domingo, 31 de março de 2019

Graça e indiferença na questão do Brexit



Enquanto na Europa nos afligimos, avessos ao Brexit, o texto de João Carlos Espada desvaloriza a questão, referindo a fleuma e a indiferença britânicas perante uma manifestação de rua pró-Brexit, de migrantes contrários à U. E., manifestação com que se vai advertindo, em todo o caso, o estudioso visitante do Churchill Archives, a fim de que este não esbarre com a manifestação em Pall Mall. Tal acontecerá, todavia, mas sem sarilhos de maior, gente ordeira os da rua, os da sua relação, mais requintada, que o atendem, desligados, aparentemente da questão e bebendo Porto. Retrato de um povo calmo e superior, também segundo o parecer dos migrantes, a quem são oferecidos meios de sobrevivência superiores aos que a U E oferece. O povo britânico é, de facto, superior? Uma crónica suavemente maliciosa.
BREXIT           Carta de Inglaterra /Premium
 JOÃO CARLOS ESPADA    OBSERVADOR, 25/3/2019,
Após cinco dias em Inglaterra, não faço ideia de como vai acabar o Brexit. Mas faço votos de que, qualquer que seja o resultado, não estrague as boas maneiras que ainda encontrei por todo o lado.
Para quem faz planos com alguma antecedência, o passado fim-de-semana seria o último antes do ‘Brexit’ (inicialmente previsto para 29 de Março). Em parte por esse motivo, escolhi esta data para uma visita ao Churchill Archives Centre, no Churchill College, Cambridge, para a qual tinha sido convidado em Novembro do ano passado. Escrevo agora, passado este fim-de-semana, e não faço a menor ideia sobre quando terá lugar o ‘Brexit’. Mas foi uma grande experiência, em qualquer caso. Cheguei ao Churchill College na passada quarta-feira à noite. Tudo estava tranquilo e devidamente preparado, como previsto. No “Porter’s Lodge”, a senhora que me deu a chave do quarto e o mapa do colégio, amavelmente acrescentou: “Dizem-me que vai para o Oxford & Cambridge em Pall Mall, Londres, no sábado. Devo aconselhar que viaje cedo porque haverá uma manifestação nessa rua ao meio-dia”. Não fazia ideia de que ia haver uma manifestação no sábado — anti-Brexit, de facto, soube mais tarde, porque a senhora não disse qual era o sinal político da manifestação. Ela apenas me aconselhou a viajar cedo. Nessa mesma noite, quando cheguei ao meu quarto no Churchill College, vi uma mensagem do Oxford & Cambridge Club de Londres avisando sobre essa mesma manifestação e sobre “road closure”. Comecei a pensar que era um assunto sério — e que a minha escolha de fim de semana talvez não tivesse sido a mais sábia.
No dia seguinte, quinta-feira, passei o dia tranquilamente, consultando o Churchill Archive. À noite, jantei na High Table, por amável convite do meu anfitrião, Allen Packwood, o jovem director do Churchill Archives Centre. Observei com prazer que todos usávamos gravata (ou, nalguns casos, laço), ao contrário do que pudera observar durante o dia no Colégio — onde todos, exceptuando os funcionários, pareciam fazer gala em usar trajes andrajosos e barba por fazer. Durante a High-Table, as boas-maneiras britânicas foram observadas. Pude conjecturar que todos os “locals” eram contra o “Brexit”, mas ninguém disse isso claramente. Houve uma ameaça de conversa sobre o tema, mas foi rapidamente suspensa. “Não é apropriado discutir política na High Table”, disse um dos Fellows mais idosos.
No fim do jantar, a caminho da outra sala onde é servido vinho do Porto, o Fellow acima referido aproximou-se de mim cordialmente e disse-me: “Soube que vai no sábado para Londres e para Pall Mall. Desculpe a intromissão, mas sugiro que vá cedo e que não use bow-tie, nem ande com o Telegraph na mão. Eu sou um ‘Remainer’, mas lamento ter de o avisar de que alguns ‘Remainers’ podem ser extremistas e podem ver na sua bow-tie e no Telegraph um sinal Tory”. Agradeci enfaticamente. Ambos, em seguida, apreciámos conjuntamente  excelentes variedades de Porto.
Passei a sexta-feira de novo embrenhado no Churchill Archive. No sábado, pus-me a caminho, de Cambridge para Londres, de acordo com os avisos recebidos: fui de madrugada, e sem bow-tie. O comboio estava de facto bastante cheio, mas foi pontual. E cheguei ao Clube em Pall Mall por volta das 10h da madrugada. Tudo estava tranquilo e fui informado de que poderia andar na rua até ao meio-dia, mas que talvez fosse preferível não andar em Pall Mall depois das 12h, por causa da dita manifestação. Tomei boa nota. Fui às compras em St. James, e engraxei os sapatos numa das inúmeras lojas locais. O jovem engraxador usava um impecável uniforme, com gravata, e com duas bandeiras cruzadas na lapela: da Grã-Bretanha e do Bangladesh. Perguntei-lhe há quanto tempo vivia em Inglaterra. “Doze anos,  sir”, respondeu orgulhosamente. Perguntei-lhe em seguida se sabia de uma manifestação que ia ocorrer em Pall Mall daí a pouco tempo. Com surpresa, ouvi o único discurso político sobre o tema em toda a minha viagem:
“Sim, claro que sei. Vai ser daqui a pouco. É uma manifestação contra o ‘Brexit’ e por um segundo referendo. É uma manifestação das elites europeias contra a democracia britânica. Nós votámos no referendo pela saída da União Europeia. Eles não aceitam a nossa escolha  democrática e querem impor-nos o ‘Remain’”. Bastante estupefacto, perguntei então ao meu interlocutor: “O senhor votou no referendo?” E ele respondeu assertivamente: “Sim, com muito orgulho. Eu sou um cidadão britânico. E todos os que, como eu, vêm dos países de língua inglesa — Bangladesh, Índia, Austrália, Nova Zelândia — todos votámos pelo Brexit. A união Europeia impõe um sistema desleal de imigração no Reino Unido: os que vêm da Europa podem entrar sem demoras, mas nós, vindos da Commonwealth, temos imensos obstáculos” (que ele enumerou sem hesitações, mas de que eu não consegui tomar nota). Preparava-me para continuar a conversa quando olhei para o relógio e reparei que tinha passado as 12h avisadas pelo Clube. Agradeci enfaticamente a apressei-me para Pall Mall.
A manifestação já começara e ocupava toda a rua, em direcção ao Parlamento. Eu ia em sentido contrário aos manifestantes, mas não senti a menor hostilidade (é certo que não usava bow-tie, nem o Telegraph). O grupo, bastante massivo e ininterrupto, pareceu-me simpático e bem disposto, embora não tão jovem como tinha sido anunciado. Os placards que transportavam eram em grande parte de produção caseira e bastante divertidos. O meu preferido dizia: Fromage, not Farage’. Quando cheguei ao Clube, onde a indiferença pela manifestação que passava à porta era total, perguntei se podia almoçar sem gravata. O impecável recepcionista, de gravata, respondeu que sim: de acordo com as novas regras, os sócios podiam não usar gravata até às 18h, aos fins de semana, até às 11h, durante a semana. Perguntei-lhe se ele gostava destas “regras modernas”. E ele respondeu, imperturbável : “I couldn’t possibly comment, sir.”
Resolvi envergar um dos meus Churchillian bow-ties. Pelo sim pelo não, levei para a mesa o suave Financial Times, em vez do Telegraph. Verifiquei que, na mesa em frente da minha, um sócio idoso lia ostensivamente o Telegraph. Pouco depois, na mesa ao lado da minha, sentou-se outro sócio idoso, este de tweed, lendo atentamente um livro de Michael Oakeshott. O grande dilema surgiu a seguir. Quando o empregado trouxe o ‘Stilton & Port”, apresentou-me dois pratos de sobremesa, um de Oxford, outro de Cambridge, e perguntou-me qual preferia. Embaraçado, respondi: “bem, eu estudei em Oxford, mas acabo de chegar de Cambridge”. Após um silêncio, ele respondeu: “ Talvez eu possa sugerir um compromisso, sir. Fica com os dois e usa um pouco de cada um enquanto aprecia o Stilton.” Assim fiz. E o compromisso foi agradável.
COMENTÁRIOS
José Montargil:  Até parece a Inglaterra inventada pelos escritores britânicos do século XX, tipo Agatha Christie e outros do género. Os ingleses que vêm a Portugal passar férias segundo as notícias e o que vemos pelas ruas muitos têm um aspecto péssimo, maneiras zero, bebem até cair, enfim nada do que vem no artigo. Nos campos de futebol ingleses viu-se o que se passava com os hooligans, as alarvidades, etc.... Parece-me que a visão do autor ou é parcial ou então teve muita sorte.
Francisco Ferreira: Aprecio estas crónicas, vividas, bem escritas, de humor marcado.  Pareceu-me estar ler um Blake & Mortimer...  
Pedro Pereira: Prosa engraçada, e uma visão bastante crua dos meios que se rodeia e da bolha em que vive. Um texto muito eficaz para perceber o ponto de partida para as suas crónicas, das quais não me recordo ter alguma vez concordado, mas que leio com o interesse pelo prazer de expor ao contraditório as minhas próprias ideias. Mas de facto, tendo vivido no sul de Inglaterra, do pouco que tenho saudades - incluindo claro os afectos que por lá permanecem - é o civismo britânico, da alegria e profissionalismo no atendimento, e cordialidade nas estradas. Sem igual, em qualquer outro país europeu. Claro está não serão todos e em todo o lado, a pobre qualidade da educação nacionalista virada para o consumismo, a cultura centralizada em Londres, a fraca qualidade dos museus e bibliotecas, fazem-se sentir na periferia de Londres (que é basicamente senão todo o resto de Inglaterra, pelo menos a sul onde viajei durante os dois anos que lá permaneci). E que se fizeram sentir nas urnas de voto para o Brexit. Os ingleses na sua minoria votante (comprovado nas urnas de 17 milhões pro Brexit num universo de 55 milhões de habitantes) não têm cultura ou capacidade intelectual suficiente para perceber o que é a comunidade europeia na sua essência, e o que representa para o desenvolvimento do ser humano. O pensamento é a curto prazo, virado para a capacidade de consumo e satisfação carnal da população embrutecida, suportando o enriquecimento das "elites", e a sua capacidade de beber Porto de gravata. Com o meu parco conhecimento de toda a estrutura económica e cultural do país, no entanto arriscarei o prognóstico, que devido à quantidade de dinheiro amealhado, com todos os serviços construídos, negócios, acordos e contactos produzidos enquanto parte da união europeia, penso que os mais ricos terão possibilidade de subsidiar o modo de vida dos ingleses consumidores, com maior ou menor dificuldade, até conseguirem tornear todos os desafios inerentes a este Brexit. Construirāo uma nova narrativa, e espero eu que tenham muito sucesso. Se eu concordo com este modo de experienciar a realidade? Não. Acho uma completa idiotice e uma falta de pensamento crítico, humanista e cultural, e de uma xenofobia gritante. Mas tal como o civismo, "typically British".

Breve História de Mascate e do sultão Kaboos



Ormuz, Goa e Malaca, eis três baluartes da dominação portuguesa, em terras do Índico asiático, ficou-me gravado, talvez da escola primária.
E assim vamos navegando num cruzeiro de requinte, por terras de um Oriente Médio que nos traz ao pensamento contos de encantar do oriente persa, extraídos das Mil e Uma Noites da ladina “Sheherazade apostada em salvar a sua vida, contando histórias de suspense, acerca de tesouros e outras fantasias, ao sultão mauzão que não sofria infidelidades femininas mas que era curioso de narrativas de mistério e aventuras. Salles da Fonseca vai-nos distraindo com coisas do presente arábico e simultaneamente pescando, curioso por histórias, como esse sultão Schahriar, atento ouvinte de Sheherazade, pormenores de um passado de que fizemos parte, nós, portugueses, sem, contudo, grande dimensão cultural, como velhos castros soterrados nas areias do tempo, deixando apenas vestígios de passagem, no mundo tão mutável, onde povos de cultura e dinamismo bem superiores ao nosso, espalharam influências de outra amplitude estrutural. Fica-nos o orgulho do termo Mascate, apesar da corruptela inglesa. O mesmo se passa com a marmelada portuguesa, de universalidade terminológica indiscutível, essa.
Quanto ao sultão Qaboos também me parece uma história a encaixar nas “Mil e uma Noites”, nos tempos vividos hoje, robustecidos pelas estrondosas receitas petrolíferas, a possibilitar outros tantos casos de dureza governamental, por vezes. E, todavia, a descambar para uma democracia admitindo “Sheherazades” no seu governo – caso deste sultão de Omã, “rei do petróleo”.

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃSO 30.03.19
REI DO PETRÓLEO
O que está ali em cima escrito e que o meu leitor não descortina é o nome da capital do Sultanato de Omã, Mascate, a que actualmente há quem chame Muscat. Mas isto é a corruptela inglesa do nome original, o que nós, portugueses, trouxemos para a escrita em caracteres latinos nos idos de 1500 da nossa era. Sim, há situações em que os ingleses lêem o «u» como «â» e, consequentemente, vice-versa também. Eis como ao nosso som «mas» eles acabaram por copiar na escrita como «mus» e eternizaram o erro.
Enfim, desculpemos os tradutores britânicos que por certo seriam bons artilheiros mas que deveriam saber muito pouco de etimologia.
Portanto, pondo um ponto final na discussão etimológica, a capital do Sultanato de Omã chama-se Mascate, seja qual for o tipo de caracteres utilizado. Confesso que não fui investigar como se escreve em hindi nem sequer em chinês simplificado. Mas admire-se o meu leitor de que haja por essas bandas outras ou ainda piores corruptelas…
E foi a Mascate que aportámos depois de uma noite de navegação desde que zarpámos de Khasab[i] na Península de Musandam, exclave omanita na margem sunita do Estreito de Ormuz.
É em Mascate que reina o Sultão Kaboos, um autêntico «rei do petróleo». E falar dele é contar um pouco da história omanita das últimas décadas.
Qaboos ibn Sa’id Al ‘Bu Sa’id (nascido em Salalah a 18 de Novembro de 1940) é Sultão desde 1970 quando, a 23 de Julho, por golpe de Estado, depôs o seu próprio pai.
Como Sultão, detém, em conformidade com a tradição regional, o poder absoluto. Acumula os cargos de Chefe do Estado, de Primeiro Ministro, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Ministro da Defesa e de Ministro das Finanças. Apesar da sua riqueza e poder, é considerado geralmente como autor de uma política moderada. Conhecido por ser um mãos largas (a que eufemisticamente se chama «desinteressado e generoso»), é-lhe creditada uma firme política anti-terrorista (é seguidor do Ibadismo que é diferente do Sunismo e do Xiismo).
O primeiro problema que Qaboos teve que enfrentar após assumir o poder foi uma incursão comunista armada do Iémen do Sul que derrotou rapidamente com escassa ajuda externa.
Governando com mão de ferro, desde há alguns anos tem dado passos no sentido de alguma democracia, nomeadamente com eleições parlamentares nas quais as mulheres podem votar e ser até candidatas.

(Foto do sultão  Qaboos ibn Sa’id Al ‘Bu Sa’id): « - Legislem à vossa vontade mas a decisão final é minha.»

Contudo, é grande a apreensão dos súbditos porque não se lhe conhece mulher (os comentários são emitidos sem grande contenção mas com muitos subentendidos) e, portanto, que se saiba, o trato sucessivo não está assegurado. Diz-se que há uma determinação de que ao terceiro dia após a sua morte, o Conselho de Família deverá abrir o cofre em que se encontra guardado o documento no qual ele próprio designa o seu sucessor. Quem será? Aguentar-se-á no «balanço»? Mistérios que ensombram o futuro de Omã como Sultanato.
Não nos esqueçamos de que a estabilidade política deste Estado não é «coisa» menor pois que se trata de um muito importante exportador de petróleo. E nem vale a pena buscar mais argumentos para explicar o perigo que por ali paira. E o homem já não é criança nenhuma.
Uma curiosidade não despicienda: o Rial (dividido em mil sub-unidades) é actualmente a moeda mais poderosa no planeta pois vale cerca de US$ 3,00 e de € 2,50. Imagine-se o que será comprar um Rial de pevides…
(continua)
Março de 2019

(FOTO: HSF diante da mesquita de Khasab)

[i] - Khasab é um lugarejo sobre que me eximo de escrever

COMENTÁRIO DE Adriano Lima  30.03.2019  23:25: Em texto de reduzida extensão, somos proporcionados por uma bela lição de história, geografia e política. Parabéns ao autor.

sábado, 30 de março de 2019

Tragédia antiga



Terá a ver com o fado, com as cantigas de amigo, de ambiente rústico, com o nosso “sol que em vez de criar seca”, com a inapetência para o trabalho, no “ai que prazer não cumprir um dever”, com oportunismo arrivista compensador das carências intelectuais, com o mimo prestado na infância em demonstrações de ruído e arrebatamento palavroso e vão, substituto de seriedade e racionalidade. Somos, de facto, os da cauda e, por vezes, temos consciência disso. Alberto Gonçalves tem-na sempre. Há quem não se importe. Ou não dê por isso. E o ridículo atroz do Presidente, posto em destaque por Ricardo Araújo Pereira, é aproveitado por Alberto Gonçalves no seu fundo ataque, a propósito do “somos os melhores” vexatório do PR. Maria João Avillez especifica o seu ataque, dirigindo-o sobretudo à esquerda, do discurso da banalidade carismática para povinho desleixado e interesseiro, a cuja raiz pertencemos.
Penso que fundamentalmente somos bons, bonzinhos, coitadinhos, daí uma exuberância afectiva pouco esclarecida e que tem hoje, como figura representativa da nossa parolice, o PR do  nosso repúdio. Para trás, temos figuras recentes de outro tipo de energia, que M. João Avillez defende, como Cavaco Silva e Passos Coelho. Nem tudo nos envergonha, no nosso percurso, mau grado as figuras queirosianas imortalizantes, que não representam caracteres individuais, mas tipos sociais que nos definem. Mas para trás, na história, outras ficaram, de diferente carisma. José Hermano Saraiva soube separar o trigo do joio, e ele próprio foi grande exemplo de frontalidade e nobreza que admiramos.
I - GOVERNO:   Os melhores dos melhores /premium
ALBERTO GONÇALVES    OBSERVADOR, 30/3/19
A opinião publicada não contesta o pagode socialista, na medida em que: a) acha que o pagode é normal; b) acha que o pagode é benéfico; c) espera vir a beneficiar do pagode; d) já beneficia do pagode.
O poder das ilusões é uma coisa maravilhosa. E sobretudo patética. Para não admitir o que de facto são, os portugueses fingem-se convictos de que são “os melhores dos melhores”, citando a ladainha humilhante do prof. Marcelo. O método é repetirmos com maníaca insistência que somos insuperáveis nisto e naquilo, da bola aos chouriços, das peúgas ao azeite. De tanto entoarem o mantra, alguns, coitados, chegam a acreditar nele. Muitos, porém, permanecem ligeiramente cépticos: embora proclamem a superioridade pátria nos “sectores” – sei lá – do mobiliário ou da saúde, receiam no fundo estar errados e a fazer o que os clássicos da Antropologia designavam por figura de urso. A conversão dos cépticos dispõe da propaganda oficiosa, os “telejornais” que se encarregam, dia após dia, de entrevistar governantes nas imediações de uma inauguração, ou estrangeiros nas imediações dos Jerónimos, todos dispostos a confirmar as incontáveis virtudes deste abençoado país. Se um casal de belgas gosta disto, quem somos nós para discordarmos?
Quase literalmente, não somos ninguém. É a nossa sorte. Dado que o mundo mal dá pela existência de Portugal, Portugal costuma escapar ao escrutínio do mundo. Ambos beneficiam do arranjo. Excepto às vezes. Às vezes, um acontecimento fortuito ou um tique exagerado desperta atenções alheias e indesejadas. Às vezes, as notícias escapam ao controlo, ou aos objectivos editoriais do falecido DN. Às vezes, a realidade espreita e perturba as patranhas que nos oferecem e o idílio em que vivemos. A título de exemplo recente, sugiro o documentário sobre o desaparecimento de Maddie McCann, estreado na Netflix. Ali não há turistas seleccionados a louvarem a comida e a hospitalidade e as “startups”: há ingleses que olham para Sul e descobrem um território entregue a bárbaros, onde a polícia se destaca pela espectacular inépcia e a corrupção genérica serve de cenário para apaixonantes enredos. Em meia-dúzia de horas de programa, o mito do paraíso à beira-mar afoga-se com esmero. Mas nada afoga as ilusões dos portugueses, os quais, bem amestrados, tomam a crítica por um ataque movido a inveja. Não importa que, no caso, a “inveja” seja tão fundamentada quanto a da banca suíça face à estabilidade do BES.
Uma outra história actual e digna da estupefacção “externa” é a endogamia governamental. Na sua infinita ingenuidade, o povo garante que a família não se escolhe. A sério? O PS escolhe os familiares que pode e, não satisfeito, nomeia-os para os cargos públicos que não deve. Sendo engraçado que um dos argumentos contra a monarquia consista em impedir a ascensão automática de mentecaptos, também é verdade que a situação desta peculiar república, absolutamente trivial em exotismos marxistas, não é, vá lá saber-se a razão, comum nas democracias civilizadas. É aliás inédita a ponto de impressionar a imprensa espanhola, que habitualmente nos dedica a quantidade de páginas que reservamos às Berlengas: o “ABC” fala numa “rede de nepotismo sem precedentes em toda a Europa”, lembra a “rede de 27 pessoas com vínculos familiares no exercício do poder” e refere que “a indignação tomou conta do país vizinho”. Escusado dizer que se trata de uma série de calúnias, a desmentir com urgência.
A primeira calúnia é considerar que pertencemos à Europa, presunção que apenas funciona no momento de receber, com maus modos, dinheiro alemão. Fora isso, uma fotografia colectiva do governo basta para exibir não só os perigos da consanguinidade como uma tropa fandanga que, na aparência e no conteúdo, dificilmente se sentaria na assembleia estadual do Maranhão.
A segunda calúnia são os 27 parentes, proverbialmente caídos na lama. O Observador já desenterrou quarenta e tal, e não duvido que uma pesquisa distraída pelas subsecretarias e chefias de gabinete alcance os 150. Além de que amanhã é um novo dia, e uma nova oportunidade profissional para dezenas de filhos, esposos, genros, primos e enteados dos vultos que nos guiam.
A terceira calúnia é a indignação que alegadamente nos assola. Qual indignação? Salvo por umas dúzias de excêntricos, a famosa “opinião pública” e a famosíssima opinião publicada não contestam o pagode socialista, na medida em que: a) acham que o pagode é normal; b) acham que o pagode é benéfico; c) esperam vir a beneficiar do pagode; d) já beneficiam do pagode. Entre a cretinice e o oportunismo, compreende-se a tendência do cidadão médio para a opinião informada. Se o “ABC”, o “El País” e os jornais que calhar realizassem com competência o seu trabalho, perceberiam que a notícia não é a rompante promiscuidade no governo: é a complacência de uma sociedade em peso perante a promiscuidade e perante o resto. O espantoso, na hipótese de ainda sobrar alguém que se espante, é a jovialidade com que os portugueses se permitem ser enxovalhados e roubados às mãos de uma legião de rústicos que nem possuem em manha metade do que lhes falta em vergonha.
Haverá, nos confins da Terra, populações mais oprimidas. Ou mais ridicularizadas. Ou mais burladas. Não haverá nenhuma que o aceite com este simulacro de orgulho. Nisso, e não nas peúgas ou no azeite, somos mesmo os melhores dos melhores. Ou uma desgraça sem remédio, consoante a perspectiva.
Nota de rodapé
O prémio “Uma Rotunda Em Cada Cruzamento, Dois Multiusos Em Cada Esquina, Três Sacos Azuis Em Cada Mandato” da semana vai para António Costa, com a frase: “O mundo seria muito melhor se fosse governado pelos presidentes de câmara”
II - Os imutáveis /premium
MARIA JOÃO AVILLEZ    OBSERVADOR, 27/3/2019
Nunca ocorre à esquerda avaliar o adversário pelo mérito, a responsabilidade, a iniciativa, o currículo, mas sempre só pelo insulto político ou o acinte pessoal. Caramba.
1. Que se abrigará de tão raro na cabeça das pessoas que opinam sobre a direita para não acertarem uma? E insistirem em não acertar? É um mistério: não podem ser todos assim tão pouco dotados, era coincidência forte demais (ou numa versão mais optimista era too good to be true); também não pode ser falta de informação e ninguém nasceu ontem: nem os que opinam nem os que são opinados. Só se for assim mesmo, de propósito… Senão como explicar erros de, como dizer?, “análise” tão grosseiramente desfocados? Às vezes pensa-se que será simplesmente, banalmente, trivialmente a preguiça: há um guião feito de clichés fora de prazo e toca a aviá-lo e escrevê-lo vezes sem conta. Não dá trabalho e há gente que a tudo se presta, da deficiente prestação televisiva à crónica ácida. Lembram-me até uma peça teatral que está em Londres há mais de oitenta anos, “A Ratoeira” que deve ser baratíssima: o mesmo teatro, o mesmo autor, o mesmo cenário, e os actores passando de geração em geração ou de pais para filhos como no governo socialista , sempre a dizerem o mesmo, o mesmo, o mesmo. Coitados.
2. Dizem-me que o ressentimento tudo explica e indo – como se deve ir – à natureza humana, ele está lá bem inscrito, em “gordas”, como nos jornais. Mas a verdade é que custa a crer que mesmo um grande, um imenso ressentido – alguém que tenha por exemplo sonhado ser o inspirado e inspirador guru intelectual de alguém e tenha afinal ficado longe disso, trocado por suposta (mas só suposta) menor figura – não se importe de, mais que ressentido, passar sobretudo por pouco sério ou por politicamente inverosímil, o que pode ser mau para quem tanto tempo, afinco e afã dedica à análise (?) dos comportamentos políticos dos outros. Contudo, é o que aí anda e o que aí está: as mesmas insinuações de péssimo gosto, falsidades disparadas como certezas, clichés mal alinhavados sem sombra de sentido e ainda menor conexão com a realidade. Ouve-se este realejo sobre a direita, ou as direitas, e tanto faz que passem dias ou anos: que ela é o que não é; que quer o que nunca disse querer; que aspira ao que já mostrou renegar, etc, etc. Espantoso que nenhum dos arautos se canse de si mesmo ou do guião, como os tais actores a repetirem há décadas a mesma peça. E é triste que nunca no debate político ocorra à esquerda avaliar o adversário pelos valores do mérito, da responsabilidade, da iniciativa, do currículo, mas sim pelo insulto político ou o acinte pessoal (caramba).
3. Vem isto a propósito dos desastrosos comentários sobre o Movimento 5.7. Nuns casos a idade mental explicará o desastre, noutros a indigestão provocada pela grosseria analítica terá aguda responsabilidade em tão patética empreitada. Já me habituara a esta má fé como reacção quase exclusiva a qualquer ideia, medida, proposta, intervenção, contributo do PSD ou do CDS, da Aliança ou de outro qualquer “alguém” fora do perímetro da geringonça, logo chutado para fora da área consentida pelas esquerdas. O mau gosto e a arrogância têm porém subido de grau, desqualificando obviamente os seus autores mas com isso desqualificando o país e o seu regime e os seus políticos.
Agora com o Movimento 5.7 a coisa ficou talvez com ainda pior cara. Não é que tenha muita importância mas aguça a curiosidade: porque se incomodam tanto — a ponto de terem de ser inexactos — com uma gente que mal conhecem? Porque os atemoriza que entre em cena uma nova geração que não está atarrachada ao domínio da esquerda, não se comove com os seus mandamentos culturais, não pertence ao grupo dos consentidos pelo grupo dos vigilantes consentidores, não pratica o Estado como único pulmão, nem depende “do” partido para respirar na vida? Outro mistério. Sucede porém — e este para mim é o ponto – que o comportamento de muitos destes protagonistas, actores principais ou segundas e terceiras figuras, pode ser fatal (já está a ser). É que ao nivelar o debate político por tão baixa exigência, usando de manipulação e fazendo do poder uma coisa própria e privada, inviabiliza-se qualquer diálogo politicamente racional com a oposição. Em não havendo, há o que há: um regime exausto, improdutivo e malsão. O nosso.
4. Se virmos a obsessão non stop com Passos Coelho (além de lhes ter ganho as eleições têm assim tanto medo que volte?); se ouvirmos a falsíssima narrativa que a esquerda não desiste de impor na opinião publicada sobre os anos da coligação PSD/CDS e que qualquer ser normalmente constituído em Portugal sabe ser isso mesmo, falsíssima; se atentarmos nos esforços ciclópicos para reduzir a fortíssima herança reformista de Cavaco e o próprio Cavaco ao puro esquecimento — o único lider, em 43 anos de regime democrático, com quatro maiorias absolutas no país — já devíamos ter aprendido: a esquerda não olha a meios para refazer a história e ter o exclusivo de tudo. Do poder, do Estado, do império do seu partido sobre o resto dos partidos, do funcionalismo público, da cultura, dos costumes, das narrativas. E agora do pensamento que ela quer único (e por este andar da nossa alma).
Nada disto é novo? Não. Mas a razão hoje é espantar-me — desculpem a insistência — com a confrangedora argumentação escolhida pela esquerda contra a direita de que as atoardas contra o desafio cultural e político que o Movimento 5.7 encarna são a mais nítida radiografia. E, claro, com a falta de respeito que obviamente não pode deixar de suscitar quem assim prefere comportar-se politicamente: nada consentindo apenas insultando, nada contra-propondo, antes mentindo. Faz pena, mas isso é o menos. O mais é o que dá que pensar.
5. Ricardo Araújo Pereira passou há dias umas imagens embaraçantes (e em certo sentido destrambelhadas) de Marcelo Rebelo de Sousa, que eu inteiramente desconhecia. Em cada uma dessas imagens Rebelo de Sousa, embora em circunstâncias diferentes, diz sempre só uma coisa: “os portugueses são os melhores do mundo”, quer fossem bombeiros ou professores ou já não me lembro o quê. Uma pessoa distraída dirá que é um tique, um observador razoável acertará: o homem precisa de ser amado, amado até à exaustão, mimado, louvado. Senão, perde o pé. E por isso ama também, e louva e mima; para ter a certeza que lhe devolvem, se possível intacto, o “afecto”.
Deixo uma pergunta: se os portugueses são assim de uma penada e em tudo, os melhores e logo “do mundo”, porque é que atrás de nós só há, numa União Europeia que conta vinte e oito pátrias, dois países a crescer menos que Portugal (e daqui a pouco só haverá um, visto já ser certo que a Grécia nos ultrapassará)? Mais: e porque é que dos cinco países que a partir de 2011 foram sujeitos a duros programas de ajustamento – Grécia, Irlanda, Espanha, Portugal e Chipre –, os outros quatro crescem saudavelmente e a olhos vistos e nós não? E ainda por cima “estando a economia a andar tão bem” como há pouco tempo nos lembrou solicitamente o Presidente dos “portugueses todos os melhores do mundo?
6: Ninguém tem vergonha? Mesmo sendo muito difícil escolher qual a vergonha, alguém tem alguma?    
 PS. Um dia ainda me hei-de entreter a rever a herança de Cavaco. Aquela sobre a qual as esquerdas se têm afanosamente ocupado em passar um rolo compressor por cima. Infelizmente para elas é facílimo fazer essa lista, além de que parte dessa boa herança está até muito à vista.

sexta-feira, 29 de março de 2019

Nós, é mais fofocas e arranjinhos



A viagem que Salles da Fonseca fez no seu cruzeiro por terras e mares arábicos é enriquecedora e vai-nos abrindo o apetite para o acompanharmos, consultando as vias poderosas da Internet. Gratos por isso lhe estamos, que, neste texto, nos traz vestígios da passagem portuguesa de outrora por terras de Oman – o que SF aproveita em sugestões de apelo a uma vivificação turística ou histórica e até linguística de curiosidade e patriotismo.
 Regressamos à realidade portuguesa actual, e a realidade é esta, a dos lugares, mexe e remexe, num saracoteio constante de distribuição de pastas, num fervilhar de compadrios e amizades. Como ouvi parte da entrevista ao ministro do Planeamento Pedro Marques, candidato agora a comissário dos fundos estruturais, escolho a crónica de São José Almeida para nos elucidar neste nosso cruzeiro de avidez do ganho, no soma e segue do struggle for life humilde e pedinchão.



I - ARÁBIA FELIX – 5

DE QUANDO ORMUZ ERA PORTUGUÊS
 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 29.03.19
Zarpando do Dubai um pouco antes da meia noite, navegámos lentamente contra uma ondulação que nos fez afocinhar mais do que o desejado por muitos dos nossos companheiros de viagem e acordámos atracados a Khasab, no exclave omanita na Península de Musandam, o mesmo é dizer que na margem árabe do Estreito de Ormuz.
Dizem os folhetos turísticos que se trata dos «fiordes» de Omã mas… vou ali e já venho. Sim, há penhascos que descem quase na vertical até ao mar mas nada da imponência norueguesa. Também nada que tenha impedido a construção das estradas por que circulámos confortavelmente. Sinuosas, sim, mas nada que assuste turistas experientes em alturas e planuras.
E qual não foi o meu espanto quando o passeio matinal tinha (e teve) como objectivo a visita a um forte português numa das praias a que hoje se acede com facilidade mas que no século XVI só se alcançaria por mar ou pelos penhascos que ainda lá estão.
Então, o mais curioso é que a parte mais «forte» do forte é a que está virada para terra já que do mar não esperavam os portugueses qualquer perigo.
Foi com alguma emoção que constatei o respeito com que em Omã se referem aos portugueses e ao esmero com que preservam a nossa memória edificada.
Perguntado sobre outras memórias da presença portuguesa, o nosso guia (um dos vários egípcios que para ali foram depois de o turismo ter caído a pique no seu país devido à instabilidade provocada pela Irmandade Muçulmana) referiu que há diversas localidades na região de Musandam e algumas ilhas no Estreito cujos habitantes – maioritariamente pescadores - se dizem portugueses e que falam um dialecto próprio.
Talvez um dia haja um operador turístico que se preocupe com este género de ocorrências históricas e proporcione visitas a estes (e outros) «portugueses abandonados». Talvez…
(continua)
Março de 2019

NOTAS (da Internet):
Omã: País no Médio Oriente. Omã, ou, mais raramente, Omão, oficialmente Sultanato de Omã, é um país árabe na costa sudeste da Península Arábica. Wikipédia
Estreito de Ormuz
Estreito de Ormuz está situado na entrada do Golfo Pérsico, entre Omã, localizado na Península Arábica e o Irão. Trata-se de uma via marítima estratégica por onde transita mais de 40% do petróleo mundial e 20% de transporte marítimo mundial. De pequena extensão, tem 54 km de largura mínima e seu trecho mais largo não passa de 100 km.   (Estreito de Ormuz, em detalhe. Mapa: CIA.)
Mesmo pelo pequeno tamanho, é uma importante rota marítima por ser a única passagem de grandes áreas de exportação de petróleo para o mar aberto. Passam diariamente de 16 a 17 milhões de barris de óleo pelo Estreito de Ormuz, tornando-o um dos mais estratégicos “choke points” do mundo. Localizadas estrategicamente, próximo da costa norte, situam-se as ilhas de Kish, Qeshm, Abu Musa e Tunbs Maior e Menor, as quais funcionam como plataformas de controle do tráfego marítimo.
Segundo um guia histórico, o estreito de Ormuz está situado à esquerda de grandes montanhas, chamadas Asabon, e à direita de outras arredondadas e altas, chamadas Semíramis. Na parte superior e final deste golfo há uma cidade, perto de Charax Spasini e do Rio Eufrates.
Para alguns, Estreito de Ormuz é assim chamado pois, deriva do nome do Deus Persa Ormoz e para outros historiadores e linguistas o nome é oriundo de uma palavra persa local chamada Hur-mogh, que significa Tamareira.
Desde 1997 o ministro do Irão apoiou o livre transporte de petróleo através do estreito, porém se reservou no direito de fechar a rota se o Irão fosse ameaçado. Há alguns anos, rumores afirmavam que o governo do Irão estaria disposto a travar uma nova guerra no Oriente Médio, com a ameaça de bloqueio do Estreito de Ormuz. A questão é a proximidade a que os navios navegam, explicam a facilidade com que podem entrar em confronto, podendo gerar guerras.
Em março de 2007, um incidente envolvendo o Irão acabou afectando também a marinha britânica, quando quinze marinheiros ingleses foram capturados por lanchas iranianas na região, sendo libertados apenas 2 semanas depois. Já em 2008 um incidente internacional envolveu o Irão e os Estados Unidos: um navio da Guarda Revolucionária Iraniana e três embarcações americanas, pioraram ainda mais a imagem que o governo americano divulga sobre o Irão pelo mundo e a relação entre esses dois países.
Factos recentes mostram que o general Jaafari (Irão) anunciou que a República Islâmica poderia fechar o estreito de Ormuz em represália a um ataque contra suas instalações nucleares. Em resposta aos Iranianos, os Estados Unidos e Israel não descartaram a possibilidade de um choque armado para conter as pesquisas.

Pedro Marques candidato a comissário dos fundos estruturais
António Costa aposta na conquista para Portugal da pasta dos fundos estruturais na próxima Comissão Europeia. Se o desejo se concretizar, o comissário será o cabeça de lista ás europeias.
PÚBLICO, 25 de Março de 2019
António Costa aposta em Pedro Marques para comissário europeu responsável pelos fundos estruturais LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO
O cabeça de lista do PS às europeias, Pedro Marques, poderá ser o comissário europeu a designar pelo Governo, se Portugal ficar com o pelouro dos fundos estruturais na próxima Comissão Europeia, confirmou o PÚBLICO junto de um responsável governamental.
A aposta do primeiro-ministro, António Costa, é conquistar a pasta dos fundos estruturais no novo mandato das instituições europeias que sairá das eleições para o Parlamento Europeu. Para isso, a direcção do PS está apostada em aumentar a sua representação nos hemiciclos de Bruxelas e Estrasburgo. Actualmente, os eurodeputados socialistas são oito e já foi assumido pela secretária-geral adjunta, Ana Catarina Mendonça Mendes, entrevista ao PÚBLICO, que o PS quer crescer.
Um responsável governamental afirmou ao PÚBLICO que, se eleger nove eurodeputados, o PS ficará fortalecido dentro do Partido Socialista Europeu (PES), família política em que o prestígio de António Costa tem crescido, ao ponto de ter “influenciado decisivamente” o manifesto eleitoral do PES para as europeias, aprovado em Madrid, nomeadamente na defesa de um novo contrato social para a União Europeia.
Esse fortalecimento do PS dentro dos socialistas europeus permitirá ao Governo, durante a fase de formação da Comissão Europeia, ganhar poder de influência que lhe permita conquistar o pelouro da gestão dos fundos estruturais. Um cargo que a direcção socialista considera assentar como uma luva em Pedro Marques, que foi, até 18 de Fevereiro, ministro do Planeamento e das Infra-estruturas. Nessa qualidade, foi o responsável pela negociação da aplicação do IV Quadro Comunitário de Apoio, o Portugal 2020, assim como pela preparação e negociação em Bruxelas do futuro V Quadro Comunitário de Apoio, o Portugal 2030.
Há outros nomes para ocupar o lugar de comissário europeu a designar pelo Governo português, de acordo com o que venha a ser a pasta atribuída a Portugal. Outros nomes possíveis são Capoulas Santos, se o pelouro for a Agricultura, e Maria Manuel Leitão Marques, se Portugal ficar com a área da digitalização e modernização administrativa. Mesmo a manutenção de Carlos Moedas, actual comissário da Investigação, Ciência e Inovação não está excluída, embora seja considerada difícil, até porque será praticamente impossível Portugal continuar com a mesma pasta.
Mas de acordo com as informações já divulgadas pelo PÚBLICO e agora reconfirmadas, está fora de causa que Mário Centeno venha a ser designado comissário europeu na formação da Comissão. Um responsável governativo garantiu ao PÚBLICO que Centeno se manterá como ministro das Finanças num próximo governo, se o PS ganhar as legislativas de 6 de Outubro.
A razão é simples. Centeno preside ao Eurogrupo e a direcção do PS considera que Portugal não pode perder este lugar, por isso ele deve ficar de pedra e cal no Governo. Isto porque se o ministro das Finanças mudar, o novo ocupante da pasta não poderá manter a presidência do Eurogrupo, por muito prestigiado que seja, não terá currículo à frente das contas públicas para assegurar o lugar, que a direcção do PS considera essencial no xadrez do poder na União Europeia. Além de que, com Centeno no Eurogrupo, Portugal assegura dois lugares, este e o de comissário europeu.
Centeno só será comissário se, no próximo mandato das instituições europeias, evoluir favoravelmente a ideia de que a presidência do Eurogrupo deve ser detida pelo vice-presidente da Comissão responsável pelas questões orçamentais e financeiras, o que, a acontecer, poderá levar longos meses, no âmbito da reforma da zona euro. Nesse caso, sendo já presidente do Conselho de Ministros das Finanças do Eurogrupo, Centeno seria um forte candidato ao lugar.
Se o PS ganhar as legislativas e se confirmar a manutenção de Mário Centeno como ministro das Finanças será a primeira vez que uma mesma pessoa ocupa esta pasta em dois governos seguidos desde o 25 de Abril. Até hoje, apenas António Sousa Franco conseguiu cumprir uma legislatura inteira à frente do Ministério das Finanças, no primeiro governo de António Guterres, entre Outubro de 1995 e Outubro de 1

COMENTÁRIOS
FzD, Almada 25.03.2019: Penso que haverá cada vez mais abstenção, em todas as eleições nacionais, porque é cada vez mais difícil as pessoas escolherem (entre os agraciados pelos estados-maiores dos partidos – são esses os únicos que podemos escolher). Esta é mais uma razão por que se não deveria equiparar a abstenção, o voto branco e o voto nulo. Se a abstenção se pode entender como indiferença pelos resultados, o voto branco devia ser entendido como “são todos bons” e o voto nulo como “nenhum presta”. Se esta fosse a interpretação oficial, eu votaria sempre…
ana cristina. Lisboa et Orbi 25.03.2019: por amor de deus, não entreguem o ouro ao bandido.
C. Santos, C. PIEDADE ALMADA 25.03.2019: Porquê? O C. Moedas tem feito um bom trabalho.
OldVic, Música do dia: "Canto de Hacha" (Francisco Ulloa) Liberdade para a Venezuela! 25.03.2019 : O cabeça de lista da viagem enriquecedora do PS é o exemplo acabado de um ministro que governou para António Costa e não para Portugal. Para Costa, foi um sem fim de anúncios, promessas propagandas vazias; para Portugal também. O problema é que para Costa era isso que se pretendia, e para Portugal não. Talvez Costa possa dar-lhe uma condecoração qualquer do PS. Se isto se concretizar, adeus fundos estruturais. Em vez de dinheiro vamos ter promessas e inaugurações virtuais. Pior seria com o Nuno Melo. Então teríamos só palhaçadas. Embora não saiba a quem respondo, acho que não deve ser a um utente dos comboios públicos.
mail : Não discordo do que diz sobre o Nuno Melo, mas agora que a família socialista alimenta muita gente lá isso alimenta  Eu também não sei a quem respondo. Não, não sou um utente dos transportes públicos mas sei quem é que nada fez ao longo dos anos para os degradar com o objectivo de os vender aos amigos a preço de saldo. A exemplo de outras muitas situações. Quanto aos transportes públicos tem conhecimento de uma reforma anunciada pelo governo que a direita muito a custo e com muita azia já reconhece como uma medida estrutural de muito grande relevo a vários níveis? Deve saber e estar contente já que é um utente dos transportes públicos.
OldVic, Música do dia: "Canto de Hacha" (Francisco Ulloa) Liberdade para a Venezuela!26.03.2019 : Não, não tenho. Que medida é essa?

quinta-feira, 28 de março de 2019

Significados no dicionário urdu


É do que consta a lição número 4 da «ARÁBIA FELIX»: Nas questões do hábito masculino, das políticas de radicalismo severamente aristocrático, das corridas no deserto...
Vocabulário, por ordem alfabética (alfabeto nosso): Agal, Gandurah, Gargara,  Guthra, Urdu
Da nacionalidade: Urdu, só para nacionais do Emirato. Justificação, segundo o cronista. (O urdu é uma língua indo-europeia da família indo-ariana que se formou sob influência persa, turca e árabe no sul da Ásia durante a época do sultanato de Deli e do Império Mongol. Wikipédia)
Do Hábito masculino: Agal, Guthra, Kandurah: Vantagens no calor, do traje árabe, que mereceu as malícias das senhoras do cruzeiro. Lembrou-me o viril capote e as suas vantagens no descritivo (infra) de Júlio Dinis, que utilizo como paralelo, como curiosidade… e sem malícia.
 HENRIQUE SALLES DA FONSECA       A BEM DA NAÇÃO, 28.03.19
«Gargara», é a única palavra em língua urdu que conheço e significa algo como «ondulante». Pelo menos, foi esse o sentido da conversa que nos fez um dos condutores do rally amalucado pelas dunas do deserto dubaiano. Logo me lembrei de «gargarejo» que também é algo de sonoridade ondulante. E isso vem de «garganta». Quanta da etimologia resulta das malhas tecidas pelos Impérios…
E porquê urdu no Dubai? Porque é a tal questão da nacionalidade. Quem assim falou já nasceu no Dubai mas, não sendo filho de nacionais do Emirato, não conseguirá alguma vez na vida adquirir a nacionalidade. Mas se se casar com uma mulher que também lá tenha nascido, então os filhos comuns poderão ser admitidos no grupo restrito dos nacionais dubaianos. Deste modo, aquela família, não conseguindo adquirir a nacionalidade local, não teve até agora motivos para cortar com a cultura de origem e mantém a língua dos respectivos antepassados que, neste caso, é o urdu.
E também são muçulmanos, perguntei. Que sim mas nem mesmo assim conseguem a nacionalidade. E se vierem a ser pais de crianças com a nacionalidade? Nada feito. Serão pais de dubaianos mas disso não passarão. Realmente, pensando melhor, se o Emir quiser manter as rédeas firmes do poder, não poderá deixar muitos forasteiros aderirem à nacionalidade sob pena de, a partir de certa altura, o Emirato passar a ser dominado por quem pensa como estrangeiro e os autóctones genuínos, árabes, perderem a exclusividade da Nação. Não esquecer que isto é um regime monárquico ditatorial em que a «abertura» política se limitou a promover a constituição de um Conselho Consultivo do Emir que este consulta se e quando quer e a quem não confere qualquer poder decisório.
Segue-se uma particularidade: os funcionários públicos têm a obrigação de vestir a indumentária típica do Emirato, ou seja, a Kandurah que é a túnica comprida usada pelos homens, geralmente branca mas que também pode ser bege, castanha e, raramente, preta; ao pano na cabeça chama-se Guthra e ao cordão que o segura na cabeça chama-se Agal.
E já que de início referi a Revolução Francesa, parece que aquela gente imita os «sans culotte». Em terras que podem aquecer até aos 50º Centígrados, sempre ficam mais arejados. E não repito os comentários que as excursionistas expenderam… (continua)
Texto de apoio, retirado do conto encantador de Júlio Dinis, “Justiça de Sua Majestade” (in “Serões da Província”), como paralelo com o traje masculino árabe - também para todo o terreno, e para mais complementado com refinados e poderosos adornos cimeiros - paralelo revelador das vantagens do viril “capote”, como traje para todo o clima, segundo o descritivo do seu usufruidor, o negociante “José Urbano”:
«— Eu iria jurar, meu caro José Urbano, — disse o major Samora — que partia para a Sibéria. — O aspecto respeitável do seu equipamento... — Permita-me que lhe diga, major, que essa observação desacredita um pouco a reputação de homem experiente e cauteloso que merecia. Fie-se em calores de Maio! Bom, bom. Olhe-me para aqueles riscos brancos do céu, aquilo é leste, o impertinente, o endemoninhado leste. Eu nunca ouvi o sibilar dos pelouros, meu caro Cipião, mas afianço-lhe que me não pode ser mais desagradável que o do vento leste. Não o há assim. — Nem o dos mosquitos? — perguntou um estudante. — Nem esse. Os mosquitos matam-se, o leste... mata-nos. Bem vejo que o capote lhes está causando sensação. O capote, meus amigos, é o mais útil artigo de vestuário que desde a folha de figueira tem inventado o engenho do homem. Conserva-me o calor no Inverno e a frescura no Verão. Os óculos livram-me os olhos da poeira e conservam-me a vista. O guarda-sol, que os espanta pela enormidade, abriga a minha pessoa e a bagagem dos ardores do sol e das torrentes da chuva. A cabaça, meus amigos, contém o líquido que me sacia a sede, ou me dá o calor para arrostar com o frio... — Basta, basta, amigo José Urbano — interrompeu Samora. — Vejo agora que sou imprevidente. Desse modo, tanto pode viajar pela Cítia fria como pela Líbia ardente (…)»