Será que o serviço militar
volta a ser obrigatório? Lá terão os nossos filhos de interromper os estudos
superiores – quando o forem - para cumprirem o tal serviço da tropa, e irem
defender, não a pátria propriamente dita - embora esteja incluída, naturalmente
- mas o continente, doutros continentes. Se, entretanto, Kim Jong-un não armar
uma que subverta o conceito de guerra e de tropa, mostrando que o nuclear é o
que está a dar, entre tantos países com esse poder na Terra, para mostrarem a
inutilidade da tal defesa, de que trata Teresa de Sousa, como coisa de
eficácia, no seu artigo perspicaz. O que se anuncia, é suficientemente
ameaçador para a Terra inteira, que lá se vai vingando e pode-o bem, essa, com
os rios a secar e os ventos a arrasar. Pobre Humanidade! Pobre Terra a
desfazer-se! Pobres políticas da vacuidade humana!
Voltemos a São Francisco de
Assis, ao seu “Cantico delle Creature”, forma extraordinariamente
simples e humilde, de amar a Deus, na exaltação de todas as suas criaturas,
nossas irmãs, o sol, a lua, as estrelas, o vento, a água, a terra que produz, e
os que sofrem e os que perdoam, por amor de Deus. É altura de suplicarmos, como
fez il Poverello, mas esse, agradecendo a Deus, por todos os irmãos que nos
protegem, mas se vão cansando das nossas maldades. Nós, suplicando a Deus que
destrua o irmão homem que arrasa a Terra – e o resto dos nossos irmãos
benfeitores, Sol, Fogo, Água, - com tanta loucura e idiotia. Não, não
exageremos nos louvores.
Altissimu, onnipotente, bon Signore,
tue so’ le laude, la gloria e l’honore et onne benedictione.
Ad te solo, Altissimo, se konfano,
et nullu homo ène dignu te mentovare.
Laudato sie, mi’ Signore, cum tucte le tue creature,
spetialmente messor lo frate sole,
lo qual’è iorno, et allumini noi per lui.
Et ellu è bellu e radiante cum grande splendore:
de te, Altissimo, porta significatione.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora luna e le stelle:
in celu l’ài formate clarite et pretiose et belle.
Laudato si’, mi’ Signore, per frate vento
et per aere et nubilo et sereno et onne tempo,
per lo quale a le tue creature dài sustentamento.
Laudato si’, mi’ Signore, per sor’aqua,
la quale è multo utile et humile et pretiosa et casta.
Laudato si’, mi’ Signore, per frate focu,
per lo quale ennallumini la nocte:
ed ello è bello et iocundo et robustoso et forte.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora nostra matre terra,
la quale ne sustenta et governa,
et produce diversi fructi con coloriti flori et herba.
Laudato si’, mi’ Signore, per quelli ke perdonano per lo tuo amore
et sostengo infirmitate et tribulatione.
Beati quelli ke ’l sosterrano in pace,
ka da te, Altissimo, sirano incoronati.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora nostra morte corporale,
da la quale nullu homo vivente pò skappare:
guai a·cquelli ke morrano ne le peccata mortali;
beati quelli ke trovarà ne le tue sanctissime voluntati,
ka la morte secunda no ’l farrà male.
Laudate e benedicete mi’ Signore et rengratiate
e serviateli cum grande humilitate.
tue so’ le laude, la gloria e l’honore et onne benedictione.
Ad te solo, Altissimo, se konfano,
et nullu homo ène dignu te mentovare.
Laudato sie, mi’ Signore, cum tucte le tue creature,
spetialmente messor lo frate sole,
lo qual’è iorno, et allumini noi per lui.
Et ellu è bellu e radiante cum grande splendore:
de te, Altissimo, porta significatione.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora luna e le stelle:
in celu l’ài formate clarite et pretiose et belle.
Laudato si’, mi’ Signore, per frate vento
et per aere et nubilo et sereno et onne tempo,
per lo quale a le tue creature dài sustentamento.
Laudato si’, mi’ Signore, per sor’aqua,
la quale è multo utile et humile et pretiosa et casta.
Laudato si’, mi’ Signore, per frate focu,
per lo quale ennallumini la nocte:
ed ello è bello et iocundo et robustoso et forte.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora nostra matre terra,
la quale ne sustenta et governa,
et produce diversi fructi con coloriti flori et herba.
Laudato si’, mi’ Signore, per quelli ke perdonano per lo tuo amore
et sostengo infirmitate et tribulatione.
Beati quelli ke ’l sosterrano in pace,
ka da te, Altissimo, sirano incoronati.
Laudato si’, mi’ Signore, per sora nostra morte corporale,
da la quale nullu homo vivente pò skappare:
guai a·cquelli ke morrano ne le peccata mortali;
beati quelli ke trovarà ne le tue sanctissime voluntati,
ka la morte secunda no ’l farrà male.
Laudate e benedicete mi’ Signore et rengratiate
e serviateli cum grande humilitate.
É agora que a defesa vai ser levada a sério? Não haverá outra
oportunidade
A questão fundamental, para Portugal e para a Europa, é que já não
chegam as promessas rapidamente esquecidas.
Teresa de Sousa
Público, 5 de Novembro de
2017
1. Pela enésima vez, a União Europeia está a
tentar dotar-se de uma capacidade militar própria, que lhe garanta alguma
autonomia estratégica face aos Estados Unidos. As anteriores tentativas não
levaram a parte nenhuma. Foram o resultado da “humilhação” sofrida nos
Balcãs na década de 90 (tiveram de pedir socorro aos EUA). Mas também
das profundas divisões provocadas pela crise iraquiana de 2003, tentando sarar
rapidamente as feridas abertas na relação transatlântica. O Tratado de
Lisboa foi particularmente sensível a esta dimensão europeia, abrindo as portas
a uma “cooperação reforçada” especial para a Segurança e Defesa: a “cooperação
estruturada permanente”, que foi ficando no congelador à espera de melhores
dias.
Finalmente, alemães e
franceses decidiram iniciar um processo que já leva um ano para criar as
condições de uma defesa europeia mais efectiva. Há algumas razões
para admitir que, desta vez, é a sério? Há. Elas devem-se às novas
circunstâncias geopolíticas em que a Europa passou a viver e que puseram em
causa muitas das garantias americanas a que se habituou depois da II Guerra e
durante a Guerra Fria. O que há de novo? Em primeiro lugar, o choque do
“Brexit” (que ninguém conseguiu prever) e da eleição de Donald Trump. De
uma assentada, a Europa viu-se confrontada com a saída do país que era uma das
peças-chave da sua capacidade militar e da sua projecção no mundo, para
assistir, alguns meses depois, completamente incrédula, à eleição de Donald
Trump. Desde então, as relações transatlânticas que foram sempre uma parte
crucial da integração europeia têm estado sujeitas a uma verdadeira “montanha
russa” de sinais contraditórios, vindos directamente da Casa Branca. A NATO é
obsoleta ou não? O Artigo 5.º continua a valer? Os EUA deixaram de desempenhar
o seu papel de garante da ordem internacional que criaram depois da II Guerra?
2. A outra grande mudança, que dá sentido à
prioridade hoje atribuída a uma defesa europeia credível, deu-se em Berlim,
quando a Rússia ocupou a Crimeia e invadiu a Ucrânia. Angela Merkel
percebeu que a Europa não era apenas o euro e a economia. O terrorismo acentuou
ainda mais este sentimento de urgência, numa altura em que a Europa deixou de
ser uma grande exportadora de estabilidade para a sua vizinhança para passar a
ser uma importadora de instabilidade. Já antes, Nicolas Sarkozy tinha
removido outro obstáculo a uma defesa europeia, com o regresso da França à
estrutura militar da Aliança, que abandonou em 1966. De Washington
continuam, entretanto, a não vir boas notícias, com a crise na península
coreana a tornar-se cada vez mais assustadora, também graças à reacção errática
do Presidente americano. É um cenário perante o qual ninguém pode ficar
indiferente. Numa palavra, os europeus perceberam que estavam a viver num mundo
muito diferente ao qual, mais cedo ou mais tarde, se teriam de adaptar. É o que
estão a tentar fazer.
3. O que está hoje
em cima da mesa? Muita coisa, incluindo algumas decisões importantes
para cada um dos Estados-membros. O pontapé de saída foi dado em
Setembro de 2016, por Merkel e ainda Hollande, quando ambos anunciaram uma nova
iniciativa conjunta para uma defesa europeia comum. Os objectivos eram
ambiciosos mas o seu enquadramento institucional passou por várias fases.
Com que países? Chegou-se a pensar, em Paris e em Berlim, que deviam ser os
“fundadores”, sabe-se lá porquê. A Espanha e a Itália quiseram associar-se à
iniciativa, que foi evoluindo para uma visão mais aberta e mais inclusiva e que
passa, agora, pela criação de uma “Cooperação Estruturada Permanente”,
já prevista nos tratados mas mantida no congelador. É onde estamos
agora. O acto formal de compromisso com a PESCO (CEP em português) será
apenas anunciado a 11 de Dezembro, numa reunião dos ministros dos Negócios
Estrangeiros nas vésperas da cimeira europeia. Antes disso, a 13 de Novembro,
os ministros dos Estrangeiros e da Defesa reúnem-se para fazer o balanço das
adesões, já em resposta à notificação que acabam de receber sobre os
compromissos e os objectivos da PESCO. Mas o facto é que 21 países já
assinalaram uma opinião positiva, quando, há um mês, ainda se andava a discutir
se o número mínimo seria 15 ou 20. Também se percebe porquê. Basta o exemplo da
Finlândia, de novo a “namorar” com a eventual adesão à NATO (que a opinião
pública ainda não aceita), graças ao comportamento ao seu grande vizinho de
Leste. Fazer parte da PESCO seria uma garantia adicional. A Leste, por mais
“amigos de Putin” que alguns dos seus governos sejam, o conforto europeu a todos
os níveis continua a pesar bastante.
4. Sem surpresa,
Portugal será um deles, dando continuidade à sua opção de estar, sempre que
possível, no núcleo central da integração europeia, qualquer que seja o seu
nome. Na sexta-feira, Augusto Santos Silva anunciou que já recebera de
Bruxelas a notificação oficial sobre a PESCO, propondo uma audição prévia na
Comissão Parlamentar dos Negócios Estrangeiros (com o seu homólogo da Defesa)
para o dia 7 de Novembro. A questão merece um debate, embora seja da
competência do Governo (garantida desde o Tratado de Lisboa e do Tratado da
União Europeia). A defesa nacional é um dos pontos nevrálgicos da soberania
de cada país. Partilhá-la não é fácil, sobretudo para os militares, que
gostam sempre de ter um bocadinho de tudo, mesmo que isso não tenha qualquer
lógica para países médios como o nosso, mesmo que se vejam a si próprios com
uma vocação universal. A PESCO vai implicar um planeamento conjunto das
capacidades militares de cada país e uma série de compromissos de natureza
vinculativa, incluindo a lista de contribuições, cujo cumprimento será
fiscalizado anualmente pela chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini.
Seria uma boa altura para adaptar as Forças Armadas portuguesas à realidade,
eliminando os pesos mortos e simplificando as cadeias de comando. A PESCO
não prevê apenas o aumento das despesas com a defesa (aceitando a meta da NATO
dos 2% para 2025), mas uma distribuição do orçamento no sentido de reforçar as
capacidades militares destinadas a colmatar as fraquezas europeias em
determinadas áreas e ao reforço da dimensão da investigação. Convém também
recordar que a nova cooperação estruturada faz parte de um “pacote da defesa”
(adoptado na cimeira de Dezembro de 2016), com alguns novos instrumentos
financeiros, incluindo o Programa Europeu de Desenvolvimento Industrial
(PEDID), com 500 milhões de euros até 2020 para o co-financiamento de projectos
tecnológicos no âmbito da defesa ou de dupla utilização.
5. Augusto Santos
Silva e Azeredo Lopes enviaram uma carta à comissão parlamentar, na qual
apresentam os fundamentos da decisão do Governo: a nova prioridade dada à
defesa não deve pôr em causa outras, como a conclusão da reforma da União
Económica e Monetária; a segurança europeia passa por outras dimensões, que não
apenas a militar, incluindo a segurança energética ou a cibersegurança; a
iniciativa deve reforçar e complementar as relações entre a União e a NATO;
finalmente, o processo deve ser inclusivo, capaz de funcionar também como um
instrumento de convergência económica e tecnológica entre os Estados-membros.
Mas a questão fundamental, para nós e para a Europa, é que já não chegam as
promessas rapidamente esquecidas. É preciso que haja uma capacidade militar,
real e não fictícia, à disposição da política externa e de segurança europeia.
Se a Europa voltar a falhar, será difícil que venha a ter outra oportunidade.
Mesmo que a defesa colectiva continue a pertencer à NATO, os aliados europeus
podem mostrar ao seu parceiro americano que estão a fazer o esforço necessário
para distribuir melhor os custos da sua defesa e que esse esforço está a ser
feito em conjunto. Por cá, não haverá surpresas. Os dois partidos que
apoiam o Governo não gostam da NATO nem da “militarização” da Europa. O PSD não
terá dificuldade em apoiar uma decisão que tomaria se fosse governo. Mesmo
assim, espera-se um debate que esteja à altura das circonstâncias.
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