dos 14% em 2016, o maior valor desde 2008, mas em 2015 ficou nos 11,5% — uma percentagem que lhe permite descer abaixo da média europeia, que se fixa nos 12%.
Vemos que os serviços públicos de emprego agarraram o desafio e estão muito ativos no alerta para o problema do desemprego jovem. E vemos que foi criada em Portugal uma extensa rede de parceiros, não só entidades públicas mas também outros parceiros, empenhados em implementar a Garantia Jovem. Foi também lançada uma plataforma onde os jovens se podem registar, e isto é muito importante, porque precisamos de saber quem são, onde estão, para fazer alguma coisa por eles”, elogia Marianne Thyssen, a comissária europeia para o emprego, em entrevista ao Expresso.
Contudo, no que à taxa de desemprego jovem diz respeito, o panorama português continua muito mais negro do que a média da Europa. Se é certo que também desde 2013 se tem observado uma redução da taxa de desemprego dos jovens entre os 15 e os 24 anos em Portugal (passou de perto de 39% nesse ano para os 32% no ano passado), a verdade é que estes números continuam a destoar perante a taxa de desemprego jovem média de 18,9% registada na União Europeia (UE). Da mesma forma, a taxa de emprego jovem em Portugal (nos 22,5% em 2015), apesar de ter subido cerca de um ponto percentual desde 2015, mantém-se muito abaixo da média da UE (praticamente nos 34%).
A comissária, que vem esta quinta-feira a Portugal, mantém o otimismo.Temos consciência que ainda não atingimos os objetivos. Mas se olharmos para a evolução do número das pessoas que estavam desempregadas, de todos os grupos etários, e depois olharmos apenas para o número de jovens desempregados vemos que aqui houve uma grande melhoria. E isso não aconteceu apenas porque existem empregos disponíveis, mas porque há pessoas com capacidade para os integrar e um mercado de trabalho que funciona”, explica.
E há mais dados positivos a reter. Se bem que a taxa de abandono escolar de jovens na faixa etária dos 18 aos 24 anos em Portugal continue acima da média observada na Europa (16% contra 14% em 2015), está agora muito abaixo dos 35% registados em 2015.
MENOS 1,4 MILHÕES DE JOVENS DESEMPREGADOS
EQUILÍBRIO. Portugal tem de procurar o equilíbrio entre a necessidade de criar emprego, atrair investimento e cumprir o défice, explica a comissária Marianne Thyssen
GEORGES BOULOUGOURIS/CE
Estas são as principais conclusões para Portugal do relatório “Young People’s Labour Market Performance” publicado esta terça-feira pela CE, e vão de encontro à realidade observada um pouco por toda a UE, cujo desempenho dos indicadores que medem a performance do mercado laboral dos mais jovens tem “melhorado significativamente desde 2013”, de acordo com a nota enviada pela CE. Este relatório surge três anos depois da EU ter lançado o programa “Garantia Jovem”, que já abrangeu 14 milhões de jovens. Há menos 1,4 milhões de jovens desempregados na UE e menos 900 mil jovens “nem-nem”.
Em 2013, a taxa de desemprego jovem na UE fixava-se nos 24,4%, tendo vindo a decrescer até 2015, ano que ficou nos 18,9%. Já a taxa de jovens europeus que não procuram emprego nem estudam caiu dos 13,2% em 2012 para os 12% no ano passado – apesar de se manter acima do observado em 2008, quando a taxa se fixou nos 10,8%.
A iniciativa Garantia Jovem foi lançada em 2013. Em Portugal, deu origem, entre outros, ao programa Estímulo Jovem, que apoia financeiramente os empregadores que celebrem contratos de trabalho, sem termo ou com termo certo de seis meses no mínimo, com jovens entre os 18 e os 29 anos (que estejam inscritos há mais de 60 dias no Instituto do Emprego e Formação Profissional – IEFP); ou ao ‘famoso’ programa de estágios remunerados, em que o Estado financia estágios a jovens inscritos no IEFP, com duração entre os 9 e os 12 meses. De acordo com os números divulgados no relatório da CE, 43,3% dos jovens desempregados beneficiaram de uma das medidas em apenas quatro meses (a partir do momento em que passaram a estar inscritos como desempregados).
A par desta iniciativa, os países da UE que registavam taxas de desemprego jovem acima dos 25%, nos quais se inclui Portugal, foi lançado ainda a Iniciativa Emprego Jovem, um fundo que mobiliza 6,4 mil milhões de euros até 2018, para apoiar os jovens que não procuram emprego nem estudam nestas regiões. Por isso, a Comissão decidiu propor recentemente o aumento do orçamento para a Iniciativa “Emprego Jovem”. Até 2020, este programa poderá contar com mil milhões adicionais.
A Portugal, e aos restantes países membros, a Comissão Europeia pediu reformas. “Foi pedido que identificassem quem são os jovens [que procuram trabalho], que os registassem, para que, no momento em que surgem ofertas saibam onde eles estão. Em muitos estados membros temos jovens que nem estão a estudar, nem em estágio, nem a trabalhar, nem registados [nos centros de emprego]. Não se sabe onde estão estes jovens. Por isso, a primeira coisa a fazer é saber onde estão, para que saibam que há ofertas para eles e apresentar-lhe um projeto que os coloque no caminho para o mercado de trabalho”, explica a comissária europeia.
Mas para isso é preciso haver empregos por ocupar. “Esse é o outro lado: é preciso criar emprego. Num país com o défice alto, como Portugal, a prioridade é perceber como podemos trazer de novo a estabilidade financeira que o torna atrativo para os investidores e evitar os riscos que o colocaram no passado em crise financeira e económica. Em Portugal e noutros estados membros – e acontece o mesmo no meu país, a Bélgica –, o défice está demasiado elevado, mas ainda assim é preciso honrar os compromissos a que se comprometeram quando se juntaram à UE. Sem estabilidade financeira não é possível ter uma base estável para uma política sustentada de emprego no futuro. É como uma pré-condição para continuar”, acrescenta Marianne. “
A comissária admite que não é fácil o equilíbrio. De um lado a necessidade do investimento, do outro as restrições do défice. “Se estamos numa união monetária e queremos uma política sustentável não podemos ser demasiado flexíveis no lado fiscal, na situação do orçamento e da dívida. No momento em que o mercado financeiro começar novamente a levantar questões e a deixar de confiar num estado membro, não vai querer dar-lhe dinheiro porque está sempre a recorrer ao mercado. E depois vão ter de pagar outra vez sei lá que percentagem de juros para contrair empréstimos. Teremos outra vez o mesmo problema. Por isso temos de ser cautelosos e trabalhar em prol da estabilidade. E isto é o que continuamos a fazer. E tenho de dizer que esta para esta Comissão é claro que a pior parte já ficou para trás”.
Marianne Thyssen deixa, porém, um alerta: “A União Europeia não tem a fórmula para resolver tudo”, diz. “A solução não está no dinheiro dos fundos europeus mas nas reformas estruturais que deixarão os países em melhor forma para atrair investidores. Não somos o Big Brother que está sempre ali a ver como é que os filhos se estão a portar, e que tira algum dinheiro daqui e o põe ali. Podemos aconselhar os estados membros mas não podemos dizer 'tu agora vais fazer isto'. Os países têm de fazer a sua parte”.
E a lembrar que também é comissária dos assuntos sociais, recusa “uma geração perdida” em Portugal. “Porque não é só o futuro deles, é o nosso futuro. E para isso temos de trabalhar a montante e assegurar a estabilidade fiscal. Sem isso até podemos sonhar mas daqui a uns anos volta-se à mesma situação”.

PERFIL: MARIANNE, EM PORTUGUÊS
1000 km Um ano antes de ser nomeada comissária, Marianne Thyssen pedalou por Portugal, do Norte a Lisboa. “Foi uma experiência extraordinária”, garante
Marianne Thyssen aterra quinta-feira em Portugal para um dia de encontros oficiais, nas suas funções de comissária europeia do Emprego, Assuntos Sociais, Competências e Mobilidade Laboral. Será uma visita diferente do habitual. Porque o habitual, para ela, faz-se de bicicleta. A jurista belga, 60 anos, conhece o país de norte a sul, e ilhas, quase sempre a pedalar. “Viana do Castelo, Guimarães, Porto, o magnífico Vale do Douro, Coimbra, Batalha – de onde é o meu motorista -, Nazaré, Évora, Lisboa, Sintra, Estoril, Algarve. E também os Açores, o Pico, Faial, S. Miguel…”. Tudo somado já passou por cá quinze semanas desde 1977.
A experiência da primeira viagem ditou os sucessivos regressos. Tinha 21 anos. O carro em que seguia com o marido avariou-se na zona de Viseu. Nesse dia conheceu a hospitalidade portuguesa: foram ajudados e acolhidos por uma família numa quinta ali perto. “Foi a melhor recordação que trouxe”. Ao longo dos anos juntou outras ao álbum turístico. O bom vinho, sardinhas frescas, o fado, a saudade (dita assim em português), os pastéis de nata e “a visão ampla que têm do mundo”. Ainda se sente, diz, o espírito dos descobridores.
De regresso à Flandres, inscreveu-se em aulas de português, em horário pós-laboral, na Universidade de Lovaina, onde se licenciou em Direito. Os três anos de aprendizagem levaram a novas paixões: Fernando Pessoa e Saramago, apesar de continuar a lê-los na versão traduzida. Não ficou a falar fluentemente mas foi suficiente para agradecer em português a Cavaco Silva um discurso que proferiu. E de terminar no mesmo idioma a entrevista que concedeu ao Expresso, em Bruxelas, no fim de Setembro. “É uma bela língua, a língua de Camões”, disse a sorrir.
Em 2013, um ano antes de se tornar comissária europeia, pedalou mil quilómetros desde o norte do país até Lisboa, por caminhos secundários, pequenas aldeias, pelos altos e baixos do Douro – “as subidas foram duras”. A crise económica estava no auge. Em cada paragem aproveitou para sentir o estado de espírito da população (“calma, faladora”). Sentiu-a cansada, mas resistente, resiliente, combativa. “Os portugueses têm esse espírito de superar tudo. Não consigo explicar como o fazem mas fazem sempre. E agora não vai ser diferente.”
Na quinta-feira as conversas serão outras e com outros intervenientes, os que decidem. Pela manhã, a comissária reúne-se, na Assembleia da República, com os deputados da Comissão de Assuntos Europeus e da Comissão de Trabalho e Segurança Social. Acompanhada pelos Secretários de Estado do Emprego, da Cidadania e Igualdade, do Desenvolvimento e Coesão, e pelo Alto Comissariado para as Migrações, vai depois até à Tapada das Mercês, perto de Sintra – se o dia estiver limpo, vê ao longe o Palácio da Pena – conhecer o Projeto CIAPA, de promoção da inclusão social e do sucesso escolar - apoiado pelo Fundo Social Europeu.
Segue-se um almoço (de trabalho) com o ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e com os parceiros sociais (CIP, CAP, CCP, CTP, CGTP e UGT) e depois duas horas de Conferência de Alto Nível dedicada ao Pilar Europeu dos Direitos Sociais, junto à Gulbenkian. “Infelizmente a comissária não vai tempo para qualquer visita fora do programa oficial”, explica a assessora do gabinete, Natasja Bohez. “Mas o simples facto de estar em Lisboa já a faz feliz”.

Mas era  «O Orçamento nem-nem» que eu procurava e felizmente, pude transcrevê-lo na íntegra, o que não aconteceu com «Um País parado à beira do caminho» de João Miguel Tavares do mesmo jornal, que já em outro artigo transcrevi, repetindo, todavia, a pequena amostra permitida, por ser significativo do pessimismo que nos domina, apesar do primeiro texto optimista, sobre o desemprego jovem no nosso país. Por mim, o sentimento é o de João Miguel Tavares vivemos em cima do arame. O mesmo sentimento de David Dinis, afinal:  Nem-nem. Vamos andando. Depois logo se vê. Ou, como diria Álvaro de Campos na sua "Tabacaria", "nem uma coisa nem outra".

2º Texto:
O Orçamento nem-nem
Público,15/10/2016
Nem-nem. É o que costumamos chamar a uma boa parte da geração mais nova. Nem emprego, nem estudo. Parada. À primeira vista, podemos chamar isso mesmo a este segundo Orçamento do PS de António Costa: nem avança, nem recua. Continua assim num frágil equilíbrio negocial.
Vejamos as medidas centrais, anunciadas esta sexta-feira. As pensões sobem, sim, mas nem todas. Nem sequer todas as mais baixas. Os apoios sociais sobem, sim, mas ao ritmo da inflação. A sobretaxa do IRS desce, mas não como foi prometido e sem as mexidas nos escalões que o PS queria. O “imposto Mortágua” avança, mas acima dos 600 mil euros, para não prejudicar o investimento (imobiliário). Quanto ao investimento, estima-se que suba, mas nem muito. E os impostos indirectos vão subindo, mas nem tanto como se pensou.
Nem-nem. É assim também, se olharmos para os calendários. As pensões só aumentam dez euros em Agosto, mas nem para todos (nem para as mínimas aumentadas por Passos). A sobretaxa desce, mas só ao longo do ano, conforme os escalões de rendimento. O IVA da restauração talvez desça também, no que ainda não desceu, mas nunca sem antes se avaliar o efeito da medida já aplicada.
Este Orçamento, na verdade, é nem-nem por feitio, nem sequer por defeito. António Costa nem tem o seu programa, nem pode governar com o das esquerdas. Nem pode prescindir do BE e PCP, nem pode afrontar Bruxelas. Nem tem margem para estimular a economia, nem tem como fazer as reformas que, no curto prazo, poderiam ter mais impacto na competitividade. Nem tem dinheiro, nem pode pedir mais emprestado.
No actual equilíbrio político, este Orçamento tem a enorme vantagem de não ser tão mau como se esperava, tendo a desvantagem de não dar confiança para uma reviravolta na economia. Precisamente porque este Orçamento é o que podia ser, António Costa fez caminho para a China e só depois veio ver como as coisas estavam. À chegada, parece ter-lhe bastado dia e meio para fechar o documento. Espera-se agora que não tenha, no mês e meio que se segue, uma surpresa no Parlamento ou vinda de fora.
Para António Costa, olhando para estes seus dois orçamentos, o lema da legislatura será este: ano a ano, vai-se andando. Veremos, no próximo mês e meio, como termina este Orçamento (nas negociações com a esquerda, nas conversas com Bruxelas). Pelo caminho teremos de ir olhando para a economia, já sem esperança numa bala mágica. Nem-nem. Depois, logo se vê.

3º Texto - excerto:
Um país parado à beira do caminho –
Público, 15/10/2016 –

O primeiro-ministro não tem dinheiro para comprar nova mobília nem poder para mandar velha mobília fora, por isso resta-lhe mudar as jarras de sítio.


Este governo não tem tempo para governar o país porque gasta o tempo que tem a governar-se a si próprio. Portugal é apenas o cenário para os seus arriscados equilibrismos; menos uma governação do que um número de funambulismo, com António Costa permanentemente em cima do arame. De um lado o Bloco de Esquerda e do outro o PCP. De um lado as regras europeias e do outro o discurso do fim da austeridade. De um lado a dura realidade hayekiana e do outro os doces sonhos keynesianos. De um lado as agências de rating e do outro a cartilha anticapitalista...

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Ditadores reais


O texto do Público já vinha aqui e ali sublinhado pela minha irmã que me fornece os Públicos, depois de os ler, sublinhando aqui e além, a avisar sobre o que a marcou, por repúdio ou simpatia. Este visivelmente foi de repúdio, que há muito sentimos, pela governação de um ditador alcandorado no seu poder de governante capitalista, que se locupleta e à família e ao seu círculo, e pisa o povo miserável e passivo, perseguindo os que dele discordam. Mas visivelmente eu sublinhei mais do que ela, todo o artigo há muito a precisar de penetrar  - mas sem efeito – nas cabeças dos nossos cultivadores da falsidade histórica, como lhes convinha, a respeito do colonizador português prepotente e ávido. É essa verdade que se infiltrou nos esquemas mentais dos bondosos democratas de cá, que nem se atrevem a condenar a acção desse tal déspota de olhos desleais, a lembrar os de Putin, ao menos para comparar a sua governação com a dos governos colonialistas e concluírem que as verdadeiras sevícias são praticadas agora, como já o tinham sido no tempo do pai da nação Angola, Agostinho Neto, sobre cuja figura se debruçou Carlos Pacheco, historiador luso-angolano no livro Agostinho Neto, o Perfil de um Ditador. A História do MPLA em Carne Viva.

Transpus seguidamente, da Internet, um passo da notícia sobre o lançamento desse livro, em 5/7/16, subordinada ao título Uma “obra chocante” para desacreditar a figura de Neto “como um homem impoluto”

Um livro no banco dos réus: triste espectáculo do MPLA
Carlos Pacheco - Debate Angola
Público, 14/10/16
Hoje em dia o MPLA como antigo movimento de rebelião que se alçou em armas contra a “intrusão intolerável” do colonizador para defender os direitos pátrios dos angolanos pouco se distingue do inimigo colonialista que combateu. Com iguais tiques de arrogância e poder ergueu uma fronteira cerrada à sua volta e obstina-se em ser o único porta-voz da linguagem do independentismo e em se atribuir a si a prerrogativa de posse de todo o conhecimento da história da luta armada de libertação nacional. Pela ameaça e pela repressão fixou a preeminência dos seus direitos ao arrepio dos direitos dos outros. Um espectáculo lamentável que Albert Camus definiria como espectáculo da “sem-razão” ou do absurdo.
Ancorado na intolerância e no fanatismo, o Partido sempre perseguiu o hábito de desqualificar todos quanto pensam de forma diferente; uma espécie de esconjuro contra o “diabo da ilustração, enquanto “entidade maligna” que simboliza o perigo de “separar, confundir e espalhar o caos nos espíritos”.
Este traço no MPLA é tanto mais evidente quando se fala da figura política de Agostinho Neto. Se um estudioso se aventura a devassar os enigmas ocultos da história desta organização e traz à luz a dimensão verosímil daquela personagem com o seu rosto de déspota cruel, logo os “sacerdotes” do Partido atiçam um furacão de impropérios e atribuem ao “herege” o labéu de sicofanta e demente. Exemplo paradigmático é o livro por mim publicado recentemente, Agostinho Neto, o Perfil de um Ditador. A História do MPLA em Carne Viva.
As palavras do Bureau Político a propósito deste livro são acrimoniosas e chegam a extrapolar os limites da decência; ferem todos os códigos de civilidade política e até de convivência humana. Nada disto, porém, é invulgar ou surpreendente, se se passar em revista a multiplicidade de gestos no MPLA pelos quais os diversos “Outros” foram sempre desfeiteados e tratados como entidades perversas que se impunha excluir das políticas identitárias nacionais. A tradição de levar os contestatários internos do Partido ao pelourinho da infâmia, da mesma forma que os críticos externos, é antiga na organização. Jamais se tolerou a independência intelectual ou o exercício do pensamento autónomo e plural. Na lógica unidimensional do Partido dominante qualquer tentativa de dessacralizar os dogmas e os mistérios da história oficial é tida por crime de lesa-Estado; torpedeia-se o estudioso de blasfémia e acusam-no de promover “campanhas de difamação contra o MPLA” em conluio com poderes externos.
No meu caso concreto, imputou-se-me o “delito” de incorrer em crenças alheias à pátria angolana e de ser um saudosista do colonialismo. Mas não bastasse este alarde agressivo de chauvinismo e autoritarismo, ainda se tentou amortalhar a obra com a etiqueta abjecta de “insulto ao povo angolano”, como se o MPLA fosse o detentor da arca mágica da vida ou tivesse a representatividade exclusiva de falar em nome da totalidade de milhões de homens e mulheres que compõem a realidade histórica e social de Angola. Se dúvidas houvesse, tal facto vem provar exuberantemente que no MPLA escasseiam (cada vez mais) pessoas virtuosas e no seu lugar pululam filisteus, sem nenhuma dignidade institucional, que olham para o resto do mundo com absoluto desdém. A cultura amedronta-os, sobretudo o trabalho dos estudiosos independentes. Ler a declaração do Bureau Político é como ouvir as palavras de Joseph Goebbels, alto hierarca nazi, que dizia muito cheio de si: “Quando ouço falar em cultura, saco logo do meu revólver”. Este ponto é muito sério e diante dele é lícito afirmar, na esteira de Walter Benjamim, que todo “o ideal é perigoso quando se confunde com o real”.
No imaginário dos militantes do MPLA os dogmas e as catequeses da História têm uma tal força que a realidade pouco vale no confronto com a “verdade” absoluta do Partido. Falar de Agostinho Neto em oposição à ortodoxia oficial, é para os censores desta organização algo que se confunde com a difamação e a injúria. Digamos que se trata de uma ignorância sem paralelo alimentada pela vã soberba de sacralizar todos os actos de Neto, como se o antigo presidente do MPLA, pelo seu estatuto de “líder heróico” e “pai da pátria”, não pudesse ser questionado e nenhum dos seus actos menos exemplares revelados. Ao abrigo desta deificação, sustenta-se todo um catecismo de ideias e um ritual de exaltação e adulação frente aos quais as vozes discordantes são insultadas e lançadas nas fogueiras da abjecção. O equivalente às excomunhões e aos decretos papais que votavam os heterodoxos e os cismáticos ao banimento e à destruição espiritual por considerá-los portadores das marcas de Lucífer.
No MPLA temem-se as ideias originais. Os guardiões do tempo zelam para que as portas do passado se mantenham fechadas e apenas se aceita como única reconstrução do passado libertador a representação do “guerrilheiro refulgente”, nobre, virtuoso e impoluto a pelejar contra as hordas bárbaras coloniais sob a direcção grandiosa e sábia de Agostinho Neto.
Com este sentimento ufanoso e romântico da realidade, os altos escalões directivos do MPLA são incapazes de encontrar o “registo da fala” para descrever o passado autêntico da luta armada com os seus incontáveis detalhes incómodos. Habilmente se socorrem de fluxos retóricos e de narrativas fantásticas para ocultar os mistérios da sua história. Recusam-se, em suma, a reconhecer que a guerrilha não empunhou as armas tão-somente para proteger e libertar, mas também para destruir. Mataram-se camponeses e nesse banho de sangue envolveram-se todas as facções beligerantes. Matou o MPLA, matou a UNITA, matou a FNLA e matou o exército português.
Muitos maquisards se converteram em verdugos ao deixarem de purgar as suas feridas no combate libertador, os seus rancores foram canalizados para o corpo sofrido das populações rurais. Isto só foi possível mercê da abominável indiferença dos altos responsáveis políticos e militares; ou mercê daquilo a que Camus chama de “nihilismo absoluto” que aceita a “legitimação do assassinato lógico”. Ou melhor, o assassinato justificado pela luta em si. Os males estavam lá, todavia nem Agostinho Neto nem a sua equipa se esforçaram por eliminá-los. Daniel Chipenda (a quem Neto quis fuzilar), pelo contrário, não se cansou de advertir para a necessidade de se pouparem as populações e a não se violarem sexualmente as mulheres. Os abusos propagaram-se iguais a uma doença cancerígena incontrolável. Foi sem dúvida uma estrada sulcada por episódios arrepiantes. Como diz Luís de Meneses, 3.º conde da Ericeira, na Historia de Portugal Restaurado “as histórias verdadeiras não se inventam, contam-se; deve dizer-se o que foi, não o que desejamos que seja”. Trata-se de um “espelho brutal” diante do qual o MPLA se deve rever sem tibiezas e sem concessões a teorias vitimológicas.
Outra trágica consequência foi a ferocidade com que se voltaram as armas contra os críticos e os dissidentes, além do veneno do ódio que gotejou no meio dos militantes. Não raras vezes se chegou ao absurdo de se dirimirem a tiro ou por enforcamento pendências pessoais e étnicas num longo processo de guerras sujas intestinas, cujos horrores e crueldades requerem ser devidamente estudados um dia.
Em resumo, o Partido-MPLA coloca-se acima das leis, do país e dos cidadãos e imiscui-se em esferas de actividade que não lhe dizem respeito. Os políticos devem ocupar-se da política e deixar aos historiadores, literatos e a outros profissionais de humanidades o exercício do seu mister. Como observa Jesús Silva-Herzog Márquez, ensaísta mexicano, “todo o despotismo aspira a ser um regimento de palavras”.
Ora o discurso da mais alta instância do MPLA é também um regimento de palavras, só que de palavras burlescas e sobranceiras, próprias de quem detém a vara do mando há muito tempo e abusa dela em demonstrações políticas de desprezo e descortesia. Fui condenado em praça pública de modo injusto e tirânico sem que os meus juízes tivessem, ao menos, o cuidado de ler o meu livro com escrúpulo e espírito hermenêutico segundo a história. Ao invés, numa exibição de proselitismo exacerbado, tiraram conclusões apressadas a partir de fragmentos saídos na comunicação social. Esqueceram-se esses “juízes” partidários que as leis fundamentais da República são civis e o Bureau Político ou qualquer outro órgão superior de direcção, incluindo o mais alto representante do aparelho de Estado, se subordinam a tais instrumentos jurídicos. O Partido não impera sobre as leis, tal como imperavam os reis nos sistemas monárquicos absolutos.De acordo com o princípio constitucional da dignidade, as leis prescrevem que todo o cidadão é credor do respeito incondicional à sua dignidade e que este princípio é concretizado no direito à identidade, mas acima de tudo no direito ao bom nome. Ao usar de termos iníquos, o Bureau Político arbitrariamente calcou todos os pressupostos e consequências que dão substância a esta matéria jurídica.   Historiador angolano
Notícia (Público, 6/7/16)
 O historiador luso-angolano Carlos Pacheco apresentou ontem Agostinho Neto – O perfil de um ditador. A História do MPLA em carne viva - no arquivo da Torre do Tombo, em Lisboa, num evento que contou com protestos, ânimos exaltados e até uma falsa ameaça de bomba.
Cerca de 100 pessoas estiveram presentes no lançamento, entre as quais Adolfo Maria, Alexandra Simeão, Zezé Gamboa e mais de 20 jovens que em protesto contra o título do livro vestiram t-shirts com a imagem do primeiro presidente angolano e a frase: “Agostinho Neto, pai da nação”.
Pacheco reúne documentos e depoimentos numa obra gigantesca que demorou dez anos a ser feita. É editada agora em dois volumes, 1471 páginas ao todo, num livro sobre o primeiro presidente do país e a sua actuação dentro do MPLA, antes e depois da independência, num esforço para traçar um retrato mais próximo da realidade e menos sujeita à ofuscação da imagem de mítico líder dada pela historiografia oficial.
“Entra-se nesse livro com uma sensação de vertigem”, explica Nuno Pacheco, jornalista e director adjunto do diário Público, convidado para apresentar o livro. Carlos Pacheco “traça o perfil do Agostinho Neto em paralelo com o movimento que chefiou e com a maneira como foi chefiando ao longo do tempo”.
“Entramos nesse livro pelos primórdios da luta de libertação, e pelos primórdios também do nascimento do MPLA, e vamos percebendo pelos vários caminhos, através dos documentos e dos factos, que as sementes de guerra em que Angola mergulhou durante 30 anos são muito antigas. As sementes dos ódios, das dissensões, lutas de fracções, lutas de grupos, prisões, perseguições, tudo isso vinha do passado. Não apenas no MPLA, existia também na UNITA e na FNLA, mas no MPLA existia em absoluta contradição com aquilo que eram os seus princípios programáticos. O que é mais estranho neste livro é ao mesmo tempo vermos a acção em contraponto com a lógica da propaganda, ou seja, a propaganda apontava para uma coisa e a acção mostrava outra”, continua o jornalista.

Entre os milhares de depoimentos, cartas e testemunhos, estão exemplos de situações que mostram que Agostinho Neto teria “pouco apreço ou ligação ao humanismo”, diz Nuno Pacheco, ao referir os defeitos do antigo líder citados no livro………….