quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Puxa que puxa



É uma felicidade ler opiniões de gente que sabe coisas, cada uma elucidando a seu modo. Eu só sei que nada sei, e se lamento a saída da Inglaterra da U E, é, não só por egoísmo, porque nos acho mais protegidos com a nobre presença inglesa, como por tristeza - a de ver o grande país insular, pátria de grandes nomes que respeitamos e amamos, desprezar deste modo o continente a que sempre pertenceu, na distância, é certo, das suas brumas, mas acudindo muitas vezes e connosco sofrendo e ajudando q.b.
Eis a opinião de Miguel Esteves Cardoso sobre o Brexit e dos muitos comentadores:
OPINIÃO
Pobre Inglaterra
Um dos problemas do "Brexit" é que o que está em jogo só superficialmente tem a ver com a União Europeia. Embora haja excepções o que há é uma inglesíssima guerra de classes.
MIGUEL ESTEVES CARDOSO
PÚBLICO, 23 de Janeiro de 2019
De todos os políticos britânicos que tenho visto e ouvido falar acerca do "Brexit" o mais inteligente, claro e sensato é Rory Stewart, um bom escritor, viajante e diplomata com 46 anos.
Um dos problemas do "Brexit" é que o que está em jogo só superficialmente tem a ver com a União Europeia. Embora haja excepções, o que há é uma inglesíssima guerra de classes. Os desfavorecidos querem o oposto do que querem os favorecidos e a grande maioria dos favorecidos quer ficar na União Europeia até porque tiram muito mais partido da União Europeia do que os desfavorecidos.
A questão da fronteira da Irlanda do Norte também não tem nada a ver com a União Europeia. A estranheza vem do facto da Irlanda ser uma ilha que contém uma parte que não pertence à Irlanda mas sim ao Reino Unido.
A Inglaterra e a Irlanda, por muito que se proteste o contrário, são inimigas. É impossível ser-se irlandês e não sentir ressentimento pelas violências coloniais inglesas.
Os unionistas da Irlanda do Norte precisam da Inglaterra e do Reino Unido porque ficariam em minoria se a Irlanda fosse toda governada por Dublin. A maioria dos ingleses não gosta dos unionistas e bem que gostaria de entregar a Irlanda do Norte e ver-se livre, duma vez por todas, dos problemas com a Irlanda.
É por isso que dói tanto a Theresa May depender tanto dos DUP na Casa dos Comuns. Os deputados da DUP, duros mas sábios e experientes, sabem tudo isto mas, como bons políticos que são, exploram a situação.
A sério, fica-se com pena dos ingleses e da Inglaterra.

COMENTÁRIOS
Fernando Carvalho,   Alverca 24.01.2019: Sim, pobre Inglaterra, vítima de bullying por parte dos dois grandes e das instituições bruxelenses que querem, em definitivo, retirar qualquer sentido útil ao art. 50.º dos tratados que eles próprios aprovaram... A lição serve-se austera e insensível.
Zanzimbar, 24.01.2019: A cadeia do mundo da informação privilegiada tem os EUA à cabeça, logo a seguir o Reino Unido, depois o Canadá, Austrália e Nova Zelândia e Israel, e só por último a informação é dissecada é passada à França e Alemanha, ou seja os ingleses deverão saber em primeira mão que algo não está efectivamente bem na UE, e por isso abandonam o barco sabendo que vai afundar, porque é no mínimo estranho que não haja ninguém no Reino Unido a bater-se por um segundo referendo e nem mesmo os escoceses que supostamente estariam mais interessados em ficar na UE, e quando as coisas não batem certo algo estará para vir, e nós portugueses que nos cuidemos porque quanto mais para a frente pior maré e pior que isso é que não sabemos o que realmente se passa.
barbosa de almeida  Liverpool 23.01.2019 : O UK está preocupado com a invasão de refugiados para a Europa? Esse é um problema para todos resolverem. Deixar a Europa, não resolve. Além disso, quando venderem armas a zonas de conflito, ou largarem bombas em certos Países, os ingleses deveriam ser os primeiros a receber refugiados, dos Países afectados pela sua intervenção militar. Global, não é só o mercado...
Esta análise, peca por afastamento geográfico do que é a realidade no UK. Os favorecidos (milionários como Mr Banks e o Irlandês dono da cadeia Weatherspoons por ex), querem alterar a ordem existente, para ficarem ainda mais milionários (Saquem no Youtube o filme "Brexit, uncivil war"). Nem que se aumente a produção de carbono, a trazer produtos básicos do outro lado do globo. Os desfavorecidos foram envenenados por uma campanha tóxica (e ilegal) que não teve intenção de esclarecer ninguém. Em 6 semas de campanha, foram enviados 6 milhares de milhões de mensagens por Whatsapp, Facebook e Instagram para milhões de votantes com conteúdos do tipo: 70 milhões de turcos (a sua população total) vão emigrar para o UK; vamos poupar 350 milhões de libras por semana para investir no NHS(infundado)
Luis Ribeiro, 23.01. Como vivem os países, fora da UE???? Usa, Canadá, Austrália, nova Zelândia, Japão, são países que vivem na miséria, ou são atrasados socialmente e tecnologicamente, para não falar da qualidade de vida????? O UK não vive só do turismo, tem petróleo, e outros recursos!!!!
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 23.01.2019 Como nota o Luís, esta gente está tão enterrada na religião do paraíso europeísta que já nem vê a luz do sol. Não admira o pânico de o UK sair e beneficiar disso mesmo. O que restaria aos crentes? O mui europeísta Financial Times diz que o pior dos cenários possíveis custaria ao UK 6% do GDP. Os cenários optimistas sugerem benefícios logo ao fim de 2 anos.
Raquel Azulay,  23.01.2019: "Os desfavorecidos querem o oposto do que querem os favorecidos e a grande maioria dos favorecidos quer ficar na União Europeia até porque tiram muito mais partido da União Europeia do que os desfavorecidos." / Não é verdade, Miguel. As coisas são um tudo mais complicadas. Bem sei que a luta de classes é inglesíssima mas, neste caso, acho que a questão do Brexit transcende esta dicotomia. Posso estar completamente enganada, claro. Seja como for, um excelente artigo.
Fugo, AMADORA 23.01.2019 : Não sei como é que a Inglaterra vai sustentar as suas forças armadas (submarinos nucleares e tudo e tudo e tudo) e de segurança e manter o nível de vida dos seus cidadãos, ou até aumentá-lo conforme sugeriram os pró-brexit.
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 23.01.2019: Como? Como o faz o resto do mundo - como expressão de uma vontade colectiva autodeterminada.
ana cristina, Lisboa et Orbi 23.01.2019 : os "desfavorecidos" que querem ir embora e mentiram durante anos aos ingleses sobre a Europa chamam-se por exemplo boris johnson ou jacob rees-mogg. o supra sumo dos desfavorecidos, tendo a ter a visão contrária: a elite, sobretudo a elite conservadora, olha com snobismo britânico para a Europa e nunca soube jogar em equipa fora da sua ilha, da sua visão do mundo e dos seus rituais de casta superior.
Pobres de espírito (não de espíritos, que são arrogantes)
Américo Silva, 23.01.2019: Se há coisa que não podemos ter, nem devemos sequer pensar, é em ter pena de um povo que deliberada e reiteradamente persegue, ao longos séculos, o objectivo primordial de dividir nações em seu próprio beneficio! Não se iludam, o que eles pretendem é fomentar a discórdia e o caos!
Jose, 23.01.2019: RU significa união dos reinos. Não desunião. Os povos do RU são o irlandês o escocês, o galês e o inglês. O Tratado da União data de 1707. Parece ontem, não é. É a força da história e cultura dos povos.
Americo Silva, 23.01.2019: E a seguir vai dizer que o poder politico é partilhado entre os países que compõem o UK!? Não entendo então porque vai a Escócia sair da UE? Quer que lhe faça um desenho? Se calhar é mais a força da Inglaterra, e a cultura da Inglaterra sobre os demais do império! Não venha para aqui querer meter o "Rossio na rua da betesga"!!!
Jose, 23.01.2019: O que está a concluir é que uniões de povos? Não obrigado!
Essa inglesíssima "Inglesíssima guerra de classes. Os desfavorecidos querem o oposto do que querem os favorecidos e a grande maioria dos favorecidos quer ficar na União Europeia até porque tiram muito mais partido da União Europeia do que os desfavorecidos". Pode estender esse conceito a todas as economias vítimas da UE que é verdade. É uma guerra de classes que se soma à clássica luta de classes. Acresce que a UE e seus tecnocratas sustentam também total desprezo pelos sindicatos e preferem o conflito como o das camisolas amarelas na França ou fazer o que fizeram na Grécia que foi destruir a democracia pluralista. A UE está agora junta contra o RU e pode criar grandes danos. E quando for contra a França quem ficará com a Alemanha?
Alvarinho Bruto,   Lisboa 23.01.2019 : Foi muito interessante assistir à resolução do problema da Irlanda por via da livre circulação da UE. É compreensível que em Inglaterra queiram passar a fazer os seus próprios tratados de comércio. A livre circulação, pelo menos de pessoas, não era assim tão crítica para o RU, que não pertencia ao acordo de Schengen. A Inglaterra não afirmou o seu domínio no comércio dentro da UE, foi derrotada pela Alemanha. Talvez o RU possa ter um papel mais importante, ou mais interessante, no mundo, fora da UE. Daqui a 10-20 anos saberemos dizer...
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 23.01.2019 : Também acho que sim. A começar por levantar a candeia da Liberdade e autodeterminação dos povos europeus bem à vista de um continente raptado (ref ao artigo "O rapto da Europa" de ontem por ex-membros da Comissão Europeia).
Americo Silva, 23.01.2019: Estes dois Srs. fazem lembrar os marretas! concretamente os dois anciãos! Presumo que vocês tenham nacionalidade UK, pois de outra forma é descabida a defesa que fazem daquele outro país! Acresce dizer que o cenário cor de rosa que vocês pintam [liberdade dos povos, prepotência de Bruxelas] para o UK não é verdade! Primeiro, nunca mas nunca, o UK terá mais sucesso fora da UE do que dentro da UE. Segundo, se por acaso viesse a ter esse sucesso que vocês apregoam, então é porque se tinha transformado em algo idêntico a Bruxelas, logo com os mesmos defeitos anti democráticos, que alegadamente os faz querer sair! Será que vocês são assim tão inocentes que não percebem isso? Presumo que defenderão a independência da Catalunha, a anexação da Crimeia, a independência do Tibete, etc, etc!
Alvarinho Bruto,  Lisboa 23.01.2019: Caro Jonas, obrigado pelo seu comentário. Note que eu sou a favor do projecto europeu da UE, que considero essencial para a paz e progresso na Europa e no mundo. A autodeterminação de cada país é importante mas cuidado... É uma bandeira perigosa, assim como perigoso é o poder supranacional não eleito e cativo do interesse das multinacionais. Há muitos perigos nestas mudanças de vinculação política, cada passo tem que ser dado com cuidado e penso que foi isso que foi acontecendo com a União Europeia. Neste caso eu quis dizer que, penso eu, muita gente tem pena que o RU saia da UE, mas entende que o RU queira sair, deseja que tudo corra pelo melhor e que o RU se reconcilie com o seu destino, e que esse destino seja o enriquecimento cultural e económico da Europa e do mundo. Liberdade, Igualdade, Fraternidade.
Jonas Almeida, Stony Brook NY, Marialva Beira Alta 23.01.2019 "nunca mas nunca, o UK terá mais sucesso fora da UE do que dentro da UE" ... xiii que chatice vai ser quando se verificar o contrário ... Nunca mais me esqueci da cena do referendo ao euro na Dinamarca em que os políticos queriam a moeda única e entre vários argumentos de apocalipse económica estava o de que a Lego iria à falência no dia seguinte. Os dinamarqueses não se deixaram intimidar, recusaram o euro, e não consta que se arrependam - o GDP vai bem, a dívida continua em queda (em 2000 Portugal e a Dinamarca tinham a mesma , 50%, ambas em queda). Essas certezas, caro Américo, são aquelas que impingem aos roçados.



Os totalitarismos como travão



É certo que sempre andou à solta, o maligno, até mesmo entre os deuses criados pelos Homens. Não é de hoje, vem nos livros, já Jeová, de quem ontem se falou, como Deus de Israel, tinha esse poder totalitário, outrora, bem castigador que foi, o Deus dos Cristãos, seguidamente, também assim se mostrando, através dos seus mandatários inquisitoriais, e hoje é mais o Alá muçulmano que faz alastrar impunemente os preceitos islâmicos de uma profunda ambição de poder exclusivista, em termos de teologia, em sociedades monoteístas, os homens que os representam usando bem, em nome da religião, os totalitarismos fanáticos irracionais do seu desprezo humano.
Mas trata de totalitarismo político, desta vez, a mando dos homens, portanto, a argumentação de Salles da Fonseca, neste seu sexto capítulo do seu magnífico trabalho de pesquisa histórica, aligeirada de uma vivacidade comentadora, segundo os parâmetros da sua ética, de sensatez preocupada, condenatória dos atropelos humanos, cada vez mais incontornáveis, a descambar no caos.
E a preocupação mais se estabelece, os totalitarismos passados impondo atrocidades, os totalitarismos de hoje mais mesquinhos do que nunca, as democracias de recente fabricação, no fundo aspirando ao totalitarismo de mais fácil execução governamental, os ideais democráticos sendo apenas uma capa protectora, para “inglês ver”, mas esburacada, de hipocrisia bem à solta, reconhecendo quanto a possibilidade de governar passa, sim, pelas aplicações totalitaristas, que o excesso de partidarismo desorganiza, como bem demonstra Salles da Fonseca, referindo-se às governações de hoje, ansiosas de totalitarismo, que as democracias desconcertam. E José Milhazes, do texto seguinte,  o mostra também, exemplificando as monstruosidades praticadas naqueles tempos de ditaduras, sem contemplação nem  laivos de humanidade.
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 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO,  30.01.19
Foi o académico francês Jean François Revel (1924-2006) que em 1976 glosou o tema da tentação totalitária fazendo-nos recordar, entre outros temas, que todo o político gosta muito mais de mandar sem oposição do que ter que aturar uns quantos «empatas» que só fazem é tolher-lhe a vontade e os feitos. A questão da fiscalização da governação pela oposição democrática é matéria que incomoda todos, por mais democratas que se intitulem e mesmo que neguem a pés juntos tal incómodo.
É muito ténue a fronteira entre a democracia musculada e o totalitarismo e todos estamos recordados do impacto que a teorização democrata teve no combate efectivo aos totalitarismos nos países vergados pelo comunismo. Sim, foi grão a grão que o muro de Berlim foi cavando a sua própria queda – com uma «ajudinha» do lado de cá pois íamos crescendo e eles falindo.
Julgávamos que o totalitarismo morrera mas esquecemo-nos de que a tentação totalitária, sub-repticiamente, persiste. E, donde menos se deveria esperar depois da «vacina lestiana», chega-nos pela mão esquerda sob pretextos tão variados como a necessidade de combate a um putativo desmembramento nacional versus a necessária unidade nacional, como a «vontade popular» de combate aos «abusos capitalistas» em defesa dos explorados, como a introdução de reformas radicais numa sociedade conservadora e avessa a mudanças «fundamentais».
Assim surgem os Partidos únicos nos Estados de constituição recente (por exemplo, Angola, Moçambique, etc. que assentaram praça sob o jugo soviético), as políticas autoritárias (por exemplo, a Venezuela e demais países sul-americanos em confronto mais ou menos aberto com os EUA), a propaganda de base doutrinária se não mesmo religiosa (por exemplo, a Turquia que, entretanto, apesar de membro da NATO, anda de namoro com o novo czar de todas as Rússias).
Tudo pretextos para se justificarem as ditaduras quando já julgávamos que a humanidade delas se tinha libertado.
Inocentes, fomos apenas wishful thinkers, uns tontos.
A diferença está em que a democracia, cúmulo de virtudes dos direitos humanos, tem que ser criada todos os dias e sem limite temporal enquanto as ditaduras, todas malignas sejam elas de que banda forem, são criadas da noite para o dia e apanham os inocentes desprevenidos.
Então, se no caso venezuelano a boçalidade do cenário de desespero humano e falência económica aponta para um final mais ou menos previsível e não muito longínquo no tempo, no caso turco – país de fronteira civilizacional – a coisa «pia muito mais fininho».
E é precisamente esta finura – mais do que o facto de eu conhecer a Turquia melhor do que a maior parte dos turcos – que me preocupa e me leva a orar às forças do bem que travem as suas opostas.
A ver…
COMENTÁRIOS:
Manuel Henriques:   30.01.2019  Meu caro Dr. Salles da Fonseca,  Muito obrigado por partilhar as suas reflexões e enormes preocupações com o que vai acontecendo e o que se prevê, mesmo sem ter uma " bola de cristal". Um abraço 
Anónimo  30.01.2019  A insidiosa, leia-se odiosa, ditadura erdogânica de pretenso cariz religioso (já alguém viu o estafermo rezar?) só é possível pq a U.E. paga mtos milhões ao mesmo para reter os refugiados no território, ou seja, a dita organização, paradigma de todas as virtudes é, por conveniência logística, compadre de um regime criminoso!!!

As datas que devem pôr a Humanidade de guarda /premium
OBSERVADOR, 7/1/2019
27 de Janeiro é o dia das vítimas do Holocausto e também o do fim do Bloqueio de Leninegrado, duas matanças que deveriam ter servido de vacina para sempre, mas cujo prazo de validade está a terminar.

Duas datas trágicas para a Humanidade: no dia 27 de Janeiro, é o dia das vítimas  do Holocausto e o fim do Bloqueio de Leninegrado, duas tragédias que provocaram muitos milhões de vítimas. Duas matanças que deveriam ter servido de vacina, mas, se serviram durante algum, o prazo de validade está a terminar. As forças malignas voltam a levantar a cabeça e ameaçam as sociedades democráticas modernas.
Há muitos descontentes com a situação na Europa, e têm razões para isso, a elite política afasta-se cada vez mais das necessidades reais dos cidadãos, a corrupção alastra, etc., mas, não obstante tudo, é preciso ter em conta que não há receitas rápidas para os problemas. Aqueles que prometeram o paraíso terrestre ao virar da esquina, voltam a fazê-lo de forma “light”, prometendo evitar exageros. Mas o resultado será igual: perseguições, campos de concentração, limpezas étnicas, opressão social. A sociedade europeia encerra ainda muito potencial evolutivo, reformista, e, como mostra a prática, as revoluções conduzem a becos sem saída.
É triste ver na Polónia, país que tanto sofreu devido ao nazismo e comunismo, forças ultraconservadoras, chauvinistas, xenófobas no poder. Mais triste ainda é ver que influentes sectores da Igreja Católica embarcam na onda de apoio a essas forças, não obstante o discurso do Papa Francisco ir no sentido contrário. Partidos extremistas estão no poder na Hungria, na Áustria, em Itália. A extrema-direita bate à porta do poder em países tão importantes como a França e a Alemanha.
Por isso, mais do que recordar o Holocausto, é necessário criar condições para que tal desgraça não se repita não só em relação a judeus, mas a qualquer outro povo.
Na Rússia, as autoridades decidiram assinalaram o 75º aniversário do fim do Bloqueio de Leninegrado com mais uma parada militar. Sobre isto apenas quero dizer que talvez fosse melhor canalizar o dinheiro gasto em paradas para o melhoramento da vida dos poucos habitantes da cidade que ainda continuam vivos. Foram 900 dias de fome e privações, de abandono e morte.
Como não podia deixar de acontecer na Rússia do Presidente Putin, esta data não podia passar sem uma “sábia decisão” dos dirigentes do país. Ainda o filme “Festa” estava a ser filmado, ainda ninguém o tinha visto, mas os “mais fiéis servidores do povo” gritavam para que ele não fosse exibido. Uma das acusações é que se tratava de uma “comédia”, o que seria inconcebível ao abordar um tema tão tenebroso como o Bloqueio de Leninegrado.
O realizador acabou por desistir da exibição em salas de cinema e colocou-o no Youtube para que os espectadores tirassem as suas conclusões. Eu e a minha mulher, alguns antepassados da qual morreram de fome durante o Bloqueio de Leninegrado, vimos esse filme com atenção. Claro que de cómico nem rasto, mas a causa do anátema contra o filme foi outra: o seu realizador tocou um tema sensível, quase tabu, a vida farta dos dirigentes comunistas da cidade de Leninegrado, enquanto que o povo tentava sobreviver à custa de meios impensáveis no século XX como o canibalismo.
Existem documentos com as ementas dos refeitórios especiais para os “camaradas dirigentes”, memórias, mas nada deve estragar a “versão heroica” da história.
“Festa” mostra os festejos de uma passagem de Ano Novo na casa de um professor que trabalhava num laboratório secreto, estava ligado ao Partido Comunista e, por isso, ele e a família tinham direito a produtos como pato, mortadela, champanhe, etc. O filho do professor leva uma jovem simples, por quem se apaixona, para a festa…
Fico-me por aqui para que os que queiram ver todo o filme não se sintam influídos pela minha posição.
O resultado da proibição da exibição do filme nos cinemas foi, como sempre, positivo para o realizador e actores: bem mais de um milhão de pessoas pesquisaram e viram o filme no Youtube.
Em Portugal, a extrema-direita continua a ser uma força marginal, embora a extrema-esquerda faça dela um monstro para justificar a sua própria existência. Veja-se a diferença entre as representações parlamentares de uma e de outra. Por isso, o que nos deve preocupar é a existência de forças de extrema-esquerda tão numerosas e de partidos como o PS as utilizarem como muleta. Os dirigentes socialistas também parecem ter-se esquecido das lições do passado, preocupando-se mais com o poder do que com o país. A oposição de centro e centro-direita perde-se em lutas internas, na criação de grupos e partidos. A democracia está cada vez mais pobre.
PS. Por coincidência, estas duas datas coincidiram com a publicação do meu novo livro “Os Blumthal”, mas trata-se de mero acaso. Os personagens do meu livro, reais, bisavós, avós e tios-avós da minha esposa e dos meus filhos e netos, viveram essas duas grandes tragédias, foram vítimas do nazismo e do comunismo. Por isso, quando decidi escrever esse livro, fi-lo para que a História não se repita e para que as gerações presentes e futuras não se deixem levar por novos/velhos cantos de sereia.

COMENTÁRIO:
Amora Bruegas > José Milhazes:
Lamentável a premeditada confusão que se faz entre o nazismo, socialismo alemão, e o fascismo, "socialismo" italiano, apelidando aquele como se fosse este. Acontece que NÃO foram! Tiveram parecenças? Com certeza que sim, tal como com outros regimes, caso das democracias...ou o genocídio de 3 milhões de indianos pelo "democrata" Churchill, o que foi, que mentalidade revela? Ou o aborto e a eutanásia actualmente, o que  revelam?


quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Estilos


Um Requien, sincero, sentido, uma análise chã, traduzindo conhecimento e devoção, chamando a atenção de um país geralmente indiferente e depressa esquecido – o texto  de Bagão Félix, rico em informação sobre a pessoa cuja morte lamenta – CATALINA PESTANA. Texto rico em perspectiva crítica também, sobre esse pobre país de muita gente triste a necessitar de auxílio, e no qual por vezes o heroísmo surge, de uma luta sem tréguas a fornecer despojamento de si, em dedicação altruística, que a indiferença dos com poder facilmente ignora.
Uma crónica rebuscada, vibrátil e profusa, também sincera, mas de um rendilhado feminino um tanto barroco, no entusiasmo admirativo pela dupla CAMANÉ e LAGINHA, a que acrescentou o PORTO e outras figuras políticas aí representadas, que a veia jornalística de Maria João Avillez exigiu como complemento do seu texto, de preciosos “andamentos” iniciais, impecáveis de intuição analista condizente com o apuramento musical do par requintadamente descrito.
I - OPINIÃO: PORTUGAL PERDEU UMA PORTUGUESA EXEMPLAR, UMA GRANDE SENHORA
Catalina Pestana foi uma cidadã e uma cristã que nunca hesitou em pôr os sem-poder à frente de todos os poderes formais e todos os poderes fátuos e ardilosos.
ANTÓNIO BAGÃO FÉLIX,  Economista                 PÚBLICO, 22 de Dezembro de 2018
Catalina Pestana foi uma cidadã com uma inabalável ética com rosto, alma e coração. Rosto, espelhado na defesa dos que não têm voz. Alma, na vontade inquebrantável com que lutou pelos seus ideais radicalmente humanistas. Coração, na dedicação, profissionalismo e entusiasmo com que abraçou as causas por que lutou. Em nome do valor ético da esperança, da verdade, da autenticidade, da sensibilidade e da decência. Sempre com jubiloso discernimento, pugnando por uma justiça com alma e não meramente contábil.
Em 2002, como ministro da Segurança Social e do Trabalho, tive a felicidade de a escolher para liderar o projecto de refundar a Casa Pia. Fiquei-lhe infinitamente grato, como cidadão e português. Sei bem o que representou de sacrifício pessoal e sei também o sentido do dever, a força da coragem, a delicadeza humana, a consistência e o critério de auto-exigência que nortearam a sua acção. A ela bem se pôde aplicar a máxima de que uma pessoa comum é exigente com os outros, mas uma pessoa superior é exigente, em primeiro lugar, consigo própria. De uma fortaleza insuperável, jamais contemporizou com insuficiências ou abusos, indultos comportamentais ou amnistias morais.
Fui testemunha da sua nobre atitude fundada no valor da fraternidade e da partilha contra o conformismo, a indiferença e a desconsideração. Corajosamente, rompendo contra a violência do silêncio e lutando pela humanização contra a tecnocracia estatística que dilui ou banaliza os problemas e transforma as pessoas em números e algoritmos. Sempre se norteou por uma “ecologia humana” fundamentada na centralidade e dignidade de cada um, e em particular, das crianças mais indefesas. Ela me dizia que onde existe um ser indefeso, deveria também existir um conhecer, um ajudar, uma ética da responsabilidade de cuidar. Ela me dizia que haveríamos de combater o comodismo da “posta-restante social” onde se corre o risco de, sem competência emocional, se uniformizar o que exige diferenciação, de massificar o que supõe proximidade e personalização.
Uma cidadã e uma cristã que nunca hesitou em pôr os sem-poder à frente de todos os poderes formais e todos os poderes fátuos e ardilosos. Jamais se deixou enredar em tacticismos e juízos de oportunidade do instante. E não se deixou envolver pela ditadura do presente que anula o passado e transforma o futuro numa quimera.
Sei que muito fica por dizer. Que o seu exemplo perdure e a sua memória viva permaneça em nós! A muita saudade e o meu profundo obrigado à minha querida amiga Catalina.
II -PORTO: COM QUE VOZ (E O PORTO) /PREMIUM
MARIA JOÃO AVILLEZ     OBSERVADOR, 30/1/2019
Que o mesmo é dizer, com aquela convicção de aço que ponho quando a pele e o coração me dizem que estou absolutamente certa, que falo de dois sobredotados. Ambos portugueses.
1 – Primeiro andamento.
Na penumbra do imenso palco, um está sentado ao piano, o outro, pullover azul e microfone na mão, deambula, senta-se, volta a levantar-se. Às vezes sussurram os dois, às vezes Camané interpela os técnicos sobre o modo como nesse momento a luz incide sobre ele, às vezes há uma breve pausa, olham ambos para o papel com o alinhamento, monologam baixinho. E depois Mário Laginha volta a tocar e Camané volta a cantar. É o último ensaio, são os últimos retoques, a derradeira “volta” de aperfeiçoamento e detalhe antes da prova de fogo dessa noite na Casa da Música onde Camané se fará ouvir apenas acompanhado pelo piano de Laginha. Que o mesmo é dizer, com aquela convicção de aço que ponho quando a pele e o coração me dizem que estou absolutamente certa, que estou a falar de dois sobredotados. E da incrível, indefinível, jubilosa, sorte que temos em eles terem ambos nascido em Portugal. De os poder ter aqui mais à nossa mão.
Segundo Andamento. Uma vez, há muitos anos, fui sozinha à Aula Magna ouvir Camané. E naquela brevíssima pausa que por vezes acontecem aos fadistas no “swing” de uma frase, ouviu-se uma voz feminina soltar-se da plateia para o palco “Ai… Camané”. Era aquilo mesmo, que outra coisa dizer, nunca mais me esqueci. E hoje, na tarde ensolarada do Porto onde vim para este espectáculo, assistindo ao ensaio na deserta plateia prateada da Casa da Música, mais uma vez percebo que mais nada senão aquele “ai Camané” pode rematar o fulgor do “Com que voz”. E pode – se é que pode – oferecer-nos, em estado quimicamente puro, o desamparo de “Abandono”, que ouço agora. Momentos de graça, também percebo.
Terceiro Andamento. “Os dois, só os dois?”, espantei-me eu quando Camané me contou há dias que “iria ao Porto só com o Mário”. Fiquei incrédula, estou sempre com o ouvido estacionado no José Manuel Neto – outro génio e também nosso: “Isso é porque você nunca viu nem ouviu a mão do Mário a fazer nas teclas o mesmo que a mão do Zé Manel faz nas cordas da guitarra e a ir por ali fora no piano…” Sorte minha, prestei muita atenção a isto. O fado leva-me sempre, Camané leva-me até ao fim do mundo. Meti-me num comboio e fui.
Quarto Andamento. Nada em princípio dirigiria a mão de Laginha para esta aventura, nem ele era sequer um ouvidor de fado. Não estava “aí”, estava na sua, que não era esta. E depois, de início talvez sem explicação racional ou justificação aparente, as coisas desenrolaram-se, o dom de um e o génio do outro também, e o que era uma temeridade ou poderia vir a ser uma intenção falhada, deixou de ser. E transfigurou-se numa experiência artística seriíssima, conversada, estudada, experimentada, amadurecida. Não foi um “entretém”, nem ainda menos “um vamos os dois brincar aqui um bocadinho”, mas um muito inspirado exercício que um dia destes -quando eles o tiverem aprimorado até ao limite da perfeição — pode desaguar numa uma obra-prima da música. Como um ex-libris. Nosso. (Tenho sempre que insistir nisto do “nosso e nossa”, santos de casa nunca fizeram milagres e mesmo que neste caso, ambos, Camané e Laginha, sejam muito reconhecidos, aplaudidos e distinguidos, parece-me sempre que deveriam ser ainda mais.)
Ultimo andamento. “Ah eu estava muito nervoso…” No bruáá dos bastidores, não tinha razão o fadista, no final de uma actuação memorável, casa cheia e plateia de pé. O que passara do palco para a sala não fora a tensão ou a sombra de uma súbita insegurança mas a voz portentosa de Camané e o torrencial talento de Laginha nessa sintonia que milagrosamente pode por vezes ocorrer entre dois criadores. Mas passara também uma outra coisa que durante todo o espectáculo flutuou silenciosamente sobre a plateia e depois ficou para todo o sempre inscrita nas paredes daquela Casa e na memória da noite: passou a humildade, o imenso respeito de ambos para ambos, a “rendição” recíproca que podíamos testemunhar em cima do palco quando um falava do outro: “ninguém canta como ele”, dizia o pianista sem parar de tocar, apenas levantando ligeiramente a cabeça e interrompendo por uma fracção de segundo a oração que em conjunto rezava com o piano. “E agora ouçam só este fado que o Mário compôs…” e Camané sai de cena e deixa o palco entregue a Laginha e nascia o Fado Barroco… e por favor não esqueçam este título, “Fado Barroco” quando alguém se lembrar de o gravar, obrigação imperiosa. Ao princípio parece-nos Bach, ah, ele foi ao Bach, afinal é um dos seus eleitos, pensei eu, mas logo a seguir já estávamos capturados pelo fado: em vários tons, em vários sons, e eis um quase divino esplendor barroco cruzado de fado e neles se encaixando um bom bocado de nós, do que somos e fomos. Eu sei, um risco isto tudo, conheço um mar – um oceano – de gente que boceja com a palavra fado e desdenha o conceito. Falta-lhes qualquer coisa, uma pena. Ou então, sim talvez eu exagere um pouco, há tempos alguém me mandou um sms que dizia apenas “se eu pudesse dava-lhe o Nobel do Entusiasmo”.
Deve ser isso, penso eu enquanto desço a vertigem de prata das escadas da Casa da Música. Mas que seria de mim sem “isso”?
2 — É muito divertido estar vivo na Rua de Santa Catarina, no Porto. Animada e popularíssima, tudo lá se passa, gente em trânsito ininterrupto, aos pares ou aos cachos, num vai e vem de onde se solta, imparável, o inconfundível sotaque nortenho. E lojas a perder de vista, um imenso centro comercial a céu aberto, onde as marcas vizinham com retrosarias, tabacarias, papelarias, mercearias e confeitarias e haverá mais simpático do que apelidar de confeitaria aquilo que a sul, costumamos chamar sem graça nenhuma, de pastelaria?
À beira dos passeios, por entre passos apressados e esplanadas repletas, há uma banca que só vende bonés, exclusivamente bonés, outra uns arremedos de bijuterias, mais adiante outras exibindo quinquilharia, malas, adereços avulso, numa ousada concorrência ao comércio com mais nome e outra idade. E há “artistas-mimos” que mais do que dar um ar da sua graça mímica, dão um ar da sua extrema necessidade e por isso são tão enternecedores; e músicos que ao entardecer enchem a rua de sons melancólicos ou ruído metalizado e há comensais fora ou dentro das confeitarias que apenas parecem ouvi-los com uma orelha distraída. É no meio desta algazarra que mora uma jóia de renome e prestígio que descubro maravilhada: o Grande Hotel do Porto (guardei a factura para os maledicentes do costume). Passa-se a porta e eis-nos noutra época, entre seda drapreada, veludos carmesins e móveis românticos. Uma cenografia. À entrada consta bronze comemorativo de uma imperial estadia no Grande Hotel de D. Pedro II, último Imperador do Brasil e de sua mulher, Thereza Cristina de Bourbon, Princesa das Duas Sicílias, mas dentro a surpresa continua quando passo um corredor: de um e de outro lado das paredes, impressivos elogios encaixilhados e devidamente autografados de quem escolheu aquela morada ao longo de mais de um século. A escolha é democrática, mas a redacção, ora vagarosa, ora veloz, da realeza, da alta aristocracia europeia, de escritores, músicos, actores, literatos, coincide no encanto e no elogio. Foi o artista plástico Fernando Marques de Oliveira — que recentemente lá redesenhou e redecorou quartos e outros espaços — quem me alertara que “não deixasse de ver toda aquela gente nas paredes”. Lá estavam: Bourbon Parma, Orléans e Bragança, Baviera, Bragança, Rothschild. Mas também o Dalai Lama ou D. Ximenes Bello, e também Svatioslav Richter ou Maria João Pires. E António Ferro, Manuel de Oliveira, Sttau Monteiro (que saudade Luís, que saudade), Mário Claudio e Lobo Antunes. E Popov, La Féria, Diogo Infante. E Camané, claro, e como não?
3 – O Porto é também Rui Moreira que há muito não via. Conversamos ao almoço, ele com um prego no prato, eu com um bife de mostarda, ele recusando as batatas fritas, eu devorando-as. Evoco as próximas eleições, as possíveis alianças, a geringonça. Falo enfim dessa da política que lhe corre no sangue perguntando-lhe se um dia quererá voar mais alto mas chega a surpreender-me de tão taxativo: “não estou interessado em nada politicamente, nem a nível partidário, nem nacional, tenho a certeza absoluta disso!”
Nem em recandidatar-se? Ui, falta “uma eternidade”, é cedo (“daqui a dois anos e três meses, direi”), dois mandatos parece-lhe um “ciclo suficiente”. Em condições “normais” (“ter concluído ou deixar irrevogavelmente encaminhado o que entendeu como fundamental fazer”) voltará ao que gosta: quer escrever, ler (“tenho lido pouco”), ver os amigos, fotografar, viajar e. bem entendido, estar com os filhos, os netos, a mãe, os irmãos. Um vasto programa.
Há porém algo onde é ainda mais taxativo: “desejo absolutamente que a mesma sociedade civil que se juntou e organizou há seis anos para encontrar uma candidatura independente — a minha — seja de novo capaz de se preparar para encontrar uma nova solução, na qual porém entendo não ter qualquer espécie de posição tutelar”.
Para estar totalmente livre e poder vir a liderar o Futebol Clube do Porto? “
Ah… o Presidente do Futebol Clube é eterno, vai lá ficar sempre…
Uma não-resposta que não ilude o rumor que circula. E com razão, como me explicam: seria uma alternativa pacífica e uma candidatura bem vista. O presidente da Câmara tem a paixão da sua cidade, é intrinsecamente “dali”, conhecem-no, o povo estima-o sem precisar de recorrer a selfies. E last but not least, é um “portista” ferrenho que se orgulha de uma camisola que nunca despiu: a do Futebol Clube do Porto, justamente.

4 — A qualquer lado onde vou lembro-me que ele poderia lá estar também. Miguel Veiga faz falta. Há ausências que se nos colam à pele. O Miguel faz falta naquele célebre quinto andar da Foz, onde tanta vida ocorreu e decorreu e tantos mundos se fizeram e desfizeram, faz falta por entre as suas mais de 400 telas, faz falta na varanda debruçada sobre as brumas do Douro quando o rio casa com o oceano e cheira sempre a maresia.

Mas ainda não é o fim!



Desta vez é uma lição de religiões ocidentais do tipo extremista, que Salles da Fonseca nos apresenta, como manigâncias do diabo à solta, a causar-nos engulhos, ordens do próprio Corão, no radicalismo dos seus seguidores actuais, que retomam hábitos passados de invasão e conquista.
Para que a lição seja mais completa, socorro-me também da Internet, em jeitos de complemento esclarecedor, na expressividade ameaçadora dos seus conceitos:

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
 A BEM DA NAÇÃO, 29.01.19

Alá não é o Deus dos muçulmanos mas é, sim, como se diz Deus em árabe.
Quer os teólogos muçulmanos queiram quer não, Alá é precisamente o mesmo que Jeová é para os judeus e Deus é para os cristãos.
As diferenças resultam da exegese que cada um faz dos respectivos textos sagrados. Mas há quem não faça exegese nenhuma e cumpra o seu texto sagrado à letra - os muçulmanos sunitas relativamente ao Corão.
Vai daí, estamos todos «à pega» quando o cumprimento literal do texto sagrado sunita assenta em ordens tais como:
Quando os meses sagrados houverem transcorrido, matai os idólatras onde quer que os acheis; capturai-os, acossai-os e espreitai-os - (Corão, 9ª Surata, versículo 5)
Mas, apesar de não fazerem a exegese, não se coíbem de dar motes. Eis algumas frases «simpáticas» de um dos teólogos muçulmanos mais radicais, o Sheick Hassan al-Banna (1906-1949), fundador da hoje tão actuante «Fraternidade Muçulmana»:
É da natureza do Islão dominar, não ser dominado, impor a sua lei a todas as Nações e fazer alastrar o seu poder ao planeta inteiro.
O punhal, o veneno e o revólver… Estas são as armas do Islão contra os seus inimigos.
Sim, no sec. XXI continua a haver quem mate em nome do Deus infinitamente bom e tenha o desplante de apregoar que o Islão é uma religião de paz. Claramente, na vertente sunita, não
E são precisamente os sunitas que estão a invadir a Europa, para além dos que já cá estavam. A diferença está em que o proselitismo sunita – na sua versão mais radical, a wahhabita – vem sendo financiada pela Arábia Saudita, a mesma que se diz tão «amiguinha» dos EUA.
Mas dado que o clero sunita não tem uma estrutura hierárquica que discipline a mensagem transmitida, cada mulah é livre de pregar o que lhe apetecer sem ter que prestar contas a ninguém.
 Vai daí, o descontrole é total e parece instalar-se uma competição de encarniçamento contra os infiéis e de destabilização da sociedade de acolhimento, cristã ou oriunda do cristianismo. Mais: uma sociedade de acolhimento fundada em valores benignos, não mais belicosa como nos tempos da intransigência medieval, aberta ao acolhimento de quem a procura.
O resultado é a destruição de um tecido pacífico por um clima de rancores cada vez mais cruzados.
Sim, anda o maligno à solta e bem necessário sería que alguém tomasse providências antes que seja tarde, antes que a mostarda chegue ao nariz dos pacíficos, antes que o caldo se entorne e alguém invoque São Bartolomeu.   (continua)
Comentário: Anónimo  29.01.2019 : Antes que seja tarde demais??? Já é! “Alea jacta est!”

Notas via Internet:
1ª: Suna: Segundo a definição do Dicionário Aulete, o verbete Suna significa “livro dos muçulmanos, que contém os ditos e os feitos de Mafoma [Maomé]”. Na cultura árabe, a palavra tem o significado literal de “caminho trilhado”, ou seja, as veredas que foram seguidas pelo profeta, das quais surgiram as suas tradições.
Além disso, Suna apresenta um significado terminológico que indica todas as aprovações, dizeres e realizações de Maomé em mais de 20 anos como mensageiro divino. Assim, tudo que envolve a sua vida forma a Suna, que deve ser praticada e seguida pelos muçulmanos segundo as tradições. Um exemplo de moralidade para o povo em questão é a "hadith", os registos que foram validados no caminho do profeta.
A importância da Suna é enorme para os muçulmanos, pois, notavelmente, somente perde em importância para o Alcorão. É considerada uma fonte secundária, mas não menos importante. Nesta religião, a palavra de Allah [Deus] está no sagrado Alcorão e a Suna seria a forma encontrada por Maomé para disseminar, ensinar e aplicar o Islão.
2ª:Alcorão (Al-qurʾān, em árabe, Recitação) é o livro sagrado a todo o adepto da religião islâmica. Segundo o tradição, é o registo das palavras exactas reveladas por Deus (Allah) por intermédio do anjo Gabriel a Maomé (Mohammad), que o memorizou e ditou aos seus companheiros. O seu texto é seguido nos dias de hoje por um quarto da população mundial, cerca de 1,3 bilhão de pessoas.
O livro sagrado dos muçulmanos é a própria revelação, a manifestação de Deus (Alá, em árabe), um papel comparável ao de Jesus no Cristianismo. Embora o texto possa soar repetitivo e cansativo em português, em árabe as palavras ganham musicalidade.
O livro está dividido em 114 capítulos, chamados de suras, que são ordenados de uma maneira bem diferente da organização encontrada na Bíblia. Eles não contêm uma narração linear, como na história da criação no Gênesis, por exemplo. As suras são organizadas por temas. Nenhuma palavra de suas 114 suras foi mudada ao longo dos séculos. Assim, o Alcorão permanece, em cada detalhe, o mesmo livro de quatorze séculos atrás.
Em apenas 200 anos, a palavra de Alá contida no Alcorão inspirou o povo árabe, até então majoritariamente nómada, desunido e em vários aspectos atrasado a conquistar toda a península arábica, o norte da África e a Ásia Central. Em seguida, foram anexados Espanha, Portugal e grande parte da Índia. O ímpeto expansionista árabe chegou até mesmo à China, onde permanece como religião predominante na região de Xinjiang (noroeste do país).
Desde a sua revelação, o livro serviu de inspiração político-religiosa para inúmeros líderes, que da sua palavra faziam uso, adoptando princípios do Alcorão em meio às práticas políticas. Nas nações de maioria muçulmana, ou “países islâmicos”, como geralmente são chamados, o Direito costuma ser completamente baseado nos preceitos do Alcorão, que serve ao mesmo tempo como livro religioso e código jurídico.
3ª - Significado de Hégira: A fuga de Maomé de Meca, sua cidade natal, para Medina, no ano 622 da era cristã; a era maometana que teve seu início nesse ano. [Figurado] Êxodo; qualquer tipo de fuga, de saída de um lugar para outro.[Figurado] Viagem demorada, normalmente com o objectivo de se livrar de uma situação perigosa. [Figurado] Fuga; saída às pressas. Etimologia (origem da palavra hégira). Do árabe hidjira; talvez al-hifrah. Sinônimos de Hégira: êxodoemigraçãofuga

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Também não defendo a sua escolha



João Miguel Tavares que me desculpe, pois sinto simpatia por ele, pela visão honesta dos casos que põe na mesa, num discurso desempoeirado e directo, sem artifícios de estilo, mas correcto na informação, embora por vezes periclitante na intenção, (quando se cola aos amigos ou inimigos da esquerda, em natural constatação, talvez, de que por vezes estes também acertam, porque erro e acerto são ambos pertença dos humanos). Não, não o condeno a ele, jovem que é, e ambicioso que deve ser, sentindo-se honrado com a proposta do Sr. Presidente. Qualquer um se sentiria, mesmo os que tão virulentamente o condenam. Acho mais condenável a leviandade do PR, de minimizar o Dia de Camões - efeméride contendo um sentido patriótico, como representativa da Nação - entregando a pasta da sua representatividade a um jovem mais conhecido pela subjectividade dos seus discursos de cunho agressivo, pese embora a honradez de um pensamento ético. Mas o Dia 10 de Junho tem a marca de Camões, pesada e solene demais para uma juventude airosa, conquanto digna. Estamos habituados, nesse dia, aos discursos que sejam lição glorificadora, e por isso estranhamos a sua escolha, como ele próprio, de resto, estranhou.
Pior do que a sua falta de humildade em aceitar esse encargo, contudo, por muito que se esforce por brilhar nele – e acredito na sua capacidade – é, sim, a bofetada nas convenções, de Marcelo Rebelo de Sousa, que, desrespeitando valores e capacidades mais adequadas a um acto tão solene, desrespeita o seu país e os seus concidadãos, numa atitude frívola e provocatória a merecer condenação. Infelizmente, não inesperada, num homem de discursos inócuos e de exibicionismo fácil, em manifestações afectivas pouco convincentes.
Não admira, de resto, o gesto soez. Portugal há muito que perdeu o apodo que lhe imprimiu Camões, o seu cantor, há muito que a “ditosa Pátria que tal filho teve» deixou de ter significado que preste.
Mas espero que João Miguel Tavares se esmere, a provar o contrário.

A crónica de Liliana Borges:

João Miguel Tavares no Dia de Portugal gera críticas: "Há uma diluição da importância das personalidades"
Escolha de João Miguel Tavares para presidir a comissão organizadora das comemorações do Dia de Portugal provocou uma chuva de críticas. Entre antigos governantes e deputados, vários políticos condenaram a escolha do Presidente da República.
PÚBLICO, 26 DE JANEIRO DE 2019
Mais ou menos tímidas, as críticas ao convite feito por Marcelo Rebelo de Sousa ao jornalista e colunista João Miguel Tavares multiplicaram-se assim que se soube da escolha do Presidente da República. A selecção de João Miguel Tavares para presidir à comissão organizadora das comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas surpreendeu várias personalidades — incluindo o próprio, como admite em entrevista ao PÚBLICO.
Com um perfil distante do historial de escolhas para a função,  João Miguel Tavarespresença assídua na esfera mediáticasuscitou vários tipos de reacções negativas. As críticas chegam especialmente da esquerda, quer através de bancadas parlamentares quer por parte de antigos membros do Governo, como é o caso do historiador Rui Vieira Nery e da pianista Gabriela Canavilhas, que tiveram responsabilidades na pasta de Cultura-
A estrutura das críticas repete-se: os comentários começam por listar alguns dos nomes de anteriores presidentes da comissão do 10 de Junho — pessoas com mais idade, com intervenções menos polémicos e que tinham currículo político ou académico — para logo se lamentar a escolha do jornalista, de forma mais ou menos directa.
Ao ler a notícia, fiquei furioso com o PÚBLICO, porque achei indecente que tivessem mudado de dia da semana para a publicação do Inimigo Público”, ironiza o diplomata Francisco Seixas da Costa sobre a escolha do colunista que integra também o espaço de comentário semanal do programa Governo Sombra, na TVI. “Ainda hoje não perdi a esperança que fosse só isso”, afirmou ao PÚBLICO o antigo embaixador português.
Também a antiga ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, recorreu à ironia. “Vivemos tempos em que o autor da coluna que conhecemos é catapultado para o mesmo nível de António Barreto, Sobrinho Simões, Sampaio da Nóvoa, Elvira Fortunato, Silva Peneda”, resume. “Depois de 2019, qualquer um pode ser presidente das comemorações. Basta aparecer na TV. Talvez em 2020 seja a Cristina Ferreira”, atira.
Em conversa com o PÚBLICO, a antiga deputada socialista explica as críticas ao que considera uma nomeação baseada no mediatismo do colunista. Com a escolha de João Miguel Tavares “há uma diluição da importância das personalidades nos actos públicos”, condena a antiga ministra da Cultura, contactada pelo PÚBLICO. Gabriela Canavilhas, que no último ano foi nomeada curadora da FLAD — Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento pelo primeiro-ministro António Costa, considera que a nomeação reflecte a “desconsideração de valores que noutros tempos se valorizavam”.
A importância do trajecto intelectual, da preponderância, do trajecto individual, da intervenção académica e do trabalho científico são desvalorizados em função de mediatismo.
Para Canavilhas, a estratégia de Marcelo Rebelo de Sousa reflecte “sobretudo uma abordagem popular”, que não se reduz à mais recente escolha do Presidente da República. “Este é apenas um exemplo”, lamenta Gabriela Canavilhas, que diz assistir a essa metamorfose “com preocupação”.
A crítica mais extensa é a de Rui Vieira Nery, secretário de Estado da Cultura durante o primeiro Governo de António Guterres. “O que me perturba nesta escolha não é, obviamente, o princípio genérico do rejuvenescimento do perfil do orador”, começa por justificar num longo texto partilhado no seu Facebook.
O musicólogo queixa-se “de uma desvalorização do estudo aprofundado e da reflexão fundamentada sobre as questões cruciais da nossa vida colectiva contemporânea” e do “amadurecimento através de uma obra longa e consistente, muitas vezes longe da ribalta e sem resultados visíveis imediatos”. Rui Vieira Nery critica ainda a “tendência perigosíssima dos nossos tempos de relegar a criação artística e literária de ponta ou a investigação científica especializada, em todos os campos, para uma remota prateleira académica, negando-lhe a relevância fundamental”, dando exemplo de várias alternativas que teriam sido, na sua perspectiva, escolhas mais adequadas.
Do lado dos bloquistas e dos comunistas também houve farpas.  Na sua página de Facebook, José Manuel Pureza, deputado do Bloco de Esquerda, partilhou a notícia nestes termos: “Não faço nenhum comentário. Não é preciso”, sintetizou, escusando-se a acrescentar declarações. Já o antigo dirigente do PCP, Vítor Dias, recorreu ao seu blogue para propor um negócio ao Presidente da República “Ditosa Pátria, valeroso Presidente, troco um quilo de afectos por 100 gramas de respeito”.

COMENTÁRIOS:
Luís Furtado:   28.01.2019 É só tomar o peso da recente opinião incendiária de JMT "Os bairros da Jamaica deveriam visitar mais vezes as Avenidas Finas" para ter a noção de que este senhor é, pelo menos, francamente polémico. Até porque JMT arriscava-se a cair no ridículo, pela hipótese de vir a público, numa dessas manifestações, o paradoxo de alguns bairros camarários: É que algumas dessas pessoas, aliás auto excluídas, iriam às tais 'visitas' nos seus BMW e até Porsche. Nos bairros não há só ligações directas de água e luz por tudo quanto é prédio. Tampouco passes sociais 'pró bochecho'... 
Joao Vieira de Sousa,   Cruz Quebrada Dafundo 26.01.2019: Quem não é fanático da esquerda, será sempre criticado, pelos "pensadores" dessa área, que se diz muito democrata, os de direita são todos fascistas, mas não toleram quem põe em causa certas atitudes da esquerda. Fazem-me lembrar um vigarista que conheci e que queria o filho como advogado, para o proteger e ajudar nas trafulhices, dizia ele: "o meu filho se for para advogado, pode escolher o que quiser" É o que se passa em Portugal, desde que seja para falar bem da esquerda, podemos dizer o que quisermos. No tempo da outra senhora, se não falasses contra a política Nacional, também podias falar à vontade. 
 Pedro P26.01.2019: Não entendo a surpresa nesta nomeação. É mais uma decisão do brincalhão do prof. Marcelo no país das idiotices, que ele tão bem gere. confesso que prefiro a Alice no país das maravilhas.