Dia Mundial do Vegetarianismo e uma lição
de História que gostei de saber. Vegetarianismos … extremismos, malabarismos, fanatismos,
equilibrismos…
Est modus in rebus, indeed!
PÚBLICO, 1 de
Outubro de 2019
Vegetarianismo. Ou a abstenção
do consumo de carne e peixe. O que muitos ainda consideram uma moda tem, na
realidade, acompanhado uma grande parte da história da Humanidade e é
transversal a inúmeras sociedades e culturas ao longo do tempo, remontando a
épocas anteriores a Cristo, possivelmente à tradição filosófica indiana ou à
Grécia antiga.
Muitos reconhecerão, certamente, o nome Pitágoras de Samos, o filósofo e matemático grego que viveu no século
V a.C. e que ficou, sobretudo, conhecido pelo seu célebre Teorema de
Pitágoras, aprendido por todos os petizes na escola, e que ainda hoje nos ajuda
a descobrir as hipotenusas e a projectar os nossos edifícios. Mas poucos
saberão que foi também ele, provavelmente, um dos
primeiros proponentes do vegetarianismo clássico,
enquadrado na sua visão da transmigração das almas, ou seja, na crença de que
todos os seres vivos possuíam almas, que migravam de um corpo para o outro.a a publicar várias edições de uma
revista designada O Veg
Até meados do séc. XIX, o nome do filósofo grego passou a
estar associado a todos aqueles que optavam por não consumir carne de animais,
ou seja, os “Pitagóricos” — assim passaram a ser designados. Alguns dos
quais são nomes de vulto, facilmente reconhecidos, como Leonardo da Vinci, Percy Shelley, Leo
Tolstoy, Alexander Pope, Henry Salt, George Bernard Shaw, entre outros.
A palavra vegetariano era inexistente no léxico popular
até essa altura, sendo que alguns até utilizavam o conceito “anti-carnívoro”
para designar alguém que não comia carne. Até que o termo surgiu pela primeira
vez em publicações do século XIX e foi
incorporado pioneiramente no vernáculo inglês. Apareceu inicialmente em formato
impresso na edição de Abril
de 1842 da revista The Healthian e passado pouco tempo a
primeira sociedade vegetariana surgia na Inglaterra, em 1847, abrindo portas para que muitos outros
colectivos e organizações despontassem um pouco por todo o mundo.
Esta terminologia era o produto da justaposição das
palavras inglesas “vegetable" e “arian". O termo “vegetable" remete para o reino vegetal, como se intui
facilmente, ou seja, para alimentos vegetais. Já o termo “arian”
é um sufixo utilizado frequentemente para conotar com uma prática ou uma
doutrina, conforme é o caso também de “proletarian”, ou seja, proletariado,
ou “librarian”, um bibliotecário.
Em Portugal, o conceito começou a popularizar-se com a
criação da Sociedade Vegetariana de Portugal, fundada pelo médico Amílcar de
Sousa em 1908, e que estava sediada na cidade do Porto. Esta instituição viria a publicar
várias edições de uma revista designada O Vegetariano, entre 1909 e 1915, a
qual continha diversificados artigos, ilustrações e receitas vegetarianas;
estas edições ainda hoje podem ser encontradas em algumas bibliotecas. Impulsionado
por adeptos da alimentação vegetariana e do naturismo, a associação já contava
com mais de 3000 associados em 1914, atestando à popularidade crescente desta
forma de alimentação.
Com o intercalar do
período salazarista, a alusão ao vegetarianismo passou a ser escassa e os
movimentos perderam alguma visibilidade pública. Não seria por acaso, pois Salazar considerava o
vegetarianismo como uma alimentação “dos pobres”, promovendo
o consumo exacerbado da carne. Existiu uma
associação promotora do vegetarianismo entre as décadas de 1960 e 1980, a qual
se extinguiu entretanto.
Foi necessário chegar-se
ao século XXI para que resurgissem
instituições ligadas com o vegetarianismo em Portugal, como a Associação
Vegetariana Portuguesa, fundada em 2006, e o Centro Vegetariano, fundado em
2008. Presentemente,
o conceito de vegetarianismo goza de uma grande popularidade, não só em
Portugal como um pouco por todo o mundo. De Pitágoras a figuras públicas
actuais como Yuval Noah
Harari, Leonardo Di Caprio, Moby, Lewis Hamilton, Natalie Portman e, por cá, João
Manzarra ou Rita Blanco,
parece que os “pitagóricos” são uma tradição que está para ficar e que a sua
existência se tornará cada vez mais importante, diante dos desafios
civilizacionais que nos são colocados no presente, seja ao nível da
sustentabilidade, do bem-estar animal ou da saúde das populações.
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