quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Um corolário e a continuação da tese



Corolário dos textos postos anteriormente aqui, no blog, já neste dia, o Editorial de Manuel Carvalho, que, provavelmente, se regozija do jogo de cintura do seu Primeiro Ministro. E a continuação do jogo, no recomeço da tese, desta vez apontado por Santana Castilho sobre o problema-mor deste país, de que dependem todos os outros – a Educação, ou antes, a falta dela. Magnífico texto este, de SC, que a maioria dos comentadores reconhece, com as excepções dos adeptos habituais do parasitismo social.
I - EDITORIAL: A força do Governo está na fraqueza da esquerda
Como se fosse um rei feudal, Costa está disposto a fazer dos deputados à esquerda uma espécie de escudeiros. Com privilégios, mas obrigados a proteger o senhor.
MANUEL CARVALHO
PÚBLICO, 31 de Outubro de 2019
Passavam poucos minutos das 16h00 desta quarta-feira quando, na Assembleia da República, o deputado Pedro Filipe Soares recuperou a fórmula de cálculo concebida pelo primeiro-ministro para analisar as hipóteses de derrube do Governo e afirmou: “Onde havia promessa de negociação no ar hoje parece haver um caminho de desafio e ameaça.” Nessa simples declaração ficou condensado o novo relacionamento entre o PS e a esquerda parlamentar e, em especial, o Bloco.
Se no passado a “geringonça” se alicerçou na dissimulação de uma relação entre partidos que na sua essência têm mais para se confrontar do que para colaborar, o futuro quadro político vai ser mais claro. O PS viverá sempre condicionado, mas quer o Bloco e o PCP estarão condenados a ponderar todos os dias os riscos políticos de deixarem cair um governo de esquerda.
Pedro Filipe Soares tem, por isso, razão no que disse. Quando António Costa declara que “a direita toda junta, desde o PSD ao Chega, só poderá derrotar o PS se conseguir somar os votos do PAN e de toda a esquerda” está a tornar clara a razão pela qual desta vez decidiu prescindir da negociação de posições conjuntas com o Bloco e o PCP. Está a sugerir que há uma coacção política a pairar sobre os partidos da esquerda que protege o seu Governo.
Para o primeiro-ministro, e para a maioria dos cidadãos, só uma anormalidade permitiria a soma dos votos de um destes partidos com o PSD. A imunidade do Governo a moções de censura, na teoria de António Costa, justifica-se pela fragilidade estratégica dos seus outrora parceiros.
Sobra ainda outra questão para a sustentabilidade do Governo: a obtenção de maiorias para aprovar leis. E aqui Costa regressa às suas conhecidas manobras de envolvimento. “Quem votou no BE votou mesmo para dar continuidade à solução governativa da anterior legislatura”, observou António Costa. O PS quer manter o anterior caminho, quer estar aberto à negociação, pronto para o diálogo e até para eventuais cedências, sugeriu. Como se fosse um rei feudal, Costa está disposto a fazer dos deputados à esquerda uma espécie de escudeiros. Com privilégios, mas obrigados a proteger o senhor.
Fica assim fechado o grande plano de António Costa. Um plano que revela uma inteligência táctica notável, um cinismo prático exemplar e um jogo de cintura impressionante. Se alguém tinha dúvidas de que o novo Governo tem condições para durar quatro anos, esta terça-feira teve novos argumentos para as desfazer.

II - OPINIÃO: Directo a si, dr. António Costa!
Na Educação, o Governo falhou e o Governo tem um primeiro responsável. Por isso o acuso a si, dr. António Costa.
SANTANA CASTILHO     -      PÚBLICO, 30 de Outubro de 2019
Na Educação, o ambiente é de profundo mal-estar e o programa do novo Governo não conseguiu atribuir-lhe qualquer réstia de esperança. Outrossim, acentua a onda de “planos”, “projectos” e “estratégias”, para picar os miolos aos professores. Antes de Maria de Lurdes Rodrigues, todos sabiam exactamente o que fazer. Os chefes eram menos e as escolas funcionavam. Depois cresceram os chefes. E consigo, dr. António Costa, cresceu a desorientação e o deslumbramento com as pedagogias sem sentido. E cresceram as siglas “eruditas” para denominar inúteis organismos, projectos, plataformas e planos. Veja estas, dr. António Costa (e não são todas), criadas pelas suas luminárias da modernidade: ACES, ACCRO, AERBP, AIRO, CAA, CAF, CD, CEB, CP, CPCJ, CRI, CT, DAC, DEE, DT, EE, EECE, EFA, ELT, EMAI, EO, ESAD, JNE, ME, PAA, PASEO, PE, PEI, PES, PHDA, PIT, PL2RTP, SPO, UFC e ULS. Não lhe chegavam? Enxergue-se, dr. António Costa!
O dr. António Costa deu campo aberto ao narcisismo político dos seus prosélitos. Mas nunca promoveu um trabalho sério para apurar o que pensa a esmagadora maioria dos professores de sala de aula sobre um conjunto de temas-chave, que permitiriam reformar com solidez o sistema de ensino. Por isso, não me espanta que tenha perdido totalmente o pudor, proibindo as reprovações no Ensino Básico. Não me espanta, dr. António Costa, que a decisão política em Educação continue assente no desconhecimento da realidade e no oportunismo político das madraças da flexibilidade e da inclusão, criadas para pastorear incautos e transformar velharias falhadas em tendências pedagógicas novas.
O grande tema da comunicação social foi, recentemente, o professor que bateu no aluno e os alunos que batem todos os dias nos professores. O contraste evidente entre a presteza com que o Ministério da Educação suspendeu o professor agressor e a espiral de silêncio em que envolve as constantes agressões a professores e funcionários não pode passar de fininho. Sem rodriguinhos e medindo o que digo, é para si, dr. António Costa, que falo, que o ministro Tiago é tão-só seu mordomo. O dr. António Costa é um dos grandes responsáveis pela sucessão de políticas que têm reduzido os professores a simples funcionários, cada vez mais desautorizados e despromovidos socialmente. Um dos grandes responsáveis por, farisaicamente e de modo cruel e perverso, pôr a sociedade e a opinião pública contra os professores: para lhes retirar o direito à greve; para lhes retirar força salarial; para lhes roubar o tempo de trabalho cumprido. É duro o que lhe digo? Repito-lho na cara se quiser, sem seguranças de permeio, para ver se se domina, como o desgraçado professor da D. Leonor não se dominou.
O seráfico paternalismo com que os ideólogos a quem deu rédeas querem que os professores ensinem quem não quer aprender ou integrem quem não quer ser integrado tem de ser denunciado. Com efeito, é fácil medalhar os líricos que decidiram a “inclusão” universal. Mas é impossível, sem meios nem recursos (materiais e humanos), lidar, dia-a-dia, na sala de aula, com jovens com perturbações mentais sérias, descompensados por imposições pedagógicas criminosas.
O problema, dr. António Costa, é a natureza das políticas, que fizeram entrar o ensino em decadência. O problema é que o dr. António Costa afaga banqueiros e juízes sem perceber que morre lentamente uma sociedade que não acarinha os seus professores.
Quando as obrigações do Estado não são cumpridas, é ao Governo em funções que devemos pedir responsabilidades. Porque o Governo, qualquer que seja a força partidária que o sustente, é o rosto do Estado. Porque, independentemente da responsabilidade subjectiva (que no caso vertente é sua), a responsabilidade objectiva do Governo é proteger os professores das agressões de que são vítimas. O Governo falhou e o Governo tem um primeiro responsável. Por isso o acuso a si, dr. António Costa.
Victor Jara (que também foi professor) foi abandonado numa favela de Santiago do Chile, depois de torturado e assassinado, por cantar O direito de viver em paz. A sua sorte, dr. António Costa, é que os professores não são capazes de se unir, ao menos uma vez, para reclamar o direito de ensinar em paz. Antes que acabem, definitivamente, abandonados num país sem défice.
COMENTÁRIOS
AndradeQB: 30.10.2019: Uma voz que faz acreditar que Portugal não está condenado.
subbmarine, 30.10.2019: Este homem é um dos pilares da nossa sanidade mental. Que continue a bradar verdades por muitos anos, porque não há mais quem o faça.
mzeabranches, 30.10.2019: Obrigada, Professor! Sabe tão bem esta veemência com que denuncia o contínuo desastre do nosso sistema de ensino e a dificuldade crescente de ser professor! Alguém capaz de falar com paixão, num país tão fadado para a apatia e a inércia! Permito-me sugerir: a todos os desastres do nosso ensino é indispensável acrescentar a imposição ditatorial e imbecil do AO90, linguisticamente indefensável, como tantos especialistas já demonstraram! O respeito pelo país que somos, cuja língua constitui uma dimensão essencial, e o respeito pelos jovens que estamos a formar, não se coaduna com a adopção deste vil atentado contra o português europeu, a língua de Portugal, que herdámos e temos o dever de transmitir aos vindouros em boas condições.
Luis Morgado, 30.10.2019: Muito bem apontada a falta de pudor do Dr António Costa quanto à Educação. O programa do novo Governo combate o insucesso escolar com um "plano de não retenção" até ao 9º ano de escolaridade. Como é que isto pode ser bom para os alunos, para a educação e para o país? Qual é o incentivo que se quer dar aos melhores para serem ainda melhores? Definitivamente não se quer preparar os jovens para uma sociedade cada vez mais competitiva. Isto só pode beneficiar os alunos das escolas privadas e aqueles que tenham a sorte de ter frequentado escolas estrangeiras. Imagino também o clima de frustração que os professores irão sentir numa sala de aula em que os alunos sabem que não precisam de trabalhar para não ficar "retidos".
viana, 30.10.2019: Então agora os "melhores" precisam de saber que os seus colegas podem chumbar (porque se são os "melhores", não são eles que estarão em risco de chumbar) para se sentirem motivados a trabalhar mais?!... Espero que quem escreveu este comentário não seja professor! Mas que raio de valores é que quer que sejam transmitidos aos estudantes? Egoísmo e tirar prazer com o sofrimento dos outros? Sinto-me em cima quanto mais os outros estiverem na mer*a?!... E quanto à retenções, não sabe que em alguns dos países com melhores índices educacionais, como a Finlândia, não há retenções? Queremos uma sociedade em que as pessoas são "treinadas" para responder apenas ao medo?! E que tal tentar motivar os estudantes? Dá trabalho, é?!...
Luis Morgado, 30.10.2019: Os melhores para serem melhores precisam de saber que o seu trabalho é valorizado através de um sistema de avaliação sério que não nivele por baixo. Os que não são melhores têm que ter objectivos porque se sabem que passam automaticamente, qual é o incentivo que lhes dá para progredir? Sem metas, o que acontece é que se nivela a qualidade pelos mais fracos e na nossa escola o nível médio é muito baixo. Por outro lado vai agravar o problema dos alunos que passam de ano sem bases sólidas para compreender as matérias seguintes. Quanto aos países nórdicos, espero que saiba que esse sistema teve sucesso (agora começa a ser questionado) devido ao elevado nível de vida e à igualdade social e económica da população, ou seja, condições que não temos. As suas observações chegam a ser ofensivas.
viana, 30.10.2019: O que é que a ausência de retenções tem a ver com o nível de dificuldade do ensino? As retenções não deixam de existir porque a avaliação é tão benévola que todos "passam". As retenções deixam de existir, pura e simplesmente. Em que é que isto afecta o grau de exigência pedido aos estudantes?! Não passa a ser "proibido" testes difíceis! Quanto aos que seriam "retidos", caso não tenha percebido, estes terão obrigatoriamente de ter acompanhamento (como já acontece com aqueles em risco de "chumbar"). Qual é a vantagem para alguém de chumbar? Acha que no ano seguinte vai estar mais motivado?! Aparentemente está satisfeito com um sistema que obriga muitos a estudar por medo, entre os quais os que falham são condenados. Sacrificam-se uns para outros "aprenderem". "Bela" filosofia de ensino!
Luis Morgado, 30.10.2019: Repito: entre muitos outros problemas, a retenção vai agravar o problema dos alunos que passam para outros anos sem terem assimilado as bases que permitem compreender as matérias mais complexas com que se vão confrontar (este é um problema, mesmo no sistema actual). Estes alunos são prejudicados porque dificilmente vão acompanhar os anos seguintes. Os restantes alunos, em vez de progredir normalmente acabam por se ver travados pela necessidade de rever matérias dirigidas aos outros que passaram sem as devidas bases. Acha que um aluno brilhante ou trabalhador deve ser prejudicado por um aluno fraco ou preguiçoso? A filosofia que eu defendo é a do trabalho, da exigência e do mérito. Acredito que os mais fracos têm que ser ajudados, mas não acredito em falsas igualdades e em facilitismos.
Ferrel, 30.10.2019 3: Viva o sapatilha. Qual era o lugar que querias?
CF, 30.10.2019: Professor Santana, não adianta usar argumentos inteligentes com gente do PSV (Pinho Sócrates Vara).
Maria Carlos Oliveira, 30.10.2019: O problema da educação não é de hoje. Maria de Lurdes Rodrigues é uma referência neste processo, ainda que não a única. Lembremos alguns aspectos: a) Apresentou um modelo de avaliação de professores, importado do Chile (mal sucedido), impraticável; b) Proletarizou a função docente, confundindo o número de horas com trabalho. Ignorou a importância do ócio criativo no desempenho das funções docentes. José Gil, na altura, decretou em Serralves o fim da profissão; c) Impulsionou, com grande apoio do representante da A. de Pais, a escola a tempo inteiro (resultados?); d) Não resolveu, como os sucessores, o problema da entrada na profissão (os exames deveriam ter sido ponderados por todos); e) Desautorizou os professores, que lhe responderam com uma multidão. E agora Senhor Primeiro Ministro?
Sandra, 30.10.2019: "oportunismo político das madraças da flexibilidade e da inclusão, criadas para pastorear incautos e transformar velharias falhadas em tendências pedagógicas novas." pois... justiça seria feita se reconhecesse que, quem não deu para este peditório, foi o senhor professor Nuno Crato.
J Ferraz, 30.10.2019: Só generalidades. Não especifica o que deve ser feito.
Bernardo Ribeiro, 30.10.2019: precisamente o oposto ao que denuncia! Não percebeu?
Jose, 30.10.2019 10:19: A generalidade dos portugueses e dos senhores professores estão preocupados como Santana Castilho. O seu eloquente esforço por evidenciar a angústia de ver o ensino público a entrar no cano de esgoto, os alunos obrigados a permanecer retidos na escola/armazém da infância e juventude é uma dor de alma. Costa está muito à frente. Ele sabe que o que interessa são estatísticas que brilhem aos olhos dos tecnocratas do dono em Bruxelas. Ele sabe que não há meritocracia nem elevador social. Ele sabe que a elevação geral do nível de vida da população e designadamente a sua formação são a maior ameaça à UE da TINA a que ele obedece com o empobrecimento, precariedade, abandono, exclusão e punição. Os eleitores, que ainda votam, acreditam, como Santana Castilho, na melhoria da educação. Costa não!
CS.788492, 30.10.2019: Apreciei comentário e a coragem, porque já vimos que os afrontamentos podem ser perigosos. Parabéns
Jf, 30.10.2019: O primeiro ministro governa como se estivesse a navegar sem vela nem motor, ou seja, ao sabor dos ventos e marés... Parabéns pelo artigo.
SC RIBEIRO, 30.10.2019: O que andava a dizer este colunista nos tempos da PaF????? Foi de excelência o ensino nessa altura? Com milhares de estudantes a terem de fugir para o estrangeiro para estudarem???? Não me lembro de ler-lhe nada sobre essa tragédia...
Manuel Castilho, 30.10.2019: Ao leitor SC Ribeiro: Seria preocupante não se lembrar, tantos foram os artigos que publiquei sobre a matéria e a sua natureza de crítica assertiva. Estimo pois que não seja um potológico caso de perda de memória. Posto isto, a resposta é sobejamente fácil: pesquise aqui, no Público, e ficará esclarecido. Os meus cumprimentos!


Um dia em cheio para o meu marido



Que não arredou pé do debate, no Parlamento, até mesmo à hora do almoço. Eu só ouvi à hora dos noticiários, mas não deixei de escutar os Batanetes, fazendo zapping simultâneo, também em busca de outras distracções, um filme a propósito, Questions sempre, José Hermano Saraiva religiosamente… A Crónica de Nuno Carvalho comenta – negativamente – o programa económico do Governo, a de João Porfírio descreve e comenta o que se passou no Parlamento, Rui Rio em destaque, alguns dos factos descritos colho nos noticiários. Um dia em cheio, com sabor a “déjà vu”, a não deixar ilusões, que os comentadores do segundo texto comprovam, por vezes sem grandes maneiras, A “Encomendinha” está entregue, não sabemos se bem.

OPINIÃO  O monstro dentro do programa do Governo
Neste programa, as principais medidas económicas terão um efeito (se vierem a ser aplicadas) de longo prazo. As medidas para os problemas que a economia tem a curto prazo são quase inexistentes.
NUNO CARVALHO    -    PÚBLICO, 30 de Outubro de 2019
A expressão “monstro” foi aplicada à despesa pública portuguesa pelo professor Cavaco Silva, como forma de simbolizar a dimensão da despesa pública e o impulso de a realizar com lógicas mais eleitorais que racionais.
O grande problema deste monstro é o seu apetite e a sua dieta. O apetite é voraz e a dieta é rica em impostos.
Este programa de governo define um modelo de governação baseado em alterações cirúrgicas na política fiscal, percebendo-se que o nível da carga fiscal é para manter. Nesse aspecto, não há alterações face aos últimos quatro anos. A alteração na governação proposta pelo PS desta nova legislatura parece residir na ideia de um Estado que vai funcionar melhor com preocupações no ambiente, demografia, transportes públicos, turismo e a ambição de tornarmos a sociedade mais digital, criativa e inovadora. Objectivos meritórios, mas que continuam a merecer a dúvida de como se vão pagar. Não basta enunciar metas: é preciso dizer como pretendemos alcançá-las.
O problema neste programa é o pouco que lemos sobre economia e o papel do sector privado. Existem medidas muito concretas para várias áreas de actuação governativa, mas muito poucas para a economia e especificamente para as empresas.
O programa do Governo está desenhado como se a economia do país mantivesse a capacidade de alimentar a actual carga fiscal durante toda a legislatura. E não há medidas, no mesmo programa, que estimulem a economia para conseguir manter esses esforços. Simultaneamente, há sinais externos que indiciam uma desaceleração económica e eventual recessão mundial.
Quando a economia não permite às finanças do país angariar a receita fiscal suficiente, o monstro da despesa releva-se omnívoro. E dos impostos passa a alimentar-se também de cortes de salários, redução do investimento público, cortes nos serviços do Estado, etc. Como se fosse possível cortar ainda mais em serviços públicos que estão no limite e em investimento que está em mínimos históricos.
Certo é que a economia portuguesa não tem a mesma robustez que outras grandes economias mundiais e por essa razão está sempre mais exposta ao cenário internacional. Mas isso também não pode ser sinónimo de não fazer nada. Temos de adoptar políticas para nos tornarmos mais resistentes às oscilações da economia internacional. E só conseguiremos isso com um apoio concreto e verdadeiro aos agentes da economia. Neste programa, as principais medidas económicas terão um efeito (se vierem a ser aplicadas) de longo prazo. As medidas para os problemas que a economia tem a curto prazo são quase inexistentes.
Inclusive no turismo, que é um dos sectores no qual o Governo poderia ter medidas com um efeito mais imediato. Para esta legislatura, o programa menciona medidas que disparam em várias direcções. Estranhamente, nenhuma delas aponta para o reforço da promoção de Portugal junto dos países onde perdemos ou poderemos vir a perder turistas. O único programa de promoção de Portugal previsto é o que pretende promover o nosso país como um destino LGBTI. Sendo esta uma medida cujo alcance económico é difícil de perceber.
Não existe um objectivo para estruturar o financiamento das empresas de forma a torná-las menos dependentes da banca, que serve para financiar a tesouraria mas continua a não ser a melhor opção para financiar investimentos. Tal como não existem medidas que acelerem a justiça. Entre o dinheiro que não chega para fazer investimentos e dinheiro que está parado nos processos que se arrastam em tribunais, a economia do país perde a capacidade de acelerar. E este é o momento para acelerar enquanto a conjuntura económica é favorável.
Enquanto o Governo fixa exigências de curto prazo à economia, como o salário mínimo e a receita fiscal, peca pela ausência de medidas que podiam ter um efeito mais imediato e que em nada iriam colidir com medidas de médio e longo prazo que constituem a esmagadora maioria das propostas económicas que constam do programa do Governo.
Deputado do PSD
II -Round I. Rio com o dedo no gatilho (ora no lugar, ora nos corredores, ora no Twitter)
30 oct 2019, 21:15 8      JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR
Apesar de já ter sido deputado há 18 anos, a presença de Rui Rio na Assembleia da República foi encarada como uma espécie de estreia. Assim que o líder do PSD cruzou os corredores de tapete vermelho, lá encontrou as câmaras de televisão e os microfones apontados para si. E não se faz de rogado. Eram 10h da manhã quando, à entrada para o hemiciclo para dar início ao debate do programa de Governo, Rui Rio prestava as primeiras declarações do dia aos jornalistas. Pouco depois, dava-se o primeiro frente a frente com António Costa, onde disparou em todas as direcções porque lhe disseram que tinha 10 minutos para o fazer (e 10 minutos dá para muito) e, pouco depois, voltava a sair para fazer novas declarações aos jornalistas nos corredores. Ah, e também não se esqueceu do Twitter, onde escreveu o que tinha dito à porta do hemiciclo.
Primeiro, os preliminares. À chegada ao grupo parlamentar do PSD, junto à entrada para o hemiciclo, Rui Rio antecipava logo que o longo debate desta quarta-feira seria “um debate assim-assim”, na medida em que houve pouco tempo entre a entrega do programa do Governo e a discussão parlamentar, tendo sido dado apenas dois dias aos deputados para lerem o programa e o analisarem. “Tive tempo de ler o programa, mas em dois dias não se lê com tanto pormenor como numa semana, como sempre foi no passado e bem, o reparo que fiz faz todo o sentido”, disse, insistindo que “há uma diferença muito grande entre fazer o debate bem e fazer o debate assim-assim”.
Cinco ataques em dez minutos: tamanho do Governo, Centeno, Galamba, PPP, Hospital de São João
Mas o debate não seria “assim-assim”, pelo menos no momento em que Rui Rio e António Costa se confrontaram pela primeira vez naquele palco parlamentar. Depois de Costa fazer uma intervenção inicial de apresentação do programa, Rui Rio foi o primeiro a pedir esclarecimentos. “Disseram-me que tinha 10 minutos”, notou a dada altura, quando Ferro Rodrigues pediu que se apressasse a terminar a intervenção. E 10 minutos dão para atacar muita gente. “Vai ser preciso um roteiro para a gestão do Governo tantas são as secretarias de Estado”, Primeiro, o próprio Governo, que é o “maior e mais caro Governo da história de Portugal”. disse, sugerindo que, havendo 70 governantes na actual composição, muitos deles não vão saber onde começa e acaba a sua área de actuação.
Depois, Mário Centeno.“O Ronaldo foi despromovido da hierarquia do Governo”, notou Rio, questionando Costa sobre se o primeiro-ministro estava “em condições de garantir que Mário Centeno está de pedra e cal no governo ou se é um ministro a prazo”. Pergunta feita, segue jogo. Novo ataque, que o tempo está a contar: agora, Joao Galamba. O líder do PSD passou para a polémica em torno da exploração de lítio e do papel que João Galamba, entretanto promovido a secretário de Estado adjunto da Energia, teve no processo. “Ao ser promovido está em condições de dizer ao país que no plano legal, político e ético João Galamba agiu sem qualquer mácula?”, perguntou Rio a Costa, voltando até a insistir na insinuação, já feita, de que o Governo poderá ter interferido no adiamento do programa “Sexta às 9”, da RTP, para a história da exploração de lítio não ser divulgada em plena campanha eleitoral. O ataque mereceu uma resposta lateral da própria RTP, que  – depois de há uns dias já ter feito um outro comunicado a responder a acusações do próprio secretário de Estado –  disse que “não guarda notícias na gaveta” e que a reportagem em questão “não estava concluída durante a campanha eleitoral”.
Acusação feita, novo tema. Agora, a Saúde. Rui Rio começou este capítulo por acusar o Governo de ter um “tabu ideológico” ao rejeitar, por princípio, qualquer eventual Parceria-Público-Privada que seja benéfica ao Estado, em termos financeiros e em termos de eficácia de prestação de serviços. Terminou acusando Costa de ter aproveitado a campanha eleitoral para lançar a primeira pedra das obras da ala pediátrica do Hospital de São João, no Porto, mas as obras estarem agora paradas. Eram quatro os temas que Rui Rio tinha levado na manga e desferiu todos os ataques: dentro do tempo e no tom certo. Pelo menos a bancada do PSD pareceu gostar, e até André Ventura, na ponta direita do hemiciclo, acenou em concordância.
Um elogio inesperado de um adversário interno
Até dos famosos opositores internos, Rui Rio recebeu um inesperado elogio. Miguel Pinto Luz, candidato à liderança do partido, utilizou as redes sociais para elogiar a postura de Rui Rio na sua estreia parlamentar. “A posição do PSD, face ao resultado do passado dia 6 de Outubro, é de principal força política da oposição”, começa por explicar no seu Facebook.
“É fundamental colocar em evidência as enormes fragilidades deste Governo. E são muitas. É este o rumo que deve ser trilhado. Sem concessões a António Costa, que nunca deve alimentar a ilusão de encontrar no nosso partido uma muleta de emergência, à direita, quando lhe faltarem as muletas de esquerda em que se apoiou nos últimos quatro anos”, escreveu. Por isso, Pinto Luz considerou que a intervenção do líder do PSD foi bem conseguida: “Critico quando e onde o tenho de fazer. Hoje, devo dizer que apreciei a prestação do PSD no combate e oposição ao Governo Socialista”.
O contra-ataque de Costa: comentador televisivo e julgamentos de tabacaria (tudo o que Rio abomina)
Mas se as perguntas tinham sido duras, o primeiro-ministro respondeu ao líder do PSD de forma crispada. Para isso foi buscar um argumento que era expectável que fosse utilizado contra o social-democrata assim que começasse a exercer a sua actividade parlamentar. Lembrou a frase de Rui Rio durante a campanha, quando afirmou que não tinha particular entusiasmo por exercer a função de deputado para atacar o rival. Dizendo que já tinha percebido por que razão é que Rio tinha proferido tal afirmação: porque “é apenas um estágio para ser comentador televisivo
Ana Catarina Mendes também não deixaria a já celebre frase de Rui Rio no esquecimento minutos mais tarde, quando usou da palavra e aproveitou para enviar mais farpas ao social-democrata. A nova líder parlamentar do PS encontra ainda um outro motivo para que o presidente do PSD tenha dito que não tinha especial apreço pela função que agora exerce: “optou pela demagogia e pelo populismo ao invés de dignificar o debate sobre o programa de Governo, e espera-se mais de um deputado como Rui Rio, que é líder do maior partido de oposição”. O PS e o Governo estavam sintonizados neste all in no ataque ao PSD e em particular ao seu líder.
Um ataque duro e directo que estabeleceu o tom que iria nortear as restantes respostas ao líder do PSD. Sobre a composição do executivo, Costa afirmou que cada um se devia preocupar com o que lhe competia: “Eu preocupo-me com a composição do governo, o senhor que se preocupe com a redução do tamanho do seu grupo parlamentar”.
Uma defesa que se fazia ao ataque e que permitia não responder a todas as perguntas que Rui Rio tinha colocado ao primeiro-ministro. Sobre a questão do lítio, Costa voltou a usar o mesmo tom ríspido, dizendo a Rio para que, nesta sua passagem pela AR, não transforme o Parlamento num palco para “julgamentos de tabacaria”, numa alusão a um termo muitas vezes usado pelo líder do PSD.
Outro dos temas com que Rui Rio quis confrontar Costa tinha, claro está, a ver com o Porto, mais concretamente com a construção da ala pediátrica do Hospital de São João. Perante a acusação do social-democrata, que acusou o líder do Executivo de lançar “a primeira pedra a escassos dias das eleições”, algo que, no entender de Rui Rio, “já era de lamentar”. “Mas agora sabemos que a obra nem começou, era apenas uma ilusão. Quando vai efectivamente lá lançar a segunda pedra'”, questionou de forma directa.
Na resposta, Costa disse que não foi “lançar nenhuma primeira pedra” e atirou ao anterior governo PSD/CDS: “O meu antecessor tinha tido o privilégio de colocar a primeira pedra da ala pediatria do Hospital de São João, teve mesmo a gentileza de pôr duas primeiras pedras”. A resposta chegava com acidez e a bancada do PS ia aplaudindo as palavras de Costa, que continuou dizendo que quando lá foi em campanha foi para “ouvir as garantias do engenheiro da obra”, virando de seguida o tabuleiro, convidando Rui Rio a acompanhá-lo na inauguração da obra “no final do primeiro semestre de 2021”.
Já sobre as PPP, tema também levantado por Rui Rio, António Costa adoptou um estilo mais professoral, lembrando que a lei de bases da Saúde aprovada na recta final da última legislatura não impede que venham a existir PPP na gestão hospitais públicos, mas esclareceu que essa não é a intenção deste Governo.
E mesmo antes de responder directamente a Rui Rio, já se tinha visto um António Costa pronto a espicaçar o PSD, quando, na intervenção inicial de apresentação do programa de Governo, o primeiro-ministro descartou as reformas estruturais tão faladas por Rui Rio: “Não é de rupturas ou de ‘míticas reformas estruturais’ que o país necessita, mas de um esforço continuado de melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos, em qualquer parte do território nacional”, afirmou. Uma investida sobre o líder dos sociais-democratas e um piscar de olho à esquerda. Em vésperas de Orçamento do Estado, pode ser sintomático.
O debate segue dentro de momentos… (nos corredores e no Twitter)
Sem tempo para responder à pergunta de António Costa, Rio fê-lo nos corredores, aproveitando a enchente de jornalistas que tinha à sua espera no intervalo do plenário para almoço. Antes, no Twitter, já tinha aproveitado para reforçar a ideia de que Mário Centeno pode ser um ministro a prazo. Perguntei ao Sr. Primeiro Ministro se podia garantir que Mário Centeno não vai sair do Governo já em 2020. Não obtive resposta. Parece que podemos tirar a conclusão óbvia: o Ministro das Finanças está a prazo.
À saída do hemiciclo, na pausa para almoço, Rio lamentou que António Costa “não tenha dado nenhuma justificação para ter o Governo mais caro e maior da história de Portugal” e que não tenha respondido sobre a continuidade, ou não, de Mário Centeno no Governo: “Podemos tirar a ilação de que o ministro está a prazo“. Disse ali, disse no Twitter, para que ficasse registado.
Mas não se ficou por aí. Insatisfeito com a resposta de Costa sobre a polémica da exploração de lítio, Rio insistiu que o PSD vai “puxar pelo tema” quando as comissões parlamentares forem formadas e garantiu que pelo menos João Galamba, o secretário de Estado da Energia, vai ser chamado ao Parlamento para dar explicações sobre o contrato de concessão do minério que foi alvo de uma investigação do programa Sexta às 9, da RTP. E sobre os julgamentos de tabacaria? “Se fosse considerado um julgamento de tabacaria, os deputados não podiam abrir a boca nem podiam falar sobre nada porque estariam eventualmente a incriminar um inocente e assim os deputados não podiam falar nunca”, disse.
Nos corredores houve ainda tempo para Rio falar de um tema que não falou lá dentro, no seu lugar: o salário mínimo nacional que o PS quer aumentar para os 750 em 2023. “Um bocado arrojado”, considerou Rio, que fez contas para o salário mínimo se fixar no máximo nos 700 euros no final da legislatura, se se confirmarem as previsões de inflação e produtividade.
Rui Rio participou na primeira fase do debate, que durou, no seu todo, mais de nove horas. Mas depois da pausa para almoço, optou por se ausentar do plenário, dando uma entrevista à SIC ao mesmo tempo que o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, fazia uma intervenção dentro do hemiciclo. Rui Rio regressa na quinta-feira, para o debate de encerramento do programa de Governo.
COMENTÁRIOS:
André Ondine: O Habilidoso rege-se por valores duvidosos, dada a sua evidente limitação ética. Vai ser complicado Rio conseguir o registo rasteiro que lhe permitirá estar ao mesmo (baixo) nível do que o Chef Costa. Os socialistas actuais parecem gostar do registo trauliteiro do líder do gangue, mas existe um país que agradece que Rio mantenha uma postura de estadista e desmascare a ilusão Habilidosa com elevação e rigor.
Joaquim Moreira: Ao contrário do que disseram muitos dos seus detractores, Rui Rio teve sempre como objectivo ganhar as eleições para ser PM de Portugal. Objectivo que não conseguiu, face às circunstâncias políticas e à acção da CS. Mas, apesar de todas as contrariedades, é o único líder político capaz de chegar ao poder, sem medo de dizer verdades. O que se passou hoje, só atesta as suas grandes qualidades. Agora, como líder da oposição, vai demonstrar que a "aproximação" ao PS não é aquilo que quiseram dizer que, “era o que parece". E que, apesar da difícil situação, que é a de liderar a oposição, vai fazê-lo, com seriedade, coragem e transparência, sem, do futuro, perder a visão. Até porque sabe, que é o político que Portugal precisa para governar o Estado desta quase milenar Nação. Pessoalmente, acredito que vai conseguir convencer a maioria dos portugueses que, até agora, têm votado na Abstenção.
Paulo Guerra: Ao nível da canalhada com quem vai disputar a liderança do PPD. Para quem só concorria para PM nada mau.
José Mendes> Paulo Guerra:  Muito bem!
José Mendes: Costa tem os votos. Justa ou injustamente os eleitores, que ainda votam, premiaram a governação de Costa. Essa vitória eleitoral trouxe o velho Costa e PS arrogante de volta.
Joao Mar:  As respostas do costa são de um ordinário, taberneiro, reles e grosseiro. Não tem argumentos recorre ao insulto e provocação de baixo nível. Um personagem nojento e abjecto.
Miguel Fernandes >Joao Mar: Sem duvida. E nunca responde a nada. Uma autentica besta.
Pedro Miguel Guerreiro> J oao Mar: Terá o fim que merece. Um pedante com todos os tiques de líder autocrático.


quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Um texto de alerta climático e sem demagogia



É de Claudia Carvalho Silva, apoiado em estudos de um investigador alemão, que aquela define. Parece sério, feito não para assustar mas para prevenir e a sua leitura torna-se um prazer, pelas hipóteses de adaptação possíveis aos vários riscos climáticos, conquanto exigentes, certamente, de gastos incomportáveis para as zonas mais pobres e atrasadas. O apelo é para todos nós, é claro, que todos vivemos em risco, como os corais, mas com possibilidade de alguma reparação.
Alerta global: os oceanos estão em risco e mais de mil milhões de pessoas podem ser afectadas. Da subida do nível da água do mar que afectará as populações costeiras à perda de biodiversidade marinha, os oceanos estão a sofrer com as alterações climáticas, alerta o relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) divulgado esta quarta-feira. É preciso tomar medidas hoje para evitar cenários irreversíveis.
PÚBLICO, 25 de Setembro de 2019
A subida das águas do mar e o aumento de fenómenos meteorológicos extremos (como tempestades e inundações) deixam as populações costeiras particularmente vulneráveis a estes efeitos das alterações climáticas. “A subida das águas já será um desafio mesmo que tenhamos um cenário de emissões de dióxido de carbono reduzido, mas será drasticamente diferente se tivermos um cenário de emissões elevadas”, explica ao PÚBLICO o investigador alemão especialista em gestão de risco e zonas costeiras, Matthias Garschagen, que é também um dos autores do relatório sobre oceanos do Painel Intergovernamental das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (IPCC) apresentado no final de Setembro, no Mónaco. “O relatório deixa isso muito claro: alguns dos impactos serão tão grandes que a adaptação se torna difícil.”
Como os riscos para quem vive em zonas costeiras estão altamente dependentes do cenário de emissões de gases com efeito de estufaque escolhamos enquanto comunidade global”, o cenário ideal para evitar efeitos nefastos seria uma redução gigante destas emissões. De resto, a solução pode passar por prevenir, adaptar, criar estruturas artificiais que permitam construções já por cima do mar— como uma espécie de palafitas ou como se fez com as ilhas artificiais no Dubai (Palm Jumeirah) e se planeia continuar a fazer no Mónaco — ou ainda “pela retirada das zonas costeiras, planeando-se a realojamento das populações costeiras noutras zonas mais seguras, algo que não está a ser considerado por muita gente”.
 Para Portugal, o principal risco directo é a ameaça da subida das águas do mar a que já estamos a assistir”, considera o investigador da Universidade Ludwig-Maximilians, mas trata-se de um risco ligeiro quando comparado com as nações que vivem em ilhas, ameaçadas de forma mais crítica. “Basta olharmos para o caso das pequenas ilhas do Pacífico, onde a ocorrência de fenómenos extremos de subida de águas do mar, tempestades e furacões já tem aumentado de intensidade”. Continuará a haver um agravamento destes fenómenos meteorológicos extremos, garante o cientista, sobretudo nas regiões tropicais.
Nas ilhas, o problema agrava-se: “É bastante claro que não se tem muito terreno disponível para onde as pessoas se possam mudar – sobretudo em nações em desenvolvimento e pequenas ilhas. O problema é bastante diferente de qualquer outra zona costeira e, no fundo, fica-se em risco de perder o próprio território, o que é, sem dúvida, um risco de outro calibre”, assevera. “Pode não só perder-se uma faixa costeira de terreno habitável, mas quase todo o território de uma nação.”
Este poderá ser o caso de “muitas das ilhas no Pacífico, como as Fiji e Vanuatu, ou então as Maldivas e outras ilhas das Caraíbas”, porque “são regiões muito baixas em que a população está quase toda concentrada na costa”. “Se aumentar esta exposição [à subida do nível do mar e de fenómenos meteorológicos extremos], então a alternativa é mudar para outro sítio. Só que nestes casos é uma alternativa incrivelmente limitada.”
No relatório do IPCC sobre os efeitos do aquecimento global nos oceanos e na criosfera, diz-se que “quanto mais alta for a subida da água do mar, mais desafiante é a protecção costeira, sobretudo devido a barreiras financeiras e sociais e não tanto por limitações técnicas”. Ademais, “as pessoas mais expostas e mais vulneráveis são muitas vezes aquelas com menos capacidade de resposta”, alertou-se durante a conferência de imprensa, na altura da divulgação do relatório.
Decisões das próximas décadas são tomadas hoje
Além da vulnerabilidade socioeconómica de algumas populações, há ainda um agravamento de riscos nas zonas costeiras mais baixas, com um número crescente de fenómenos meteorológicos fora do normal. “Muitas megacidades localizadas em zonas baixas e pequenas ilhas deverão assistir, pelo menos uma vez por ano, a fenómenos que aconteciam de século em século.” Não só haverá mais tempestades tropicais como também terão mais intensidade, magnitude e precipitação. Pode parecer distante e incerto, mas os cientistas do IPCC alertam que “muitas das decisões costeiras que só terão efeito daqui a décadas estão a ser tomadas agora”.
A subida do nível do mar foi acelerada pela perda de gelo dos calotes polares da Antárctida e da Gronelândia. Na Antárctida, a perda de gelo foi três vezes maior entre 2007 e 2016 do que tinha sido entre 1997 e 2006; na Gronelândia foi duas vezes maior. Esta aceleração na Antárctida pode “potencialmente levar a um aumento do nível das águas do mar de vários metros em poucos séculos”.
No que toca a refugiados climáticos – pessoas que se vêem obrigadas a abandonar as suas residências devido a fenómenos relacionados com o clima –, Matthias Garschagen diz que os estudos analisados são “controversos” na comunidade científica, e que é por isso “pouco razoável” dar estimativas e números. Ainda que seja certo que as populações costeiras estejam “mais expostas e mais vulneráveis” e, consequentemente, mais passíveis a precisarem de mudar de sítio, há medidas de adaptação locais que podem ser tomadas. “Não se pode então dizer que toda a gente que está exposta à subida do nível das águas do mar será obrigada a abandonar [o sítio onde vivem].”
Além da retirada de populações e do avançar na costa, há outras medidas para minimizar os riscos de quem vive em zonas costeiras. A primeira palavra é “protecção”: ficar no mesmo sítio e construir infra-estruturas de protecção, como barreiras, “o que resulta melhor em zonas de alta densidade populacional ou cidades”. A segunda passa por “tentar lidar com as inundações no local de residência, ao criar habitações à prova de inundações ou sistemas de prevenção” que permitam alertar para a ocorrência de fenómenos meteorológicos extremos – um maior número de inundações costeiras e de intrusões salinas (quando a água doce fica em contacto com a água do mar, cuja salinidade penetra nos aquíferos ou poços), tempestades e ondas de calor, tanto em terra como no mar.Não é necessariamente algo de protecção elevada, é mais tentar viver com as águas em ascensão”, explica Garschagen. A terceira passa por avançar em direcção mar com estruturas artificiaisque é o que algumas cidades estão a tentar fazer”. Pode-se ainda fazer uma adaptação através de ecossistemas que descarbonizam, como os sapais, mangais ou pradarias marinhas.
Os ecossistemas são não só uma possível solução, mas também “vítimas” dos efeitos das alterações climáticas: estão em perigo e, ao contrário dos humanos, são “inteiramente reactivos” e pouco podem fazer para se adaptarem com antecedência aos efeitos das alterações climáticas. “É completamente diferente: no nosso caso, os cientistas avisam-nos com antecedência e podemos começar a planear, mas os organismos destes ecossistemas não têm isso. Daí que já tenhamos começado a assistir à migração de peixes e a recifes de corais que já estão em grande parte dos casos a ultrapassar o seu limite de adaptação e sobrevivência”, lamenta o cientista alemão.
Existem cenários que já são irreversíveis, “basta pensar na perda de recifes de corais de águas quentes, no derretimento de muitos glaciares mais pequenos ou no derretimento de gelo em montanhas mais baixas”. “Portanto, mesmo que reduzíssemos as emissões hoje, esse compromisso já teria chegado tarde e esse atraso teria resultado numa série de perdas drásticas.”
TÓPICOS


Um pequeno texto justificativo



«A caridade trouxe-me à Comunidade. Da Vida e Paz recebi a esperança pois é possível a mudança. E é neste caminho de partilha desinteressada que se fundem as energias que compõem este grande corpo de voluntariado.»

Foi o Ricardo que o escreveu e que a Comunidade Vida e Paz publicou. Eu admiro sem rebuço todos os meus que fazem voluntariado, e já são cinco, e tantos mais, e ainda os que me vão extorquindo dinheiro ou víveres, para colaborar com as Instituições beneméritas. São todos precisos, é certo, mas, no primeiro caso, em que, duas vezes por mês se dispõem a encurtar as suas noites de descanso para ir distribuir víveres ou razões de apelo a um viver mais digno e menos parasita, conquanto lhes exalte o altruísmo (não isento de riscos), não deixo de sentir zanga contra uma sociedade que resguarda o parasitismo dos que romperam com a sua condição humana de responsabilidade e acção, entregues ao seu desprezo pela sociedade a quem viram costas só aparentemente, submersos no mundo inefável da sua redução larvar. O nosso PR prometeu tratar do caso, reduzir o número dos que escolheram a calçada e o céu aberto como guarida ou outras grutas do seu afundamento social.
O certo é que cada vez se precisa mais, ao que parece, destes altruísmos de uma caridade real, (que, é certo, por vezes conseguem livrar alguns dessa condição, através de argumentação construtiva).
Dantes, os “Garrinchas” pediam esmola, de terra em terra, esforçavam-se para sobreviver apelando para a caridade alheia e tomando decisões, tema de muitos poetas, que Guerra Junqueiro rematou com o seu lirismo apiedado (mas que Cesário Verde referiu com natural repúdio de revolta social):
OS POBREZINHOS (in OS SIMPLES)
Pobres de pobres são pobrezinhos
Almas sem lares, aves sem ninhos.
Passam em bandos, em alcateias,
Pelas herdades, pelas aldeias….
Mas hoje os excluídos sociais são menos lutadores, habituados a serem servidos por uma sociedade responsável, certamente, pelo seu afundamento, através da droga que a permissividade dos governos deixou progredir, fonte de receitas criminosas que rodam no mundo.
Partilha desinteressada, escreveu o Ricardo. Sim, isso é real, e admiro por isso todos esses que altruisticamente e obscuramente dispõem de horas da sua vida para benefício de quem não quer ter vida.
Mas esperança de mudança? Aqui???

Era uma vez



Gostei a valer de rever o historial do CDS que São José Almeida nos oferece, o qual, ao que parece, não tem futuro nem mais apetece. Julgo que já não é preciso esse partido agora, bem útil outrora, todavia, ainda que mais não fosse, porque nos trouxe certa acalmia, quando fazia com o PSD parceria, ou mesmo com o PS, o que também aconteceu então, zeloso que foi na restauração da ordem no país de desordem. Mas teve figuras, além do mais, esse partido, de grande relevo, que São José Almeida tão bem rememora e que lembrámos saudosamente, do tempo ido. Mas por ora esse partido anda à nora, sem ideal e muita confusão, nem é mais preciso, pois estamos bem com quem nos seduz diariamente, na companhia do presidente, no esforço pertinaz de ir cumprindo, apalpando terreno, à esquerda, à direita, progredindo sempre, e rindo, e rindo, possantemente.

OPINIÃO: CDS, que futuro?
Com os pés sobre ruínas, o CDS terá de tentar encontrar um caminho, mas, repito, o momento é único e qualquer comparação com o passado não faz sentido.
SÃO JOSÉ ALMEIDA
PÚBLICO, 26 de Outubro de 2019
O CDS vive o momento mais difícil da sua história. Apesar de comparações apressadas e superficiais, o CDS não regressou ao “partido do táxi”. Nada do que se vive agora neste partido fundador da democracia tem paralelo na crise que atravessou durante a década do cavaquismo.
Reduzido a 221.774 votos, que representam 4,22%, o CDS tem o pior resultado de sempre. Caiu de 18 para cinco deputados e está ainda em estado de choque. Com congresso marcado para 25 e 26 de Janeiro, a dimensão do desastre dificulta o aparecimento de candidatos a líder, depois de Assunção Cristas se ter demitido na noite eleitoral.
Era, aliás, a única coisa que podia fazer, depois do falhanço da estratégia política que escolheu, sobretudo desde as autárquicas. O CDS acantonou-se na auto-suficiência de Cristas, que se encheu de si, com os 20,59% de votos para a Câmara de Lisboa. Desde então, não travou a proclamação de autonomia do CDS, desdenhado entendimentos com o PS e também com o PSD. Pior. A direcção de Cristas estigmatizou-se ao entrar em acordo com a esquerda parlamentar, em defesa da luta dos professores pela reposição integral das carreiras, que é liderada por Mário Nogueira. Para, nas europeias, radicalizar o discurso, depois de ter tentado protagonizar uma direita moderada e aberta.
Cristas chocou com a tradição do CDS e com a mentalidade machista do eleitorado conservador de direita ao assumir-se como uma mulher afirmativa e até assertiva (ou mesmo agressiva) no discurso, mas que explora o estereótipo da “mãe de família” e usa técnicas de comunicação que passam pela exposição em revistas e programas de entretenimento na TV.
Com os pés sobre ruínas, o CDS terá de tentar encontrar um caminho, mas, repito, o momento é único e qualquer comparação com o passado não faz sentido. A começar pela sociedade portuguesa, que está a anos-luz do que era há três décadas. O próprio país político é outro. O CDS terá de fazer o caminho das pedras num Parlamento onde está acossado. De um lado, tem o discurso reaccionário da extrema-direita representada pelo Chega. Do outro lado, é apertado pelo liberalismo da Iniciativa Liberal.
Já a posição do PSD — e a relação possível do CDS com ele — é radicalmente diferente da que foi no cavaquismo. O PSD é o segundo partido, mas teve um resultado baixo e não tem um projecto político aglutinador como foi o de Cavaco Silva. O relacionamento com o PSD é, para o CDS, um desafio complexo e insere-se na crise profunda que o centro-direita vive e no processo de transformação a que está obrigado.
O CDS, “partido do táxi”, levou uma década a recuperar, mas em circunstâncias diferentes. A crise de então caracterizou-se por um demorado processo de erosão eleitoral, depois de, em 1985, Lucas Pires ter recusado o convite de Cavaco para o CDS se apresentar às legislativas em listas conjuntas com o PSD. O resultado foi o PSD no Governo de maioria relativa e o CDS a ficar-se pelos 9,96%, descendo de 30 para 22 deputados.
Lucas Pires demite-se, mas seguem-se dez anos de mínimos eleitorais. Em 1987, Cavaco conquista a primeira maioria absoluta. Liderado por Adriano Moreira, o CDS bate no fundo, com 4,44% dos votos, e elege quatro deputados. É o “partido do táxi”. Depois da demissão de Adriano Moreira, Freitas do Amaral regressa à liderança e, em 1991, o CDS tem 4,43% e elege cinco deputados. Freitas retira-se. O partido é presidido interinamente, durante uns meses, por Adriano Moreira até ao Congresso do Altis, em Março de 1992, em que, com o apoio oficial e assumido no palco do congresso de Adriano Moreira e de Nuno Krus Abecasis, Manuel Monteiro é eleito.
Tinha, então, 29 anos, apenas uma licenciatura em direito e o currículo político de ter sido líder da Juventude Centrista. Mas tinha um núcleo duro fortíssimo: Jorge Ferreira, Gonçalo Ribeiro da Costa, Luís Queiró, Luís Nobre Guedes e, também, o ainda não militante do CDS Paulo Portas, então director de O Independente. Além disso, a sua direcção contava com pessoas como Fernando Paes Afonso, Nogueira Simões, Rui Vieira, Manuel Queiró. E agregou personalidades como Maria José Nogueira Pinto e Nuno Fernandes Thomaz. E, questão não menor, mesmo com cinco deputados, a bancada do CDS era um escol: Adriano Moreira, Narana Coissoró, José Luís Nogueira de Brito, Girão Pereira, António Lobo Xavier.
Mais: Monteiro tinha um projecto e uma ideia de país. Assumiu um programa político-ideológico de direita nacionalista e eurocéptica que levou o CDS a recusar o Tratado de Maastricht e a ser contra a adesão ao euro, então em construção. Ensaiou técnicas de discurso populista, mas nunca pôs em causa o modelo de democracia liberal. Um projecto e uma ideia de país que refundou o CDS e o levou aos 15 deputados, em 1995.
Nas diversas e peculiarmente adversas circunstâncias actuais, quem — e com que projecto — irá dar um futuro ao CDS?
COMENTÁRIOS
VitalBicho E Portugal, 28.10.2019: "CDS que futuro" o futuro pode passar por a reflexão desta crónica, onde "Portas e Cristas"  são de pouca referência, a politica e as necessidades, têm outros prioridades e como já escrevi, o CDS só faz sentido, com uma reestruturação, com a evolução dos tempos, reconquistando credibilidade, se mesmo com a astúcia politica de Portas, o CDS perdeu identidade, com Cristas foi o descalabro, por vezes populista, sempre ressentido e em negação, em gíria diria, "quis voar sem asas"... Mais ao centro ou à mais direita, um CDS com linhas do passado, praticando a Democracia Cristã, não só evocando, tem lugar na democracia portuguesa, pede-se simplesmente, "uma oposição construtiva"...
Raquel Azulay, 26.10.2019: Futuro???
AndradeQB, 26.10.2019: Não milito nem votei no CDS, mas o julgamento dos eleitores ditado por todos estes jornalistas comunistas enoja-me. O sucesso da geringonça deve-se fundamentalmente a medidas tomadas pelo CDS, Adolfo Mesquita Nunes no turismo, Paulo Portas nos vistos gold e a Assunção Cristas com a lei das rendas e a desburocratização do licenciamento de obras de reabilitação urbana. Jornalistas como SJM trabalharam diariamente para lhes atribuir a culpa da falta de dinheiro, virem agora falar sobre o seu enterro é deprimente.
Qualquer coisa, 26.10.2019: Andrade, a São é uma jornalista experiente e como ex eleitor do CDS até às últimas eleições devo dizer que é certeira. Votei IL. O Nuno Melo costumava me inspirar mas hoje em dia acho-o um cobarde político, que está bem acostumado a Bruxelas. Aliás muitas das pessoas do CDS parecem me hoje em dia uns betinhos, sem gana nenhuma.
Mendonça, 26.10.2019: CDS é um partido condenado. Não tem conteúdo ideológico. Não tem base social. A Dª Cristas foi fingindo que existia mas todo aquele vazio era mais que patente, sem qualquer hipótese de levar muito mais longe a farsa.