Passeios, anseios - sem rodeios
Salles da Fonseca vai
passeando e meditando e conta, de forma elegante e simples, as suas
observações, por vezes jocosas, por vezes críticas, de pessoa habituada a ler e
a reflectir e a colher da vida os sumos que a vida vai fornecendo. São três os
textos, postos hoje no seu blog “A
Bem da Nação”, o terceiro, de homenagem a Diogo Freitas do Amaral, hoje
falecido, e cuja acção política descreve, com conhecimento e
simpatia.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
02.10.19
O Actor Taborda
Hoje,
tive boleia até ao jardim, cheguei folgado. Com muita tranquilidade, dei uma
volta inteira ao recinto deixando-me ultrapassar ou cruzando-me com quem não
tem mais nada que fazer e, por isso, corre. Não vi ninguém a fazer yoga nem
tai-chi. Só vi uns quantos velhotes na «batota» e um casal no banco do quiosque
da biblioteca. Como sempre, o coreto em votos de silêncio. Uma pena, tanto
subaproveitamento de um espaço em que deveria haver filas de músicos à espera
de lugar no coreto, «overbooking» na reserva de recantos de relvados para
grupos de ginástica lenta, grupos de ouvintes de contadores de histórias… E se
chover? Tendas, claro está.
Então,
aproveitando o silêncio que jorrava do coreto, entendi que era boa altura para
aproveitar o Verão que veio passar o Outono a Lisboa e sentei-me perto da
estátua de João de Deus, o da «Cartilha Maternal» e dos jardins-escola.
Foi
então que pensei na barafunda que é a toponímia lisboeta com este jardim a
chamar-se oficialmente «Jardim Guerra Junqueiro» cuja estátua está na Praça de Londres enquanto aqui está a de João de Deus, outra de Antero de Quental e um busto do actor Taborda.
De
Antero lembrei-me d’ O Palácio
da Ventura
Sonho que sou um cavaleiro andante
Por desertos, por sóis, por noite
escura,
Paladino do amor…
…
e mais não sei de cor. Lembrei-me também das Conferências do Casino e de As causas da decadência das
nações ibéricas… E, é claro, lembrei-me
daquele banco público em Ponta Delgada…
Do
actor Taborda lembro-me apenas de ouvir os
meus avós a falarem dele mas confesso que não me recordo do que diziam. Só me
lembro que se fartavam de rir com o Chaby que, mesmo sem dizer uma palavra,
punha as plateias todas a rir. Seria a mímica? Talvez.
Do
João de Deus, como já disse, lembrei-me da Cartilha
Maternal e do mérito absoluto que ele teve no combate ao
analfabetismo. E lembrei-me também duma polémica teológica que ele teve com o
meu avô, Tomás da Fonseca. Nunca li porque se trata duma discussão sobre fé e
eu acho que a fé não se discute. Se fosse uma discussão sobre teologia
propriamente dita, leria de certeza; sobre fé, não me interessa.
Levantei-me
e fui lentamente até um quiosque que vende cafés e pastéis de nata pensando
como, apesar dos esforços do João de Deus e seus seguidores, ainda hoje temos
analfabetos e um relativamente baixo nível médio de instrução.
E
pensei que ao fim deste tempo todo desde as Conferências
do Casino, ainda andamos «à procura da rolha» no processo das causas do
nosso atraso – eu creio que essas causas têm muito a ver com o tema do João de
Deus…
Já
estava a chegar junto da montra dos pastéis de nata quando meditei no actor
Taborda como sendo, de todos os figurões representados na estatuária do Jardim, o mais réussi já que foi ele que nos convenceu, não sei quantas gerações
depois, a viver num mundo irreal, muito fora das nossas capacidades, a fingir
que somos o que não somos, como fazem os actores.
Actores,
fingidores, tudo «numa boa», à espera de mais uma troika.
Outubro de 2019
Henrique Salles da Fonseca
Notas de APOIO: Francisco Alves da Silva Taborda
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Francisco Alves da Silva Taborda “(Abrantes, 8 de Janeiro de 1824 — Lisboa, 5 de Março de 1909), foi um actor português. Em Lisboa actuou no Teatro Timbre, como amador. Iniciou a sua carreira no Teatro Gymnasio em 1852. Na década de 1870 actuou no Brasil. Também em 1870 foi inaugurado um teatro com o seu nome. Em 1912, foi erguida uma estátua em sua honra, no jardim que mais tarde se passaria a chamar Actor Taborda, em Abrantes, em frente do edifício onde esteve o Teatro Taborda, onde Francisco actuou diversas vezes. Posteriormente, o Jardim Actor Taborda passou a designar-se Praça Actor Taborda. Em Lisboa, a rua Actor Taborda é uma homenagem a este actor. Caricatura de Taborda, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
03.10.19
Circula por aí uma citação do Barão Otto von
Bismarck que diz algo como «nunca se mente tanto como depois de uma pescaria,
durante uma guerra ou antes de umas eleições».
Não sei ao certo qual a experiência eleitoral
e, portanto, democrática do Barão von Bismarck mas o que sei é que ele foi o
responsável por um desaguisado entre Nietzsche e Wagner já que o filósofo se
insurgiu contra o cerco alemão a Paris que ele considerava a sede da moderna
Cultura Ocidental enquanto o músico dizia que «se não fores capaz de voltar a
pintar quadros, não és digno de os possuir» (Biografia de Nietzsche por Sue
Prideaux, Círculo Leitores, pág. 119).
Porque não acredito na democraticidade do
Barão;
Porque duvido da veracidade da fonte da dita
citação;
Porque os Leitores do “A bem da Nação” não
precisam de «ajudas» para se decidirem na opção do voto,
… decidi manter este blog
afastado das discussões eleitorais.
E assim respondo à pergunta por que é que o “A
bem da Nação” não participa na campanha eleitoral. E também para ter a certeza
de que não tropeça nalguma mentira.
Outubro
de 2019
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
03.10.19
(21 de Julho de 1941 – 3 de
Outubro de 2019)
CDS
– Centro Democrático Social, o Partido de que foi o
primeiro Presidente, em parte nenhuma do nome nem dos princípios por que sempre
se regeu se afirma de direita. O «D»
significa «democrático» no sentido que no Ocidente se dá ao conceito que é o de
defensor da liberdade de opinião, dos Direitos Humanos em conformidade com a
respectiva Declaração Universal de 1948, do pluripartidarismo, da independência
dos Poderes Legislativo e Judicial, da dependência do Poder Executivo
relativamente ao Legislativo, da dependência das Forças Armadas e de Segurança
ao Poder Executivo. Nos seus princípios, o CDS não faz uma opção de
Regime (República ou Monarquia) pelo que essa é uma matéria fora de discussão e
que só a cada militante diz respeito.
Sob
a égide de Diogo Freitas do Amaral, o CDS sempre se afirmou como seguidor dos
princípios da Doutrina da Democracia Cristã, ou seja, da Economia Social de
Mercado. O «C» significa «Centro» e não tem qualquer outro significado
que não exactamente esse, ou seja, que não é de direita nem de esquerda. A
génese doutrinária do CDS nada tem a ver com qualquer dependência do marxismo
tanto praticante como seu «spin-off» mas, sendo incondicional defensor do
Estado de Direito, opõe-se frontalmente a todas as formas de fascismo quer de
direita quer de esquerda.
Sob
a égide de Diogo Freitas do Amaral, ninguém entrou no CDS que não subscrevesse
estes princípios doutrinários.
No dia da sua morte, continuo a
crer que se manteve firme nestes princípios fundadores do CDS que, para além
dele, muitos continuamos a considerar fundamentais. Mais opções que o Partido admitiu – Liberalismo e Conservadorismo -
após a sua presidência, alteraram o modelo inicial e Freitas do Amaral não se
terá sentido confortável.
Mas foi ele que nos deu os princípios fundamentais.
3 de Outubro de 2019 Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIOS:
Anónimo 04.10.2019: Henrique.
Obrigado e Paz recordando e, lembrando Diogo Freitas do Amaral que parte sem
partir..., deixando muito e, tanto de Vida com Vida para Além dela dum
Político, Professor, Amigo que muito lutou pela Liberdade ao Centro com rigor,
princípios e valores que defendeu e, ensinou a caminhar livre e, solto por
Portugal.
Anónimo 04.10.2019: Ao longo de muitas horas hesitei se
deveria fazer algum comentário sobre o falecimento do Senhor Prof. Diogo
Freitas do Amaral. Quem sou eu para dizer algo que acresça ao muito que já foi
dito e ao que ainda se dirá por pessoas legitimadas para o dizer, como tu,
Henrique. Mas se nos últimos tempos tenho tido o privilégio de, por vezes, te
acompanhar, a título de comentador, nos teus artigos aqui publicados, achei que
este seria também o momento de te enviar umas linhas e deixar à tua
consideração a sua publicação ou não. Abstenho-me de fazer qualquer panegírico do Senhor
Professor ou de realçar qualquer aspeto do domínio público, tarefas que outros
assegurarão com legitimidade e brilhantismo. Não o conheci pessoalmente, pese
embora tivéssemos, em dado momento, um amigo comum. Um e outro comungavam as
mesmas raízes nortenhas, e o nosso amigo, nos anos “de brasa”, não se cansava
de o elogiar e de me transmitir a visão do Senhor Professor sobre o Portugal de
então. Nem sempre o nosso pensamento
político coincidiu, mas apraz-me sublinhar, uma ocasião, difícil, em que tal
aconteceu – foi na contestação à segunda guerra do Iraque. Vivia eu então em
Madrid e manifestei a minha repulsa a esta no limite que o exercício das minhas
funções institucionais o permitia. Finalizo
com duas notas. A primeira reporta-se às
sequelas da maioria silenciosa de 28/9/1974 ou do famigerado golpe de
11/03/1975 (não estou certo), em que houve uma clara perseguição a militantes
ou a simpatizantes do CDS. Na empresa onde eu trabalhava destacava-se uma
militante que tinha fixado, junto ao seu posto de trabalho, um autocolante do
CDS. Assisti, cobardemente, a um colega a destrui-lo. Ainda hoje a minha passividade
pesa-me na consciência. A segunda nota
refere-se ao período em que o Professor foi Vice-1º Ministro, do Governo
presidido pelo Dr. Pinto Balsemão, tendo como Ministro das Finanças o Dr. João
Salgueiro e como Ministro da Indústria o Prof. Bayão Horta (1981-83). Para
salvar uma importante empresa industrial que, na altura, teria alguns 7 mil
trabalhadores, (para além de muitos outros, em outras empresas que dependiam
daquela, na qualidade de fornecedoras, todas situadas numa zona industrial
crítica), e que tinha significativa obra praticamente concluída, a qual iria
para sucata, no caso de não serem concluídos os 2% que faltavam, seria
necessária a publicação de um delicado diploma legal. Este tinha o acordo dos
Ministros sectoriais mencionados, e existia um sólido suporte jurídico por
parte de eminentes jurisconsultos de Lisboa, de Coimbra e de Amesterdão. Havia
a necessidade de o diploma ser aprovado em Conselho de Ministro e para tal era
condição imprescindível o acordo do Prof. Freitas do Amaral, que o deu após
aprofundar o tema. A empresa manteve-se à tona de água durante uns anos mais… e
este caso, integrado numa visão cronologicamente mais ampla, viria a ser objeto
de tese académica, anos decorridos. Abraço. Carlos
Traguelho
Nenhum comentário:
Postar um comentário