Para boi dormir, talvez. Nunca é demais
lembrá-los, mas… que importa a A.
Costa o jeito paternalístico com que A. Barreto se desunha a lançar a sua colherada de xarope num
governo engripado, mas habilmente prevenido com as mezinhas e os agasalhos
necessários? Para mais, há muito que apanhou a vacina anti-gripal, e quem se
trama são os que vivem na borrasca dos vendavais.
OPINIÃO: Bom dia, Governo novo!
Para o Governo novo, quase igual ao
velho, não se sabe ainda o que António Costa nos reserva. Não é possível
continuar a tratar só da duração e da estabilidade, pois nada será como dantes.
ANTÓNIO BARRETO PÚBLICO, 20 de
Outubro de 2019
O novo Governo
merece votos de boa sorte. Se as coisas correrem bem para ele, é provável que
também corram bem para nós. Nem sempre é assim, já vimos governos fazer o que
deve ser feito e ninguém lhes agradecer. E também já vimos os que não fizeram o
que deviam ter feito e, mesmo assim, foram recompensados com votos ou
benevolência. Os povos são ingratos e os governos também.
O
Governo velho, o que agora acaba, orientou-se, com sorte e habilidade, por
princípios simples: a capacidade de negociação, a estabilidade e a duração.
Conseguiu. Também
adoptou ideias e valores de enorme simplicidade: ter as contas certas,
manter uma firme política de contenção financeira, devolver e distribuir
rendimentos. Deu resultados. Achou por bem seguir a onda e os ventos europeus,
sem invenções nem projectos esquisitos. Teve êxito.
Para
o Governo novo, quase igual ao velho, não se sabe ainda o que António Costa nos
reserva. Não é possível continuar a tratar só da duração e da estabilidade,
pois nada será como dantes. É pena, aliás, que o primeiro-ministro não
tenha querido estabelecer uma qualquer base sólida (acordo, contrato, aliança
ou coligação…) para o Governo e a legislatura. Teria assim podido ocupar-se
mais do conteúdo e dos objectivos e menos das habilidades e dos adjectivos.
É possível que, no discurso de posse, na primeira ida ao Parlamento e noutra
qualquer oportunidade, ele nos revele finalmente o sentido principal que
pretende dar ao seu Governo e ao seu mandato. Talvez tenhamos, como é
costume, uma enumeração de prioridades, às dúzias, incapazes de definir uma
ideia ou um destino. Mas não parece provável que apenas deseje repetir o
primeiro acto, devolver, ceder e negociar, com um único objectivo, o de durar. Na verdade, os seus adversários e os seus amigos
aprenderam, à sua custa, que esse estilo lhes é desfavorável.
Com
a Catalunha à vista e o Reino Unido fora dela, com as ameaças nacionalistas
conhecidas, com a crise da imigração sem sinais de abrandamento e com a
altíssima tensão no Próximo Oriente, era excelente que o Governo novo, mesmo
com primeiro-ministro velho, consiga ou queira redefinir um caminho. Não se
trata de metafísica romântica, mas tão só de uma exigência clássica para a
melhor política: dar um sentido ao Governo.
Todos
sabem que as necessidades comandam boa parte da política. Assim é e assim será.
A dívida continua grande, melhora muito devagar. O investimento está baixo,
mas conheceu algum progresso. O crescimento está a melhorar. O défice parece
estar em boa situação. Seria bom que o Governo novo reforce estas políticas,
mas mantê-las já seria avisado. O Governo sabe que tem de tratar do poder
excessivo das potências e dos interesses que adquiriram grande parte da
economia portuguesa. Como não é novidade ser inevitável alterar as leis
laborais a fim de facilitar o crescimento. O Governo sabe isso, mas
gostaria de adiar. Ou esperar que a simpatia internacional pela estabilidade
e pelas contas certas fosse suficiente e não exigisse reformas dolorosas.
Mas o Governo sabe que a tal não escapará.
Ainda
no domínio das evidências, está a necessidade de olhar para os serviços
públicos essenciais, mais ainda, de encontrar recursos enormes para acudir a
uma situação de quase ruptura. O atendimento público e as relações
entre cidadãos e Administração estão no ponto mais baixo de há muitos anos. O
Serviço Nacional de Saúde, que o PS acusa de ter sido destruído pela direita e
pela troika, mas que na verdade foi também miseravelmente mal gerido pela
esquerda, está a precisar de cuidado intensivo.
Nada
disto faz o essencial. Nada disto é muito mais difícil do que a gestão normal
da nossa vida colectiva, que nunca é fácil e que tem sempre dificuldades. Acima
de tudo, em cada momento, está o que faz a decência na vida e nas instituições
de um país. Nas nossas condições de vida e nas actuais circunstâncias, a confiança
nas instituições, o respeito da Administração pelos cidadãos e a protecção
essencial dos nossos direitos e liberdades, constituem o sentido principal da
acção pública das autoridades. E para que isso seja possível, uma palavra:
Justiça!
O
Governo tem agora o dever de olhar com redobrada atenção, com vontade superior
e com energia renovada, para a justiça, com especial relevo para os aspectos
que mais se evidenciaram negativamente nos últimos tempos. As regras
processuais, fonte de desigualdade e despotismo. A chicana burocrática que
destrói a eficiência e alimenta a desigualdade. As garantias excessivas, factor
de injustiça e paralisia. As relações entre magistratura judicial e Ministério
Público, sem falar nas polícias, que se têm transformado em obstáculo sério à
eficiência.
É
imperdoável que António Costa continue a afirmar, com evidente cinismo, que “à
política o que é da política, à justiça o que é da justiça”. Quando algo está
errado ou desempenha mal a suas funções, o tema transforma-se em política. De
que se deve ocupar a política se não é justamente disso mesmo, do que está
errado? Do que
sofrem pessoas e cidadãos sem esperança nas instituições e no seu funcionamento
normal? António Costa tem diante de si o imperativo moral e político de fazer,
pela política e com o respeito pelas leis essenciais do seu país, o que a
justiça não sabe, não quer fazer ou não consegue ser: justa, pronta e
eficiente. Não se trata de fazer com que a política se substitua à justiça,
erro absoluto. Mas trata-se com certeza de criar condições legais,
institucionais, processuais e materiais para que a justiça funcione e cumpra os
seus deveres. Apesar de muitas outras carências (sociais, económicas,
culturais…) o que mais falta faz à democracia portuguesa é uma justiça eficiente,
pronta e justa. Uma justiça que não dê razão aos que pensam que existe uma
justiça especial para os poderosos, os afortunados, os amigos e os políticos.
Uma justiça que seja o antídoto essencial contra a corrupção, em todas as suas
formas, das famílias aos partidos, das empresas aos serviços públicos, à volta
do núcleo central, o do poder político venal e cúpido. Este tema é
eminentemente político, legal e constitucional. E o Governo é, com o
Parlamento, protagonista privilegiado e responsável maior.
Sociólogo
COMENTÁRIOS
Colete
Amarelo, 20.10.2019: Uma análise lúcida do contexto político.
Gostaria de realçar que o Governo não tem maioria absoluta. Nestas condições, qualquer programa de governo está
sujeito a sofrer desvios e qualquer coação externa poderá ser mais ou menos
travada pela oposição a menos que o PS perca a modéstia que o definiu durante a
Geringonça e queira afundar-se no sonho da maioria absoluta. Também nos
poderá vir a surpreender se se aliar à direita. Que
PS e BE não se tenham entendido, é um mau sinal. O povo português votou num PS
dependente de outras forças políticas, necessariamente de esquerda, pois quem
não pensou assim votou na direita. O BE e a CDU sabem isto, o PS não o poderá
esquecer. A direita aguarda qualquer desentendimento futuro com o oportunismo
que se lhe reconhece. Daqui para a frente é a direita quem tem mais a ganhar. A
esquerda não pode esquecer isto, não pode esquecer que os tempos são mais
voláteis do que nunca. O povo votou na capacidade que a esquerda tem em se
entender. Coragem.
J I Toscano, 20.10.2019: António Barreto pensa e isso é que os morde!
Fowler Fowler, 20.10.2019: Investir na qualidade e quantidade de recursos
(materiais e humanos), quer na Justiça como na Saúde e Educação, presumo que
seja um dever de qualquer governo quer nacional, regional ou local. Porém, o
sr. Barreto, sem qualquer autoridade, vem defender o indefensável: a
politização da Justiça e a judicialização da política. O mesmo cidadão que
ainda há pouco tempo defendia que a Justiça funcionava melhor no Estado Novo.
Um papagaio com habilidade para o show business.
J I Toscano, 20.10.2019: Fiz um comentário civilizado às 14:31 que ainda não
apareceu. Vou repetir: É muito reconfortante ler quem pensa o colectivo. Pensar
está cada vez mais raro e os governos e os partidos que os suportam detestam
quem pensa, principalmente os da sua área. Agradeço a António Barreto, como
ontem agradeci a Francisco Assis. São excepções à regra enunciada por
Sloterdijk: “2500 anos depois, tanto os deuses como os sábios se retiraram,
deixando-nos sozinhos com a nossa ignorância e o nosso parco conhecimento das coisas.”
ana cristina, 20.10.2019: Vamos ser lúcidos: esta não é equipa para tanta
ambição. O António Costa não foi buscar quem demonstrou capacidade de
concretização. Simplesmente reuniu uma equipa de propagandistas e obedientes
admiradores. Não é para melhorar o país, é para continuar a encher o olho
dos pacóvios.
cisteina, 20.10.2019: Concordo, provavelmente António Costa não tem remédio
nem alternativa, à falta de pão responde com circo (leia-se, marketing,
publicidade, propaganda e propagandistas). Quem quer governar um país assim e
aceitar convites envenenados? Daqui a dois anos, conversaremos, mais do mesmo,
pacotes de farinha Amparo ... mas a família socialista está feliz, a
concorrência não aperta, veremos se esta loja de videirinhos deixa de ser
abastecida ... Basta olhar o Mundo, a Catalunha, pequeno exemplo, a
Turquia, a Síria e os curdos, os malucos do Trump e Boris inglês, uma guerra
comercial prestes a explodir, muita fúria e furor. Só não vê quem não quer ...
ana cristina 20.10.2019 Pequeno país ao sabor das crises internacionais e das
ambições pessoais de meia-dúzia de oportunistas. Há dias mais pessimistas....
:))) a entrevista do Daniel innerarity no observador é muito rica e
esclarecedora, mas há dias em que perceber melhor o que se passa não basta.
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