Dois textos de duas jornalistas que apontam factos e alertam para o que
se passa entre nós, com um ministro de “costa-espertice”, que entrou,
aparentemente, a matar, pela Europa, e afinal “se agacha” à Europa, sugerindo mais
impostos para resolver crises – as nossas, sobretudo – impostos que já estavam
em cima da mesa europeia, segundo conta Helena Cristina Coelho, a qual explica
as dificuldades europeias devidas ao Brexit, e as nossas, que Costa pretende
resolver ao seu modo açambarcador e doloso, desde o seu início governativo. O segundo texto, de Helena Matos, sobre
a extensa crise e o êxodo venezuelanos, e as responsabilidades disso, que uma
vez mais recaem sobre governantes – Chavez e Maduro – ao pretextarem
defender o povo para bem se governarem a si próprios, sempre apoiados pelos
nossos panegiristas da defesa de iguais valores samaritanos, indiferentes à destruição
perpetrada naquele país.
Mundo de comédia o nosso, na questão dos governantes, de tragédia o
deles, na questão dos governados.
I TEXTO:
Costa e a rábula do bom aluno
HELENA CRISTINA COELHO
OBSERVADOR, 13/2/2018
Se o plano do Governo ao acenar com estas (não tão novas) propostas de
impostos europeus é cair nas boas graças da liderança europeia, está na direção
certa. Só lhe falta o título de "bom aluno".
As notícias sobre a proposta do Governo português de criar três novos
impostos europeus são, afinal, manifestamente exageradas. O
exagero, entenda-se, não está nas benditas ideias, que essas mantêm-se em cima
da mesa. O exagero parece estar antes em considerar que há aqui ideias novas.
Só que não. As propostas que António Costa estará tão empenhado em levar a
Bruxelas no final deste mês não só já fazem parte de um projeto de resolução do
Parlamento Europeu de janeiro deste ano, como parte tinha sido debatida pela
Comissão Europeia no passado mês de setembro. Outros tempos e já as redes sociais
estariam a multiplicar hashtags: ‘por acaso (não) foi ideia minha’…
Deixemos a ‘costa-espertice’ e a originalidade (ou a falta dela) de lado
e falemos das tais ideias que Costa defende, mais para provar que está alinhado
com a Europa do que inspirado por ela. O objetivo é ter medidas que ajudem a
União Europeia, por um lado, a compensar o vazio orçamental que a saída do
Reino Unido vai causar; por outro, a reforçar os apoios nas áreas de Defesa,
Segurança e Migrações. E o plano passa por, entre várias opções, aplicar taxas a três grandes áreas: transações financeiras, economia digital e
economia verde. Dito de outra forma: mais impostos para garantir novas fontes
de financiamento, é isto que o governo português está disposto a subscrever
(também aqui há nada de novo, certo?)
Tenho dúvidas, porém, de que este seja o melhor caminho para lá chegar.
É certo que, com o Brexit, há menos um país a contribuir (a receber também) e
isso obriga a descobrir fontes alternativas e a redistribuir o esforço entre os
vários Estados-membro. É preciso reforçar contribuições país a país e descobrir
o melhor modelo para as suportar sem exigir mais aos contribuintes. O próprio
Marcelo já veio comentar as necessidades financeiras da Europa.
Mas a fórmula preguiçosa de agravar a carga fiscal, para sacar mais
receita em pouco tempo, pode durar pouco e ser contraproducente. Pior: só vai
complicar a já estafada e labiríntica burocracia da União Europeia, a mesma que
se anda a tentar simplificar há anos e anos. Se é assim que a pretendem
reformar, então boa sorte — é capaz de ser mais fácil chegar a Marte ao volante
de um Tesla.
E como explicar a escolha dos alvos fiscais? Anda um governo e os seus
ministros a subir a palcos para dizerem ao mundo que a economia digital é uma
aposta do país, que as tecnológicas não encontrarão melhor ambiente para
crescer do que em Portugal, que os negócios verdes precisam de se expandir.
Depois chegam e, surpresa, dão de caras com mais impostos. É isso que se quer?
Ora, quando a estratégia passa por tentar atrair novos investidores e
empresas inovadoras, grandes tecnológicas e multinacionais, novas áreas e
negócios sustentáveis, não me parece que o discurso das taxas e taxinhas seja o
mais convidativo. E não vale a pena vir com a história do bicho papão de que,
usando o fisco, se evita que certas plataformas digitais operem de forma ilegal
ou se corrige a aparente injustiça das grandes margens de lucro, entre outros
argumentos — porque não é com taxas que isto se resolve, é com lei e regulação.
Se o plano do Governo ao acenar com estas (não tão novas) propostas é
cair nas boas graças da liderança europeia, está a ir na direção certa — só lhe
falta mesmo receber o título de “bom aluno” da Europa (onde é que já ouvimos
isto?). Mas, neste momento-chave da União Europeia, António Costa tem uma
oportunidade de fazer chegar ideias novas, verdadeiras propostas de reforma,
criar ruturas, de discuti-las com os decisores, fazer valer a influência
portuguesa de que ele próprio tanto se gaba. Será capaz disso? Ou vai,
simplesmente, representar a rábula do bom aluno, prestável e obediente? Ou,
pior, armar-se no aluno cábula que prefere socorrer-se das ideias dos outros
como se fossem suas para passar no exame?
II TEXTO: VENEZUELA
Por qué se han callado?
OBSERVADOR, 11/2/2018
O apoio implícito a tudo o que transpire estatismo levou a que num tempo
de indignações se silenciasse a tragédia da Venezuela. Em 2015 ainda Maduro
levou um prémio da ONU pelo combate à fome.
Finalmente fala-se deles, dos refugiados venezuelanos. Não tanto por
eles mesmos mas sim porque no Brasil e na Colômbia o fluxo crescente de pessoas
que deixam a Venezuela fez soar as campainhas de alarme. Nos jornais do Brasil
e da Colômbia os refugiados venezuelanos são agora referidos todos os dias: “Venezolanos, la migración más grande en la historia de Colombia”;
“Brasil discute possibilidade de barrar entrada de refugiados venezuelanos”;
“Pedidos de refúgio de venezuelanos no Brasil quadruplicam em dois anos”;
“Nuevas medidas para venezolanos buscan llegada más organizada”… Enfim o habitual em qualquer zona do mundo
confrontada com uma chegada massiva de refugiados com a diferença que por
aquelas bandas e neste particular assunto não vigora a censura do costume e
portanto temos títulos como “Onda de imigrantes da Venezuela
pode gerar crise em Roraima”; “En Atlántico crece número de
enfermedades por inmigrantes venezolanos”; “Atracos, el lado oscuro del
éxodo de los venezolanos”…
A crise na Venezuela não surpreende. Ela era mais que anunciada. Afinal
serem pobres e perseguidos não para sempre, mas enquanto não se conseguirem desembaraçar
dos seus auto-proclamados libertadores tem sido o destino de todos os povos que
caem nas mãos dos construtores da igualdade. Aliás também já sabemos o que vem
a seguir: a culpa é do Maduro porque, vão dizer, se o Chavez não tivesse
morrido tudo teria sido diferente. A culpa é dos países vizinhos que não estão
a ser solidários com o governo da Venezuela ou que não apoiam os seus
refugiados (Os dois argumentos só aparentemente são contraditórios pois em
ambos os casos desculpam o governo da Venezuela). A culpa é do petróleo quando
é mais barato porque gera menos receita. A culpa é do petróleo quando é mais
caro porque gera mais receita e torna o governo mais dependente do
petróleo. A culpa é dos EUA e obviamente de Trump.(Antes de se usar este
argumento convém recordar que o esforço colocado pela administração Obama na
melhoria das relações com Cuba visava entre outras coisas fragilizar o governo
venezuelano que mimoseava o então presidente norte-americano com epítetos como
“o negro” e “palhaço”). A culpa é
da oposição venezuelana que não é alternativa… Enfim, a culpa será de todos mas
nunca dessa fraude ideológica representada pelo socialismo.
Valha, contudo, a verdade que na tragédia que se está a viver na Venezuela
existem outros culpados além da camarilha grotesca que se governa enquanto faz
de conta que governa aquele país. E esses culpados são os cúmplices do costume em Portugal
representado pelo PCP ou pelos radicais e terroristas espanhóis
transformados em assessores do governo venezuelano. (Nesta galeria de horrores
temos em Portugal além dos comunicados do PCP apoiando “o processo libertador
bolivariano” a inauguração em 2016, repito 2016, na Amadora, da
Praça Hugo Chavez). Mas os principais culpados estão na esfera democrática
porque são eles e a sua condescendência face a qualquer um que integre no seu
discurso expressões como combate à pobreza, solidariedade, apoio aos mais
pobres, combate às injustiças e às desigualdades, reforço do papel do Estado
nas políticas sociais… que tornaram possível que a Venezuela tenha passado de
país que recebia imigrantes a país de emigrantes e refugiados. De país que
exportava a país onde falta tudo. Na verdade, basta usar a língua de pau do
socialismo para se gozar do benefício da dúvida dos jornalistas e das
organizações internacionais, todos sempre tão angustiados com a falta de
condições de vida no mundo capitalista. Só este apoio implícito a tudo o que
transpire socialismo-estatismo tornou possível que entidades como a FAO
premiassem em 2013 e 2015 o governo de Maduro pelas suas políticas de combate à
fome e à pobreza. Aliás durante anos a FAO só viu e estou a citar “progressos notáveis e excepcionais” na luta contra a
fome na Venezuela
Na página da FAO dá-se como bom exemplo da política de
combate à fome levada a cabo pelo governo venezuelano a rede estatal de
supermercados onde o subsídio aos preços chegava a atingir os 78,7%. Não é
preciso ser especialista em alimentação para perceber que aquilo que tanto
inebriava a FAO — 22 mil pontos estatais de abastecimento de que dependiam ou
foram tornadas dependentes 17,5 milhões de pessoas com preços ditados pelo
governo — pode servir como serviu para ganhar eleições mas alimentarmente
falando só podia acabar na tragédia da fome.
A lista de prémios e elogios aos governos de Chavez e Maduro pelas suas
políticas sociais é aliás extensa e resistiu ao grotesco discursivo de Chavez,
às imagens das prateleiras vazias nos supermercados (resultado da especulação
dos merceeiros); às denúncias da oposição (gente ligada à CIA); à destruição
das empresas (incapazes de se adaptar às mudanças)… Até que como
invariavelmente acontece nas diversas marchas para o socialismo em qualquer
lugar do mundo, o povo — sim, o povo esse em nome de quem se faz o
socialismo— se pôs a caminho e fugiu da revolução.
Parafraseando Juan Carlos e o seu célebre Por qué no te callas? dirigido
a Hugo Chavez, temos de perguntar Por qué se han callado? por
esse mundo fora durante tanto tempo técnicos, políticos, dirigentes de
organizações internacionais perante o caminho que a Venezuela estava a tomar?
Pelas mesmas razões por que se calaram quando no lugar da Venezuela estiveram
Angola, o Vietnam, a Coreia do Norte (sim, sim a Coreia do Norte já foi
um país exemplar face ao covil representado pela Coreia do Sul), o
Cambodja…: porque para muitos o socialismo é o regime que defendem ou que
não defendendo apenas porque o acham inalcançável reconhecem como
moralmente superior (Ah, já me esquecia, a Praça Hugo Chavez na Amadora foi
aprovada por maioria numa comissão de toponímia integrada pelo PS, CDU e coligação
Amadora Mais PSD/CDS-PP).
Ps. Prémios Machismo do Ano, Exploração do Trabalho Infantil e Vamos Lá
Ver Se Não Há Pedófilos Por Ali: a substituição nas provas de Fórmula 1 de
modelos femininos devidamente pagas para o efeito por crianças presume-se que a
título gratuito.
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