quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Passeios, anseios - sem rodeios


Passeios, anseios - sem rodeios
Salles da Fonseca vai passeando e meditando e conta, de forma elegante e simples, as suas observações, por vezes jocosas, por vezes críticas, de pessoa habituada a ler e a reflectir e a colher da vida os sumos que a vida vai fornecendo. São três os textos, postos hoje no seu blog “A Bem da Nação”, o terceiro, de homenagem a Diogo Freitas do Amaral, hoje falecido, e cuja acção política descreve, com conhecimento e simpatia.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA
02.10.19
O Actor Taborda
Hoje, tive boleia até ao jardim, cheguei folgado. Com muita tranquilidade, dei uma volta inteira ao recinto deixando-me ultrapassar ou cruzando-me com quem não tem mais nada que fazer e, por isso, corre. Não vi ninguém a fazer yoga nem tai-chi. Só vi uns quantos velhotes na «batota» e um casal no banco do quiosque da biblioteca. Como sempre, o coreto em votos de silêncio. Uma pena, tanto subaproveitamento de um espaço em que deveria haver filas de músicos à espera de lugar no coreto, «overbooking» na reserva de recantos de relvados para grupos de ginástica lenta, grupos de ouvintes de contadores de histórias… E se chover? Tendas, claro está.
Então, aproveitando o silêncio que jorrava do coreto, entendi que era boa altura para aproveitar o Verão que veio passar o Outono a Lisboa e sentei-me perto da estátua de João de Deus, o da «Cartilha Maternal» e dos jardins-escola.
Foi então que pensei na barafunda que é a toponímia lisboeta com este jardim a chamar-se oficialmente «Jardim Guerra Junqueiro» cuja estátua está na Praça de Londres enquanto aqui está a de João de Deus, outra de Antero de Quental e um busto do actor Taborda.
De Antero lembrei-me d’ O Palácio da Ventura
Sonho que sou um cavaleiro andante
Por desertos, por sóis, por noite escura,
Paladino do amor…
… e mais não sei de cor. Lembrei-me também das Conferências do Casino e de As causas da decadência das nações ibéricas… E, é claro, lembrei-me daquele banco público em Ponta Delgada…
Do actor Taborda lembro-me apenas de ouvir os meus avós a falarem dele mas confesso que não me recordo do que diziam. Só me lembro que se fartavam de rir com o Chaby que, mesmo sem dizer uma palavra, punha as plateias todas a rir. Seria a mímica? Talvez.
Do João de Deus, como já disse, lembrei-me da Cartilha Maternal  e do mérito absoluto que ele teve no combate ao analfabetismo. E lembrei-me também duma polémica teológica que ele teve com o meu avô, Tomás da Fonseca. Nunca li porque se trata duma discussão sobre fé e eu acho que a fé não se discute. Se fosse uma discussão sobre teologia propriamente dita, leria de certeza; sobre fé, não me interessa.
Levantei-me e fui lentamente até um quiosque que vende cafés e pastéis de nata pensando como, apesar dos esforços do João de Deus e seus seguidores, ainda hoje temos analfabetos e um relativamente baixo nível médio de instrução.
E pensei que ao fim deste tempo todo desde as Conferências do Casino, ainda andamos «à procura da rolha» no processo das causas do nosso atraso – eu creio que essas causas têm muito a ver com o tema do João de Deus…
Já estava a chegar junto da montra dos pastéis de nata quando meditei no actor Taborda como sendo, de todos os figurões representados na estatuária do Jardim, o mais réussi já que foi ele que nos convenceu, não sei quantas gerações depois, a viver num mundo irreal, muito fora das nossas capacidades, a fingir que somos o que não somos, como fazem os actores.
Actores, fingidores, tudo «numa boa», à espera de mais uma troika.
Outubro de 2019
Henrique Salles da Fonseca

Notas de APOIO: Francisco Alves da Silva Taborda
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Francisco Alves da Silva Taborda “(Abrantes8 de Janeiro de 1824 — Lisboa5 de Março de 1909), foi um actor português. Em Lisboa actuou no Teatro Timbre, como amador. Iniciou a sua carreira no Teatro Gymnasio em 1852. Na década de 1870 actuou no Brasil. Também em 1870 foi inaugurado um teatro com o seu nome. Em 1912, foi erguida uma estátua em sua honra, no jardim que mais tarde se passaria a chamar Actor Taborda, em Abrantes, em frente do edifício onde esteve o Teatro Taborda, onde Francisco actuou diversas vezes. Posteriormente, o Jardim Actor Taborda passou a designar-se Praça Actor Taborda. Em Lisboa, a rua Actor Taborda é uma homenagem a este actor. Caricatura de Taborda, da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro.

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
03.10.19
Circula por aí uma citação do Barão Otto von Bismarck que diz algo como «nunca se mente tanto como depois de uma pescaria, durante uma guerra ou antes de umas eleições».
Não sei ao certo qual a experiência eleitoral e, portanto, democrática do Barão von Bismarck mas o que sei é que ele foi o responsável por um desaguisado entre Nietzsche e Wagner já que o filósofo se insurgiu contra o cerco alemão a Paris que ele considerava a sede da moderna Cultura Ocidental enquanto o músico dizia que «se não fores capaz de voltar a pintar quadros, não és digno de os possuir» (Biografia de Nietzsche por Sue Prideaux, Círculo Leitores, pág. 119).
Porque não acredito na democraticidade do Barão;
Porque duvido da veracidade da fonte da dita citação;
Porque os Leitores do “A bem da Nação” não precisam de «ajudas» para se decidirem na opção do voto,
… decidi manter este blog afastado das discussões eleitorais.
E assim respondo à pergunta por que é que o “A bem da Nação” não participa na campanha eleitoral. E também para ter a certeza de que não tropeça nalguma mentira.
Outubro de 2019

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
03.10.19
(21 de Julho de 1941 – 3 de Outubro de 2019)
CDS – Centro Democrático Social, o Partido de que foi o primeiro Presidente, em parte nenhuma do nome nem dos princípios por que sempre se regeu se afirma de direita. O «D» significa «democrático» no sentido que no Ocidente se dá ao conceito que é o de defensor da liberdade de opinião, dos Direitos Humanos em conformidade com a respectiva Declaração Universal de 1948, do pluripartidarismo, da independência dos Poderes Legislativo e Judicial, da dependência do Poder Executivo relativamente ao Legislativo, da dependência das Forças Armadas e de Segurança ao Poder Executivo. Nos seus princípios, o CDS não faz uma opção de Regime (República ou Monarquia) pelo que essa é uma matéria fora de discussão e que só a cada militante diz respeito.
Sob a égide de Diogo Freitas do Amaral, o CDS sempre se afirmou como seguidor dos princípios da Doutrina da Democracia Cristã, ou seja, da Economia Social de Mercado. O «C» significa «Centro» e não tem qualquer outro significado que não exactamente esse, ou seja, que não é de direita nem de esquerda. A génese doutrinária do CDS nada tem a ver com qualquer dependência do marxismo tanto praticante como seu «spin-off» mas, sendo incondicional defensor do Estado de Direito, opõe-se frontalmente a todas as formas de fascismo quer de direita quer de esquerda.
Sob a égide de Diogo Freitas do Amaral, ninguém entrou no CDS que não subscrevesse estes princípios doutrinários.
No dia da sua morte, continuo a crer que se manteve firme nestes princípios fundadores do CDS que, para além dele, muitos continuamos a considerar fundamentais. Mais opções que o Partido admitiu – Liberalismo e Conservadorismo - após a sua presidência, alteraram o modelo inicial e Freitas do Amaral não se terá sentido confortável. Mas foi ele que nos deu os princípios fundamentais.
 3 de Outubro de 2019      Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIOS:
Anónimo 04.10.2019: Henrique. Obrigado e Paz recordando e, lembrando Diogo Freitas do Amaral que parte sem partir..., deixando muito e, tanto de Vida com Vida para Além dela dum Político, Professor, Amigo que muito lutou pela Liberdade ao Centro com rigor, princípios e valores que defendeu e, ensinou a caminhar livre e, solto por Portugal.

Anónimo 04.10.2019: Ao longo de muitas horas hesitei se deveria fazer algum comentário sobre o falecimento do Senhor Prof. Diogo Freitas do Amaral. Quem sou eu para dizer algo que acresça ao muito que já foi dito e ao que ainda se dirá por pessoas legitimadas para o dizer, como tu, Henrique. Mas se nos últimos tempos tenho tido o privilégio de, por vezes, te acompanhar, a título de comentador, nos teus artigos aqui publicados, achei que este seria também o momento de te enviar umas linhas e deixar à tua consideração a sua publicação ou não. Abstenho-me de fazer qualquer panegírico do Senhor Professor ou de realçar qualquer aspeto do domínio público, tarefas que outros assegurarão com legitimidade e brilhantismo. Não o conheci pessoalmente, pese embora tivéssemos, em dado momento, um amigo comum. Um e outro comungavam as mesmas raízes nortenhas, e o nosso amigo, nos anos “de brasa”, não se cansava de o elogiar e de me transmitir a visão do Senhor Professor sobre o Portugal de então. Nem sempre o nosso pensamento político coincidiu, mas apraz-me sublinhar, uma ocasião, difícil, em que tal aconteceu – foi na contestação à segunda guerra do Iraque. Vivia eu então em Madrid e manifestei a minha repulsa a esta no limite que o exercício das minhas funções institucionais o permitia. Finalizo com duas notas. A primeira reporta-se às sequelas da maioria silenciosa de 28/9/1974 ou do famigerado golpe de 11/03/1975 (não estou certo), em que houve uma clara perseguição a militantes ou a simpatizantes do CDS. Na empresa onde eu trabalhava destacava-se uma militante que tinha fixado, junto ao seu posto de trabalho, um autocolante do CDS. Assisti, cobardemente, a um colega a destrui-lo. Ainda hoje a minha passividade pesa-me na consciência. A segunda nota refere-se ao período em que o Professor foi Vice-1º Ministro, do Governo presidido pelo Dr. Pinto Balsemão, tendo como Ministro das Finanças o Dr. João Salgueiro e como Ministro da Indústria o Prof. Bayão Horta (1981-83). Para salvar uma importante empresa industrial que, na altura, teria alguns 7 mil trabalhadores, (para além de muitos outros, em outras empresas que dependiam daquela, na qualidade de fornecedoras, todas situadas numa zona industrial crítica), e que tinha significativa obra praticamente concluída, a qual iria para sucata, no caso de não serem concluídos os 2% que faltavam, seria necessária a publicação de um delicado diploma legal. Este tinha o acordo dos Ministros sectoriais mencionados, e existia um sólido suporte jurídico por parte de eminentes jurisconsultos de Lisboa, de Coimbra e de Amesterdão. Havia a necessidade de o diploma ser aprovado em Conselho de Ministro e para tal era condição imprescindível o acordo do Prof. Freitas do Amaral, que o deu após aprofundar o tema. A empresa manteve-se à tona de água durante uns anos mais… e este caso, integrado numa visão cronologicamente mais ampla, viria a ser objeto de tese académica, anos decorridos. Abraço. Carlos Traguelho

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