domingo, 30 de junho de 2019

Na corda bamba


Ontem, li no “Courrier Internacional” de Julho 2019, textos à roda do tema do aquecimento global, verdadeiramente assustadores. O próprio título da revista nos põe em choque: “Chegou a hora de entrar em pânico”. E explica profusamente o porquê disso, embora a imprensa diária já o tenha feito, para além das tais mudanças climáticas de que todos nos vamos apercebendo. Hoje leio este texto de Teresa de Sousa, sobre hipotética destruição da U E, tantos são os entraves de desentendimentos, e também entre os chefes do eixo Paris-Berlim. Teresa de Sousa explica bem, alguns comentadores ajudam a esclarecer, religiosamente tento acompanhar, modo de passar o tempo, no intervalo de outros filmes da vida. Ontem, todavia, “revi” dois musicais: Chicago” e “Mamma Mia”. E esqueci o medo, agradecida à Internet, que nos fornece imagens poderosas da criatividade humana. Mas o medo paira sempre, o pesadelo vai continuar, cada dia que passa nos traz exemplos, daqui e dalém. Dantes, a visão era mais limitada, cada horror mais circunscrito. O progresso trouxe mais desassossego, é coisa sabida.
OPINIÃO
Está quebrado o eixo sobre o qual a Europa roda
Macron tem razão quando diz que a Europa precisa de figuras políticas de peso à frente das suas principais instituições. A Alemanha, habituada a mandar, parece não sentir a mesma necessidade.
PÚBLICO, 23 de Junho de 2019
1. Não seria o melhor momento para os líderes europeus oferecerem publicamente mais um triste espectáculo de desunião em torno das questões que estavam na agenda da cimeira que terminou na sexta-feira, em Bruxelas. Escolher quem vai liderar as principais instituições europeias nunca é tarefa fácil. É preciso encontrar equilíbrios de natureza vária – desde os políticos aos geográficos, passando pela distribuição entre “grandes” e pequenos. É necessário, como sempre na União Europeia, um espírito de cooperação que permita encontrar soluções aceitáveis por todos. E é preciso, obviamente, que os dois extremos do eixo Paris-Berlim, sobre o qual a integração roda melhor ou pior, se consigam entender. Qualquer um destes ingredientes está em falta nos dias de hoje. Aquele que provocou mais danos, impossibilitando um entendimento em torno da distribuição dos cargos, foi o último: Merkel e Macron, pura e simplesmente, não se entendem.
2. Os desentendimentos entre ambos já vêm de trás. Começaram a avolumar-se quando o Presidente francês percebeu que todas as suas propostas para o futuro da Europa não tinham qualquer eco em Berlim. A única que deu alguns passos – curtos e poucos – foi a da reforma da zona euro, de forma a evitar que uma próxima crise leve a Europa à beira da ruptura, como aconteceu há nove anos. Mesmo assim, em relação a duas propostas fundamentais de Paris, apoiadas pelos países do Sul – um orçamento próprio da zona euro e a conclusão da União Bancária –, a Alemanha cedeu o mínimo possível para não dar aos mercados a ideia de que as fragilidades da moeda única eram demasiado grandes. Com a intermediação do primeiro-ministro português, foi possível encontrar uma solução que dota o euro de um pequeno orçamento próprio (que nem esse nome tem para não ferir a susceptibilidade alemã), apenas destinado a financiar reformas que melhorem a competitividade dos países-membros no sentido de facilitar a convergência entre as respectivas economias. É importante, porque a sustentabilidade do euro assenta nessa convergência (dado que qualquer mecanismo de transferências financeiras próprio de qualquer zona monetária única não é consentido por Berlim), mas está ainda a anos-luz do que seria necessário e foi proposto por Macron: um orçamento com significado suficiente para servir de estabilizador em caso de choques assimétricos que atinjam um ou mais países da zona euro. Paris pode dizer que se deu um pequeno passo na boa direcção. Ainda falta saber qual o montante deste orçamento e definir as condições em que pode ser utilizado. Quanto ao terceiro pilar da União Bancária (a garantia de depósitos), sem o qual o seu efeito de estabilização do sistema financeiro fica bem aquém dos objectivos, a teimosia de Berlim é inquebrantável.
3. De resto, Paris e Berlim estão nos antípodas em quase todas as questões europeias essenciais, como raramente estiveram no passado. Merkel está de saída e não vai sair da melhor maneira. As eleições europeias registaram uma queda acentuada da CDU, ainda que continue a ser o partido mais votado. A fragmentação do sistema partidário alemão deixou de garantir a tradicional estabilidade política. A “grande coligação” está por um fio, também (ou sobretudo) porque a queda do SPD ainda é mais dramática. Ninguém pode dizer ainda de que matéria é feita AKK, a nova líder do centro-direita que deverá suceder a Merkel. Mas, sobretudo, a Alemanha está de novo mergulhada numa crise existencial que tem, como sempre, debate é mais interno do que europeu. A emergência de um partido de extrema-direita e a multiplicação de ameaças (algumas concretizadas) à vida de alguns líderes políticos está a ter um enorme impacto psicológico, alimentando o eterno pânico do regresso ao passado. A economia, que até agora era a verdadeira força e o verdadeiro orgulho dos alemães, está a dar sinais de esgotamento, que podem ser apenas conjunturais, mas que podem revelar também os pontos fracos de um modelo de crescimento que assenta quase só nas exportações, que tem um sector de serviços incipiente e que passa por uma contenção salarial que se pode tornar um custo demasiado elevado para a maioria dos alemães. Acresce a questão que mais parece afectar a identidade alemã: a imigração. Em 2015, Merkel abriu as portas a quase um milhão de refugiados sírios. A sociedade alemã dividiu-se profundamente. A economia precisa desesperadamente de imigrantes mas muita gente vê-os como uma ameaça ao seu modo de vida e à sua cultura. É este o factor que alimenta o extremismo e que fez da AfD a terceira força política do Bundestag desde as eleições de 2017. O único sinal de esperança está na confirmação do fenómeno dos Verdes, ao ponto de as últimas sondagens, já depois das europeias, os colocarem um ponto à frente da CDU da chanceler. O seu êxito assenta, curiosamente, na defesa daquilo que já foi dado como certo na sociedade alemã e agora é dado como incerto: a Europa, que continuam a defender sem estados de alma, criticando o Governo pela timidez e pelo egoísmo da sua política europeia; a abertura aos imigrantes; uma concepção da economia liberal e reformista; e uma atitude de abertura em relação ao mundo. São a excepção que confirma a regra.
4. A Alemanha tem muito maiores dificuldades do que a França em adaptar-se a um mundo que entrou em crescente desordem e em que a geopolítica regressou em força, ameaçando o modelo de multilateralismo, ao qual Berlim se adaptava facilmente, assente na regra da relação existencial com a América, que foi um dos dois pilares fundamentais da nova República Federal depois da guerra, e entrou em ebulição graças a Trump. Paris consegue adaptar-se facilmente a esta nova realidade transatlântica: está habituada a estar com os EUA ou contra os EUA sem que isso perturbe demasiado a sua relação com a América. Percebe muito mais facilmente a lógica da relação de forças. Tem uma capacidade militar (e nuclear) que lhe dá uma autonomia relativa. Como lembrava Macron no seu discurso das celebrações do Desembarque na Normandia, pode estar em oposição aos Estados Unidos na questão do Irão, mas está com eles no Sahel. Berlim fala da necessidade de maior autonomia militar da Europa, mas teima em não gastar nem mais um euro com a sua própria defesa. Aprendeu recentemente que a “geoeconomia” afinal não é tudo, sendo cada vez menos nos tempos que correm. É obrigada a constatar a hostilidade da China, mesmo no campo privilegiado dos negócios do qual lucrou muitíssimo durante o tempo em que Pequim não era visto como uma ameaça. A Rússia, depois da Ucrânia, deixou de ser outro paraíso para os investimentos alemães e passou a ser uma ameaça constante à estabilidade da Europa Central, que Berlim vê como fundamental para a sua inserção europeia. Finalmente, vive na incerteza constante de acordar um dia com a aplicação de tarifas às importações americanas dos seus automóveis. Os outros países europeus até podem encolher os ombros. Os alemães não podem: nas estradas americanas há apenas quatro tipos de carros: americanos, japoneses, coreanos e alemães. É muita coisa para digerir. O resultado até agora tem sido, em boa medida, a paralisia. É esta a principal acusação de Macron que, obviamente, tenta encontrar outras alianças para tentar, pelo menos, abrir uma brecha no muro que encontra em Berlim.
5. Voltando ao início, desta vez o jogo das escolhas dos cargos europeus parece obedecer a outra lógica: o confronto entre famílias políticas num Parlamento Europeu em que o PPE, mesmo sendo o maior partido, perdeu boa parte da sua força ao abrir a possibilidade da constituição de alternativas capazes de anular a sua maioria relativa. Os liberais, fortalecidos com a entrada do “Em Marcha” do Presidente francês, mais os socialistas reforçados pelo peso crescente da Península Ibérica e pela recuperação da social-democracia nórdica, somados aos Verdes, conseguiram até agora uma “frente comum” capaz de retirar o poder de escolha à chanceler, que, por sua vez, precisa de algum tempo e de alguma coisa em troca para poder ceder. Com outro factor relevante que muitas vezes não é levado em conta: se o PPE ainda é maioritário no PE, não o é no Conselho Europeu. Os líderes voltam a encontrar-se a 30 de Junho, mas uma coisa é certa: Macron tem razão quando diz que a Europa precisa de figuras políticas de peso à frente das suas principais instituições. A Alemanha, habituada a mandar, parece não sentir a mesma necessidade. Entretanto, lá fora, cresce a tensão no Golfo Pérsico, pondo em causa a segurança internacional, incluindo uma subida abrupta do preço do petróleo…
COMENTÁRIOS
Francis Delannoy, 24.06.2019: Está quebrado o eixo sobre o qual a Europa roda´. Macron tem razão quando diz que a Europa precisa de figuras políticas de peso à frente das suas principais instituições. A Alemanha, habituada a mandar, parece não sentir a mesma necessidade. O eixo do carrossel europeu está liderado pelos alemães, com desunião entre países europeus, em que cada um se deixa girar pela grande roda europeia mas no fundo cada um anda na sua carroça .. culturas diferentes, economias diferentes, salários diferentes, modos de viver diferentes, fiscalidade diferente, corrupção diferente, politica diferente, justiça e injustiça diferente no fundo é o carrossel da ilusão.Todos giram ao sinal da mesma música europeia, mas todos primeiro giram para eles.O povo este pode ficar esmagado sobre o peso das rodas fiscais
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 24.06.2019: Às vezes fico com a impressão de que o grau de trauma económico e subserviência política dos portugueses está no ponto em que já nem mais se lembram de como funciona uma união monetária não predatória. Aqui, podia ser outra qualquer, fica o exemplo dos EUA onde o banco central tem actas públicas e os impostos circulam de um lado para o outro: The Economist 1 Ago 2011 "America's fiscal union - The red and the black - Where federal taxes are raised and spent"
joaorapace, 23.06.2019: Os alemães estão-se nas tintas para os opinadores que escrevem e comentam. Desde sempre estiveram, isso sim, a pensar neles. Quem não faz o seu trabalho, que somos nós, está agora aflito. Vendemos tudo e agora Portugal está bonito! Não tem futuro!
TP, Leiria 23.06.2019: Mas os alemães hão de chegar à conclusão que a apostar na economia interna e europeia é o que os vai salvar da guerra comercial e do isolamento dos US. Não é por acaso que a UE continua a ser a maior economia do mundo.
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 23.06.2019: Tenho a impressão de que TdS conhece melhor Houston Texas do que a Alemanha. Também eu vivi e trabalhei lá uns excelentes 5 anos (em Houston). No entanto, de amizades, colaborações e alunos alemães, tenho poucas dúvidas que eles não querem ser outra vez o Eixo de mais um projecto totalitarista no continente. A resistência de Merkel a seguir na direcção da autocracia que Macron propõe reflecte o domínio do aceitável para a opinião pública alemã. Vale a pena lembrar que a Alemanha não entrou voluntariamente no euro, e dele sairá quando a ameaça de deixar de funcionar como um marco for real. Recomendo sobre o tema este artigo no Der Spiegel de 30 Out 2010 "Was the Deutsche Mark Sacrificed for Reunification?". A Alemanha não precisa da UE. É o Eixo que precisa da Alemanha.
TP, Leiria 23.06.2019: Jonas não vale a pena você mencionar um artigo de 2010 completamente desactualizado. A Alemanha precisa da UE e os Alemães sabem disso. Por isso é que não hesitam em apoiar partidos pro UE.


Gostei, como “quase” sempre


Fico entristecida com o teor da crítica da maioria dos comentadores de VPV, e como não são muitos, desta vez, julgo que a maioria emudeceu talvez por receio de ferir as susceptibilidades de uma esquerda que não se ensaia em despejar o seu desagrado, como alguns fizeram. E, na verdade, só o primeiro o apoiou com a expressão “A sempre jovem e clara voz de Vasco Pulido Valente”, que logo mereceu deselegâncias rebarbativas. Julgo que VPV é ainda dos poucos portugueses corajosos que se atreve a confrontar a parcimónia assertiva dos discursos de um Salazar modesto mas indispensável a uma nação doente então, com a suavidade melíflua de um Centeno orgulhoso e, afinal, essencialmente falso nas afirmações de êxito que os mais conhecedores reconhecem como fictícios, numa nação mais doente agora, sem perspectivas de equilíbrio moral. A frase que o Público destaca em epígrafe “Quando apareceu, Salazar não prometia muito mais do que contas certas. E, ao princípio, podia gabar-se de muito maiores façanhas do que as de Centeno” é prova dessa voz “jovem”, por aguerrida, e temerária de VPV que os demais comentadores devem deplorar, e que por isso arrancou tão poucos comentários e só dos que vêem nesse nome odiado do “ditador” um tabu a ignorar.
O que VPV afirma a respeito de Nuno Bragança e do seu sentido de humor parece-me justo também, relativamente, pelo menos ao seu dito de espírito. De resto, as notícias às pinguinhas têm subentendido um amplo saber de quem se basta, por vezes, com simples metáfora “afiada”, como essa do “testamento” de Rui Rio. Quanto à observação de AndradeQB, do Porto, a respeito da frase de VPV em torno da questão sobre a responsabilidade de Trump na morte de um pai e sua filha, o discurso de VPV parece-me claro, e confuso o de AndradeOB.  Retomando: Se não há o direito de fugir da morte, a culpa é de quem instigou à fuga. Se há esse direito, a culpa é do Trump, que não o admitiu, causando, com isso, a morte. Parece claro, embora sucinto, VPV não se envolve, apenas aponta o caminho. Quanto à lição do Iraque, a respeito da Guerra do Vietnam, está subentendida a condenação dos EU.
Serão dados às pinguinhas, talvez para os que dominam bem as questões. Para mim, são um prazer, por uma inteligência que sobressai sempre, com uma certa verrina que nos seduz, exterior à objectividade do historiador, mas não do cronista, que ele não deixa de ser, ainda que a conta-gotas.
OPINIÃO
Diário
Quando apareceu, Salazar não prometia muito mais do que contas certas. E, ao princípio, podia gabar-se de muito maiores façanhas do que as de Centeno.
PÚBLICO, 29 de Junho de 2019
Esta manhã, a ler a revista do Expresso, tropecei na fotografia de um homem, que ocupava mais de meia página. Esse homem era-me familiar. Quem seria? O Tengarrinha? Olhei para o rodapé e percebi: era o Nuno Bragança. Estou velho: entre 63 e 67 vi o Nuno duas ou três vezes por semana.
Devo dizer que, ao contrário da maioria dos católicos que fizeram O Tempo e o Modo, nunca gostei muito da personagem. O artigo do Expresso vinha a propósito da reedição comemorativa do 50.º aniversário do romance A Noite e o Riso. Pedro Mexia, encarregado de fazer a apologia da coisa, não se coibira. Mas não consigo partilhar do seu entusiasmo. A graça do Nuno e a graça do livro não têm, para mim, graça nenhuma.
Pedro Mexia talvez veja alguma virtude na piadinha: “tango + orango = orangotango”. Eu não, porque a ouvi sob várias formas, infinitas vezes, apresentada como se fosse uma descoberta histórica. O Nuno era um exibicionista e julgava que tinha sentido de humor. Escrevia, por exemplo, na agenda do Pedro Tamen, sob o título: sábado, 22 de Junho, 11:30 da manhã – “ir ao c... ao Lindley Cintra”. Toda a gente achava isto uma prova de génio, como também as pérolas de originalidade de que ele se aliviava para provar que era um grande pensador: “A minha dificuldade portuguesa em encontrar a prosa certa, não a desligo eu dessoutra que é a maneira de dar com a maneira certa de ser eu em Portugal.” Que esta espécie de reflexões à mistura com orangotangos ainda hoje sejam veneradas excede a minha credulidade.
23 de Junho: A direita não fala em eleições, só fala no que se vai passar depois das eleições. Um testamento de Rui Rio.
24 de Junho: Há quem acuse este governo de não ter outro objectivo, excepto o de controlar o défice. Quem acha isso devia pensar duas vezes. Afinal, quando apareceu, Salazar não prometia muito mais do que contas certas. E, ao princípio, podia gabar-se de muito maiores façanhas do que as de Centeno.
25 de Junho: Os portugueses podem não ter memória histórica, mas os jornalistas do liberalismo americano têm; e, tendo, lembraram-se de uma fotografia que virou a opinião pública contra a guerra do Vietname: foi a célebre fotografia da execução de um viet cong no momento em que a bala lhe entrava na cabeça.
Desta vez, descobriu-se a fotografia não menos atroz de um pai e de uma filha de dois anos afogados no Rio Grande. O que não livra ninguém de responder a uma pergunta simples: há ou não há um direito absoluto de qualquer ser humano a fugir da fome ou da opressão, migrando para onde quer? Se não há, quem promove ou aplaude a migração do “triângulo” da América Central para a América do Norte é o responsável moral pelas vítimas do Rio Grande. Se há, o responsável é Trump.
26 de Junho: Viseu decidiu dar a João Félix um Viriato de Ouro. Enquanto ele recebia este “galardão”, cá fora juntaram-se umas centenas de crianças e de adolescentes, para o ver e lhe tocar.
Ele é a Cinderela no mundo real.
28 de Junho: As guerras no Médio Oriente são guerras de religião como as da Europa no século XVI e no século XVII. Nenhum muçulmano se intrometeu nessas querelas, como nenhum cristão se deve intrometer na antiquíssima querela entre sunitas e xiitas. Parece que não bastou à América a lição do Iraque.
Colunista
COMENTÁRIOS
Colete Amarelo, Aqui mesmo:  A sempre jovem e clara voz de Vasco Pulido Valente.
Sima Qian, China: O que tem de "jovem"? Só para perceber.
Colete Amarelo, Aqui mesmo: Com prazer, Sima Qian. Vasco Pulido Valente confessa-se velho, a 22 de julho, no entanto sempre o li com a mesma voz. Essa não envelheceu, mantém-se jovem.
Ferrel, Lamaros: Concordo. Mas mudando a forma. Afinal sempre foi velho. Quando o conheci, na altura do divórcio da M Cabral, já era assim velho e de hálito estranho.
Fernando Luz: Ressabiamento contra tudo e contra todos. Valerá a pena?
Espectro, Matosinhos: O grande problema de Pulido é, ao cabo e ao fim, o problema de todos os humanos (utilizo esta palavra para não ferir os bloquistas. Se falo em homens, dizem que sou machista e esqueço as mulheres, se digo mulheres, ficam a faltar claramente os homens, assim…vai humanos), é não conseguirem ser originais em nada, porque já tudo foi pensado e dito, todos os quadros necessários à compreensão da arte pintados (Picasso percebeu isso muito bem e por isso desconstruiu a arte) e todas as partituras escritas. Só resta, mesmo, desfazer o que foi feito há tantos séculos. O Pulido não está imune a esta fatalidade espectral, daí que seja semana após semana, repetitivo, banal e enfadonho. Calado é um poeta, porque todos o somos, desde que não abramos a boca nem mexamos a caneta. LOL
AndradeQB, Porto: Penso que na referência à fotografia de pai e filha afogados, onde está a culpa é de Trump, a ideia seria "não é". Só assim percebo o sentido e com ele estou de acordo. Não tendo ainda ouvido ninguém defender que não deveria haver fronteiras e a entrada nos países fosse livre, presume-se que existam para alguma coisa e que quem governa garanta que cumprem o seu papel. Que culpa tem Trump? Não ter adivinhado que se iam afogar e ter mandado dar-lhes entrada? Ou, não podendo adivinhar, mandar abrir a fronteira e os guardas todos para casa?

sábado, 29 de junho de 2019

Que importa?



Ambas as crónicas – de Alberto Gonçalves e de Alexandre Homem Cristo – afinal, se complementam - a hilaridade do primeiro transformada antes em um esgar de raiva incontida, ante a ineficácia da sua crítica para cegos, surdos e mudos, a seriedade do segundo, desmascarando o jogo histriónico do Governo, de alarde sobre falsos êxitos económicos, que engolimos, papalvos e abúlicos que somos - tendo ambos os textos idêntico propósito de alertar para o caminho de uma destruição sem retorno, mau grado os que vão cumprindo, para bem de si próprios e da Nação, que tanto precisa de gente séria e responsável. Tempo não de gargalhada mas de luto, o optimismo como sintoma de candura. Ou hipocrisia. Ou de indiferença, o que é pior, apática e desinteressada. Excepto pelos pontapés na bola, única obsessão permitida, como alienante e sintomática do resto, da nossa idiossincrasia de papalvismo e subserviência…
Esta não é uma crónica sobre o prédio Coutinho /premium
OBSERVADOR, 29/6/2019
Portugal para os portugueses. Nenhum estrangeiro mentalmente equilibrado aguentaria isto mais do que um fim-de-semana. A apatia perante os selvagens que mandam no país não é para todos os paladares.
Tomem lá uma anedota para descontrair. Conhecem a do cigano, do cavalo e da deputada municipal do PAN na Moita? É gira: a senhora do PAN criticou os maus-tratos dispensados aos cavalos por parte dos ciganos da região. A assembleia acusou a senhora de “xenofobia”. O PAN forçou-a a demitir-se. Os ciganos continuam a sobrecarregar os cavalos de trabalho e pancada. Os cavalos continuam a sofrer. O PAN continua a ser o partido que defende os bichos. E, desde que inspire uma boa indignação, a xenofobia tem costas largas.
Parecendo que não, até por causa do significado das palavras e doutras minudências, sempre é preferível que a xenofobia diga respeito à aversão a estrangeiros, e que os crimes não se castiguem ou perdoem de acordo com a “etnia” dos perpetradores. Os crimes variam. Os estrangeiros são os do costume. Chegam aí exaustos, desorientados, vindos de lugares remotos, exprimem-se em línguas diferentes, vestem roupas esquisitas, exibem costumes estranhos, interpelam transeuntes com pedidos inconvenientes, atafulham ruas e pracetas, vêem-se frequentemente explorados por gente sem escrúpulos e, de brinde, acabam insultados onde calha. Falo, é claro, dos turistas.
Há dias, a propósito do São João no Porto, o “Público” publicou um artigo acerca do São João no Porto. É um artigo preguiçoso e mal escrito, sem função ou tema, que se resume a meia dúzia de depoimentos de feirantes em volta das vendas e da “tradição”. Entre os feirantes, um vendedor de “pipocas vermelho garrido” queixa-se das modernices e, em particular, do turismo. O “Público” aproveitou a deixa e elevou o drama a título:O São João do Porto já não é o que era? ‘Há turistas a mais’”.
Não importa que deixem dinheiro. Não importa que criem emprego. Não importa que façam a exacta figura que fazemos quando visitamos os países deles. Para boa parte da esquerda, uns pedaços da “direita” e inúmeros indecisos, os turistas constituem uma praga atentatória da “vida portuguesa”, a erradicar com urgência. Além disso, promovem um milagre: em tempos de ofensa fácil e vigilância apertada, os turistas concedem-nos a liberdade de ofender forasteiros com uma violência que o PNR não ousaria dedicar a refugiados sírios. E, ao contrário do que agora é moda, sem aborrecimentos profissionais, morais ou legais. Para cúmulo, o ódio aos turistas encontra um alvo, ou cinco, literalmente em cada esquina, enquanto o ódio do PNR a refugiados e afins se vê à rasca para descobrir destinatários (excepto, talvez, nos aeroportos, a caminho da Europa que lhes interessa). Aliás, convém evitar quaisquer confusões com sentimentos de intolerância: se o sr. Trump não permite que as populações integrais da Guatemala, El Salvador, Nicarágua e México penetrem confortavelmente o Texas, o sr. Trump é fascista. Se desejarmos enxotar 17 alemães do Chiado, somos patriotas. Em suma, descontados os que chegam na penúria, que servem a demagogia e o escarcéu, os estrangeiros são essencialmente desprezíveis e, em prol da higiene pública, reclamam a acção das autoridades.
A boa notícia é que as autoridades já começaram a agir. Na pequena escala, multiplicam as taxas, as taxinhas, os regulamentos, as restrições, as coimas e o geral inferno burocrático que, grão a grão, transformam as actividades ligadas ao turismo em suplícios que indivíduo algum suportará. Ao nível “macro” (perdão), temos os benefícios fiscais ou os 6500 euros que o Estado oferece aos emigrantes que regressem à terrinha e contribuam para diluir a sujidade turística e afinar a pureza da “portugalidade”. Apenas se estranha um pouco que, dado o fulgurante sucesso económico dos drs. Costa e Centeno, os emigrantes necessitem de incentivo material para voltar aqui. A acreditar nos peritos amestrados do governo, a pujança de Portugal é tanta que os outrora foragidos da “troika” deviam esgadanhar-se para alcançar Vilar Formoso. Pelos vistos, não se esgadanham. E nem os incentivos convencem esses traidores.
Felizmente, há excepções. Decerto desiludido com a fraca resposta dos emigrantes indiferenciados, o governo passou a apostar no regresso dos especializados. Em particular, os funcionários do Estado Islâmico. É uma ideia radiosa, a de recuperar “jihadistas” em fase indefinida das respectivas carreiras. Trata-se de trabalhadores altamente motivados, assíduos e dotados de competências raras nos sectores dos rebentamentos e das decapitações. É verdade que não são muitos. Mas são muito empenhados e propensos a provocar impacto junto dos que os rodeiam. Um único terrorista (certificado) é capaz de, sozinho, eliminar directamente dezenas de turistas e indirectamente afugentar milhares.
Portugal para os portugueses, pois – mesmo porque nenhum estrangeiro mentalmente equilibrado aguentaria isto mais do que um fim-de-semana. A apatia perante os selvagens que mandam no país não é para todos os paladares. O que está a acontecer no prédio Coutinho, que deliberadamente não invoquei para não chamar os selvagens pelo seu autêntico nome, é um reles, bastante reles, exemplo do que acontece diária, impune e discretamente entre o poder e um povo que se quer orgulhosamente só. É uma sorte: um povo assim orgulhoso de enxovalhos seria péssima companhia.
COMENTÁRIOS:
Ahfan Neca: É como aquela anedota dos existencialistas. Perguntaram a um governante quem vive no prédio Coutinho. Este respondeu que eram existencialistas. Existencialistas? Sim, teimam em existir!
José Paulo C Castro: Mas a crónica é sobre um país megalómano a ser demolido pelos seus e onde só ficam os tugas idosos que não fugiram daqui. Um prédio Coutinho na beira-mar da Europa.
chints CHINTS: Muito bom!
 Ping PongYang: Vamos a ver se o Sr. Goebells das conservas percebe melhor assim: Der Kaninchen ist tot! Die Kaninchen sind verloren kaputt !
De fininho: portugal humilhado na europa e a censura de extrema esquerda do observador apaga apaga.

Portugal na liga dos últimos /premium
OBSERVADOR, 27/6/2019
A economia pouco cresce. Mas o discurso oficial ignora a existência dos desafios económicos e não reage ao facto de, comparativamente aos seus parceiros europeus, Portugal estar a ficar para trás.
Apenas 7 países europeus têm um PIB per capita (em paridades de poder de compra) abaixo do português – Bulgária, Croácia, Roménia, Grécia, Letónia, Hungria e Polónia. Este resultado refere-se a 2018, o segundo ano consecutivo em que o país se afastou da média europeia neste indicador. Desde 2015, Portugal foi ultrapassado por três países – Estónia, Lituânia e Eslováquia. A perspectiva para 2019 é que o fosso português se continue a cavar. A Comissão Europeia estima que a economia portuguesa cresça cerca de 1,7%. Na Europa dos 28 países, há 9 que crescerão menos. O ponto é que esses 9 são as economias mais fortes do continente europeu, como a Alemanha (0,5%), a França (1,3%), a Itália (0,1%), a Holanda (1,6%) ou a Áustria (1,5%). Isto alerta para dois problemas iminentes. Primeiro, o crescimento frágil dos países que são o motor económico da UE pode ser o anúncio de uma eventual crise. Segundo, o nosso país continuará a ser ultrapassado no PIB per capita pelos países do leste acima referidos, na medida em que todos (repito: todos, sem excepção) estão a crescer mais depressa do que nós. Aliás, alguns estão a crescer o dobro (Bulgária – 3,3%; Roménia – 3,3%; Hungria – 3,7%) e há quem já não esteja longe de crescer num ano aquilo que Portugal demora três anos a crescer (Polónia – 4,2%). Facto indesmentível: Portugal segue acelerado para a cauda da tabela europeia e pertence cada vez mais à liga dos últimos.
Por um lado, o crescimento económico em Portugal é muito insuficiente, nomeadamente quando comparado ao dos países com que Portugal disputa posições nas hierarquias europeias – como os dados acima demonstram. Mas, por outro lado, o discurso oficial aponta completamente noutro sentido. Basta escutar o primeiro-ministro. Primeiro, assinala estar-se acima da média europeia em taxa de crescimento do PIB – o que, sendo verdade, se deve ao mau desempenho das economias mais fortes, como as da Itália e da Alemanha, que puxam a média europeia para baixo. Depois, afirma que as metas portuguesas têm sido ambiciosas, por estarem acima da média europeia – o que é sobretudo enganador, porque não há nada de ambicioso em crescer a metade do ritmo da Roménia, da Bulgária ou da Polónia. Ou seja, o discurso oficial não reage ao facto de, comparativamente aos seus parceiros europeus, Portugal estar a ficar para trás – antes prefere manter ilusões de pujança da economia portuguesa.
Note-se que os últimos lugares europeus não são um exclusivo do desempenho da economia portuguesa. Num outro caso comparado, foi recentemente divulgado que Portugal é o país europeu que menos cumpre as recomendações do Conselho da Europa no combate à corrupção. Os números portugueses são péssimos e a comparação internacional um autêntico sinal de alarme. No final de 2018, a Portugal faltava cumprir com 73% das recomendações europeias – um desempenho ainda pior do que Turquia (70%), Sérvia (59%) ou Roménia (44%), por exemplo. De resto, Portugal nem sequer ratificou a Convenção sobre Corrupção e Lei Criminal, demonstrando de forma explícita a sua falta de compromisso quanto a esta questão.
Esperar-se-ia que, num país onde um ex-primeiro-ministro enfrenta tão graves acusações de corrupção, houvesse um maior enfoque no combate à corrupção e na promoção da transparência no exercício de cargos públicos. Mas o que há é precisamente o inverso. Primeiro, só agora, na preparação da próxima legislatura, é que o primeiro-ministro elegeu o combate à corrupção como prioridade política – uma forma de assumir que, até ao presente, essa preocupação não existiu (o que é evidente). Segundo, e porque as acções falam mais alto do que as palavras, as iniciativas legislativas do PS e do governo só provam que as suas reais intenções seguem no sentido de um maior controlo político da Justiça – por exemplo, por via da proposta de acabar com a equiparação entre a magistratura judicial e a magistratura do Ministério Público, enfraquecendo os poderes de escrutínio a quem desempenha funções políticas. Como bem explica Luís Rosa, “é óbvio que o PS não quer lutar contra a corrupção”.
Dir-me-ão que estes dois indicadores (crescimento económico e combate à corrupção) representam apenas a ponta do icebergue. Sim, é longa a lista de áreas onde nos destacamos pela negativa e em que caímos para a cauda das comparações internacionais – por exemplo, há dois dias foi também divulgado um relatório internacional que coloca Portugal como o terceiro país do mundo onde menos se confia no governo. Mas pior do que ter estes desafios pela frente é mesmo constatar que, no discurso político, todos eles são sucessivamente ignorados. É elementar que a resolução de um problema depende, primeiro, do seu reconhecimento – e não só isso não está a ser feito, como o discurso oficial se tem alicerçado na percepção de que tudo está bem e que os desempenhos portugueses são muito positivos. Claro que um dia será impossível disfarçar estes e outros problemas estruturais – na economia, na Justiça, no sistema político. O problema é o de sempre: quando esse dia fatal chegar, já pouco restará a fazer para prevenir os piores cenários e respectivas consequências.


sexta-feira, 28 de junho de 2019

Um discurso responsável



Gostei do texto de Margarida Mano, que me pareceu sério, apesar de ela se dizer seguidora do Acordo Ortográfico - o que me parece isso, todavia, índice de um desprezo pela sua língua, que constitui, para mim, pecha desfiguradora de um conceito de cidadania que não se coaduna com intenções de respeito pátrio, que o seu texto me parece conter, na sua defesa de um Ensino que acusa de ser adulterado por este Governo. Não me lembrei de que ela sucedeu a Nuno Crato, o que na altura me causou indignação, mas os seus comentadores não o deixaram passar em segredo e condenam-na, juntamente com outros dados acusatórios, o que me fez consultar a sua biografia, a qual me parece bastante preenchida de realizações - pelo que atribuo as críticas, sobretudo, aos motivos mesquinhos de oposição partidária. De resto, o falhanço no Ensino, como em tudo o resto, imputo-o antes aos erros, primitivos e seguintes, de uma democracia libertária acéfala e suicidária, desde o seu início.
OPINIÃO:   O Governo do Engano (também) na Educação
Na Educação, ao fim de quatro anos de legislatura, o que é factual é que o investimento é insignificante, que as condições nas escolas estão degradadas e que existem profundas contradições entre o discurso e a realidade.
MARGARIDA MANO      PÚBLICO, 25 de junho de 2019
Sabemo-lo e olhamos para a situação com a resignação de quem reconhece tratar-se de uma inevitabilidade... “está-lhe no sangue”. Habituámo-nos a ver o primeiro-ministro defender os resultados nas finanças públicas “graças ao fim da austeridade”, ao mesmo tempo que o seu ministro das Finanças tranquiliza o Financial Times dizendo que “não houve uma dramática viragem da austeridade”. Sabemos hoje que as narrativas de propaganda política do Governo coexistem num Portugal, em 2018, com a maior queda da Europa nos rankings de competitividade; com a maior carga fiscal dos últimos 24 anos; com um dos piores crescimentos económicos da União Europeia e com níveis de investimento público inferiores a 2015. Poderíamos voltar a falar do “caso dos professores”, em que a realidade foi, como a UTAO pode confirmar, distorcida até à última consequência da grande ameaça de demissão, de forma a condicionar a liberdade de acção do Parlamento. Essa é uma história que só um Governo sério poderá vir a provar: a de como uma justa recuperação do tempo de serviço, sendo possível, pode ser uma peça relevante nas necessárias reformas da Educação.
Sabemo-lo, o Governo continua a enganar (quase) todos na Educação. Há poucos dias, o chefe de Governo foi inaugurar uma escola requalificada em Arcos de Valdevez: 4,1M€ de investimento; promessas para o futuro e, cereja no topo do bolo, um “tributo aos professores”. Podemos gostar de o ouvir, mas não esqueçamos que estamos a ser enganados: 2,7M€ foram-nos dados pela Europa (a Europa das eleições nas quais muitos não votamos) e 1,2M€ foi investimento do município. O Governo contribuiu para a requalificação com uns quase insultuosos 0,2M€. Estes momentos de campanha não podem fazer-nos esquecer do fundamental: os números do investimento na Educação estão ao nível zero (0,3%), tendo em conta o orçamento do ministério (6000M€). No total, são pouco mais de 20M€, que mal dariam para cobrir o custo médio de uma única intervenção da Parque Escolar. Menos 80% do que o investimento realizado em 2015! Na Educação, ao fim de quatro anos de legislatura, o que é factual é que o investimento é insignificante, que as condições nas escolas estão degradadas e que existem profundas contradições entre o discurso e a realidade, como a contradição chocante entre o discurso de tributo e a prática de desprezo pelos agentes da educação (alunos, famílias, assistentes técnicos, técnicos educativos, professores, inspectores, etc.).
O sistema está enfraquecido num contexto de enormes desafios, não só societais, mas também demográficos. Na última década o sistema perdeu 175.000 alunos, um número que se espera superior nos próximos dez anos. Os dados referentes aos alunos matriculados no ano lectivo 2017/18 confirmam esta tendência. Igualmente preocupante é a contradição entre o discurso (repetido até à exaustão) do Governo na suposta defesa da escola pública e a real escolha das famílias. É um facto indesmentível: pela primeira vez nos últimos anos a escola privada ganhou alunos à escola pública, curiosamente à entrada e à saída da escolaridade obrigatória, ou seja, no 1.º ciclo do ensino básico e no secundário. E isto acontece apesar do encerramento de várias escolas de referência, em particular em territórios de baixa densidade, que, tendo visto os seus contratos (válidos até 2019) desrespeitados pelo Governo no início da legislatura e apesar de todos os esforços, não conseguiram evitar o encerramento. Foi disso mais um terrível exemplo, na passada semana, o CAIC, em Cernache, um marco com 65 anos de exemplo na formação humana integral na região. Se é claro o impacto da natalidade na diminuição global de alunos, os dados mais recentes indicam um novo elemento preocupante: o abandono da escola pública está a ser acompanhado pelo aumento dos alunos nas escolas privadas. A Educação Pública na realidade está em falência.
Do lado dos professores, o cenário não é melhor. Na escola pública, os professores são uma classe profissional envelhecida. Os que conseguem entrar para os quadros têm, em média, 50 anos de idade, alguns quase na idade da reforma. Por sua vez, o número de candidatos para dar aulas tem vindo a diminuir – menos 4000 do que em 2018. A situação é preocupante, uma vez que precisamos dos melhores professores para, em diferenciação pedagógica, estimular cada uma das nossas crianças e jovens a serem cidadãos preparados para o futuro!
Ninguém terá dúvidas do papel da Educação Pública como alicerce de um futuro socialmente justo em Portugal. Sabemos que os recursos públicos são limitados e exige-se uma melhor aplicação dos recursos com que os Portugueses contribuem. Há urgência nas escolhas certas! Naturalmente que estas não passam por cortar o investimento nas escolas, numa legislatura de crescimento económico, ou por fugir dos problemas e das negociações. Também não passam por obras de última hora, ou por falsos tributos de circunstância. As escolhas certas pressupõem governos que falem verdade, que respeitem os órgãos de soberania eleitos, que respeitem o esforço dos contribuintes e que saibam, em concertação social, construir compromissos. A urgência das escolhas certas requer uma visão para o país do futuro que valorize a Educação e a Escola pública, requer o respeito pelo país do presente, assente na transparência e no compromisso e requer coragem para governar de facto, com equilíbrio e sustentabilidade. Infelizmente nenhuma destas três condições parece estar presente na ação deste Governo do Engano (também) na Educação.
Vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD
COMENTÁRIOS:
jafundo, 25.06.2019 Isto vindo de uma senhora que quis suceder a Crato que suspendeu as obras nas escolas e aumentou o número de alunos nas turmas e despediu centenas de professores. Que falta de vergonha! Que desplante! Muita gente pode opinar mas que se calem estas pessoas que quiseram enterrar a educação pública.
viana, Porto 25.06.2019 Depois da cambalhota do PSD no que se refere à sua relação com os professores, ainda há lata para alguém do PSD comentar o estado da Escola Pública? Vão gastar mais dinheiro na Escola Pública, enquanto aumentam de novo o financiamento público de escolas privadas? E os porcos têm asas?... Tomam todos como parvos, ou quê?!!
isabel.dente, 25.06.2019 nem esta mulher nem o jornal têm vergonha e ainda querem subsídios isto não é jornalismo é apenas um sai de lá tu para ir eu.
Francis Delannoy, 25.06.2019 -O Governo do Engano (também) na Educação +++++ quando mentirosos e incompetentes estao no topo do poder é o que da.. a fragilização da sociedade desde as escolas ao emprego.. anda tudo com uma mão na frente e outra atrás..porque sempre fizeram uma politica de austeridade pilhando e gastando a lagardère os recursos do estado deixando as dividas para as gerações que ainda não nasceram e as que estão a nascer. São uns políticos irresponsáveis , da pior espécie porque iludem o povo com competências que não têm..
Alguns dados biográficos:
Margarida Isabel Mano Tavares Simões Lopes (Coimbra, 3 de dezembro de1963) é uma professora portuguesa, tendo sido Ministra da Educação e Ciência do XX Governo Constitucional de Portugal.[1]
Margarida Mano foi eleita deputada da Assembleia da República nas eleições legislativas de 2015. De Março de 2011 a Setembro de 2015 foi Vice-Reitora da Universidade de Coimbra, responsável pelos pelouros do Planeamento Estratégico, Financeiro e da Acção Social.
É doutorada em Gestão pela Universidade de Southampton (Reino Unido), mestre e licenciada em Economia pela Universidade de Coimbra e docente na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra desde 1986, nas áreas de Economia e de Gestão (gestão estratégica, avaliação institucional e gestão da qualidade).
Iniciou a sua carreira profissional na Banca em 1987, tendo depois exercido funções de gestão universitária como Administradora (1996-2009) e Pró-Reitora (2009-2011) da Universidade de Coimbra.
Especialista do European Foundation for Quality Management (EFQM) para o Ensino, tem participado em diversos projectos de benchmarking e redes de cooperação Internacional no âmbito da Administração Pública, em particular do Ensino Superior, no âmbito da European Universities Association, nomeadamente o projecto European Universities Implementing their Modernisation Agenda (EUIMA); Transparent Costing in European Higher Education Institutions (IES/TCE); Define (Governance, Autonomy and Funding) e enquanto Membro do Comité Internacional de Avaliação do Observatório de Boas Práticas em Direcção Estratégica no Ensino Superior da Rede Telescopi. A nível nacional foi responsável por projectos de mudança organizacional, cujo desenvolvimento facilitou práticas colaborativas e de transparência da administração de mérito reconhecido … Desenvolveu ainda colaborações com Escolas enquanto perita externa de Agrupamentos de Escolas, nomeadamente no âmbito do Projecto Educativo Programa de Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP II) – Trabalho, Engenho, Inclusão e Progresso. É membro fundador da Rede dos Administradores Universitários Ibero-Americanos (RAUI), da Heads of University Management and Administrators Network in Europe (Humane) e da Associação Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa (Forges) cuja Direção integra. É também autora de várias publicações (livros e artigos) no âmbito da Gestão do Ensino Superior.  Publicações: ……. Publicações: …….

Lições de política económica


Que incluem questões demográficas, científicas, políticas, e põem interrogações. O que não entendi, foi essa de meter Portugal ao barulho. Nunca pensei que Portugal servisse de termo de equiparação e até me senti a modos que envergonhada, neste sentimento de raquitismo sem retorno. Miguel Gouveia parece banalizar a ascensão económica da China, ou pelo menos põe dúvidas. Provavelmente não entendi bem o seu raciocínio. Só sei que uma pessoa amiga, que foi a Moçambique, diz que Lourenço Marques - perdão, Maputo - está em progresso visível, e isso graças ao dinheiro chinês. E eles, os chineses, furam por outros lados lá na África. E dizem que na Europa também, e suponho que no resto do mundo, de que as lojas são a parte visível. Aqui neste cantinho onde vivo, numa roda limitada de metros, só lojas chinesas há quatro, com muita tralha e poucos empregados. Mas isso são trocos, em termos de economia, peanuts, mixaria…. O domínio chinês será outra coisa, pertence ao domínio dos deuses, do deus Mercúrio, com certeza, industrioso deus do comércio, além de mensageiro do seu extremoso pai Júpiter...
O crescimento económico da China
MIGUEL GOUVEIA
OBSERVADOR, 28/6/2019
É muito improvável que num país governado por uma clique cujo poder tem poucas limitações funcione o princípio da "destruição criativa" indispensável para que uma economia realmente avançada progrida.
Um dos traços mais relevantes dos nossos tempos tem sido a ascensão da China ao estatuto de grande potência política, militar e económica. Muitos analistas prevêem até que a China superará os EUA e se tornará a superpotência líder mundial num futuro não muito distante. Este artigo defende que, embora o crescimento recente da China tenha de facto sido impressionante, está longe de ser certo que a China continue a crescer ao mesmo ritmo no futuro. As razões para essa avaliação são demográficas, económicas, e principalmente políticas.
Comecemos pela demografia. A China é o país mais populoso do mundo, com 1,42 milhar de milhão de pessoas em 2019. No entanto, o crescimento da população chinesa está a desacelerar rapidamente. Em 2028 a população começará a declinar, em consequência de uma taxa de fertilidade extremamente baixa, parcialmente explicada pela política radical de uma criança por família, implementada de 1979 a 2016. A transição de alta fertilidade para baixa fertilidade gerou o chamado dividendo demográfico, um intervalo de tempo com poucas crianças, poucos idosos e uma proporção anormalmente grande de população em idade activa. Entre 1978 e 2010, a proporção da população em idade ativa na China aumentou de 58% para uns notáveis 74%. Mas esse dividendo demográfico já desapareceu. A ONU estima que a fracção da população economicamente activa cairá para 62% até 2040. Ou seja, a população chinesa está a envelhecer rapidamente. Em 1990, apenas 5,7% da população tinha 65 anos ou mais. Essa fracção dobrou para 10,6% em 2017 e duplicará novamente até 2040, chegando a 22%. Esse envelhecimento acelerado ocorre num país com relativamente poucas pessoas cobertas por planos de reforma e com sistemas de saúde frágeis e muito abaixo das necessidades. Haverá um enorme e dispendioso aumento na procura por serviços e benefícios de protecção social. Exactamente ao mesmo tempo, a população activa declinará, a poupança diminuirá, e a força de trabalho tornar-se-á menos dinâmica!
Outro problema que a China enfrenta é a chamada armadilha do desenvolvimento dos rendimentos médios. No passado, muitos países conseguiram crescer de situações de pobreza extrema para níveis de rendimentos médios. No entanto, poucos conseguiram continuar a crescer e juntar-se aos países mais ricos. O Brasil é um exemplo típico dos países que não conseguiram fazer a transição.
O crescimento da China nos últimos anos é nada menos que surpreendente. De 1990 até 2017, a China experimentou uma taxa média anual de crescimento real do PIB per capita de 8,9%. Os valores correspondentes para os EUA, Japão e Portugal são de 1,4%, 0,9% e 1,2%, respectivamente. Em 1990, o PIB per capita da China era de 8% do de Portugal. Essa proporção aumentou para 55% em 2017. Actualmente, a China é um país de rendimento médio, precariamente colocado na fronteira onde a maioria dos países não conseguiu transitar para níveis de desenvolvimento pleno. Conseguirá a China ultrapassar esse limiar? Até agora, grande parte do crescimento da economia chinesa seguiu um padrão já visto noutros países, incluindo uma migração maciça de trabalhadores das áreas rurais de baixa produtividade para áreas urbanas e industriais. As altas taxas de poupança e de investimento estrangeiro proporcionaram o capital necessário. A China tornou-se uma fábrica para o mundo. Em parte, o mesmo ocorreu com a industrialização da União Soviética. No entanto, a China teve a grande vantagem de se integrar no comércio mundial. Tirando partido da sua dimensão enorme, a China conseguiu atrair investimentos estrangeiros e forçar, por meios razoáveis e outros menos razoáveis, grandes transferências de tecnologia e de know-how. Actualmente existem empresas muito grandes e lucrativas na China, como a Alibaba e a Tencent. No entanto, elas prosperam num mercado protegido e, mais do que isso, essas empresas não estão a inovar, estando apenas a alcançar a fronteira tecnológica. Algumas empresas, como a Huawei, parecem ter o que é preciso para ter sucesso no mercado mundial, mas não é claro se elas não são excepções raras. Será que as empresas chinesas poderão dar o próximo passo e começar a inovar e a funcionar na fronteira tecnológica?
Os optimistas acerca da China apontam para o facto de a produção científica do país, em áreas como tecnologias de informação, inteligência artificial, etc., parecer ser muito grande. Por coincidência, esses são os tipos de tecnologias que um estado totalitário considera úteis para monitorar os seus cidadãos e controlar dissidentes e minorias. Interpretá-los como sinais de sucesso económico futuro é ainda prematuroA produção científica internacionalmente relevante da China ocorre em áreas muito estreitas. Por exemplo, a contribuição da China ainda é irrelevante nas ciências sociais. Para além disso, parece estar a seguir o modelo soviético de ciência. Esse modelo foi bem sucedido para fins militares ou no início da exploração do espaço (uma área na moda na época, tanto quanto a inteligência artificial hoje) mas não funcionou bem no que diz respeito ao desenvolvimento económico e social da União Soviética.
Apesar dos sucessos económicos recentes, outros problemas de natureza política se erguem no futuro. A China tentou uma experiência nunca antes levada a cabo com sucesso num país grande: ter capitalismo de mercado e, ao mesmo tempo, tê-lo governado por um Estado totalitário de partido único. Isso contradiz a experiência histórica ocidental. A elite chinesa (a sua “aristocracia”) concebeu um modelo em que um grupo de pessoas muito inteligentes e muito bem treinadas administraria um país, com boas intenções e nenhuma das confusões da democracia (tal como ocasionalmente eleger demagogos e escolher políticas que dificultam o crescimento).
Essa aristocracia seria suficientemente esclarecida e ampla para que as políticas escolhidas fossem sempre para o bem de todo o país e não para o benefício de grupos de amigos à custa da sociedade. Durante algum tempo esse modelo pareceu funcionar: os presidentes da China iam e vinham, respeitando os seus limites de mandato, e os processos políticos pareciam transcorrer suavemente. Isso não durou muito tempo. Como Aristóteles disse há 24 séculos, há uma tendência natural para a aristocracia degenerar em oligarquia. O actual presidente Xi Jinping eliminou os limites do seu mandato e passou a utilizar de forma discricionária acusações de corrupção contra potenciais inimigos e possíveis rivais. Outras más políticas estão em marcha, tais como sustentar firmas estatais ineficientes, desperdiçando o capital de investimento de um sistema bancário administrado por via política.
Em última análise, se a China conseguirá fazer a transição para se tornar um dos países mais ricos do mundo depende de uma questão muito simples: será que a liberdade é necessária para o pleno desenvolvimento económico? A resposta remonta a Schumpeter e ao seu conceito de destruição criativa. Para que uma economia realmente avançada funcione, novas empresas e tecnologias que tornem obsoletas as actuais devem poder prosperar, colocando em risco as anteriormente bem sucedidas e, às vezes, colocando-as mesmo nas “lixeiras” da história. É muito improvável que isso aconteça num país governado por uma clique cujo poder tem poucas limitações. Será sempre mais fácil e mais barato para essa facção livrar-se dos rivais utilizando o poder do Estado que ela mesma controla. Será mais fácil — mas isso impedirá o pleno desenvolvimento económico. Por agora, esse parece ser o rumo que a China está a tomar.
Professor Associado da Católica Lisbon School of Business & Economics


Bom gosto, bom senso, letargia…



Mais palavras para quê? Tudo é dito e bem, mas como esculturas de areia que o mar desfaz, ou castelos de cartas que um sopro derreia. Num país de inconsciência, de medonha inaptidão, sem mais “restauração” que não seja a dos sabores gustativos, que os écrans reproduzem. Para amortecer.
CRÓNICA: Que fica do que passa? Nada? (E duas notas) /premium
MARIA JOÃO AVILLEZ    OBSERVADOR, 19/6/2019
Que foi preciso ir acontecendo de tão sulfúrico no país para ocorrer uma demissão da inteligência, da sensibilidade, da cidadania, da responsabilidade, desta envergadura?
1. Há poucas semanas a atenção global estacionou por uma tarde nas chamas de Notre Dame, em Paris. Um coro de pena e lamentos embora hoje, seja já com um desinteresse distraído que vagamente se ouve dizer que “houve uma missa” ou que alguém sugeriu “colocar uma piscina” no ex-tecto da Catedral, quando se iniciar a reconstrução. E há dias, a atenção do país – instituições, escritores, políticos, literatos, amigos próximos, longínquos, povo, mirones, media — fixou-se na despedida de Agustina Bessa Luís. Brevemente: quando no dia seguinte, por sugestão desinteressada mas inteligente de alguém, propus a um meio de comunicação social a publicação de um quase desconhecido texto da escritora, a resposta foi “ah mas agora já não vai ‘dar’, estamos com os 30 anos de Tienamen”, e era verdade: estavam todos na China.
2. Se apenas há força convocatória no célere momento conhecido por actualidade — mas logo enxotado para fora do écran e da vida, porque essa é a regra — a quem interessa o que conta? A quem interessará de facto esta incerta paisagem nossa, humana, política, económica, social, fora do reduto dos “paisagistas” dela encarregues? Que fica deste borbulhante entra-e-sai, como no carrossel das feiras para além de mentes desapossadas? Nada? Que se guarda dos que morrem, sempre heróis com glória e sem mácula — nenhuma mácula — no dia em que partem, embora nos dias seguintes, tempos depois, anos depois, ninguém lhes evoque nem nome, nem legado? E que se retém do que seria obrigatório reter e as coisas da vida servirem de facto para alguma coisa em ver de se dissolverem pelos ares e pelos ventos?
3. Como quase toda a gente pelei-me pela vitória de Portugal na Taça das Nações-excelente jogo, óptimo ritmo, o nosso onze muito concertado. Mas como em um daqueles não anunciados furacões, fiquei aturdida com o “depois”: recitações gloriosas, incessantes evocações patrióticas, louvores, bandeiras, hinos e o nome de Portugal declinado em todos os tons, por entre o elogio ditirâmbico e a lágrima — lágrimas verdadeiras. Não é novo nem de hoje, dirão, mas nessa noite, depois de felicitar Fernando Santos, deu-me para prestar boa atenção ao que vi e ouvi aos portugueses. E foi mau e foi pena. Caramba: que foi preciso acontecer – ir acontecendo — de tão sulfúrico no país para ocorrer uma demissão da inteligência, da sensibilidade, da cidadania, da responsablidade, desta envergadura? Que soma de erros, faltas e omissões se conjugou entre dirigentes, educadores, pensadores, governantes, para obter tão devastadoras consequências? Para só trinta por cento dos portugueses ter achado a “Europa” merecedora de uma deslocação às urnas, mas mais do dobro ter confundido a pátria com um golo e um voto com uma chatice? Onde se vê em Portugal – e aplicado a quê? — este mesmo ímpeto, fornecimento de energia, disponibilidade grátis, rendição voluntária e orgulho sem dique a controlá-lo, que observei a saída do estádio naquela noite? Quantos daqueles espectadores — prontos para tudo em nome de golos, livres e cantos — eram capazes de um esforço pela sua comunidade, um voluntariado que integrasse ou acolhesse, colaborações em zonas, bairros, escolas, museus? De uma intervenção cívica séria em nome desse país que tanto os embriaga e solicita nos relvados, mas parece que apenas só nos relvados? Haveria certamente muito pasmo ao simples enunciado de algumas destas digamos, solicitações, e temo que a poucos ocorra pôr a render energias e disponibilidades para além de “servir “o futebol com a mesmíssima energia e a mesmíssima disponibilidade.
4. Deu enfim que pensar aquele espectáculo ao vivo e em directo de pura apologia da menorização. Sim, mesmo se o país assiste (consolado) àquilo todos os dias, espanta-me que poucos se desconsolem com os consolados. Apetece perguntar sem ofender: aquela (tanta) gente, para além “daquilo”, é capaz de quê? E que fica do que se passa: alguma reflexão, algum alerta, alguma ideia?
5. Nota um: ainda João Miguel Tavares? Ainda: muito mais do que o que ele disse – muitas vezes tão capturado por uma aguda fulanização… — interpelou-me a absoluta novidade de ter sido alguém como ele a dizê-lo. Alguém de fora dos autorizados oficiais. Outra geração, outro tom, outros interesses, outros objectivos. Outro “ver”. E depois que se discuta. E uma liberdade já não condicionada por várias “obrigações” (escolho uma: dizer e ensinar que se deve ter vergonha de oito séculos de caminho até Abril de 1974 e ensinar e dizer que a seguir, todos os amanhãs cantaram. E cantam).
6. Nota dois: e agora o resto, que é muito: não se pode ter a ingenuidade de ignorar, disfarçar ou fazer de conta que João Miguel Tavares não fez um arranjão a Marcelo. Fez: disse em voz alta e com audiência nacional o que ele, Marcelo, não quer, não pode ou não ousa dizer (mas obviamente pensa e quer que se diga). E não por acaso, quis “isto” em ano de eleições e a três meses da sua realização. Com a direita moribunda mas um Presidente tão metediço noutros (alheios) poderes, um dia a esquerda acordará com mau sabor na boca.
COMENTÁRIOS
kringa gomes: Belíssimo artigo! Subscrevo cada comentário nele contido. Os portugueses só chegarão, talvez, a saber o país em que vivem quando restar apenas o que é relatado no artigo: futebol, falsas emoções, nada que mereça crédito, total instabilidade, medo e a covardia e servilismo que vai caracterizando  a sociedade que alastra entre nós. Lá para o Natal é bem provável que tudo esteja clarificado. Até o tempo.
Pedro J.: Os bons fogem, desistem disto. O que sobra é uma manada ordeira e uns oportunistas espertos. Alguns dos quais no poder. "É o sistema", como dizia o saudoso gestor que tentou gerir o Sporting até perceber o pântano do futebol nacional, tão semelhante ao da política, que nem se percebe quem aprende com quem.
Maria José Melo: ... não se pode ter a ingenuidade de ignorar, disfarçar ou fazer de conta que João Miguel Tavares não fez um arranjão a Marcelo. Fez: disse em voz alta e com audiência nacional o que ele, Marcelo, não quer, não pode ou não ousa dizer (mas obviamente pensa e quer que se diga). E não por acaso, quis “isto” em ano de eleições e a três meses da sua realização. ‘ Ora aí está! Houve um propósito na escolha de JMT.
francisco oliveira: Há 40 anos vivíamos numa ditadura do PCP, hoje numa ditadura "democrática". O chamado povo continua amorfo, apático, ignorante. A juventude ignora a politica e os chamados políticos. A UE controlada por mãos invisíveis arrastam-nos para futuro incerto desprezando a Historia , culturas, querer apagar a raiz religiosa judaico-cristã. A mediocridade e o polvo estimulam-se mutuamente. Os milhões da Bruxelas, mal geridos servem para alimentar as Offshore e anestesiar o povo. Pelo andar da carruagem, o futuro prevê-se ainda mais brilhante. O forró continua e o povo vai aplaudindo!
Fernando Bernardo: O futuro quer lá saber de enfadonhas notícias. Nenhuma criança ou adolescente quer saber desse género do que se passa assim. E no entanto todos acarretam a nossa história e são o nosso futuro.
Tiago Manso: Obrigado pelo texto. Brilhante a nota 2.
Ana Ferreira: Poucos tiveram a coragem de classificar o contrário daquilo que defendem como sulfúrico, mas enfim, sempre chega o dia em que as máscaras caem, nem que seja por já não se ter travões.
Pérolas a porcos: "Que foi preciso ir acontecendo de tão sulfúrico no país para ocorrer uma demissão da inteligência, da sensibilidade, da cidadania, da responsabilidade, desta envergadura?" O PREC, que continua...!
Madalena Magalhães Colaço: Nos seus escritos sobre o Salon em Paris Emile Zola dava nota que todos, desde a duquesa ao homem do talho faziam fila para visitar as obras expostas. Esse hábito ficou de tal maneira enraizado que não é só a dita "elite" que frequenta galerias e museus, mas todos se interessam. Há uns meses no museu judaico em Paris a  exposição de Freud era acompanhada por várias conferências, que eram à noite durante a semana, e mesmo assim dias antes já era impossível a inscrição, não consegui assistir "A influência do judaísmo na psicanálise", com grande pena. Da biblioteca de França (BnF), a tantos outros museus menos conhecidos, a programação e exposições são estimulantes e o público adere em massa. Na televisão os economistas estão longe de dominar o debate, e convidam-se historiadores, filósofos, geógrafos ... Em Portugal, programas como a de Ana Sousa Dias, na RTP, que entrevistava todos que para ela tinham algum interesse cultural  desapareceram por completo. Só futebol e  política que na semana seguinte esquecemos.

Paulo António: Portugal está a tornar-se um país onde tudo pode acontecer e....os cidadãos não são chamados a nada, nem a esclarecimentos, nem a tomada de decisões. Estão a tornar-nos em "ratinhos da India" como apelidou o governo belga: https://www.leca-palmeira.com/5g-os-ratinhos-da-india-somos-nos/
maria perry: À medida que um país empobrece, a sua população vai ficando cada vez mais atrasada, em todos os aspectos, cultural, poder de compra, valores éticos. Enquanto os outros países crescem e saem do marasmo, Portugal é ao contrário, está a definhar. Não se justifica isto hoje em dia, numa economia global dinâmica, em que os povos vão convergindo para um bem estar melhor, graças também à rejeição das políticas de esquerda. Em Portugal, o PM é uma mente fraca, inebriada pelo poder, dá tudo aos funcionários públicos para que votem nele e não se interessa que o país afunde. O importante é tentar continuar no poder o mais tempo possível.
Pedro Ferreira: Excelente texto, mas o saber dá muito trabalho e não se adquire no écran dos computadores ou dos telemóveis. Os 75% de analfabetismo da pré- república permanecem nos tempos de hoje, com outro nome: iliteracia. A massificação do ensino na escola pública originou esta situação, mas para quem tem os filhos na escola privada tudo vai óptimo. Lembram-se que diziam de Salazar (injustamente) que gostava de um povo inculto, pois o regime democrático alfabetiza para criar imbecis. Como se explica que o povo, em urnas, escolha para líderes cadastrados e vendedores de banha da cobra? Maria João, não digo que seja o caso aqui no "Observador", mas a generalidade das pessoas não consegue entender o seu texto e antes de chegar ao fim já lhes dói a cabeça. Frequento diversos espaços públicos e constato que nem os jornais gratuitos das mesas as pessoas se dão ao trabalho de ler, um povo que não lê e se limita a ver os bonecos e a ouvir os gritos de uma qualquer apresentadora de TV está condenado a ficar estupidificado. O tempo passou, mas o século XIX que o Eça referia ,está cá e em força e por sinal os países mais atrasados da Europa continuam a ser (grosso modo) a Grécia e Portugal.