Já o tenho contado mais vezes, pelo
simbolismo caricatural das nossas andanças governativas com as andanças quixotescas
do jovem Gil, futuro São Frei Gil de
Santarém, que, predestinado a ser grande sábio, teve os seus amores de pureza
por uma Solena, que foi raptada por bandoleiros. Em vão Gil a procurou, conta
Eça na sua “Lenda de Santos”, incompleta - “Lenda de S. Frei Gil” - e até mesmo
a procurou aflitivamente por Vouzela, e no castelo de Lanhoso, onde este era
defendido por valentões que gritavam “Cá
por aqui é honra!”.
Assim o nosso governo, feroz guardador
do seu castelo, a sua honra, o seu remanso. Mas leiamos o texto de Luís Rosa, não de todo negativo todavia, para o
castelo de António Costa, secundado
por comentadores igualmente dos prós e dos contras, que trazem achegas úteis, segundo as respectivas honras.
Um Governo imobilista /premium
O espartilho do acordo com a
extrema-esquerda foi destruído mas o resultado será o mesmo: um Governo com uma
alergia absoluta a qualquer mudança estrutural que promova o progresso
económico e social.
LUÍS ROSA, Redactor
Principal e colunista do Observador
OBSERVADOR, 21 oct 2019
1.
Mudar para que tudo continue como está — é a ideia central d’ “O Leopardo” de
Tomasi di Lampedusa que resume bem os governos de António Costa. Acabou a
geringonça mas o imobilismo político do primeiro Governo de António Costa vai
continuar no segundo Executivo. O espartilho do acordo com a extrema-esquerda
foi destruído, os ministros mais moderados viram o seu peso político reforçado
mas o resultado final será exactamente igual: um crescimento económico
medíocre, a ilusão dos portugueses de que estão a recuperar poder de compra e,
acima de tudo, uma alergia absoluta a qualquer mudança estrutural que promova o
progresso económico e social.
Com
uma ou outra excepção, a esmagadora maioria dos 19 ministros irão gerir o
dia-a-dia, apostando no marketing político em que o PS é especialista para
vender uma imagem de país de sucesso — quando o mais provável é
continuarmos a empobrecer e a perder competitividade face aos países europeus
do nosso campeonato.
Uma
Segurança Social falida que irá
prejudicar, e muito, as gerações nascidas após 1974, um Serviço Nacional da
Saúde a decompor-se lenta e irremediavelmente até que o Bloco de Esquerda e
o PCP voltem a gritar, como no tempo da troika, que há utentes a morrer por
falta de cuidados e uma Educação em que a escola pública voltará a ser um
palco de confronto entre o corporativismo acéfalo de Mário Nogueira e um
ministro fraco e sem rasgo. Como cereja no topo do bolo, teremos um Ministério
das Finanças com uma enorme capacidade criativa para criar mais impostos e
aumentar os já existentes.
Porque um Estado que não se deixa
reformar, que não quer ser competitivo, que se está nas tintas para o cidadão e
que mais não é do que uma espécie de balcão de atendimento das necessidades das
diferentes corporações da administração pública — esse Estado é um Monstro que
precisa de ser alimentado, bem alimentado com impostos, impostos e mais
impostos para contentamento das clientelas do partido do dr. António Costa.
2.
Costa não falhou a maioria absoluta por um deputado, como António Guterres em
1999, mas a sensação de déjà vu é incontornável. Além da falta de
energia e de caras novas e do clima de económico igualmente de abrandamento, as
semelhanças entre os segundos executivos de Costa e de Guterres chegam ainda à
criação de um famoso e utópico Ministério para a administração pública.
Verdade
seja dita que António Guterres escolheu o homem certo para nada fazer: Alberto
Martins, de seu nome. O seu curriculum político resumia-se a falar bem e
ao facto de ter sido um dos rostos da crise estudantil de 1969 em Coimbra.
Dois anos depois de ter liderado o pomposo Ministério da Reforma do Estado e da
Administração Pública o resultado foi um rotundo e absoluto zero: zero de
reformas, zero de medidas concretas de modernização da administração pública e
muitos mas mesmo muito estudo. A tradicional receita guterrista, portanto.
Já António Costa resolveu criar um
Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública. Repare-se na subtileza:
Guterres queria reformar, enquanto Costa quer modernizar o Estado. Apesar do perfil claramente mais executivo de
Alexandra Leitão, algo me diz que o resultado não será diferente do de Alberto
Martins.
Primeiro
porque Mário Centeno irá ter sempre uma palavra a dizer em qualquer alteração
que Leitão queira fazer na organização do Estado ou na administração pública
pelo óbvio impacto orçamental. Por
outro lado, se há área em que o PS nunca quererá gerar grandes insatisfações é
precisamente na função pública — uma das suas base eleitorais de apoio.
Seja revendo as carreiras especiais
da função pública (como está no programa do Governo), seja alterando outras
matérias, qualquer mudança terá sempre o mesmo objectivo: deixar tudo como
está, uma vez mais.
3.
Aliás, só consigo ver uma área onde há condições para alterações
estruturais: as Infraestruturas. Primeiro porque está a entregue ao
ministro com maior capacidade política (leia-se capacidade de fazer) deste
Governo: Pedro Nuno Santos.
Por outro lado, porque há um trabalho preparatório que o primeiro Governo de
Costa já fez e há condições orçamentais em termos da União Europeia para um
forte apoio, por exemplo, à modernização da ferrovia e à expansão na área
portuária.
Pedro Nuno Santos é o homem
certo para iniciar
esse processo de modernização que pode verdadeiramente aproximar o país da
média europeia, promover um aumento da qualidade de vida dos cidadãos e ainda
ter ganhos ambientais significativos. Mas que terá sempre de ser continuado
pelos seus sucessores.
O
mesmo se diga da escolha de Ana Mendes Godinho para o Ministério do Trabalho. Neste caso, o objectivo
será estancar a vontade do PCP e do Bloco de Esquerda de influenciarem a
reversão da flexibilização da lei laboral aprovada (com os votos do PSD) na
última legislatura.
4. Outro
lado positivo do novo Governo é a continuidade de Francisca
Van Dunem na pasta da Justiça. Depois da
acusação do caso Tancos a surgir em plena campanha eleitoral, os socialistas
ficaram de pé atrás em relação à Justiça. O Expresso o o Observador chegaram
mesmo a noticiar que o PS
acreditava que existia uma conspiração do Ministério Público contra o partido.
Depois
dessa acusação gravíssima, era expectável a substituição de Van Dunem por
alguém adepto de uma linha dura contra o sector da Justiça — um pouco na
linha do que Rui Rio tem defendido.
A
continuidade de Van Dunem significa que António Costa optou por um perfil mais
consensual e pacífico. Para todos os efeitos, trata-se de uma magistrada
prestigiada que, certamente, não será cúmplice de qualquer controlo da Justiça
por parte do PS.
5. O
mais extraordinário, contudo, é o alfa e ómega do novo Executivo: a presidência
portuguesa da União Europeia (UE) em 2021, como se o Governo se esgotasse
naquele evento que dura seis meses.
Aparentemente,
e numa presidência portuguesa da UE que durará seis meses, o primeiro-ministro
deixará de ter tempo para o país e, por isso, necessita de quatro ministros de
Estado — sendo que um deles, Augusto Santos Silva, também estará ausente do território nacional algures na
União Europeia no primeiro semestre de 2021.
Tendo
em conta o défice de organização dos portugueses, pode parecer boa ideia
começar a pensar com dois anos de antecedência num evento como a presidência da
UE. Mas, na realidade, tal capacidade de antecipação só quer dizer uma coisa: António
Costa já está a pensar numa carreira internacional.
Como se não bastasse já termos um
primeiro-ministro sem visão de longo prazo para o país, também tínhamos de ter
um chefe de Governo que não tem a cabeça em Portugal mas sim na alta política
europeia para benefício próprio com todos os jogos palacianos e de bastidores
inerentes aos processos de decisão europeu.
O que dá vontade de perguntar: será
que António Costa quer imitar Durão Barroso e fugir do país quando as nuvens
negras da economia (e do imobilismo político por si promovido) impedirem a
política de distribuição de rendimentos de que Costa tanto gosta? O que fará
Costa se o Governo cair?
É
uma pergunta legítima tendo em conta a convicção geral de que este Governo não
durará mais do que dois anos e as presidenciais de 2021 já têm um vencedor
antecipado: Marcelo Rebelo de Sousa.
Rectificação: A
Presidência do Conselho da União Europeia não é tripartida, logo Portugal
exercerá a sua presidência no 1.º semestre de 2021. O chamado programa de
trabalho de cada presidência é acordado entre os três Estados-Membros que
exercem tal presidência de forma consecutiva, sendo que Portugal terá de
negociar esse mesmo programa com a Alemanha e a Eslovénia.
COMENTÁRIOS
Joao Mar: O Governo que Portugal merece
Antaeus IX: Eppure se
muove!...
Joaquim Zacarias: Valha-nos a ministra da agricultura, que sabe imenso de olivicultura.
Antonio Fonseca > Antaeus IX:
Mas nunca ouviu
dizer que a Cristas desse 3000 euros por um galináceo,
Antonio Fonseca: O governo pode ser imobilista mas o país, esse não vai ficar parado. Lenta e seguramente vai continuar a sua marcha,
calma e serena, em direcção à cauda da Europa. Nessa marcha, breve só teremos à
nossa frente a Grécia.
Paulo Silva: O Rui Rio é pior. Só para decidir se fica ou sai demorou duas semanas.
Alexandre Barreira: ....ó "Rosinha-dos-limões"........como não consegues chegar à
"lata-de chouriços".....pimba.....toca a
"chover-no-molhado"....assim não vais lá........!!!!
Conde do Cruzeiro: "Um Governo imobilista". Tem toda a razão, caro Luís,
este governo é mesmo imobilista pois ainda não recebeu autorização para iniciar
o seu caminho. O senhor é que os conhece bem, muito obrigado por
alertar para esse facto os saloios.
Joaquim Moreira Este até pode ser considerado um “Governo imobilista”,
mas é o ideal, para a maioria da comunicação social. Mas também é muito claro
que, sendo socialista, só pode ser imobilista. Até porque, só pretende durar
até que o maior protagonista arranje melhor lugar. Mas não posso deixar de
dizer que o Luís Rosa e o Observador deram um forte contributo para o manter no
poder, fazendo-lhe, assim, um grande favor. Ao fazerem um ataque cerrado àquele
que foi, e vai continuar, o seu maior opositor. E, por uma simples razão:
continuar a combater por uma verdadeira governação. Até porque, dizer que
tivemos um “governo” nos 4 anos anteriores, só mesmo de quem entende os
governos, como o melhor meio para se fazerem favores. Sendo socialista, mais do
que ser imobilista é mais uma solução criada para manter em Cena o génio do
Artista.
Joaquim Moreira > Alberto Gonçalves: Não é poeta quem quer. No meu
caso nem se trata disso sequer. O que se trata é de rimar. Esta foi a forma que
encontrei para, com a ignorância e a empedernida militância, não me irritar.
chints CHINTS: Se ganhou porque é que mudaria? Já ter tirado alguns familiares é de
admirar (daqui a nada lá estarão)
Joao Rodrigues:
Imobilista! O governo
ainda não tomou posse!
O Famoso Faisão: Mudar?!...Mas por que carga de águas???....A famiglia
está no governo, o pessoal é carregado com impostos e não protesta, morrem nos
hospitais e não protesta, trabalhas as 40 horas e não protesta, o PR é dos nossos…...Mudar
para quê!!! O pessoal está bem!!!!
Ana Ferreira Até agora o espartilho era a Geringonça, agora é o
imobilismo...tradução: não há espartilho ou imobilismo, só "maus
fígados" do Luís e Cª!
Paulo Guerra:
Mas o que é que a
Rosinha sabe de progresso económico e social?
Antonio Fonseca
> Paulo Guerra:
Mas o que é que o
Paulo Guerra sabe de progresso económico e social?
Joaquim Zacarias > Antonio
Fonseca: Só se for de Cuba
Sergio Coelho: Discordo! Não podemos acusar este clube
mafioso, despesista e nepotista de "imobilismo", atendendo a que eles
"mobilizam" guita (que não existe e de terceiros) às toneladas e
banalidades, futilidades e inutilidades. Logo, não são imobilistas, mas
"mobilistas". "mobiliza-os" a causa pública e o altruísmo!
Está-lhes no "adn" do clube do Largo dos ratos.
Xico Nhoca: A imobilidade do PS quando governa é o melhor que podemos ter e desejar. Ou
teríamos porcaria. Aliás a grande virtude do governo que agora termina foi ter
mudado pouco o que o governo do PPC fez. Se tivesse minimamente cumprido o que
prometeu (acabar com a austeridade, blablabla) já teríamos cá a troica.
Antonio Fonseca > Xico Nhoca: E a grande virtude
do PPC foi ter mudado pouco o que o governo de Sócrates fez!!???
Pedro Silveira > Antonio
Fonseca: Não parece António. Só para
falar no défice, o sentido foi exactamente o inverso. Sócrates a subir e Passos
Coelho a descer. Um abraço
António Hermínio Quadros Silva: É preciso que as moscas mudem para que a scheisse
continue a mesma
Carlos Quartel: Costa e os seus desejam o poder para tratar da sua
vida e para ajudar `
à prosperidade dos seus amigos, familiares, conhecidos. Ao calor do pote vão tratando de juntar uns cobres, fazendo negócios, criando empresas para ganhar concursos e assim vai a vidinha. Não há interesse em mudar nada, assim está muito bem. Distribuem-se as cenouras indispensáveis para manter o pagante tranquilo, é só ....
à prosperidade dos seus amigos, familiares, conhecidos. Ao calor do pote vão tratando de juntar uns cobres, fazendo negócios, criando empresas para ganhar concursos e assim vai a vidinha. Não há interesse em mudar nada, assim está muito bem. Distribuem-se as cenouras indispensáveis para manter o pagante tranquilo, é só ....
Mosava Ickx: "um Ministério das Finanças com uma enorme capacidade criativa para criar
mais impostos e aumentar os já existentes" E
mais nada, 4 anos de esclerose!
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