Nasceu o Ricardo, há 61 anos,
o meu primeiro filho. Uma crónica especial, para ele, para mim. Vasco Pulido Valente é único,
sempre, mesmo quando discordamos. Único, especialmente para Portugal.
CRÓNICA: Diário
O novo governo de Costa é um governo de
amigos do peito, de amigos do PS e de amigos recentes. Não é um governo para
mudar nada, é um governo para conservar tudo.
VASCO PULIDO VALENTE
PÚBLICO, 19 de Outubro de 2019
12 de Outubro: Esta gente não tem emenda, passou a semana a dizer que não se devia falar de
André Ventura e, logo a seguir, falou
ininterruptamente de André Ventura. André Ventura é um comentador
desportivo, ponto final.
13 de Outubro: Eu sei como se resolvia o problema da
Catalunha. A Espanha
dava independência à Catalunha. A Catalunha, evidentemente, invadia as
Baleares. E, a seguir, a esquadra de Vigo bombardeava Barcelona. A Catalunha
capitulava – e todos ficavam bons amigos.
14 de Outubro: Mário Nogueira,
ressuscitado dos mortos, apareceu outra vez para dizer que não
queria Tiago Brandão Rodrigues para ministro da Educação. Ou seja,
continua a confundir o papel do sindicalista com o papel do político. Os
sindicatos não podem nem devem mandar no governo. Mas, desgraçadamente, em
Portugal o Estado é o grande patrão.
15 de Outubro: O novo
governo de Costa é um governo
de amigos do peito, de amigos do PS e de amigos recentes. Não é um governo para
mudar nada, é um governo para conservar tudo. A esquerda é intrinsecamente
conservadora, muito mais conservadora do que a direita. Espanta-me que quase
ninguém dê por isso.
16 de Outubro: Na América, a esquerda e a direita
juntaram-se contra Trump a propósito da Turquia. Não têm razão. A lucidez
de Trump, não a do indivíduo mas a da história, é maior que os seus pequenos
preconceitos. A Rússia, que se vai imiscuir naquelas guerras, tem o interesse
substantivo de controlar os seus portos de água quente. A América, agora que é
auto-suficiente em petróleo, não tem
qualquer interesse naqueles desertos e, seja como for, tem a Arábia
Saudita, um feudo mais limpo e definido.
17 de Outubro: A juventude catalã, uma das mais mimadas da
Europa, continua a
fazer fogueiras nas ruas de Barcelona. Isto tudo pelo privilégio de
falar uma língua que ninguém fala e que ninguém jamais quererá aprender. Os
escritores catalães que não eram estúpidos nem paroquiais sempre escreveram em
castelhano e é por isso que os lemos.
Podem
dizer que nós estamos no mesmo caso, mas não estamos: uma importante parte do
mundo fala português e, já agora, é bom lembrar que no século XVII Portugal
tinha um enorme império e a Catalunha tinha sobretudo o problema, que persiste
até hoje, de não saber onde começava e onde acabava e a ambição ridícula, que
também persistiu até à guerra civil, de conquistar Leão e as Baleares.
18 de Outubro: Os media
de Inglaterra e da América tentaram fazer de Boris Johnson um palhaço, uma
espécie de réplica do que eles pensam que Trump é. Erro deles. Boris
conseguiu um novo acordo com a União Europeia, que é aceitável pela
maioria do Partido Conservador. Claro que a Câmara dos Comuns não vai aceitar.
Porque metade do Partido Trabalhista é remainer e porque Corbyn tem medo de
eleições. Mas Boris não tem, e com um acordo com a UE, que toda a gente
julgava impossível, no bolso, ainda menos.
Ainda
vou gozar com o fim desta história.
Colunista
COMENTÁRIOS:
Luis Morgado: Vasco
Pulido Valente rendido ás manobras de Boris Johnson. O homem que conseguiu um
"novo acordo". Um acordo com condições sobre a Irlanda do Norte que o
mesmo Johnson, há menos de um ano, dizia serem inaceitáveis. O mesmo que há uma
semana tinha cozinhado um "acordo", apresentando o DUP como aliado, e
que agora substitui por outro em que o DUP é completamente ignorado.
Basicamente Johnson está na mesma situação de Theresa May, mas com a vantagem
de ser um jogador de poker.
Rafael.guerra: Descontando
a sua opinião favorável sobre o misógino, racista, xenófobo e nacionalista que
ocupa a Casa Branca, é preciso reconhecer o excelente humor com que no dia 17
de Outubro retratou o ridículo egoísmo paroquial dos nacionalistas regionais da
Catalunha.
DCM: Por
falar em constante mudança, admira-me que VPV não tenha mencionado as eleições
em Moçambique. Para não sair do calendário, tal referência não destoaria se
fosse incluída como complemento ao seu dia 15 de outubro. Não só por as
eleições terem ocorrido naquela data, mas também porque os moçambicanos
continuarão a ser espoliados pelo mesmo "governo" que sempre lhes
tirou tudo.
Colete
Amarelo: Ri-me com o
diário de 13 de outubro. Era o que aconteceria se o mundo não estivesse em
perpétua mudança.
henrique Mota: Uma
lufada de ar frio vinda da História.
nelsonfari: 16
de Outubro: continuo a pensar, pelo que vejo, leio e oiço, que existe um
tremendo equívoco com Trump, confirmado por certas figuras de intelectuais e
cientistas portugueses que já viveram nos EUA, nomeadamente nas zonas ditas de
ambiente liberal-americano. A imagem que é exportada para a Europa é
precisamente esta, a da América liberal e cosmopolita. Trump só foi
eleito pela degradação social e económica da maioria dos americanos, não
enfrentada pelos democratas. Os americanos do Midwest votam em Trump e
continuarão a votar em 2020. Será reeleito, o que custa admitir. O discurso das
alterações climáticas e do colapso planetário não chega aos agricultores
asfixiados pela agro-indústria, aos mineiros e ao pessoal da ferrugem. A Europa
está completamente aturdida no seu labirinto decadente.
cisteina: Lúcido
politicamente, não falhou uma, mesmo a da Catalunha, muito bem. O problema - e
Vasco Pulido Valente sabe-o melhor que ninguém - é que a política nem
sempre é lúcida, exactamente porque os interesses de todo o tipo (pessoais,
corporativos, etc.) não agem com lucidez. E, porque tal acontece, só com
políticos lúcidos e capazes, conseguimos resolver os problemas. Não sei se
António Costa vai lá, uma boa parte da sua equipa (mais gorda e não encorpada,
o que não ajuda) não tem estaleca para secretário de estado quanto mais para
ministro. Pior ainda, faltam-nos directores gerais de peso, inteligentes e
sabedores à moda de Salazar, e sobram-nos muitos chefes e chefinhos que nada
percebem como funciona a política governativa e a quem se dirige, às pessoas,
obviamente. Marcamos passo.
Espectro: Agora
já não restam dúvidas. Os heróis de Pulido são o Trump e o Boris!
Aqueles que quase todo o Mundo considera anormais responsáveis pelo
desequilíbrio político, social, de segurança e económico em que vivemos, são
para Pulido os cordeiros vítimas dos lobos maus, a saber: António Costa,
Macron, Merkel e UE no seu conjunto. Arranjem-lhe um bom psiquiatra
rapidamente. Aconselho o Daniel Sampaio, o que avalizou a sanidade mental do
Bruno de Carvalho para ser presidente do clube do Lumiar. LOL
Luis: Fraquinho
o comentário. Porque o autor não mostrou admiração por Boris ou Trump. Apenas
constatou que a leitura mediática das acções dos mesmos, repito acções, é
enviesada, com ou sem razão. O problema é que hoje apenas se pode repetir o
eco. Mesmo que ele possa não fazer sentido às vezes. Ou faz sempre, para
sempre, sentido?
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