sexta-feira, 30 de junho de 2017

Público de 24/6/2006: O INCÊNDIO


O horror foi suficientemente vasto para que se dê por finda a referência. Ainda hoje, foi tema de todo o debate de Pacheco Pereira, Lobo Xavier e Jorge Coelho, mais ainda do que na Quadratura passada, e todos disseram coisas acertadas, Jorge Coelho no seu papel de apoiante incondicional de António Costa, Pacheco Pereira no de crítico incondicional de Passos Coelho, Lobo Xavier no de seu censor também desta vez, por uma razão grave – a precipitação de crítica daquele, de intuito eleitoralista, apoiada em factos graves não fundamentados, o que é indesculpável em Passos Coelho. Os artigos seguintes, mais severos, não se coibiram de apontar o jogo de interesses que presidem à multiplicação dos incêndios no nosso país, mas na Quadratura do Círculo ignorou-se a questão, o que deixa subentender uma inibição de discrição, provavelmente proveniente do conhecimento das entidades prevaricadoras, que a crítica escrita torna mais vaga e menos directa, permitindo a permanência no crime impune desses tais do lucro incendiário. O artigo de João Miguel Tavares é severo e justamente indignado sobre uma questão condenável em tantas frentes, desde incúria nacional, irracionalidade interesseira no traçado da floresta, falência criminosa na gestão dos meios de combate ao fogo, escape às responsabilidades, e tudo isso espalhando o horror do inconcebível. O artigo de Manuel Loff não poupa António Costa nem os nossos “Trumps” florestais que contribuem criminosamente para a desumanização e isolamento da aldeia, com a conivência dos governos. José Pacheco Pereira rebuscadamente parafraseia Platão, convertendo em diálogo - canicular - uma questão grave, de forma sábia e filosófica, os três SSS – Simplício, Sagredo e Salvioti – desempenhando o seu papel de Sócrates tripartido, todos eles igualmente experientes e sabedores. No fundo, todos sentem raiva e desespero, perante uma situação que não acontecia dantes, num tempo em que me lembro de ir ao pinhal perto de casa, apanhar caruma e pinhas para acender a lareira…
I
O respeitinho não é bonito
Não nos atirem mais fumo para os olhos
João Miguel Tavares
A mera hipótese de que não haja responsáveis concretos pela tragédia, e de que tudo não tenha passado de uma lamentável maldade da mãe natureza, é um absurdo.
Deixemo-nos de sonsices. A não ser que em Pedrógão Grande tenha acontecido um fenómeno meteorológico nunca antes visto no planeta Terra – a combustão espontânea e simultânea de duas fileiras de eucaliptos e de duas dezenas de carros –, é evidente, absolutamente óbvio e totalmente cristalino que a morte daquelas 47 pessoas tem responsáveis e que ela representa uma falha gravíssima do Estado para com os seus cidadãos.
Quem são os principais responsáveis por essa falha, ainda não sabemos. Talvez a GNR. Talvez os bombeiros. Talvez a falta de coordenação da Protecção Civil. Talvez a falência do SIRESP. Talvez tudo em simultâneo. Mas se é cedo para dar resposta definitiva a estas dúvidas, já é mais do que tempo para termos esta certeza: a mera hipótese de que não haja responsáveis concretos pela tragédia, e de que tudo não tenha passado de uma lamentável maldade da mãe natureza, é um absurdo, uma inadmissível ofensa à memória de quem foi vítima da mais horrível das mortes, e é tratar por estúpido qualquer português que tenha dois olhos na cara e três neurónios a funcionar.
Quando vemos as imagens dos carros carbonizados e colados uns aos outros, significando que nenhum condutor estava a ver um palmo à frente do nariz; quando vemos a poucos metros da EN236-1 passar o IC8, muito mais largo e arejado, e que estava encerrado ao trânsito; quando vemos que o fogo começou antes das três da tarde e que estas pessoas terão morrido queimadas nos seus carros quatro horas depois; quando vemos tudo isto, não podemos engolir a postura dos paninhos quentes, dos dias de luto passados em pesaroso silêncio ou a reverência acabrunhada dos “afectos”.
Apoiar emocionalmente as pessoas é fantástico. Usar os abraços para desculpar a incompetência é obsceno. É uma vergonha o discurso de Marcelo na noite de sábado (“o que se fez foi o máximo que se poderia ter feito”; “não há nem falta de competência, nem de capacidade, nem de imediata resposta”). É uma vergonha ver os responsáveis pelos bombeiros e pela Protecção Civil andarem a fazer tudo o que podem para desvalorizar a ocorrência de falhas graves e de falta de coordenação. É uma vergonha que se confunda o esforço e a comoção dos vários intervenientes com a competência no desempenho das suas funções.
Eu cheguei a ouvir o secretário de Estado da Administração Interna comentar o facto de ele próprio ter salvo a família num incêndio em sua casa na década de 80. Acho óptimo. Mas esse episódio, tal como a eterna presença da ministra da Administração Interna de jaqueta laranja e sapatos ténis, é irrelevante. Mais: tanta presença ministerial cheira a tentativa de controlo político dos danos, mantendo uma vigilância permanente sobre quem deveria estar concentrado a combater o fogo – ou os assaltos, já agora, porque à subvalorização inicial da violência do incêndio seguiu-se a sobrevalorização do seu perigo, evacuando-se dezenas e dezenas de aldeias que foram pasto para assaltantes.
Uma semana depois, já sabemos muito – e o que sabemos não é bom. Tudo indica que a gestão inicial do incêndio tenha sido desastrosa e caótica. E esse caos, nem bombeiros, nem GNR, nem Protecção Civil, nem o Governo, vão ter interesse que seja conhecido na sua inteira extensão. Compete-nos lutar pela verdade. Saber o que realmente se passou na tarde do dia 17 de Junho de 2017 é a dívida que todos temos para com 64 pessoas que foram abandonadas pelo Estado português no momento em que mais precisavam dele.
II
OPINIÃO
O fogo, "um problema de ordem pública"...
Manuel Loff
O ministro da Administração Interna de então, austeritário como os demais do governo Sócrates, chamava-se António Costa. Espera-se que vá a tempo de corrigir isto tudo.

64 mortos em Pedrógão Grande, um número indeterminado de desaparecidos, a caminho dos 300 feridos. Da discussão que temos de fazer sobre o território, a "desumanização" do mundo rural (como lhe chama Jorge Paiva) e o papel das indústrias da madeira e do papel na determinação da política florestal não dependem apenas os lucros da indústria ou o que o Estado deve pagar pela discriminação positiva de territórios cada vez mais despojados de serviços e bem estar. Dependem vidas humanas. Sobre as consequências do aquecimento global podemos, como se tem feito, invocar o comportamento de Trump, mas era bem mais útil denunciar os nossos Trumps domésticos, a começar pelo lóbi das indústrias da fileira florestal.
Num mundo rural que perdeu, em poucas décadas, a grande maioria do seu peso na economia, a produção de madeira para a indústria é das raras atividades que nele são altamente lucrativas. Somos o 3º produtor europeu de pasta de papel. "A área florestal dedicada ao eucalipto tem vindo a aumentar substancialmente desde 1963, passando de apenas 3,8% da superfície florestal para 23,3% do total dessa área em 2005/2006." As "indústrias papeleiras são responsáveis pela gestão de cerca de 185 000 hectares de floresta (83% da qual é constituída por eucalipto)", espécie tão rentável quanto inflamável, "os quais abastecem cerca de 20% do volume total de madeira consumida" (estudo de E. Sarmento e V. Dores, Revista Portuguesa de Estudos Regionais, 2013). A eucaliptização é um facto, produz lucros muito acima de outras atividades económicas e tem um peso significativo nas exportações portuguesas. Que, perante a tragédia de Pedrógão Grande, se multipliquem as vozes que pretendem desviar a atenção da questão é a prova de que pode o fogo continuar a matar e a devastar todos os anos metade da superfície queimada da UE que, por este lado, não haverá tréguas: lucro é lucro. É, aliás, muito revelador ver quem, perante a exigência de assunção de responsabilidades e de reforma de fundo da floresta portuguesa, assobia para o lado e repete a velha ladainha de que o que temos "é um problema de proteção civil e de ordem pública. A monocultura do eucalipto é um falso problema" (presidente da Associação dos Proprietários Florestais, Antena 1, 22.6.2017). O argumento vem acompanhado das velhas teses conspiracionistas do presidente da Liga de Bombeiros (esse cacique dinossáurico do Pinhal Interior, Jaime Marta Soares) que, "contrariando toda a informação disponível sobre o assunto", como recorda Henrique P. Santos (PÚBLICO, 19.6.2017), continua a insistir em que "75% dos incêndios tem origem criminosa", incluindo o de Pedrógão. É exatamente a mesma atitude daqueles que desvalorizam qualquer esforço de explicação do crime ou do terrorismo: o que interessa é armar mais polícias e militares para os combater! Como se por detrás de todos os fenómenos naturais ou sociais estivesse a imprevisibilidade ou a maldade. "Quando um governante diz que o fogo é imprevisível (...) está claramente a fazer uma opção obscurantista de desprezo pelo conhecimento".
38% da superfície do nosso país é floresta. 98% dela é privada. O seu papel na vida das comunidades rurais mudou radicalmente com as migrações dos últimos 70 anos. A grande maioria dos proprietários são incapazes de gerir o que têm de floresta. Qualquer política de ordenamento e gestão do território tem de contar com esta realidade sociodemográfica e assumir o dever de discriminação positiva que implica mais recursos e mais despesa - ou, em alternativa, sofrer mais incêndios e mais mortes. Ter acabado com os Serviços Florestais em 2006, distribuir as suas funções por cinco entidades desarticuladas e com poucos recursos, "esquecendo-se da conveniente profissionalização e apetrechamento dos bombeiros", também não ajudou, como o denuncia há muitos anos Jorge Paiva. No decreto de 2006 invocavam-se "razões de racionalidade e eficiência económica [que] desaconselhariam desde logo a criação de um serviço autónomo da Administração Pública (...) vocacionado para a prevenção e a intervenção de primeira linha em incêndios florestais".
O ministro da Administração Interna de então, austeritário como os demais do governo Sócrates, chamava-se António Costa. Espera-se que vá a tempo de corrigir isto tudo.
III-ESPAÇO PÚBLICO
Conversas a 40º
José Pacheco Pereira
À medida que se caminhava para o calor dos trópicos, as pessoas pensavam pior.
 [Simplicio, Sagredo e Salviati estão à sombra de um dia de 40º. Não sei bem onde os colocar, porque têm que estar parados. Ninguém se mexe com 40º a não ser que seja obrigado ou seja trabalhador ou pobre. Numa esplanada urbana, há sempre turistas a mais. Make Porto podre again, está escrito na parede. Num bar de hotel, envolvidos por uma lista com cinquenta gins tónicos diferentes, e ar condicionado, é mau cenário para uma conversa destas. Chaparros que dão sombra eficaz com 40º são um mito rural alentejano. Na praia? Salviati não gosta de praia, Sagredo é indiferente e só Simplicio gosta. Simplicio ficaria muito inteligente, e Sagredo muito estúpido. Não dá. Mas em frente ao mar, sem ser na praia, serve. No Norte, com cheiro a maresia, sem praia, serve. Vem no Roland Barthes, mas ninguém já o lê. É ficcional o arranjo, porque com 40º não há cheiro a maresia. Comecemos.]
Sagredo – De que falamos?
Simplicio – Dos fogos.
Salviati – Já chega!
Simplicio �� Enquanto for notícia, nunca chega. Os fogos sugam tudo: fora deles nada interessa a ninguém.
Salviati – Não é bem assim, como já vamos ver. Seja. Os fogos.
Sagredo – Mas não achas que se fala demais? Não estás também tu a discutir os fogos e a participar na logomaquia dominante?
Salviati – Estou, mas defendo-me.
Sagredo – Como?
Salviati – Estou a fazer um diálogo e os diálogos desafiam as citações. Quem tiver que colocar uma citação no jornal vai-se ver aflito.
Simplicio – Isso é maldade com o jornal.
Sagredo – De que falamos então?
Simplicio – Dos fogos. Dos mortos. Da culpa.
Salviati – Tem mesmo que ser?
Simplicio – Tem. Está na agenda e se não falarmos do que está na agenda, ninguém nos ouve. Está tudo virado para o mesmo lado e a agenda só pode ter um tema. Dois já colidem entre si. Os fogos são hoje a agenda…
Sagredo – … não é bem assim. Os escândalos do futebol ocupam quase tanto tempo como os fogos, só que é fora dos noticiários. Fogos nos noticiários, futebol nos programas de conversa.
Salviati – Mas o que é que há para ser discutido no futebol? O futebol é o ruído de fundo da comunicação social, está lá sempre, de vez em quando invade tudo. Agora com os fogos, perde os noticiários, mas está lá sempre. É a doença infantil da comunicação social portuguesa.
Sagredo – Parece que os clubes estão a contratar hackers para entrarem nos computadores e telefones uns dos outros. E depois encontram exactamente aquilo que estão à procura…
Salviati – … o espelho daquilo que eles mesmos têm nos seus computadores e telefones. Que interesse é que isso têm? Falcatruas, amantes, ameaças, corrupção aos árbitros, alegria com a desgraça alheia, bares de alterne, restaurantes da moda, insultos, negociatas, escatologia. Parece uma ópera bufa.
Simplicio – O povo gosta. Os vermelhos ficam felizes quando são os azuis que se tramam, e vice-versa.
Sagredo – Sim, a nós tudo se desculpa e é permitido, aos “outros” é um escândalo.
Salviati – É a escola Trump.
Sagredo – E o que pode ser importante, isso não se discute, ou só se discute com falinhas mansas.
Salviati – Os impostos por pagar, a fuga ao fisco. Na verdade, ninguém quer saber se o Ronaldo fugiu ou não aos impostos. É o Ronald ou o “special one”. Podem sair de casa e dar um tiro na rua num passeante e tudo continua na mesma.
Simplicio – Estou a ouvir-te pensar: “É a escola Trump.”
Salviati – É. É por isso que eu não dou um tostão pelas denúncias populistas da corrupção. Param sempre nos “nossos”. Em Portugal então é uma enorme hipocrisia.
Sagredo – E nos fogos não há hipocrisia?
Salviati – Muita. Quem os viveu tem medo e alívio. A maioria das pessoas, - e isso é a coisa mais sã no meio destas coisas, - não quer sequer pensar no que aconteceu a quem morreu. E vos garanto que as pessoas são muito capazes de recriar mentalmente as cenas…
Sagredo – …e são terríveis. Esse choque fica lá no fundo e não passa facilmente. Mas é interior, indizível, íntimo. Não se desabafa, não se conversa, não se fala.
Simplicio – E a culpa?
Salviati – A culpa é já outra coisa, já implica um afastamento, uma distância. Pode parecer estranho, mas já é um mecanismo de apaziguamento face à tragédia, abre caminho para inserir o indizível no dizível. Podemos já então falar sem que o mero acto de falar seja ofensivo.
Sagredo – É por isso que o mecanismo comunicacional explora o pathos enquanto há choque, alimenta-o e prolonga-o e depois, quando se esgota, começa a normalizá-lo com a discussão da culpa. A culpa ajuda a tornar o que aconteceu num “assunto”. Passa de drama a “assunto”.
Simplicio – Mas isso não favorece a passagem do pathos para o logos, de que estás sempre a falar?
Salviati – Parece, mas não é. O que emerge não é uma discussão racional, como seria se ela fosse centrada nos factos, nas causas, nos eventos, na identificação de quem é responsável e por quê, mas um prolongamento menos dramático do pathos, um pathos menor, que, como sabem os leitores de audiências, tem menos valor comunicacional, é menos poderoso e dura menos. Por isso, os sinais de que o impacto mediático dos fogos e dos mortos já está na fase decrescente, são evidentes. Dentro de pouco tempo, o futebol vai de novo ocupar o lugar dos fogos nos noticiários, e os fogos não tem a mesma condição de ruído de fundo do futebol, que se está sempre a ouvir, e vão-se extinguir. Até à próxima calamidade.
Simplicio – E os políticos?
Salviati – Com esta passagem para a logomaquia mais habitual…
Sagredo –… como a nossa…
Salviati – … como a nossa, as personagens mudam. Acabam os moradores, as testemunhas, acabam os “locais”, as aldeias, as serrações queimadas, a devastação, passa tudo a filme de arquivo e entram em cena as “autoridades”, a competição política, os “meios”, os custos, o dinheiro.
Sagredo – Os bombeiros, os autarcas, a Protecção Civil, os secretários de estado, os ministros, o Primeiro-Ministro, o Presidente, os cientistas e os técnicos de fogos, da floresta, do ordenamento. Aparecem as burocracias.
Simplicio – Mas não tem sentido que se pergunte sobre as responsabilidades, sobre as culpas, sobre as negligências, sobre os erros?
Sagredo – Tem todo o sentido.
Salviati – Mas o que emerge é o pensamento utilitário, que quer tirar vantagens do que aconteceu. E isso é uma das nossas maiores pobrezas: a escassa independência, o simplismo das acusações, a afronta das defesas, a irresponsabilidade generalizada, a cultura da protecção política. As pessoas começam a alinhar conforme gostam ou não do governo, conforme pensam que podem tirar vantagens da tragédia, a inquinar o assunto, com culpas e passa-culpas. Metade só está a pensar em como escapar às responsabilidades, reais ou imaginárias, e a dizer que o que aconteceu já vem detrás, e a outra metade a pensar que tudo o que correu mal foi responsabilidade dos actuais governantes. As duas coisas são verdade, mas o equilibro entre elas é falso e impede a discussão. Estamos já nesta fase, a dos exércitos combatentes, dos clubes em armas, dos vermelhos contra os azuis. O terreno mais favorável vai ser a Assembleia, e é para lá que isto agora vai.
Simplicio – Assim não se vai a lado nenhum.
Sagredo – Assim não se tem ido a lado nenhum.
Salviati – Mas então há uma terceira fase, que está por detrás de tudo, e que depois vai, com toda a discrição que puder ter ou comprar, tornar-se dominante: a dos interesses que estão presentes na floresta portuguesa. Dos grandes, dos pequenos dos médios. Dos proprietários individuais, aos compartes dos baldios, às empresas de celulose, ou mesmo nalguns casos na exploração imobiliária. Esses todos falam baixo, mas forte, Vão ser os limites de quaisquer soluções, em nome do empreendorismo, da propriedade privada, do poder autárquico, das “populações”, dos negócios dos bombeiros aos aviões. Até agora tem impedido que as coisas mudem, vamos ver como vão actuar.
Simplicio – Sempre pessimista.
Salviati – Talvez, a culpa é dos 40º. Não é uma temperatura em que se pense bem.
Sagredo – Estou virado para dar razão ao General Kaúlza de Arriaga que dizia que à medida que se caminhava para o calor dos Trópicos, as pessoas pensavam pior.
Salvaiti. Se calhar.


quinta-feira, 29 de junho de 2017

Lições de História actual


São antigos os textos seguintes, que informam e comentam, sobre casos já idos mas ninguém nos diz que não se repitam. O de Paulo Rangel é mesmo assustador, na referência aos tantos interesses em jogo, lá para os lados de Sarajevo, que nos ficou gravado na memória da nossa incultura como um slogan justificativo da 1ª Guerra Mundial – “O Atentado de Sarajevo”- contra o arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do Império Austro-Húngaro em vias de se desmoronar. Revivi, literariamente, é certo, as andanças dos Thibault em torno dessa Primeira Grande Guerra da obra de Martin Du Gard que tanto impacto teve na minha juventude, e só desejo que, contrariamente ao previsto e bem esmiuçado por Paulo Rangel acerca dessas novas manobras de interesses na Europa Central ameaçadores da paz, esta consiga segurar-se ainda, com os esforços de Macron e Merckel, se é que as suas políticas de abertura democrática não contribuirão antes para a tal guerra de que os atentados terroristas – embora não mais a arquiduques - vão semeando os indícios. Esperemos que isso não aconteça.
1º TEXTO: Terror em São Petersburgo
Qualquer graduação no impacte, na forma de repúdio até a nível emocional, é um modo enviesado de dar a entender que há reações diferentes face ao terror.
Público, 8 de Abril de 2017
Domingos Lopes
Já se sabia o que foi confirmado com o atentado terrorista contra os passageiros do metropolitano de S. Petersburgo. Há mortos e mortos. Os nossos. E os outros. Os nossos mortos são franceses, ingleses, belgas, estadunidenses ou alemães. Os outros são todos os outros, embora nesses outros todos também há uns mais que outros.
Os russos mortos em S. Petersburgo não mereceram os tempos de antena que os media ocidentais deram aos mortos do passeio de Westminster ao pé do parlamento do Reino Unido. E muito menos a emoção das emissões. A obrigatória referência à relação da Rússia com os bombardeamentos na Síria não teve equivalência nos media no que concerne aos bombardeamentos na Líbia ou no Iraque por parte da Grã-Bretanha.
Os seis mortos em Londres foram mortos por um britânico que estaria ligado ao Daesh, segundo a revindicação do Daesh. Os 11 mortos do metropolitano de S. Petersburgo foram mortos, segundo as autoridades russas, por um quirguize com ligação ao extremismo islâmico.
Na tarde do dia 3 de Abril, as televisões “pararam” para passar a comentar os acontecimentos de Londres. O atentado em S. Petersburgo não teve o mesmo tratamento, embora as vítimas fossem mais, mas não eram bem as nossas.
Houve até quem referisse que a Rússia de Putin tem problemas com os muçulmanos da Chechénia que faz parte daquele país; o que não acontece à Líbia, ou o Iraque, que os ingleses foram atacar militarmente.
Os chechenos podem não ser russos, podem querer ser independentes como os bascos ou os escoceses ou os catalães, mas por ora são parte da Rússia. Os catalães têm de ser espanhóis, como os bascos. Os chechenos, se ficassem independentes, enfraqueciam a Rússia… como os kosovares enfraqueceram a Sérvia.
Os sírios, os iraquianos, os iemenitas, os líbios, esses não são seguramente ingleses nem britânicos. Ao contrário do terrorista que atacou em Londres, que era cidadão do Reino Unido, o que atacou na Rússia não era russo.
Há uma diferença, embora todo o terrorismo só possa ser considerado do mesmo modo ignóbil.
O terrorismo no Ocidente é brutal e hediondo; o mesmo ocorre em S. Petersburgo ou em Moscovo. Onde quer que aconteça. Nenhum tem qualquer espécie de justificação e as condenações devem assumir as mesmas dimensões políticas, éticas, religiosas, emocionais e psicológicas, naturalmente em termos gerais. 
Todo o terrorismo é condenável, incluindo, por maioria de razão, o terrorismo de Estado, o qual é muito mais violento e tem outra proteção. As mortes humanas causadas pelos terroristas são quase sempre todas elas de cidadãos inocentes desligados de qualquer responsabilidade pelas políticas prosseguidas por certos governos.
Num contexto de vivência democrática, no interior de uma dada sociedade há uma luta que se pode e deve travar contra o que se considera errado; luta essa que os cidadãos podem utilizar e com ela dar expressão à concórdia ou ao repúdio pela ação dos respetivos governos. O terrorismo tem como objetivo tentar em vão paralisar o modo de viver de certas sociedades e o de tentar tomar ou manter poderes em certos países ou regiões que controlam ou pretendam vir a controlar.
O terror é uma arma para tentar impor uma política que impeça os cidadãos de desfrutarem a segurança acompanhada das liberdades e direitos cívicos arduamente conquistados. Mas é também uma política contra os próprios muçulmanos no sentido de os impedir de usufruírem direitos e liberdades universais, na medida em que os coloca sob o terror dos jihadistas.
Segundo o autoproclamado califa e os dirigentes jihadistas do Daesh, esta é a vontade do Deus que proclamam adorar, bem sabendo que a sua interpretação é tão hostil à vontade das gentes que só por via das crucificações, amputações e degolações se impõem à generalidade dos crentes muçulmanos.
2º TEXTO: Nos umbrais da guerra (em sentido literal)
Se Macron não for capaz de apresentar uma visão convincente para a França e para o seu lugar na Europa, Le Pen pode vencer. Repito: pode vencer. E por isso esta é uma semana de angústia, de inquietação, de desassossego.
Público, 2 de Maio de 2017
Paulo Rangel
1. Esta semana que antecede a segunda volta das eleições presidenciais francesas é uma semana particularmente difícil. Quase todos dão como certa a vitória de Emmanuel Macron, com mais ou com menos diferença para Marine Le Pen. Mas em caso algum se deve ter isso por garantido. Le Pen é uma candidata muito experiente e que, apesar das suas ideias populistas e extremistas, conseguiu uma aura de credibilidade. Nada tem a ver com o estilo Trump, Wilders, Grillo ou do seu pai – que, mesmo assim, não deixaram de, num ou noutro momento, acumular vitórias. É muito mais sofisticada, muito mais articulada, muito mais convicta, muito mais perigosa portanto. Quem julga que a contenda está ganha, engana-se. Se Macron não for capaz de apresentar uma visão convincente para a França e para o seu lugar na Europa, Le Pen pode vencer. Repito: pode vencer. E por isso esta é uma semana de angústia, de inquietação, de desassossego.
2. E, no entanto, na sombra, muito na sombra, há uma porção da Europa que caminha aceleradamente para a guerra. Para a guerra em sentido literal. São os Balcãs e, designadamente, as antigas repúblicas jugoslavas que não fazem parte da União Europeia. Para quem, por dever de ofício (por ter o pelouro da “filiação” – “membership” – na presidência do PPE) tem de acompanhar de perto a vida política interna desses países e tem de os visitar de tempos a tempos, a situação é alarmante. O caso mais grave é o da Macedónia – da antiga república jugoslava da Macedónia –, onde a etnia eslava cristã e a etnia albanesa muçulmana se digladiam violentamente. O país, totalmente contaminado pela corrupção, está à beira do caos e da guerra civil. Sem qualquer exagero ou hipérbole, a guerra está iminente.
3. Neste momento, o factor de maior perturbação é a ambição do vizinho albanês. Os líderes albaneses sonham com a criação da Grande Albânia, que incluiria parte da Macedónia e o Kosovo. Todos os dias a Albânia intervém nas lides políticas macedónias, incendeia e exacerba as posições contrastantes. Os albaneses – e os macedónios albaneses – estão a ser directamente patrocinados por Erdogan e pela Turquia, que sonha, por sua vez, com o estender do velho e longo braço otomano. A inspiração e conspiração turca é completada pelo suporte financeiro da Arábia Saudita e do Qatar, que não cessam de inundar os seus aliados com recursos monetários. Os protagonistas do Golfo actuam basicamente no domínio religioso, enviando os religiosos wahabitas para todas as mesquitas e pagando quantias mensais relevantes (na casa dos 100 euros) às famílias muçulmanas que obriguem as suas filhas e os seus filhos a adoptar os preceitos mais fundamentalistas (designadamente, em sede de indumentária e de prática religiosa). Os macedónios eslavos, de religião ortodoxa, recebem, pelo seu lado, o apoio da Sérvia (também impregnada do sonho de, mais dia menos dia, restaurar a Grande Sérvia). E com a ajuda sérvia vem naturalmente o alto patrocínio da Rússia e de Putin. Putin e Erdogan jogam no tabuleiro balcânico com todas as pedras e já sem nenhuma cerimónia ou disfarce. Aqueles que crêem que há uma santa aliança entre o czar e o sultão, também podem desenganar-se. Não é necessário lembrar que, ainda muito recentemente, foi a Turquia que documentou e certificou o ataque químico do Governo sírio, algo que não poderia desagradar mais a Moscovo. Mas basta visitar os Balcãs para compreender como a Rússia e a Turquia, os seus aparelhos de influência e as suas máquinas de propaganda, se enfrentam no terreno.
Importa perceber que se a Albânia interferir no conflito civil macedónio, a Sérvia reagirá imediatamente. A Sérvia, de resto, já só aguarda esse pretexto para entrar no Norte do Kosovo e descer até à Macedónia, recuperando assim a parcela de terra onde se formou a sua “alma nacional”. E, nesse caso, Albânia e Sérvia serão os procuradores encartados da tensão entre Turquia e Rússia.
4. Quase ao pé do desastre está ainda a Bósnia-Herzegovina com a sua presidência tripartida – muçulmana, sérvia e croata –, onde têm assento três políticos do pré-guerra. Também aqui os sauditas investem fortemente, transformando os arredores de Sarajevo num novo destino turístico para a sua classe média e numa ilha de fundamentalismo religioso empedernido. Os líderes bósnios muçulmanos visitam Ancara e Erdogan todos os meses. Os sérvios, praticamente autodeterminados na República Srpska, já só dialogam com Belgrado e Moscovo. Os croatas recebem passaporte da Croácia para poderem emigrar para a União Europeia como cidadãos europeus. Na federação bósnio-croata, os alunos muçulmanos têm aulas de manhã e os alunos católicos à tarde, de forma a não se encontrarem. A convivência entre jovens das três comunidades foi reduzida a zero, justamente nos antípodas do que se passava nos tempos da federação jugoslava. No início de 2016, os sérvios bósnios promoveram um referendo para criar o seu feriado nacional, o que, para lá de ser declarado inconstitucional, foi visto como um ensaio para a secessão. Como resposta, o presidente bósnio muçulmano recorreu, no último dia possível (28 de Fevereiro passado), da decisão do Tribunal da Haia que absolvia a Sérvia de apoio directo ao massacre de Srebrenica. Fê-lo à revelia dos outros dois membros do colégio presidencial e entretanto não teve sucesso, mas incendiou por completo as já periclitantes relações políticas. Com a emulação turca e russa, com uma enorme passividade europeia, nunca as coisas estiveram tão mal. A Bósnia caminha para o desastre e não se vê quem possa travar o reacender da guerra.
A União Europeia, centrada nos seus problemas, adormeceu na região, descansando numa ajuda financeira que todos aproveitam mas que nenhum agradece. O esquecimento a que votou os Balcãs deixou todo o terreno à Rússia, à Turquia, ao Golfo e até à China. Esse olvido vai ser pago com o sangue das populações locais e com uma enorme crise de refugiados. É tarde, bastante tarde.
3º TEXTO:  Como aproveitar as boas notícias vindas de França
O que pode ser feito para aproveitar a vitória de Macron e fazer avançar ainda mais a luta contra o populismo?
Público, 26 de Maio de 2017
Kenneth Roth
A vitória de Emmanuel Macron contra Marine Le Pen permite a quem estava preocupado com o crescimento do populismo antiliberal dar um suspiro de alívio. A margem de vitória de Macron, de dois para um — mais do que as sondagens tinham previsto — representa um “non” firme dos eleitores franceses às políticas de ódio e intolerância antimuçulmanas e anti-imigrantes de Marine Le Pen.
No entanto, um triunfo único do liberalismo democrático não é propriamente um momento para complacência. O partido de Le Pen ainda pode ter um bom resultado nas eleições legislativas francesas, em Junho. Os populistas continuam no poder na Hungria e na Polónia e a União Europeia tem sido lenta a desafiar o desmantelamento por parte destes dos pesos e contrapesos da autoridade executiva e o seu desprezo pelos valores de tolerância e abertura do bloco europeu. Entretanto, a primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, deixou claro que o objectivo do seu governo não é apenas o “Brexit”, mas também impor limites à aplicação dos padrões de direitos humanos, seja através da revogação da Lei de Direitos Humanos britânica ou do abandono da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Para lá das fronteiras da UE, populistas de vários géneros estão no poder na Turquia, na Rússia, no Egipto, na Índia, nas Filipinas e, claro, nos Estados Unidos. Cada um destes líderes, falando em nome do “povo”, revelou estar disposto a esmagar os direitos das minorias desfavorecidas e, muitas vezes, até dos críticos dominantes.
O que pode ser feito para aproveitar a vitória de Macron e fazer avançar ainda mais a luta contra esta forma perigosa de populismo? É útil começar por analisar as preocupações públicas de que os populistas tiram partido. Os populistas são muito bons a oferecer soluções fáceis a problemas complexos — tipicamente, fazendo dos mais vulneráveis bodes-expiatórios —, mas isso não nos deve distrair das queixas muito reais que estão por trás do seu crescimento.
A economia global e a mudança tecnológica deixaram muitos trabalhadores a sentir que tinham sido deixados para trás, com muitos deles a perder o emprego ou a ter reduções no salário. Claramente, os líderes que aceitaram a visão económica de que o comércio livre iria expandir a economia para benefício de todos não prestaram atenção suficiente à forma como estas recompensas económicas iriam ser distribuídas e como os trabalhadores atingidos iriam ser afectados. Uma defesa útil contra o populismo pode ser produzida garantindo uma rede de segurança social adequada, passos para melhorar a formação profissional e lidar com o desemprego e uma partilha mais equitativa dos benefícios do crescimento económico, inclusive através da rectificação de políticas fiscais que favorecem injustamente os ricos.
Uma defesa contra o populismo também exige que se abordem os problemas da imigração e da integração. Há factores fortes que atraem pessoas para a Europa e o Ocidente: a fuga da perseguição, da pobreza e do conflito, juntamente com a necessidade que o Ocidente tem de trabalhadores para suplementar as suas populações decrescentes. No entanto, os países europeus, de um modo geral, não fizeram um bom trabalho na integração das comunidades imigrantes, como exemplificam as zonas de desespero nos subúrbios de Paris. A defesa contra o populismo exige uma maior atenção aos obstáculos da integração, incluindo a discriminação na habitação, educação, emprego e policiamento. Também exige uma discussão mais franca sobre o equilíbrio apropriado entre a imigração e a integração, uma vez que a incapacidade de um governo para dar os passos necessários à integração é um caminho seguro para haver oposição pública a mais imigração.


quarta-feira, 28 de junho de 2017

Artigos de ANTÓNIO BARRETO


Sem Emenda, é o seu antetítulo, o que implica o sentido de análise crítica que os informa. O primeiro, entre elogios e censuras, é uma denúncia de uma situação que parece caricata, se não for temível. O Parlamente de uma União europeia, que se pretende democrática, sujeito ao aval do Parlamento de uma nação dessa União. Já é pecha antiga, não se deve estranhar, até favorece as guerras do expansionismo e da vileza. E com Emmanuel Macron, já outros o disseram, as energias positivas da nova aliança mastigarão em conformidade, retirado o Reino Unido do percurso da pseudo omnipotência germânica. Aguardamos, provavelmente agachados, esperando o cibo, gratos e esquecidos, bicos escancarados em pipilares clamorosos.
O segundo texto é sobre a hipótese de uma deslocalização para Portugal da Agência de Medicamentos sediada em Londres, de que o Brexit implica a transferência para um país da União. Seria uma candidatura de Lisboa, subentendia-se, mas as nossas habituais disputas internas assentes nas invejas e interesses que brotam no solo pátrio como bichas de rabiar, logo travam as hipóteses construtivas, ainda antes do processo se iniciar, atemorizando naturalmente os que têm as decisões em mão. No mínimo, tais obstáculos tão ridiculamente criados, de galarós em disputa, revelam quão minúsculos somos, habituados que estamos aos programas futebolísticos exibicionistas televisivos, que, embora sem lirismo adequado, mas de jeito façanhudo, “enclausurado nas duas polegadas do coração, não compreendendo dentre todos os rumores do Universo senão o rumor das saias de Elvira”, que é como quem diz o rumor dos pontapeados e das cabeçadas de jogadores e de clubes, são uma impertinente prova da monocórdia televisiva portuguesa, complementar da mesma pasmaceira que ditava os lirismos de outrora, motivo da crítica de Eça no seu Fradique.
Para quando a mudança? Nunca, pois não dá audiência. Digo, na televisão.

A liturgia democrática
António Barreto
DN, 18/6/2017  -   SEM EMENDA
Todos merecem parabéns! Os portugueses em geral, António Costa, Mário Centeno, o governo e os partidos que o apoiam e os sindicatos: pelo que fizeram e pelo sentido de equilíbrio. Mas também a troika, os exportadores e o governo anterior, que preparou parte do caminho feito. São dias de congratulação e de lugares-comuns.
Quase todos merecem também condenação. Muitos dos que acima são referidos, mais José Sócrates e seu governo, banqueiros e ex-banqueiros, assim como ministros, uns empresários das rendas e das PPP e os autarcas dos swaps. Todos merecem um julgamento impiedoso por terem contribuído para a ruína de Portugal.
É falsa a percepção de que só um governo, este ou anterior, fez o que tinha a fazer. É errada a noção de que a austeridade não era necessária. E é finalmente perigosa a ideia de que o essencial está feito e já temos uma folga. Muito falta fazer, como todos sabem, mesmo os que não querem dizer.
Nas televisões, ouvimos Schäuble sobre as pretensões do governo português: "Já remeti ao Parlamento alemão o pedido de Portugal para sair do défice excessivo da UE e para adiantar o pagamento ao FMI. Estou convencido de que o Parlamento aceitará e não haverá problemas. Portugal é um caso de sucesso!" O homem estava visivelmente satisfeito. Depois, também disse umas tolices sobre Centeno e Ronaldo.
Uma pequena nota passou desapercebida: "Já remeti ao Parlamento federal..." Pois é. O poderoso governo alemão, a potente Angela Merkel e o irascível Wolfgang Schäuble têm de fazer o caminho do calvário, ir a Berlim pedir aprovação ao Parlamento. Sabemos que será coisa fácil, neste caso. Sabemos que pode ser mera liturgia. Mas terá de ser feito. O que funciona de duas maneiras. Obriga à aprovação posterior, tal como exige negociações anteriores.
Mesmo para questões europeias, a Alemanha nunca renunciou totalmente às instituições nacionais. O Parlamento federal alemão é, por vezes, a última instituição a pronunciar-se em toda a Europa e a demonstrar que a palavra final é sempre alemã! Também o Tribunal Constitucional se ocupa de inúmeras casos de decisões constitucionais europeias e toda a gente espera pelos seus acórdãos. E não esqueçamos que frequentemente compete aos parlamentos estaduais alemães aprovar decisões europeias.
Destes factos há lições a retirar. E experiências sobre as quais meditar. É chocante verificar o facto de o Parlamento alemão ter mais poder do que o Europeu. Atrás da Comissão e do Conselho, a verdadeira estrutura parlamentar é o Bundestag! Mas o essencial desta história não é a hegemonia alemã, contra a qual podemos rosnar. O essencial deste episódio reside na ligação entre União e Estado, entre as instituições europeias e as nacionais. Os alemães não abdicaram desta relação.

Um Parlamento trivial
António Barreto
DN, 25/6/2017 -   SEM EMENDA
A Agência Europeia de Medicamentos poderá vir para Portugal! A saída da Grã-Bretanha da União tem consequências destas. Organismos estabelecidos no Reino Unido serão deslocados. Dezenas de empregos apetecíveis serão criados noutros países. Muitos funcionários sairão de Inglaterra. Centenas de funcionários britânicos deixarão Bruxelas, Estrasburgo, Luxemburgo e outras localidades onde existem representações. Em vários países, por efeitos do despedimento de britânicos, abrirão vagas e empregos. Percebe-se. É uma maneira de castigar os irreverentes e de favorecer os disciplinados. Também é verdade que mal se compreenderia que uma agência não estivesse sediada num país membro. Cargos até hoje ocupados por ingleses ficarão acessíveis à competição: muitos são os técnicos e os cientistas, indivíduos e empresas, que se preparam para colher os despojos. Uns casos serão decididos por mérito e concurso, outros pela família ou o partido.
Há, na União, dezenas de instituições que desempenham funções importantes e beneficiam de elevados orçamentos e de quantidades de pessoal qualificado. Todos os países querem ter organismos destes dentro das suas fronteiras. Os mais poderosos conseguem os melhores. Uma dúzia de países lançou-se atrás da Agência de Medicamentos. A sede fica num prestigiado centro de edifícios modernos, em Canary Wharf, Londres. Trabalham lá 800 funcionários de elevada competência técnica. O organismo tem a tutela, por assim dizer, de umas dezenas de instituições nacionais que tratam dos medicamentos e das indústrias farmacêuticas.
Já há 18 candidatos, entre os quais Barcelona, Paris, Amesterdão e Milão. Assim foi que o governo e o Parlamento decidiram candidatar Lisboa à localização da agência. Tudo corria bem, até que surgiu a polémica. Então e o Porto? A resolução votada no Parlamento era explícita: Lisboa! Os deputados não viram. Ou não se deram conta. Ou não perceberam. Ou foram obrigados a mudar de posição. Algo aconteceu. Os chefes partidários, os deputados de várias cidades e os organismos locais dos partidos acordaram! Pensaram nas autárquicas. Na descentralização. Nas regiões. Uns mudaram de opinião e disseram, outros mudaram e não disseram, outros ainda não mudaram... Dias depois, com o coração apertado pelas autárquicas, o governo decidiu reabrir a hipótese de outras cidades, isto é, do Porto. E até o primeiro-ministro afirma que foi enganado! Sobra a questão: o que se passou para que uma unanimidade fosse posta em causa em tão poucos dias por tanta gente? Como foi possível?
Pense-se num dia de votações no Parlamento. Veja-se como aquilo funciona e percebe-se que tudo é possível. São listas de votações automáticas, umas seguidas às outras, para que ninguém falte e não haja surpresas. A música é conhecida e vê-se bem no Canal Parlamento. Resolução número tal, projecto de lei número tanto, proposta disto e daquilo, quem vota contra, quem aprova, quem se abstém, está aprovado pelos partidos tal e tal, rejeitado pelos partidos assim e assado. Quando o presidente pergunta quem vota a favor e contra, de cada grupo levanta-se um senhor ou senhora, é como se todos se levantassem, não há indivíduos nem pessoas, não há deputados nem representantes, há unidades colectivas, regimentos e claques. Voto sindicado e obediente. Vota um por todos.




terça-feira, 27 de junho de 2017

Faltou o “à séria” do nosso riso triste

Porque este “à séria” abunda cada vez com mais estridor, na oralidade dos nossos falantes da novelística televisiva nacional, como detectei há dias em “Amor Maior”, em actores e actrizes que respeito nas suas qualidades de representação artística, e que deixaram essa nódoa pestilencial no pano da sua reputação, embora ela se deva assacar, talvez, antes aos autores ou encenadores desatentos em questão de purismo linguístico, no que toca às camadas culturais e sociais mais distintas, pelo menos, pois os falantes “populares” são bom veículo de prevaricação linguística que favorece a deseducação do  povo, incapaz de distinguir o erro da graça. Refiro-me em especial aos actores Maria João Abreu e José Raposo, cujo excelente desempenho é responsável pelo aprofundar dos chutos grosseiros na gramática, necessariamente hilariantes e realistas, mas por isso mesmo favorecedores do enraizar dos erros grosseiros do povo, que, felizmente, já vê telenovela, mesmo sem conhecer a gramática da sua língua.
Já reparei, no entanto, que quanto maior é a chamada de atenção para o erro, mais ele fortalece e se ateia, tal como o fogo no matagal. O nosso PM é bem exemplo de alguns dos erros que aponta Bagão Félix, indiferente à sua correcção, caso da insistente «competividade» que, embora deformada, é sempre de manter como gloriosamente tem revelado.
Há mesmo quem adira à perversão do erro, e alguns comentários que mereceu o artigo de Bagão FélixCuidado com a língua”, o demonstram, sem respeito pelas regras, como o de Silva, que cito, pelo seu pretensiosismo adulador do inglês ou do português crioulo, e desprezador da sua língua, indiferente ao caos a que conduz esse desrespeito e desamor que manifesta, como tantos outros, numa ironia displicente de quem prefere curvar-se ao prestígio alheio, como meio pedante de auto-saliência intelectual perfeitamente irrisória:
«Silva, 14 de Junho: :O artigo está perfeito mas a mensagem arrepia. O espectro terrível da professora primária por instantes chegou a materializar-se mesmo à minha frente.
É claro que deve haver respeito pelas regras, mas uma língua deve ser sobretudo um meio vivo, descomplicado, estimulante, para fomentar comunicação e pensamentos. O crioulo transgressor dos brasileiros, por exemplo: é magnífico, e é isso que torna a Língua tão viva entre eles, criativa e fervilhante. Já entre os angolanos, ao contrário, enfronhados no formalismo da velha escola, e subjugados a estas coisinhas, a estes preciosismos inibitórios, a coisa é um terror; mesmo entre quadros qualificados. Hoje poucos se atrevem a redigir um relatório e muitos tremem só de pensar nisso. Até o pensamento lhes fica tolhido. Não admira, pois, que encontrem mais riqueza no gentílico. O caboverdino acabou por adoptar o crioulo como primeira língua e o português como ‘língua segunda’… e os outros lusófonos mais ou menos a mesma coisa perante tanta regrinha antipática.
Para Língua culta o mundo tem adoptado invariavelmente o inglês pelo seu potencial prático, conciso, simples e lógico. Exactamente o contrário do emaranhado de regras rocambolescas que fazem relegar este velho português para a prateleira das bizarrias. Não admira, pois, o brilhante futuro de uma e o ridículo declínio ensimesmado da outra. Para além de que em qualquer caso é sempre péssimo sinal (e crassa má educação) quando se objecta sobre o acento trocado ou o preciosismo filológico e nada se atende da substância comunicada.»
A este seguiu-se o comentário de Am que não resisto a transcrever:
«Am: Ninguém está a criticar calinadas na gramática resultantes do uso de gírias ou crioulo. O que está em causa é o espectáculo desolador da expressão oral e escrita que campeia em alguma comunicação social, nomeadamente na TV pública, que não tem paralelo com o que vemos por ex. no Brasil. A ideia de que o Português não se presta a que nos exprimamos de forma clara, simples e concisa também é cliché agora que o inglês está na moda. Como se costuma dizer – quem pensa claro fala claro …»
Mas agradecemos a Bagão Félix o cuidado na recolha de exemplos para o seu artigo atento, de quem ama realmente a sua língua, que tem tanto direito a pertencer ao mundo bem falante como outra de quem quer que se respeite, o que é, indiscutivelmente, o caso de Silva.
Cuidado com a língua!
Público, 12 de Junho de 2017
Li no Ciberdúvidas um texto que me entristeceu: o de que a RTP irá interromper (terminar?) o programa “Cuidado com a Língua”. Trata-se de um didáctico magazine, iniciado em 2006, e que vai na sua 9ª série. Um projecto interessante de promoção da nossa língua, “ao mesmo tempo informativo e lúdico, divertido e com algum humor q.b.”.
A confirmar-se este óbito linguístico, e embora desconhecendo o contexto da decisão, não posso deixar de criticar mais um duro golpe no quase deserto de iniciativas públicas para se bem falar e escrever. Neste caso, tratando-se de um programa do serviço público de televisão, bom seria sabermos as razões que levam a esta sentença. Questão de audiência? Desconsideração do tema? Outras prioridades de programação?
Parte da linguagem televisiva deixou-se capturar pela indigência semântica, gramatical e fonética. Há jovens profissionais, no seu esplendor de idade e de ignorância, a debitarem um paupérrimo português com a mais convencida conversa para “com vocês”. Por sua vez, oráculos surgem nos nossos ecrãs com erros linguísticos primários. Tudo rápido, tudo excitante, tudo avassalador, tudo misturado, mas tudo cada vez com menos atenção ao pobre português falado e escrito.
Se alguém estiver disposto a coligir erros na nossa língua, sugiro um lápis e um bloco para apontar o que se diz em certos programas de televisão. Há de tudo em avantajadas doses. Deixo aqui o que anotei em poucos dias. Há, evidentemente, os já batidos erros desde “interviu” a “entreteu”, “hadem de ser” a “houveram”, “há tempos atrás” a “à condição”, e a fonética nunca emendada dos “acórdos”, das “hepátites” e “bácterias”, dos “juniores” e “seniores” (que são graves com a tónica na penúltima sílaba), dos “lidéres” em vez dos líderes, da “rúbrica” em lugar da rubrica e do “tem a ver” pronunciado como se fosse “tem a haver”. Ouvi, também, a “hetacombe” de “quaisqueres” crises qualificadas como humanitárias, “despoletadas como constrangedoras confrangedor, entendidas como vocábulos  sinónimos.  “Dignatário” sem dignidade é o que há para aí mais, eminentes trocados por iminentes nem só com eminências pardas, “encapuçados” sem capuz também abundam no crime e “cônjugues” com dois é meio-caminho andado para o divórcio. Tudo com o bem-estar linguístico do mal “mau-estar”. Tudo “expontâneo” nos “mídia” (que fino, hem!). Entre o uso de de ou que é um fartote: “deve de ser”, mas “tem que ser” “enquanto que for”).  E é claro que se agradece aos convidados “terem aceite em vez de “aceitado”. “Precaridade” (sem o pobre e) “empreendorismo” e “competividade” (engolindo uma sílaba), perca (não me refiro ao peixe do Nilo) no lugar de perdapor ventura em vez de porventura, “concerteza” com certeza, “prejorativo”, “preverso” e “previlégio” são erros que “saiem” à “descrição”.
Cuidado com a língua” alertava para exemplos concretos de erros nos noticiários, que, todavia, persistem. É que, nesta matéria, o erro faz parte da moda. Ou porque se acha que o erro deixou, aparentemente, de o ser (correndo-se até o risco de quem diz correctamente ser olhado como usando mau português), ou porque a correcção exige predisposição para tal e isso dá muito trabalho…
Há, ainda, a “terceira via” do “pós-acordismo” ortográfico, em que, no meio de tanta confusão, se escrevem palavras que nem correspondem à anterior escrita, nem ao AO (por exemplo, fato para facto e contato sem tacto…). Imagino a trapalhada nas escolas!

Em suma, vai acabar o que creio ser o único programa televisivo sobre a nossa língua. Resistiu muito tempo, mas cai onde melhor falar e escrever  conta pouco. No entanto, não há dia que não se fale da lusofonia e se lhe teçam louvaminhas. Tudo teatro, tudo encenação, quando, ao mesmo tempo, se menospreza a essência e pureza da língua.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Reencontro em devoção


De repente, uma foto colorida, de António Barreto, trazendo-me à memória velhas lembranças de tempos vividos noutros sóis e noutras perspectivas de vida, em que o que se fomentava de traição e reviravolta era ainda desconhecido das populações assentes na sua tranquilidade de ordem e trabalho, ignorando o que se fabricava na sombra, ramos de árvore carcomida, erguendo airosos a sua folhagem a proteger o tronco ainda, sem lhe prever o desbaste. Era-se mais jovem, ria-se, brincava-se, sentia-se - como em todos os tempos se fez - na ignorância do cataclismo, agindo ou reagindo às circunstâncias e às experiências vividas, em liberdade e independência crítica, desde que esta não excedesse os limites impostos, de respeito pelos valores que breve se revelariam anacrónicos, exigindo debandada em várias frentes. E o velho tronco remoçou, de facto, graças, é certo, ao endividamento externo, e ao envolvimento das novas aves canoras, defendendo coisas sociais importantes e modernizações, mas mergulhando-o em trajectórias de desvios sob a capa das ideologias democráticas que a esses ascensores à governança cobriu, em primeiro lugar, talvez apegados ao santo cuja foto António Barreto expõe. Também eu em tempos escrevera sobre o dito, texto que transcrevo a seguir, por ser mais leve na graça, que os novos tempos amorteceram.

As minhas fotografias
António Barreto
Observador (25/6/2017)
São Judas Tadeu: votos, promessas e graças. Fotografia dos anos 1970, na Sé de Braga (ou será no santuário do Sameiro?), com a guerra de África bem presente. É um santo antigo, foi apóstolo de Cristo, com quem consta ser muito parecido, diz-se mesmo que era seu primo. Não deve ser confundido com Judas Iscariotes, o "apóstolo traidor", o do "beijo de Judas". Era irmão de Tiago. Mártir, foi assassinado com outro apóstolo, Simão, por terras da Pérsia. É o "santo das causas perdidas" ou das "causas impossíveis". Ao que parece, escrevia muito bem. Tem carta publicada na Bíblia. Pode encomendar-se-lhe muita coisa em Portugal, tantas são as causas difíceis. Ou mesmo desesperadas. Talvez a causa das florestas, cujo patrono poderia ser ele. Na sua carta, alude às "nuvens sem água arrastadas pelos ventos" e às "árvores de Outono sem fruto, duas vezes mortas e arrancadas pela raiz"...




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«Reze a S. Judas Tadeu”
(In “Pedras de Sal”, 1974, e “Cravos Roxos”, 1981)
«Quando as coisas me não correm de feição – e também quando me correm, de outra maneira seria egoísmo puro – apego-me aos santos e não me tenho dado mal com o sistema. Nós, os pecadores, devemos escolher espíritos de eleição para nos orientarmos convenientemente onde precisarmos de orientação.
Devem ter tido conhecimento do meu apego e da minha necessidade de orientação – estas coisas sabem-se – pois recebi uma carta duma pessoa amiga que me deseja bem, encarregando-me de rezar a S. Judas Tadeu para obter dele aquilo que eu mais desejar.
Pus-me, pois, imediatamente a rezar e imediatamente também a fazer reformas na casa, já por conta da fortuna que ele não deixará de fazer tombar sobre a minha pessoa reconhecida e expectante.
Entretanto, tiro as 19 cópias necessárias e vou enviá-las às dezanove pessoas a quem desejo boa sorte. Estive a fazer cálculos e reparei que são vinte as pessoas a quem desejo boa sorte. Como, de modo algum, penso alterar a cadeia, terei de suprimir uma cópia ou uma amizade, mas optarei com certeza por rezar para que S. Judas se não esqueça também da minha amiga suprimida.
Foi um senhor de Benguela chamado Domingos, oficial do exército – noto, por sinal, neste conjunto de favorecidos, uma pronunciada predilecção por titulares do exército – que iniciou esta sequência, e antes dos dez dias estabelecidos, alcançou uma grande fortuna – possivelmente o que ele mais desejava e o que pediu a S. Judas, tal como eu.
Outro senhor português de nome Mário Gomes respondeu à sequência e obteve o 1º prémio da lotaria, assim como a empregada duma senhora – não especifica a nacionalidade – que, ao ver a patroa atirar para o cesto dos papéis a cópia recebida, aproveitou-a, respondendo em nome próprio, e antes de vinte dias caiu-lhe a lotaria em casa.
Também um general enriqueceu, sem explicar de que maneira mas sem grande esforço, depois de ordenar à empregada que se encarregasse ela das cópias e dos envios às suas amizades. Não esclarece a nótula recebida da amiga que me deseja bem se a empregada do general assim enriquecido beneficiou de alguma percentagem, mas não me cabe a mim pôr em dúvida a generosidade e critério de justiça de um general.
Por outro lado, aqueles que quebram estas cadeias sofrem riscos graves, como na Bíblia. Foi o caso do sr. Pery que sofreu um desastre, outro foi durissimamente golpeado pela vida, comendo os filhos por tabela, sem culpa nenhuma dos desmazelos do pai.
Ante estes casos tão explícitos de catástrofes resultantes de quebras de sequência, e de fortunas resultantes de obediência e fé, eu de maneira nenhuma iria permitir que os meus empregados domésticos – não possuo outros – aproveitassem do meu cesto dos papéis um benefício por mim desdenhado. O mais que posso fazer – e com todo o prazer - é incluí-los nas minhas 19 cópias, embora receie um pouco que se dê aí a quebra, sobretudo no que respeita à Marta, desconhecedora dos caracteres escritos, o que, aliás, só lhe tem trazido vantagens para justificação de enganos comerciais.
Esta sequência de cartas em homenagem a S. Judas Tadeu deve dar a volta ao mundo tal como outrora o antipatriota Fernão de Magalhães, e não, como ele, ficar-se pelas Filipinas em desastrosa interrupção.
O meu espírito profundamente dedutivo conclui, pois, que a quantidade de acidentes sucedidos por aí diariamente resulta apenas de quebras de sequência de homenagens, tal como as fortunas também fabricadas diariamente provêm da sua não interrupção.
Não, não tenho intenção nenhuma de interromper. As reformas no mobiliário da casa são já por conta da recompensa.