quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Lavoisier estava errado

Um e-mail que me foi enviado com excertos de Eça fez-me adoptar alguns passos, no mesmo espanto maravilhado que levou o autor dele a transcrevê-los da obra queirosiana, ao verificar a imutabilidade de situações entre a época dele e a nossa época.
De resto, toda a obra de Eça nos leva a idênticas constatações de análise inteligente das idiossincrasias do seu povo, integrado numa época de análise pretensamente realista e naturalista que outros comparsas das letras fizeram dos seus próprios povos ou da realidade humana, Zola, Flaubert, Wilde, com Molière e La Fontaine e outros muitos servindo de pioneiros, o próprio Du Bellay do século XVI, perito na arte de descrever o cortesão da sua época, que revemos no de hoje, também muito nosso, como retrato a que os humanistas naturalmente conferiram dimensão e universalidade.
Não, afinal, a teoria de conservação das massas segundo o químico Lavoisier não é cem por cento exacta. Nada se perde, certo, nada se cria, também. Tudo se transforma?
E aqui vamos nós, imutáveis nos nossos genes, o que deve ter a ver antes com o sol libertador. Desresponsabilizador.


«José Maria de Eça de Queirós »
Povoa de Varzim - 25 de Novembro de 1845 Paris - 16 de Agosto de 1900

"!!! … 139 anos depois … !!! "
"1872 Portugal e a Grécia 2011"

"Nós estamos num estado comparável apenas à Grécia: a mesma pobreza, a mesma indignidade política, a mesma trapalhada económica, a mesmo baixeza de carácter, a mesma decadência de espírito. Nos livros estrangeiros, nas revistas quando se fala num país caótico e que pela sua decadência progressiva, poderá vir a ser riscado do mapa da Europa, citam-se em paralelo, a Grécia e Portugal" (in As Farpas) 1972 "


"Portugal e a crise"

“ … somos um povo sem poderes iniciadores, bons para ser tutelados …"

“Diz-se geralmente que, em Portugal, o público tem ideia de que o Governo deve fazer tudo, pensar em tudo, iniciar tudo: tira-se daqui a conclusão que somos um povo sem poderes iniciadores, bons para ser tutelados, indignos de uma larga liberdade, e inaptos para a independência. A nossa pobreza relativa é atribuída a este hábito político e social de depender para tudo do Governo, e de volver constantemente as mãos e os olhos para ele como para uma Providência sempre presente.”
In “Citações e Pensamentos” de Eça de Queirós».


“Ordinariamente todos os ministros são inteligentes, escrevem bem, discursam com cortesia e pura dicção, vão a faustosas inaugurações e são excelentes convivas. Porém são nulos a resolver crises. Não têm a austeridade, nem a concepção, nem o instinto político, nem a experiência que faz o ESTADISTA. É assim que há muito tempo em Portugal são regidos os regimes políticos. Política de acaso, política de compadrio, política de expediente. País governado ao acaso, governado por vaidades e por interesses, por especulação e por corrupção, por privilégio e influência de camarilha, será possível conservar a sua independência?”
(Eça de Queiroz, 1867 in “Distrito de Évora”)


Assim é. “Política de acaso, política de compadrio, política de expediente.” E tudo o mais que Eça disse e se mantém.
Conservar a sua independência”? Já vimos quanto é falaz essa ilusão. Outros comparsas na governação vão tentando manter o país à tona. Mas o mundo inteiro descrê disso.
E a juventude que boicota as aulas não nos deixa margem para crer numa evolução positiva.
Os ideais democráticos são avessos ao rigor, fixados que foram nas artimanhas da sensibilidade. Mas também da argúcia. Egocêntrica.

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