Um excelente texto de um nome a fixar – PATRÍCIA
FERNANDES – jovem ainda, professora universitária que não
receia atacar as temáticas em moda, de “cultura do ódio”, de um falso moralismo, que já encontráramos nos hippies, naqueles anos contestatários, de uma
mocidade desejosa apenas de fruir da existência, e que trouxera para a ribalta
todos esses valores da contestação, cada vez mais arreigados nessa sociedade equilibrada
e capitalista que eles ajudaram a desmoronar, talvez, em termos de eficácia de
pequena dimensão, (já que o fosso entre o capitalismo e a pobreza se tornou
progressivamente mais vincado e para mais assente em corrupção imparável que a
Justiça finge eliminar). E os “sem abrigo de hoje” são consequência dessa
ausência de valores, que o alastrar das drogas ajudou a petrificar nesses
conceitos apaixonados de um mundo injusto feito ao serviço de homens injustos,
os puros amparando-se numa criatividade inicial de beleza de alma e de corpos
juvenis, de que James Dean, os Beatles e tutti quanti foram símbolo que seduziu
as gerações seguintes cada vez mais impregnadas dos sentimentos
existencialistas que o após guerra ajudou a radicalizar, e as leituras
marxistas ajudaram a esclarecer, como, aliás, já os filósofos da Revolução
francesa haviam aberto as pistas dos novos rumos democráticos. Mas hoje, como
nunca, o ódio está assente, sob a capa da falsa moralidade, que não isenta os
contestatários de iguais vícios de uma ambição idêntica. Mas o texto de Patrícia Fernandes quase só mereceu unanimidade de loas
dos seus comentadores, prova de quanto as pessoas estão cansadas dessa
provocação e ódio gratuitos.
A cultura de ódio
O fanático activista sente-se moralmente
superior porque reivindica um acesso privilegiado à verdade e essa atitude de
superioridade impede a valorização do dissenso e a obtenção de consensos.
Em 1714 Bernard Mandeville
entrou para a história das ideias com a publicação de A Fábula das Abelhas:
vícios privados, benefícios públicos. Considerado
um dos livros fundamentais da economia política liberal, diz sobretudo muito
sobre a moralidade do homem moderno.
Partindo da separação moderna entre esfera pública e esfera privada, o
argumento de Mandeville passa por considerar que os vícios privados são
essenciais para a prosperidade económica, gerando benefícios públicos e colectivos
– num argumento mais radical do que o do interesse próprio de Adam Smith. Ao
recuperar a dicotomia entre vícios e virtudes e valorizando os primeiros,
Mandeville permite-nos uma compreensão particular do espírito moderno. O espírito dos antigos consistia na busca pela vida
virtuosa, a partir da comunidade, e o pensamento cristão manteve durante mais de
mil anos a mesma ideia numa lógica de pecados capitais a evitar. Mas com a
modernidade os vícios adquiriram aceitabilidade, primeiro privada e, mais
tarde, pública.
Hoje
assistimos ao culminar de uma expansão de vícios privados para a esfera
pública. É o
caso da ira e a tentativa de sustentar racionalmente
discursos de ódio. Embora
marque toda a modernidade, esse discurso floresceu com especial ênfase no mundo
académico durante os anos 60 do século XX. É
o nascimento da nova esquerda e a concepção radical de que o sistema existente
é a encarnação de todo o mal, estando para lá da possibilidade de redenção. Todas as aflições públicas e privadas são
manifestações desse sistema que é preciso combater activamente: deve ser
totalmente destruído para que seja possível construir um novo mundo. Nos Estados Unidos esse discurso ganhou forma numa
espécie de ira provavelmente inédita: contra o próprio país e tudo aquilo que
ele representa – capitalismo, imperialismo, guerra,
desigualdades, injustiça. Um
sentimento que se foi alargando a outras academias e que atinge o seu auge com
o 11 de setembro. A
professora canadiana Janice Fiamengo
refere essa data como o seu momento de ruptura com a cultura que dominava a
academia e que determinara o seu feminismo radical anterior. Quando viu os
colegas manifestarem satisfação com o ataque às torres gémeas percebeu que
havia algo de profundamente errado com aquelas pessoas e aquela cultura.
Os últimos vinte anos ampliaram o discurso de ódio. Hoje
deve odiar-se tudo e publicamente. O capitalismo, o imperialismo e todos os
conflitos com os quais não concordamos. A
cultura do patriarcado e todos os homens, pois todos são potencialmente
violentos. Mas, em especial, o homem branco. Todos
os que não usam as palavras certas. Todos os filmes e livros que não coloquem a
mulher no papel principal e contenham um elenco preenchido de minorias, velhas
e novas, mesmo que à custa de erros históricos. Todo o humor, a não ser
que não tenha piada. Todos os que não aceitam cegamente a
responsabilidade humana nas alterações climáticas. Todos os que não levam a
vida a sério. Todos os que comem carne. Todos os que fazem piadas
inadmissíveis, mesmo que seja por amizade. As gerações mais velhas,
mesmo que se tenham sempre esforçado para que os filhos tivessem uma vida
melhor. E tudo isto agravado pela maior de todas as invenções da
humanidade, as redes sociais, com o seu destilar de ódio permanente desde as
caixas de comentário aos tweets irados, assentes numa lógica de vitimização.
Em
algum momento, passamos a aceitar como normal esta cultura de ódio. Pior do que
isso, passamos a valorizá-la. E é por isso que aplaudimos os olhos e as
palavras iradas da jovem Greta, os comentários daqueles que querem decidir
sobre quem pode ocupar o espaço político, os antis de toda a espécie, os
cordões sanitários, manifestos e cartas abertas, os que acusam os outros de mil
e uma fobias, a absoluta falta de empatia para quem ousa olhar para o mundo com
outros olhos.
É
fácil de perceber. Como Amos Oz afirma no
seu texto sobre o fanatismo (Contra o Fanatismo, Edições Asa, 2007), é da natureza do fanático preocupar-se
com o outro, que é sempre a sua obsessão. O
fanático acredita que pode salvar o outro, libertando-o pela conversão,
impondo-lhe a sua verdade que é a única verdade. E é aqui que reside o perigo:
o fanático activista sente-se moralmente superior porque reivindica um acesso
privilegiado à verdade e essa atitude de superioridade impede a valorização do
dissenso e a obtenção de consensos. Perder
o fanatismo é abrir as portas à ambiguidade, é reconhecer um mundo que não é a preto e branco, é aceitar a
diferença e admitir a legitimidade daquele que pensa de forma distinta. É saber
ouvir. Mas uma cultura de ódio é surda e é, por essa razão, a maior ameaça a
uma sociedade democrática. Professora da Universidade da Beira Interior
COMENTÁRIOS
José Sousa: Bom artigo.
Lúcido, directo ao ponto e causa raiz desta praga do século XXI, o activismo
cego, estúpido e irracional.
Marco Silva: Muito bem.
Que lufada de ar fresco, num jornal onde cada vez mais os artigos de opinião
tendem só para a esquerda. Artigos de opinião que nem há 1 ano eram mais
equilibrados. Agora, é o ataque diário ao homem branco por mulheres. É o ataque
ao homem branco pelo racismo que a esquerda promove. É o ataque ao homem branco
por tudo e mais alguma coisa. Enquanto isso, o homem branco tem de ir para o
trabalho de transportes públicos, esmagado contra uma porta. Tem de trabalhar
8-9-10-12 horas e voltar para casa esgotado e esmagado contra uma porta. Tem de
pagar as contas com o pouco dinheiro que lhe resta do salário miserável que
tem, pois os impostos aumentaram outra vez, pois a esquerda quer distribuir
mais umas regalias pelos parasitas do estado... e quando liga a televisão tem
lá uma mulher "afrodescendente" a dizer que o homem branco é racista
e que o/a "afrodescendente" não pode ser racista com o homem branco.
Só o "branco" é que é racista. O "preto"...não... O homem
branco repara também que essa personagem foi eleita para o parlamento... Esta é
a realidade. O homem branco, o homem da classe média, com família que trabalha
horas a fio, não tem representação no parlamento sequer...e é demonizado TODOS
OS DIAS pelos media portugueses e mundiais. O homem branco da classe média, é
que mais paga impostos, é quem mais sofre no dia a dia...e é o que é mais mal
tratado. Enfim, há pelo menos um ou outro artigo que o defende...ou pelo menos
não o ataca...daí ser uma lufada de ar fresco.
Ruik Krull: Admira-me não terem vindo aqui as/os alforrecas do costume fustigarem
gosmas de ódio à autora e ao seu texto, devem estar prostrados a fazer Alahs à
Greta.
Carminda Damiao: Óptimo texto.
Antaeus IX: Mais uma equalizadora da
moral... ou como uma mão lava a outra...
Fernando Craveiro: Texto fabuloso. Cristina, ficamos no aguardo de mais lúcidos como este.
Gil Bernardes: A influência da Maria Vieira
no meio académico não pára de crescer.
José Carlos Lourenço > Gil Bernardes: Qual influencia
mais!! A actriz do berloque de esterco !! A gaga feminista-radical !! A doidona
impostora infiltrada "pinta unhas na A.R."
Qualquer Um: Excelente texto, identifico-me
na íntegra.
José Ramos: Em suma, é mandar a Razão (como referi no sábado em relação ao artigo de
Alberto Gonçalves), a razoabilidade, a liberdade às malvas, e regressar às
trevas medievais. Com a agravante de hoje, com o olho que tudo vê de um Big
Brother global que faria arrepiar George Orwell, não haver "vícios"
que sejam privados e aquilo que são "virtudes" ser ditado pela moda
da estação.
Liberal Impenitente > José Ramos: Muitas pessoas querem culpados, mesmo que não os haja.
Isso torna-as disponíveis para irem atrás da primeira menina autista de
trancinhas que lhes aparecer. E também há meninas de outro tipo no mercado dos
milagres, mais sabidas.
Nelson Brito: Muito bom,
finalmente algum senso nesta comunicação social que cada vez da mais voz a esse
discurso radical. Eu sou da opinião que este discurso do ódio e das verdades
absolutas tem tanto sucesso porque vende, os jornais estão cheios de exemplos,
e porque é fácil de assimilar... Pensar dá muito trabalho.
João Sousa > Nelson Brito: É
precisamente isso, é branco e preto. Básico.
Miguel Gentil Gomes: Excelente texto! Quem assim fala
não é gago. Por falar nisso, alguém que mande o link à Presidenta Joacine.
Ana Ferreira: Como pode verificar lendo estes e os comentários que aí vêm, não obstante
tentar generalizar o fenómeno, ao personalizar e, sobretudo, compará-lo com a
"cruzada" de Greta, lamento mas também está a promover a cultura do
ódio.
Antonio Fonseca > Ana Ferreira: " lendo estes e os comentários que aí vêm" A Ana Ferreira também prevê o
futuro. Já sabe qual o conteúdo dos "comentários que aí vêm".
Qualquer Um > Ana Ferreira: Lamento, mas acabou de perder uma excelente
oportunidade de ficar calada...
Joaquim
Zacarias > Ana Ferreira: Calada
és uma poeta.
João Sousa > Ana Ferreira:
A esquerda não costuma dizer
que se deve tolerar os intolerantes? Pois bem, não se pode tolerar a Greta.
Diogo Luz: Parabéns, Patrícia. Retrato
perfeito da lastimável condição de decadência e colapso eminente a que os
marxistas totalitários, que capturaram a academia, o espaço público e a
comunicação social, conduziram a Civilização Ocidental. Só faltou mesmo
mencionar o caricato de tais odiadores patológicos usarem a baixeza de acusarem
todo e qualquer crítico ou opositor político, precisamente, de "discurso
de ódio", como forma de impedir o debate racional e impor a ditadura.
Lamentavelmente, o ponto de possível regeneração pacífica há muito foi
ultrapassado. Dor, sofrimento e muito sangue, é agora cenário inevitável para
todos os que ambicionem manter as suas mais elementares liberdades.
Isabel Brito: Muito bom e 100% verdadeiro! Obrigada, vou partilhar!
victor guerra: O ódio é patrocinado pela
comunicação, que transforma posições minoritárias em acontecimentos
"relevantes"
Pérolas a porcos > victor guerra: Absolutamente!!! E além disso dá a palavra aos
arruaceiros e às passionárias, como a "gretinha"!!! As pessoas deviam lembrar-se da
Joana d'Arc e da Guerra dos Cem Anos, da Evita, etc.
João Sousavictor guerra : 1000 likes, nada, passam a algo
relevante quando aparecerem no telejornal.
Fernando Costa: Excelente artigo. Obrigado.
Carminda Damiao: Excelente texto. Fazem falta
textos lúcidos como este para reporem a verdade que nos está a ser tirada.
Obrigada.
Velha do Restelo: Muito bom. Parabéns e obrigada!
Maria Nunes: Muito bom. Parabéns.
Patrícia Fernandes. Obrigada. Já não lia um artigo tão lúcido há muito
tempo. Começo o dia com alguma esperança, porque de cada vez que ouço rádio, tv
ou jornais mais me afundo na convicção de que a sociedade ocidental, democrática
está em vias de extinção.
Earl Woode. Artigo muito relevante. Exemplo disso a mudança de critérios para um
filme estar apto à candidatura de um prémio BAFTA. Procurem online as quotas
impostas já que a censura não me deixa publicar o link. É inacreditável.
Artigo muito relevante. Alguém deu pela incrível
mudança de critério dos prémios BAFTA que agora impõe quotas para um filme
sequer ser considerado apto a um prémio? As percentagens desta “quotas”
baseadas em sexo, minorias étnicas, homosexuais e transexuais são fixadas para
o filme sequer ser admitido. Portanto, acabou-se a liberdade de expressão ou
artística. A partir de agora, os filmes passam a ser propaganda. Inacreditável!
Lourenço Marques: Bom artigo que devia dar que
pensar a muitos e está em linha com o pensamento de Gabriel Mithá Ribeiro no
seu último livro, "Um Século de Escombros". Foi para isto que
renunciámos à moral cristã e à cultura de responsabilidade pessoal?
Eduardo S: Muito bom.
White Male lives matter
Tiago Nogueira: Boa análise.
Miguel Antunes: Excelente
texto.
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