sexta-feira, 31 de maio de 2019

Os nossos zelos



Parece correcto o ponto de vista de JMT, sobre a questão da operação stop angariadora de proventos e demonstrativa de iniquidades. É o nosso romance.
I- OPINIÃO: Chame o ladrão!, chame o ladrão!, chame o ladrão!
Imaginar cidadãos que devem tostões parados na estrada pela GNR para lhes levarem os carros, enquanto cidadãos que devem milhões têm os seus nomes protegidos, é uma coisa que dá a volta ao estômago a qualquer pessoa bem formada.
JOÃO MIGUEL TAVARES      PÚBLICO, 30 de Maio de 2019
O agora Prémio Camões Francisco Buarque de Hollanda tem uma belíssima canção de 1974 chamada Acorda Amor, que assinou com o pseudónimo Julinho de Adelaide, porque sabia que se fosse ele a assumir a sua autoria jamais a letra passaria na censura. Havia boas razões para isso. A canção arranca com um piano opressivo e o barulho das sirenes da polícia, para contar a história de um homem que acorda sobressaltado de madrugada, com gente a entrar-lhe pelo prédio dentro.
Para além das engenhosas rimas iniciais, nas quais Chico coloca várias palavras a rimar com “dura” sem jamais pronunciar a palavra “ditadura” – uma ideia que só por si mereceria meio Prémio Camões – a canção tem um grande refrão, no qual o narrador grita para a mulher “chame o ladrão!, chame o ladrão!, chame o ladrão!”, por motivos óbvios: chamar a polícia não servia de nada, porque era a própria polícia que estava a invadir-lhe a casa para o prender.
Esta terça-feira passei o dia inteiro a trautear “chame o ladrão!, chame o ladrão!, chame o ladrão!”, inspirado na coincidência temporal de duas notícias inacreditáveis: aquela que nos informava de operações-stop nas estradas de Portugal, com a GNR a cobrar dívidas em nome do fisco sob a ameaça da penhora dos carros; e aquela que nos informava de que o Banco de Portugal tinha enviado a famosa lista das grandes dívidas para o Parlamento, mas com os nomes e os montantes dos principais devedores escondidos num anexo sigiloso.
Imaginar cidadãos que devem tostões parados na estrada pela polícia para lhes levarem os carros, enquanto cidadãos que devem milhões têm os seus nomes constantemente protegidos pelas autoridades, é uma coisa que dá a volta ao estômago a qualquer pessoa bem formada. Mais vale chamar os ladrões – é bem possível que nos tratem melhor do que aqueles que deveriam zelar pelo bom funcionamento da Justiça neste país.
Dir-me-ão: é a lei. A GNR só está a fazer aquilo que a legislação permite, e o Banco de Portugal está apenas a velar pelo sacrossanto sigilo bancário. Sim, admito perfeitamente que seja a lei – mas também era a lei no Brasil do Julinho de Adelaide. Se é a lei, então a lei é injusta e iníqua, e deve ser mudada, tanto num caso como no outro.
Não, as funções da PSP ou da GNR não devem incluir a punição de cidadãos por dívidas às Finanças. Multas por excesso de velocidade, percebe-se; multas por excesso de dívida, não se percebe. Até porque hoje em dia o que não falta são meios coercivos para o fisco nos cobrar dinheiro, sem sequer ser preciso passar pelos tribunais (o ónus da prova no campo fiscal já foi invertido há muito, sem que ninguém pareça preocupar-se demasiado com isso).
Não, o sigilo bancário não pode servir para impedir a divulgação dos grandes devedores de bancos intervencionados pelo Estado, nem o montante das suas dívidas. Read my lips: isso é es-can-da-lo-so. O Banco de Portugal farta-se de falar em “danos reputacionais”, mas os brutais danos políticos que este brincar às escondidas provoca são infinitamente mais graves. A relação entre um banco e um devedor só diz respeito aos próprios desde que o contribuinte não seja chamado a pagar. A partir do momento em que há dinheiros públicos envolvidos (foram 23,8 mil milhões de euros em apenas 11 anos) é evidente que quem paga tem direito a saber como, porquê e para quem. Quem não percebe isto não percebe coisa nenhuma, nem com uma operação-stop à falta de vergonha na cara, que bem falta fazia.
COMENTÁRIO:
Rui Ribeiro, Bruxelas: Completamente de acordo. Parece a aplicação da velha máxima estalinista às dívidas fiscais com as dívidas de muitos milhões a serem apenas estatísticas e as de pequenos montantes a levarem ao "saque na auto-estrada". O Banco de Portugal é dirigido por ex-banqueiros. O actual governador há muito que devia ter saído. Parece completamente incapaz de servir o interesse público com a integridade que lhe seria exigível. Aliás, desde a desastrosa resolução do BES, em que se viu que ignorou inúmeros sinais que teriam justificado uma intervenção muito mais cedo, e que foi um sucesso tão grande que nunca mais se aplicou o mesmo modelo na Europa, que devia ter sido removido da sua bem remunerada cadeira dourada. Tudo isto é triste, tudo isto existe...
II –NOTÍCIA:  FISCO: Director de Finanças do Porto demite-se após operações stop da GNR e do Fisco
A operação foi criticada pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e pelo ministro das Finanças.
  PÚBLICO, 30 de Maio de 2019
O director de Finanças do Porto, José Oliveira e Castro, demitiu-se no seguimento das polémicas operações stop feitas pela GNR e pelo Fisco para cobrar dívidas a condutores que passavam em Valongo, e que viram as suas viaturas serem penhoradas, avançou esta quinta-feira o jornal Eco e confirmou o Ministério das Finanças em comunicado.
A operação já tinha sido criticada pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, e pelo ministro das Finanças Mário Centeno, com o Governo a assumir que a operação do fisco com a GNR foi um erro e a anunciar a abertura de um inquérito.
“Na sequência da forma como decorreu a ‘Acção sobre rodas’, desenvolvida pela Direcção de Finanças do Porto, para preservar a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) enquanto instituição de reconhecida relevância, o Director de Finanças do Porto decidiu colocar hoje o seu lugar à disposição, tendo a sua demissão sido prontamente aceite pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais”, com efeitos a partir de 1 de Junho, indica o Ministério das Finanças em comunicado.​
Quanto ao inquérito sobre “as circunstâncias em que decorreu a referida operação”, o ministério explica que este se encontra em curso “e visa identificar se foram respeitados todos os direitos dos contribuintes”, salientando ainda que “as acções de inspecção desenvolvidas por iniciativa regional não são previamente validadas centralmente” e que cabe ​“ao órgão de execução (Director de Finanças) definir a proporcionalidade entre os meios empregues e os objectivos visados”.
Sublinhando a “sua confiança” nos trabalhadores da AT quanto ao “seu envolvimento e contributo no combate à fraude e evasão fiscal”, o Governo destaca o seu compromisso na “criação e manutenção de relações de confiança, previsibilidade e justiça” com os contribuintes, acrescentando que tais princípios não são “coerentes com qualquer actuação abusiva ou desproporcional por parte dos serviços da Administração Pública”. Na manhã desta terça-feira, os condutores que circulavam pela rotunda da Auto-Estrada 42 (A42) em Alfena, concelho de Valongo, foram interceptados por uma operação stop da GNR e do fisco. Dez elementos da GNR mandaram parar as viaturas que circulavam por aquela via, enquanto cerca de 20 elementos da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) inseriam as matrículas das viaturas em sistemas informáticos. O objectivo da operação seria liquidar dívidas que se encontrassem em execução fiscal. Se o proprietário do veículo fosse devedor e não conseguisse liquidar o valor em causa de imediato, a viatura seria penhorada.
Em cinco horas de operação, foram penhorados dois veículos ligeiros e um camião que transportava animais. O Governo reagiu depressa, com o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, a pôr um fim à ideia que chegou ao terreno pela Direcção de Finanças do Porto. Porém, a operação gerou uma onda de críticas e acusações de “abuso de poder” por parte de elementos da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
COMENTÁRIOS
….ana cristina, Lisboa et Orbi: O Rui Esteves da Protecção civil, tal como este director, fazem parte de um sistema em que as nomeações, tal como as demissões e cada dedo que mexem, são decididas pela hierarquia. O Rui Esteves demitiu-se de forma combinada com quem o pôs no lugar, sacrificou-se publicamente e hoje está a ser compensado por isso. Ele e a família. Se o Rui é o mesmo que me responde, sabe os milhares que tem recebido. Seria interessante acompanhar os benefícios que este director demissionário, tão zeloso a mostrar trabalho à hierarquia quanto rápido a assumir culpas, vai obter em troca. Minha gente? Eu não pertenço à máfia. Sou livre, vivo do meu trabalho e não facturo um cêntimo ao estado. “Dar lugares de chefia a gente com deformação partidária dá este efeito” :))))) que cinismo sem limite, se o Rui Esteves que assina este comentário fosse mesmo o ex-número um da protecção civil, que com mais uma mão cheia de boys do PS, foram incompetentes a proteger o país dos incêndios, deixando um rasto de mortes,
José Cruz Magalhães, Lisboa 30.05.2019: Não era possível outro desfecho. O Estado, a administração central e a AT, não podem sancionar práticas e métodos que configuram abuso de autoridade e alinham, embora a distância significativa, com as acções de recuperação de dívidas praticada por alguma economia subterrânea.
pedroavalente, 30.05.2019: Pressionado a demitir-se por fazer bem o seu trabalho. No Norte leva-se a sério o trabalho e trabalha-se bem duro. Quando deixar de haver os impostos dos profissionais sérios do Norte que alimentam a preguiça de quem não quer fazer nada, estou para ver como vai ser. Sou de Lisboa e conheço bem a cultura de cá. A cultura do Norte não tem nada a ver (as pessoas pensam mais em "o que é que posso fazer pela empresa" em vez de "o que é que a empresa pode fazer por mim") e, com situações destas, está-se a atacar e destruir os poucos profissionais sérios que sobram.

A farda pisada



Sim, julgo que foi muito bom o estabelecimento do Lycée Charles Lepierre no nosso país, bem como o têm sido os vários colégios ingleses ou alemães, que vão também preparando alguns alunos portugueses dentro dos moldes que os alunos estrangeiros, naturalmente, seguem, segundo os trâmites pedagógicos dos seus próprios países, bem como, nas suas famílias, os preceitos específicos dos seus hábitos educacionais, talvez mais comedidos, embora das minhas memórias docentes aqui, me fique um cômputo quase direi só positivo e gratas recordações de amizade e de respeito mútuo, excluindo os casos pontuais da insubordinação ainda resolúveis na altura, mas que, ao que parece, se vão tornando gradualmente mais difíceis de aplicar, provenientes dos ventos não mais cálidos, mas de convulsão em tornado.
Mas, mesmo sem a influência liberal dos ensinamentos no liceu francês, também por cá (embora as minhas evocações se centrem no ensino em África) famílias houve que educavam os seus filhos sem a inscrição nos preceitos da Mocidade Portuguesa, olhada com desprezo por muitos não inscritos, o desprezo que manifesta Salles da Fonseca, por uma farda detentora de servilismos e arrogâncias em função dos preceitos estabelecidos pelas ditaduras que elas simbolizavam.
Por mim, desconhecedora então desses significados desfeiteadores de uma farda elegante, admirava quem a empunhava, nas paradas onde a maioria das raparigas, de que eventualmente fiz parte, nos festivais de ginástica e jogos naqueles anos do ciclo, usava vestido branco, que resplandecia nos quadrados centrais ou nas marchas laterais, em que a saudação à bandeira ou ao público se fazia de braço estendido, em sinal de respeito, que nunca me passou pela cabeça menosprezar, antes de ver, posteriormente, os VV socialistas ou os braços erguidos de punho fechado, que se lhes seguiram, imporem-se por cá.
Quem sabe se muitos dos que desfeitearam a língua portuguesa, num Acordo Ortográfico inconcebível, não terão feito parte dessa Mocidade Portuguesa de bela farda, que se apressaram em despir, logo após a Revolução de Abril! Por isso, acrescentei ao texto de Salles da Fonseca, o de Nuno Pacheco, uma vez mais indignado com o desplante dos subservientes linguísticos a outras pátrias, sem lógica e sem princípios!
HENRIQUE SALLES DA FONSECA              A BEM DA NAÇÃO, 30.05.19

REVOLUÇÃO FRANCESA EM LISBOA

“Liberdade, igualdade, fraternidade”
Eis os valores que o Liceu Francês veio promover em Portugal.
“Libertinagem, vulgaridade, promiscuidade”, as acusações a que eram sujeitos os princípios republicanos franceses pela sociedade portuguesa mais conservadora.
Era entre estes dois limites que uma parte importante da minha geração se situava. No meu caso, com claro pendor para a liberdade contra a libertinagem, pela igualdade contra a vulgaridade, pela fraternidade contra a promiscuidade. Tudo, numa versão não jacobina nem maçónica. De tradição familiar republicana e democrática, era-me fácil absorver aquela liberdade não constrangida por grilhetas físicas ou intelectuais, a igualdade não condicionada por preceitos sociais de nascimento, a fraternidade como atitude natural numa sociedade mais virada para a compaixão do que para o egoísmo. Por que não? Porque o contrário seriam a escravatura, a prevalência da «pureza genética», o isolacionismo individualista.
E precisamente porque os meus pais não me queriam de sotaina, me queriam mundividente e liberal, mandaram-me para o “Charles Lepierre”. Este, o «homem novo» que eles queriam, não o fardado da “Mocidade Portuguesa”.
(continua)        Maio de 2019              Henrique Salles da Fonseca
II - Cultura-Ípsilon: OPINIÃO
Socorro, querem roubar-nos a língua e deixar-nos mudos!
As variantes do português, riquíssimas, merecem ser reconhecidas como partes de uma mesma língua mas soberanas nos seus países e não desfiguradas em “unificações”.
               PÚBLICO,30 de Maio de 2019
Estava eu no Brasil, de férias, entretido (e divertido) com as diferenças entre o português de lá e de cá, quando no Expresso surgiu este título lancinante: “Há quem queira ficar com a nossa língua e quem, por cá, aplauda.” Imaginei logo uma enorme faca, afiada, a deixar-nos mudos para todo o sempre. Afinal, a coisa não era assim não grave. Nem facas nem sangue, só um lamento por alguém, no Brasil, defender que “o português brasileiro precisa de ser reconhecido como uma nova língua”. Henrique Monteiro (HM), autor do artigo, descobriu logo a marosca: os patifes que, por cá, querem acabar com o acordo ortográfico, são óbvios cúmplices desse nefando golpe, que deixaria a Portugal um dialecto minoritário (conhecido por português), enquanto o gigante além-Atlântico falaria orgulhosamente brasileiro.
Tirando o facto de tal artigo ter chegado atrasado umas décadas, já que a defesa de um grito do Ipiranga linguístico é ali velhíssima (embora sem quaisquer consequências), o artigo tem que se lhe diga. Não pela argumentação, mais rasteira do que relva recém-aparada, mas pelo que revela de profunda ignorância em relação ao tema. Vejamos alguns tópicos. H.M., sagaz, nota que há uma comissão parlamentar a propor alterações ao acordo ortográfico (AO) e que há 20 mil cidadãos a propor a “revogação, pura e simples, do tratado”. Terá lido apenas, percebe-se, o que alguém escreveu sobre o assunto. Mesmo assim, arrisca dizer que, “a bem do país e da língua, o Parlamento manterá o essencial do Acordo”. E o que é o essencial dessa coisa, saberá H.M. dizer? Não sabe. Nem ele nem as luminárias que o inventaram. Mas eu recordo e sublinho. O essencial era a “unificação ortográfica da língua portuguesa” (sic, para citar a nota explicativa do AO). Pois esse “essencial” não foi cumprido nem o será nunca. Nem com golpes baixos – como a alteração, por protocolos modificativos, do princípio básico de que o AO só entraria em vigor “após depositados os instrumentos de ratificação de todos os Estados junto do Governo da República Portuguesa” (e entrou antes, só com metade dos países, mantendo-se assim até hoje, sem alteração).
O que fazer, então? Alterar o acordo? Repor umas letras? Deitá-lo fora? Vejam bem: até H.M. diz, no seu texto, que contradições “há muitas; até incongruências”. Mas acha que não vale usá-las como argumento, porque “a perfeição, sabe-se, é tão impossível como agradar a todos”. Lindo, não é? Só que, neste caso, a palavra “imperfeição” é elogiosa, porque o AO contém um vasto rol de erros crassos, como há anos se tem vindo a apontar com exemplos, não com puerilidades. O deputado independente Jorge Lemos, que rasgou o texto do AO no parlamento, na sessão de 28/5/1991, disse tudo: “O acordo é inútil, ineficaz, secretista, prepotente, irrealista, infundamentado, desnecessário, irresponsável, prejudicial, gerador de instabilidade e inoportuno.” Ora de 91 para 19 nada disto mudou.
Tem isto alguma importância? Nenhuma! H.M. zomba até dos “que avisam que seguem a ortografia antiga” (esquece-se que, em jornais como o Expresso, muitos são obrigados a usar a “nova” por prepotência) porque “se virem com atenção, em muitos textos tal é indiferente porque não mudariam uma letra”. Na realidade, diz ele, “o que muda é 2%”. O argumento não é novo. Malaca Casteleiro e Telmo Verdelho, dois bonzos do AO, já o usaram em 2017, ao escreverem que se tais criaturas (da “antiga ortografia”) “não o declarassem, ninguém se aperceberia de tão grande heroicidade”. Isto pretende ser engraçadinho, mas vira-se contra os seus autores: se é assim, se ninguém se apercebe, se só mudou 2%, se tanto faz “nova” ou “antiga” ortografia que ninguém repara, então para quê o acordo, não nos dizem? Para nada?
Má vontade, é o que é. Porque, escreve H.M., “o idioma tem um valor decisivo na nossa projecção internacional”. Tem? Deve ser por isso que há cada vez mais Summits, Schools, Meetings, Businesses, Workshops and so on. É o português internacional! H.M. fala ainda da decadência do francês (uma ortografia “conservadora”), mas fazia-lhe bem consultar o site Ethnologue – Languages of the World. Ontem, os dados lá publicados eram, em milhões de utilizadores, estes (somando os que usam cada idioma como primeira ou segunda língua): o inglês com 1132 em 135 países, o espanhol com 534 em 30 países, o “decadente” francês com 279 em 53 países e o português com 220 em 14 países. Chega?
Por fim, dois argumentos que nunca deviam ser usados: se alguém “quer ficar com a nossa língua” (título do artigo) é porque, afinal, a língua tem dono. Afinal em que ficamos? Tem dono ou não tem? Somos nós? São eles? Somos todos? Querem parar de delirar, por favor?
O segundo, com que H.M. fecha o artigo, é: a língua “é um legado, um monumento da Expansão portuguesa. Não brinquem com ela”. Pois, mas já brincaram, ignorando que o “monumento da expansão” passou a fruto da independência. As variantes do português, riquíssimas, merecem ser reconhecidas como partes de uma mesma língua mas soberanas nos seus países e não desfiguradas em “unificações”. Este é (para citar uma palavra cara a Marcelo) um “irritante” que persiste, para incómodo geral. É mais que hora de removê-lo.

quinta-feira, 30 de maio de 2019

A teoria da ubiquidade


Só falta a Marcelo o dom da ubiquidade, para estar simultaneamente a festejar no Príncipe e no Sobral, no Brasil, a tal teoria, pois também o fenómeno do eclipse se observou ali, no Sobral do Ceará, onde também é festejada a demonstração da teoria do Einstein, pois aí se comprovou igualmente o tal encurvamento gravitacional da luz, prova da sua massa. Só que provavelmente não se dá tanta importância ali ao nosso Presidente, senão, ele arranjava maneira de lá estar à hora certa. Apesar de tudo, parece-me exagerado o encómio tão rasgado de Domingos Lopes ao nosso PR, mas deixo-me arrastar no entusiasmo e dedico ao nosso PR da ainda não ubiquidade, (que não tardará, a continuarem as demonstrações sobre a teoria quântica e seus afins, como Carlos Fiolhais explica no YouTube…), o poema de Fernando Pessoa, em participação na homenagem:
D. Sebastião, Rei de Portugal
Louco, sim, louco, porque quis grandeza
Qual a Sorte a não dá.
Não coube em mim minha certeza.
Por isso onde o areal está
Ficou meu ser que houve, não o que há.

Minha loucura outros que me a tomem
Com o que nela ia.
Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia
Cadáver adiado que procria? (MENSAGEM)
I -São Tomé e Príncipe  .100 anos. A importância de São Tomé e Príncipe na Teoria da Relatividade de Einstein (Internet)
A 29 de Maio de 1919, durante a observação de um eclipse solar na ilha do Príncipe, os astrónomos liderados pelo britânico Arthur Eddington validaram o encurvamento gravitacional da luz, provando que Einstein estava certo. Marcelo chega esta terça-feira ao Príncipe para as celebrações.
Passaram-se 100 anos desde que a Teoria da Relatividade Geral de Einstein foi comprovada na ilha do Príncipe e Marcelo Rebelo de Sousa não deixará passar a data em branco. No âmbito destas comemorações, o Presidente da República português dirige-se esta terça-feira a São Tomé e Príncipe para participar numa observação nocturna das estrelas.
Foi a 29 de Maio de 1919, durante a observação de um eclipse solar a partir da Roça Sundy, na ilha do Príncipe, que os astrónomos liderados pelo britânico Arthur Eddington validaram o encurvamento gravitacional da luz, provando que Albert Einstein estava certo.
Agora, 100 anos depois, o chefe de Estado português dirige-se à ilha do Príncipe para participar nas iniciativas que assinalam a comprovação da teoria do físico alemão. Segundo o programa oficial, Marcelo Rebelo de Sousa chega à ilha do Príncipe esta terça-feira pelas 17h locais (mais uma hora em Lisboa), sendo recebido com honras militares. Ao início da noite terá um encontro com o Presidente de São Tomé e Príncipe, Evaristo Carvalho, seguindo-se uma recepção oficial, na capital do Príncipe, Santo António. Depois, o Presidente participa numa observação nocturna de estrelas, na baía de Santo António, uma das iniciativas previstas nas comemorações, que decorrem até quarta-feira.
Na quarta-feira será ainda inaugurado o Espaço Ciência e História Sundy, na Roça Sundy, local onde Eddington comprovou a teoria da relatividade do físico alemão.
Em 1919​, o fenómeno foi observado igualmente no Sobral, Ceará (Brasil), que também acolhe iniciativas, por estes dias, estando ainda patente em Lisboa uma exposição no Museu da História Natural e da Ciência (naquela época, Portugal cedeu apoio logístico às expedições científicas).
O chefe de Estado português tinha anunciado esta deslocação, em Julho do ano passado, durante o encontro “Ciência 2018”, no Centro de Congresso de Lisboa, que contou com a participação do então ministro da Educação, Cultura, Ciência e Comunicação são-tomense, Olinto Daio.
À data, dirigindo-se a Olinto Daio, Marcelo Rebelo de Sousa declarou: “Senhor ministro de São Tomé e Príncipe, e bom amigo, ainda não há muito tempo nos encontrámos lá, e lá voltarei em Maio do ano que vem, para a celebração a propósito da comprovação da teoria da relatividade, na ilha do Príncipe”.


“Ó cousas todas vãs, todas mudaves”



Não é tão universal assim. Digo, a «Declaração Universal dos Direitos Humanos», como bem demonstra Salles da Fonseca. E aqui vamos nós em nova etapa, cavalgando, nas convulsões dos conluios, na rapidez das mudanças que dantes pareciam mais graves ainda, porque eram de armas e de terror, na sofisticação repugnante dos meios de destruição drástica, de que ditadores poderosos se arrogavam o direito de fazer cumprir, talvez amedrontadamente – se não sadicamente - obedecidos, e que hoje outros ditadores, de sítios onde a tal Declaração não chegou, também se arrogam. (Agora, nestes tempos convulsivos, é mais uma questão de generalização dos crimes, quer os de natureza física - por terrorismo puro, sob o disfarce de radicalismos religiosos, ou por interpretação abusiva das liberdades instituídas democraticamente – quer os de natureza ética, de generalização da corrupção de natureza económica ou outra, que nos afligem diariamente, pelo menos a nós, os de Ofiuza).
Mas neste momento, cá pelas democracias, travam-se discussões amigáveis, com muitos sorrisos e abraços, para uma composição e eleição presidencial segundo parâmetros anteriores, de união de afectos, que uns pretendem continuar seguindo - expõe Diana Sollers - e outros pretendem corrigir, de acordo com novos resultados eleitorais .
(E … No meio desses, cá da Ofiuza do ripanço e do primarismo que depressa cresceu para as tais mudanças, a botar faladura sorridente, o nosso Prime Minister, a pretender criar outras alianças europeias, mais ao nível da sua e nossa geringonça, para uma mais adequada distribuição dos dinheiros que não ganhámos com o nosso suor nem com as nossas lágrimas)…
Que mais irá acontecer?
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 29.05.19
Assim como, no naufrágio, Camões asiu o manuscrito d’ Os Lusíadas”, também nós segurámos o conceito do Bem.
Nem tudo se perdeu na frustração do sonho dos nossos pais. Assim foi que redigimos a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” e a dignidade regressou como valor fundamental da Humanidade.
De toda a Humanidade? Claramente, não!
Apenas no primeiro mundo, o do Ocidente (o da OCDE), porque no leste europeu (o 2º mundo) da esfera soviética (o do Pacto de Varsóvia) e na maior parte do resto do planeta (o 3º mundo), os direitos humanos continuaram a ser espezinhados. Mas nós, os ocidentais, “salvámos a honra do convento”. E alcandorámos o bem-comum à categoria de tema fundamental na discussão política no âmbito de um processo a que nos habituámos a chamar Democracia.
Nem tudo se perdeu, muito se ganhou. Um terço do mundo cumpriu o sonho; dois terços perderam-se nas vilanias.
E nós, por cá, em Ofiuza?
Cá, pela “terra da serpente”, tudo calmo, “quentinho”, em “banho maria”, de cueiros, em redoma de vidro, incubadora de Caminha a Timor…
Herdeiros de subdesenvolvimento crónico, tinham os nossos avós passado da Monarquia à República com inconcebíveis 90% de analfabetos adultos, passado pelo vexame da Grande Guerra em África e de carne para canhão inglês na Flandres; os nossos pais a serem protegidos dos flagelos directos da II Guerra Mundial mas a terem que se confinar a um modelo político monolítico que muito provavelmente não escolheriam. E por isso mesmo, podendo, nos puseram no ensino estrangeiro, esse que tinham por mais arejado.
A mim, coube-me o Liceu Francês em Lisboa.
Já conto…
(continua)               Maio de 2019, Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIOS:
João Franco, 29.05.2019: Sr Dr. A guerra em África não foi um vexame! Pode ter sido um erro estratégico ou simplesmente um erro mas nunca um vexame. João Franco
Henrique Salles da Fonseca, 29.05.2019: Muito Estimado Senhor Eng. Franco, No texto refiro-me aos episódios que ocorreram no sul de Angola e no extremo norte de Moçambique durante a guerra de 14-18, não à de 61-74 em que esta nada teve de vexame para nós, pelo contrário.
João Franco  29.05.2019: OK Então está bem. Um abraço. João Franco
Uma segunda oportunidade /premium
OBSERVADOR, 29/5/2019
O novo Parlamento Europeu mostra que a população nem quer mais hegemonias dos partidos tradicionais, nem agendas desproporcionalmente nacionalistas. Quer uma Europa renovada e geradora de consensos
Vamos começar pelas más notícias: em cinco estados da União Europeia – alguns dos maiores, por sinal – as eleições da semana passada foram ganhas por partidos de extrema-direita ou por partidos ultranacionalistas: no Reino Unido, na França, em Itália, na Hungria e na Polónia. Não deixa de ser motivo de grande preocupação.
Mas a verdade é que o cenário mais negro, o dos partidos antieuropeus obterem cerca de um terço dos assentos parlamentares, não aconteceu. Em vez disso, os liberais democratas e os verdes ocuparam uma posição central entre partidos tradicionais (em queda) e partidos extremistas (em ascensão). As forças políticas pró-europeias continuam em maioria, mas a fragmentação do novo hemicíclico é sintomática da vontade da população. Nem quer mais hegemonias dos partidos tradicionais, nem agendas desproporcionalmente nacionalistas. Quer uma Europa renovada e geradora de consensos e compromissos.
Não vai ser nada fácil. A fragmentação não gera harmonia. Aliás, já se fala de uma geringonça europeia de centro-esquerda, protagonizada pelos socialistas, os liberais e os verdes, desde já para impedirem Manfred Weber de ser presidente da Comissão. A questão de fundo é que esta coligação pós-eleitoral não corresponde nem à vontade do eleitorado, nem ao que mais convém ao Parlamento Europeu. Por vários motivos.
Em primeiro lugar, a fragmentação é também uma forma de protesto contra blocos – neste caso famílias – partidárias. Espera-se deste novo Parlamento o que é mais difícil: criar consensos alargados em várias áreas, que sejam o mais participadas possível, e que correspondam aos anseios da população. Caso não consiga, corre sérios riscos de bloquear.
Em segundo lugar, este novo Parlamento – e a distribuição de cargos pelas instituições que por consequência desta eleição vai ser muito mais diversa – é a oportunidade de que a União Europeia precisa para se reformar. Esta eleição acaba com uma espécie de Europa em marcha desenfreada para o aprofundamento da institucionalização e alargamento a mais estados e dá lugar uma arena em que as ideias – diferentes ideias de Europa – estão em confronto.
Mais uma vez a tarefa é difícil, mas caso esta oportunidade para reformar as instituições não seja aproveitada, a profecia dos cidadãos europeus poderá concretizar-se. Questionados numa sondagem do European Council on Foreign Relations sobre a durabilidade do projeto europeu, mais de metade respondeu que não se manteria por mais uma geração. É que, como foi sugerido acima, a sombra dos extremismos dispostos a transformar a Europa por dentro não desapareceu. Foi apenas menos expressiva do que se esperava.
Em terceiro lugar, a previsível confusão no Parlamento e na Comissão tenderão a fortalecer o Conselho Europeu, onde se encontram os chefes de Estado dos ainda 28, e os presidentes da Comissão e do Conselho. O reforço deste órgão, provavelmente mais estável que os restantes, pode ser um bom ponto de partida. Não só os partidos mais extremistas estão em muito menor representação, como uma reflexão sobre um papel mais activo dos estados na construção europeia pode bem ser parte da solução para o problema.
Uma coisa é certa. Apesar de sinais preocupantes (a força dos partidos antieuropeus na Grã-Bretanha, França, Itália, Polónia e Hungria), as eleições para o Parlamento Europeu mostram duas coisas: que os cidadãos não querem órgãos dominados por duas forças políticas e que, apesar disso, ao deslocarem o seu voto de partidos tradicionais para outros partidos pró-europeus, estão a dar uma segunda oportunidade à Europa. Mas é também sinal de que preferem uma Europa diferente. Queiram os eleitos e as elites de Bruxelas perceber esta mensagem, ou os riscos que ainda existem vão tender a aumentar.


quarta-feira, 29 de maio de 2019

“E esta!?Hein!”



Humor impagável E implacável. Tanto no que se refere às eleições para o Parlamento e o tal “dia para reflexão” imprescindível para bem escolher e por isso fechado a intervencionismos orientadores de opinião dos habituais analistas - como se os votantes ou os não votantes não tivessem já os seus conceitos definidos, com ou sem parti pris da concessão democrática. O segundo artigo de Helena Matos é mais uma excelente análise sobre o que “por aqui nos vai” de encobrimentos do que vai mal e de reclame do que de antemão se prepara como bom e assim se alardeia “et pour cause”. Um prazer de leituras sãs, de risonhas escritas incisivas. Um “risonho” que lágrimas traduz, de um pátrio amor sempre traído.
ELEIÇÕES EUROPEIAS  -  Marca d’água / premium
HELENA MATOS          OBSERVADOR, 25/5/2019
Votei antecipadamente. Reflecti em plena campanha eleitoral. E agora? Conto carneiros até que fechem as últimas urnas de voto nos Açores não vá eu com os meus textos perturbar os eleitores?
Qual é o dia de reflexão dos eleitores que votaram no passado Domingo? Sim, aqueles que, como foi o meu caso, optaram por votar antecipadamente estão certamente desobrigados de reflectir no sábado anterior às eleições. Nós já reflectimos há sete dias. A não ser claro que se nos aplique a obrigação de reflectir pós-dia de eleições. (É certo que os desacertos entre as escolhas feitas pelos eleitores  e aquilo em que os eleitos se transformaram depois de escolhidos são tão sonantes que levam a pensar que a reflexão pós-eleitoral devia ser obrigatória e vinculativa.) Assim sendo, e estando eu neste limbo reflectivo-legislativo, tenho a acrescentar que quero mesmo escrever sobre esta eleição europeiaa tal para que votei há uma semana – e sobre a duvidosa legalidade da forma como decorreu a votação em que participei.
https://secure-ds.serving-sys.com/resources/PROD/html5/6714/20190506/1074698010/45258766065616838/images/default_image.jpgJá aos leitores que hoje têm de reflectir recomendo que revejam a Raquel Welsh em “One million years BC”, sim exactamente aquele filme dos anos 60 que mistura bikinis, dinossauros e hortas biológicas. Andam os caros leitores com o comando até ao momento da aula de natação da Raquel Welsh aos primitivos. Pronto ficam aí sossegados que eu já volto e uma coisa dessas vale a pena ser vista várias vezes. Entretanto eu reflicto sobre a minha experiência eleitoral de há uma semana. Repito, de há uma semana. Logo estou por minha conta.
Não foi uma questão de mais fila ou de muito tempo para votar. É de legalidade mesmo que falo ou mais propriamente escrevo: votou-se depois da hora e havia urnas abertas – sim, com a urna sem tampa e com os votos todinhos ali à vista e à mão de qualquer um. Quanto ao sigilo do voto também me parece que está mais que comprometido. Senão vejamos o que aconteceu: o voto não foi apenas dobrado como nas outras eleições, mas sim colocado dentro de um envelope branco que por sua vez foi metido dentro doutro envelope, este azul. Com o voto duplamente envelopado entregava-se o mesmo a um membro da mesa que escrevia no dito envelope exterior o nosso nome do eleitor, o nosso número de cartão de cidadão e o local de voto. Como é óbvio o processo inverso é possível: olha-se para o envelope azul e lê-se o nome que lá está. Depois é só abrir o envelope azul, em seguida o branco e depois desdobrar o voto. Dir-se-á que tal nunca acontecerá. Não sei.
Acreditando que os leitores perceberam devidamente a engenhoca dos envelopes voltemos à aula de natação da Raquel Welsh mais precisamente ao momento em que estavam os primitivos a descobrir as maravilhas do crawl e aparece a aventesma do dinossauro voador.
Creio que foi desde esse momento fundador na História do cinema e dos bikinis que nas cabecinhas ocidentais se passaram a confundir alterações climáticas com tudo o que comprometa “o bom tempo” para ir à praia. Basta ouvir as palavras de ordem dos betinhos urbanos que desfilaram no centro de Lisboa para “salvar o planeta” e as diatribes daquela adolescente Greta que parece saída das aterrorizantes brigadas de crianças khmers vermelhas, para constatar que mais dinossauro menos vulcão se tornou fé obrigatória acreditar que o planeta está em risco por culpa da humanidade, para o caso das culpas restritas ao mundo ocidental. E assim com a Raquel Welsh quase a ser devoradas pelas crias do pterodactilo (o bikini continuava a assentar-lhe estupendamente!) voltamos à minha votação. De há uma semana, não se esqueçam os leitores nem a CNE.
Se alguém tratou de experimentar previamente o procedimento estabelecido para a votação antecipada certamente que se calou bem caladinho pois ao tentar-se enfiar a matrioska de envelopes dentro da ranhura da urna de voto constatava-se que não cabia. A sério, os envelopes não passavam facilmente daí que em algumas mesas de voto se tenha optado por abrir as urnas. Também ninguém ponderou o tempo necessário para se escrever no envelope exterior o nome do eleitor, o seu número de cartão de cidadão, local de voto e selar com uma etiqueta numerada a matrioska de envelopes. Mas ainda faltavam mais uns detalhes logo mais tempo na fila: tínhamos de depositar o voto na urna aberta ou lutar com a ranhura para, por fim, recebermos o comprovativo de que tínhamos votado devidamente etiquetado com um número igual ao que selara o nosso envelope. Como se percebe tudo isto demorava muito mais tempo que a votação habitual. Mas ninguém o previu.
Neste momento da fita já Afinal uma coisa é anunciar o voto antecipado e fazer de conta que sim senhor somos muito modernos. Outra bem distinta é tratar e verificar os procedimentos para que ele de facto aconteça.a Raquel Welsh está de figura inspiradora da presente articulação entre o feminismo e a ecologia pois não é em vão que ela lidera aquele grupo de amazonas que não só praticava a pesca sustentável como se dedicava com particular sucesso à agricultura biológica.
Nada do que aconteceu na votação de dia 19 é tecnicamente irresolúvel mas a forma atabalhoada como decorreu esse dia de eleições remete para um padrão governamental: anuncia-se, faz-se o show do anúncio, colhem-se os louros jornalísticos do projecto ambicioso, do anúncio histórico, da medida inovadora… Quando chega a hora da verdade em que o histórico não existe, o inovador fica abaixo das expectativas e o ambicioso falha já não há notícias até porque os jornalistas já estão a comentar outro projecto ambicioso, outro anúncio histórico e outra medida inovadora
Por exemplo, em Maio de 2018, anunciava-se como um dado adquirido que bastava cortar vagas no ensino superior em Lisboa e no Porto para que milhares de estudantes se pusessem a caminho das universidades e politécnicos do interior. Em Setembro, o ministro Manuel Heitor rejubilava porque a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro tinha atraído mais 82 novos estudantes do que no ano anterior. O Politécnico de Bragança mais 63, a Universidade do Minho 59 e a do Algarve 45. Curiosamente a Guarda que não fica no litoral registava menos 53 alunos, e as interiores Beja e Viseu perdiam respectivamente 25 e 23 alunos.
Feitas as contas conclui-se que o interior ganhou menos alunos que o Governo notícias a anunciar que íamos ter mais alunos no interior. Agora, em Maio de 2019, um estudo veio confirmar isso mesmo (o falhanço da medida não o sucesso das notícias sobre ela): “Corte de vagas não produziu efeitos desejados”. Como é óbvio a agenda anda agora entretida a anunciar o resultado doutras medidas. Elas terão de ser cada vez mais mais espampanantes, mais ideologicamente marcadas e mais irrealistas para no seu estardalhaço ofuscarem o falhanço das anteriores mesmo quando o seu falhanço é de 100% como aconteceu com a muito propalada linha de crédito para limpeza da floresta.
E a Raquel Welsh o que foi feito dela? O “leitor-eleitor em dia de reflexão” que me perdoe mas não podia estar a interromper a contabilidade dos alunos que iam para o interior e não foram com a descrição do momento em que a mesma Raquel se torna uma precursora do multiculturalismo na versão tribal mas deixo já aqui a minha proposta: os manifestantes que querem “salvar o planeta”, mais a menina Greta e os deputados que a querem ouvir qual sibila, apanham o cacilheiro e vão até Cacilhas. Aí, com os pezinhos em cima desses terrenos que já foram de um estaleiro que a luta contra o capitalismo destruiu e que a empresa estatal“Baía do Tejo” se prepara agora para vender por 2 mil milhões de euros (para quê? Para escritórios e habitação que a indústria já foi para a China!) falam sobre as alterações climáticas e a subida do nível do mar. Assim ficará mais claro quem em Lisboa quer declarar a emergência climática e em Almada quer construir rentinho ao mesmo mar que em Lisboa se garante vai subir. Acreditem o anacronismo do bikini da Raquel Welsh a par da sua aula de natação aos primitivos são um detalhe ao pé do desacerto entre o discursos e a prática desta gente.
Em resumo e como resultado de uma reflexão que creio aprofundada pela forma como votei nestas eleições: sabemos que a esquerda está no poder quando os anúncios governamentais são avaliados em função do anunciado e não do acontecido. É a sua marca d’água. Tal como o bikini era da Raquel Welsh.
E Berardo deixou-os nus /premium
HELENA MATOS   OBSERVADOR, 19/5/2019
A fúria dos seus parceiros nasce não do que Berardo fez mas sim daquilo que expôs sobre eles e como exercem o poder. Do BCP ao CCB, Berardo, o capitalista de Estado, é a outra face do socialismo.
O show da indignação dos antigos parceiros de Berardo com a prestação do comendador na Assembleia da República só pode surpreender quem não viveu em Portugal no século XXI.  A fúria que lhes extravasa por todos poros nasce não do que Berardo fez (e que eles estavam fartos de saber) mas sim daquilo que ele na sua desconcertante e, na minha opinião, nada ingénua boçalidade expôs sobre a forma como os socialistas se portam nos governos. Sobre  como pegam nos chavões da cultura para tornar aceitável o que não o é;  sobre o funcionamento do capitalismo de Estado em que se tornaram exímios; sobre como conseguem tornar tudo aceitável até que um escândalo rebente e os obrigue ao número da indignação fervorosa.
Todos os governos podem ter gente corrupta. Todos os partidos podem ser corrompidos. Todos os executivos podem celebrar acordos com empresas e organizações que acabam a revelar-se corruptas. Mas nem todos expõem do mesmo modo o aparelho de Estado à corrupção: quanto mais se aumenta a clientela dos dependentes, quanto maior é o intervencionismo estatal, quanto mais se faz equivaler sucesso governamental a políticas redistributivas, quanto maior a despesa fixa, mais aumenta a necessidade de quem governa de ter à mão o seu capitalista. Personificados nesses homens  que tendo o estilo popular de Berardo ou a pose aristocrática de Ricardo Salgado (penso que os senhores que se seguem terão aquele estilo infanto-juvenil dos empresários da área das tecnologias), os capitalistas de Estado (e do Estado) conseguem criar a ilusão de que o dinheiro aparece sempre”, de que o crescimento económico resulta de  uma questão de conjugação de vontades de gente gira que está nos negócios para promover a cultura, a igualdade, o avanço das mentalidades, ou outro item da agenda estatal do momento.
Os comunistas tinham os seus “banqueiros vermelhos”, gente que no exterior lhes garantia o acesso às indispensáveis divisas e os livrava da pateta ingenuidade dos camaradas revolucionários quando estes, em nome da ideologia, se preparavam para lhes estragar o negócio (não é coincidência qualquer semelhança com a atitude tomada pela República Popular da China, em 1974, quando percebeu que alguns militares portugueses davam sinais de pretender encetar em Macau um processo de descolonização ). Já os socialistas precisam mais do que quaisquer outros líderes dos capitalistas de Estado. Gente que monte a fachada empresarial da demagogia do sem custo, do gratuito, dos investimentos em que o principal, dizem-nos, não são os lucros mas sim a promoção de políticas. Berardo, tal como Salgado, são homens do tempo de Sócrates. Para os homens que estiveram com Sócrates no governo e que agora governam eles são uns empecilhos, fantasmas que se obstinam em desmontar a Regra Número 1 para entender Portugal: à esquerda o passado começa hoje. Em 2011, o governo socialista fez um pedido de ajuda externa. Ainda o ano não tinha acabado e já o mesmo PS se manifestava contra o programa que ele mesmo tinha negociado. Em 2012 a culpa da crise já não era da falência mas sim das medidas tomadas para a evitar… Em 2019, mostram-se indignados com Berardo, o mesmo Berardo seu parceiro no assalto ao BCP. Não duvido que dentro de uns anos serão os primeiros a indignar-se com os incêndios de 2017 ou os lucros conseguidos pelos novos capitalistas de Estado. Sim, como dizem os espanhóis sobre as bruxas que los hay los hay. Os capitalistas de Estado, claro. Das bruxas não sei nada.
A Regra Número 2 é a que estabelece: se as pessoas quisessem perceber tinham percebido. A ideia piedosa que anima muitas pessoas de que um dia, quando os outros tomarem conhecimento dos factos , então tudo será diferente é isso mesmo: uma ideia piedosa mas nada mais. Não foi por falta de esclarecimento que em 2011 um milhão e meio de pessoas votou em José Sócrates. Não foi por falta de esclarecimento ou de avisos que o país faliu. Não é por as pessoas não perceberem que em Portugal os problemas se avolumam. É sim por as pessoas terem percebido que viver enganado é mais cómodo. pelo menos durante um tempo, do que enfrentar as decisões inerentes à hora do desengano.
À atenção dos crédulos da tese de que quando os outros perceberem, então tudo será diferente segue uma pequena lista do que não temos querido ver, isto apenas nos últimos tempos Se é cliente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) vai começar a pagar mais pelas comissões. (Um banco público em Portugal é aquele que empresta aos ricos sem avaliação do risco e cobra comissões aos pobres). Manuais gratuitos até ao 12.º ano custam mais 100 milhões do que o estimado pelo Governo. (Como sempre o gratuito sai caríssimo). Dívida do SNS a fornecedores e credores aumenta 51,6% em três anos. A dívida do Serviço Nacional de Saúde a fornecedores e credores totalizou 2,9 mil milhões de euros em 2017, o que representa um agravamento de 51,6% face a 2014.(Uma forma expedita de financiamento: atrasar os pagamentos aos fornecedores).  Portanto a culpa é dos portugueses que não vão renovar o cartão de cidadão a Castelo Branco ao fim da tarde mas sim de manhã, às lojas do cidadão, em Lisboa) 2165 km2, 25 mil habitantes para um só militar. GNR do Alentejo desespera com falta de gente (O paradoxo socialista do costume: quantos mais meios para o Estado menos serviços essenciais o Estado presta!) Soflusa não sabe quando volta a fazer todas as carreiras entre Lisboa e o Barreiro. Faltam trabalhadores para garantir serviço. Empresa espera autorização das Finanças para contratar. ( Idem). A CP contabilizou, até às 18h desta terça-feira, 24 supressões na Linha de Sintra, relacionadas com um “excesso de imobilizações do material circulante” Na segunda-feira, “pelo mesmo motivo, ocorreram também cerca de 20 supressões (Uma coisa não é a coisa que é: os comboios não ficam parados por estarem degradados. Na verdade nem sequer ficam parados. O que temos é um  “excesso de imobilizações do material circulante”. Mais um pouco de “excesso” e até não temos falta de comboios mas sim excesso.
Regra nº 3. Deve existir. Mas com as duas anteriores já temos que chegue.