sábado, 12 de outubro de 2019

Kosovo, Hong-Kong, a vida continua



Notícias do mundo, de há uma semana. Gente que luta, que mal conhecemos, na rebeldia jovem contra uma autoridade cediça, num mundo sempre em evolução e em guerra, os mais afoitos, em guerra de armas, os confiantes nos ideais democráticos, em guerra de palavras e panfletos. Afinal, guerras sempre as houve, no Médio Oriente, no Vietnam, e o resto do mundo olha de longe, não com indiferença, mas com curiosidade expectante, e receosa, admirando a coragem, desta vez, das reivindicações, num mundo cada vez mais fechado ao futuro, na monstruosidade populacional que o condena. É claro que há sempre “editorialistas” unilateralmente solidários, como apontam alguns comentadores bem informados… Quanto ao Kosovo, foi um pouco mais de história europeia a leste que nos esclareceu…
I - Kosovo vai a eleições em ambiente de revolta contra corrupção e desemprego
Dois partidos da oposição disputam o primeiro lugar, ambos rejeitam concessões à Sérvia.
FATOS BYTYCI
PÚBLICO, 6 de Outubro de 2019
Vjosa Osmani quer ser a primeira mulher a chefiar o Kosovo GEORGI LICOVSKI/EPA
Os eleitores do Kosovo vão este domingo escolher um novo Parlamento em eleições dominadas pela corrupção generalizada, o desemprego altíssimo e a má relação com a vizinha Sérvia.
As eleições foram antecipadas pela demissão do primeiro-ministro Ramush Haradinaj, em Julho, depois de ter sido convocado a responder a uma investigação sobre crimes de guerra em Haia pelo seu papel na insurreição contra as forças sérvias em 1998-99. Mas este factor terá pouco a ver com as dificuldades que Haradinaj vai encontrar nas eleições: a sua actuação no passado é vista como legítima, e os líderes militares são considerados heróis na luta contra a Sérvia. Os eleitores devem votar a pensar mais no presente.
A insatisfação pública com o governo de Haradinaj (que tem, com outros dois antigos líderes do Exército da Libertação do Kosovo que se tornaram políticos, uma coligação a três) fez com que o apoio para os partidos da oposição tivesse aumentado, com a Liga Democrática do Kosovo (LDK) e o nacionalista de esquerda Vetevendosje a disputar o primeiro lugar (o vencedor, qualquer que seja, não deve conseguir votos suficientes para governar sozinho).
A candidata da LDK, Vjosa Osmani, quer ser a primeira mulher a ocupar a chefia deste Governo, e usou este argumento na campanha: “Em mais de 90% dos casos são os homens que estão envolvidos em corrupção. Uma mulher vê o Estado e o modo como se deve tratar dos nossos cidadãos de um modo totalmente diferente”, disse à Reuters.
Osmani, professora de Direito de 37 anos, estudou no Estados Unidos e representa uma geração de kosovares mais familiarizados com a vida no Ocidente e frustrados com o nepotismo e ineficiência dos partidos tradicionais do país dos Balcãs.
“Não pode ficar pior”
O slogan de campanha de Osmani é “Acreditem!” mas os eleitores são cépticos em relação às promessas dos políticos no país em que mais de um terço dos cidadãos não tem emprego e onde para ter um emprego bem pago exige geralmente algumas manobras.
Para ter um emprego é preciso subornar alguém ou conhecer os responsáveis certos”, diz Lindita Azemi, 22 anos, que ganha 300 euros a fazer hambúrgueres numa loja, apesar de ser licenciada em Ciência Política e Administração Pública.
O Kosovo tem a população mais jovem da Europa, com uma média de 29 anos de idade, mas apesar do crescimento económico ser de cerca de 4% ao ano na última década, mantém-se muito pobre.
Fazendo eco do desapontamento, Ramadan Bibaj, 66 anos, disse: “Quem quer que ganhe, não vai poder ficar pior do que está.” Se tudo continuar como está, previu, “dentro de cinco anos não teremos no país nem 400 mil pessoas”.
A população do Kosovo é de 1,8 milhões. Mais de 200 mil kosovares deixaram o país e pediram asilo na União Europeia desde que Pristina declarou a sua independência em relação a Belgrado em 2008.
A declaração de independência, quase uma década depois de a NATO ter bombardeado forças sérvias do que era então uma província sérvia, foi reconhecida por mais de 100 países, mas entre os que não reconheceram estão cinco estados da União Europeia e duas potências, a Rússia e a China (além da Sérvia, que considera o Kosovo uma província na sua Constituição).
Se no Governo cessante a tensão entre Pristina e Belgrado piorou, com Haradinaj a impor uma taxa de 100% nas importações de produtos sérvios, nenhum dos potenciais vencedores tem qualquer intenção de fazer cedências territoriais à Sérvia, uma das opções para recomeçar conversações iniciadas em 2013 mas que nunca registaram progressos significativos.

II - EDITORIAL
Hong Kong, a democracia em causa perante o silêncio do mundo
O que as ruas de Hong Kong revelam é uma luta entre a defesa de uma forma de vida e um regime que a recusa
PÚBLICO, 6 de Outubro de 2019
MANUEL CARVALHO
Já se passaram 18 semanas. Sob a chuva, nas ruas, nas estações de metro, no aeroporto ou nos viadutos gigantescos que tornam possível o fluxo do quotidiano a 7.5 milhões de pessoas acotoveladas numa área exígua, os cidadãos de Hong Kong continuam a resistir e a protestar. Começaram por recusar uma lei de extradição, entretanto anulada, que permitiria o julgamento dos seus cidadãos em tribunais da China. Continuaram com a exigência do sufrágio universal. Hoje lutam quase essencialmente pelo direito de lutar. Depois de injectarem tinta azul nos canhões de água, depois de mobilizarem gangs pró-chineses para causar tumultos e agredir manifestantes, o governo da cidade decidiu por estes dias dar mais um passo no endurecimento da sua resposta às manifestações: uma lei de excepção herdada dos tempos coloniais que já não se aplicava desde 1967 foi ressuscitada para proibir que os manifestantes usem máscaras nos seus protestos.
Entrámos definitivamente num território desconhecido. Apesar de todas as ameaças, de todas as proibições e da escalada da repressão, os manifestantes, na sua maioria jovens, não desarmam. O desespero leva as franjas mais radicais à violência gratuita. A cidade estava ontem praticamente paralisada. Sem o metro a funcionar, com centenas de lojas fechadas, com o seu habitual bulício suspenso. Só os manifestantes voltaram à rua e com máscaras. Sem que uma pretensa maioria silenciosa de cidadãos se exponha a exigir o regresso à normalidade, o que as ruas de Hong Kong revelam é uma luta entre a defesa de uma forma de vida e um regime que a recusa. O modelo de “um país dois sistemas” só existe se um desses sistemas impuser limites ao outro.
Tudo se passa perante uma gelada indiferença do mundo, em concreto a indiferença das democracias ocidentais. A União Europeia limita-se a recordar valores, sem pressionar a favor do seu respeito. Dos Estados Unidos ouve-se o comprometedor silêncio de Donald Trump. A democracia só se exige aos mais fracos, nunca a um colosso com a dimensão da China. Pode-se argumentar que esta indiferença se justifica com a prudência com que as autoridades têm gerido o conflito. Mas a situação mudou com o regresso da lei de excepção. O que se segue é incerto mas, olhando para a tenacidade dos cidadãos de Hong Kong nos últimos meses, nada garante que desarmem pela persuasão das palavras. Talvez então, nessa luta entre um gigante e um anão que se adivinha, o Ocidente democrático tenha a coragem de dizer que a razão está do lado da democracia. Mas será tarde demais.
COMENTÁRIOS
antonio jose, 07.10.2019: Grande defensor da Democracia o srº Manuel Carvalho, vem alertar a opinião pública para os graves acontecimentos em HONG Kong. Basta ver as imagens que as nossas Tv,s por vezes mostram para vermos os gravíssimos actos de vandalismo que diariamente vão sendo praticados, felizmente sem que se tenham registado mortos. Mas, o seu empenhamento de grande defensor da democracia fica-se por HONG KONG , não chega ao Iraque onde a população se tem manifestado contra o desemprego , a fome , a corrupção dos governantes, e a mando destes democratas já foram assassinadas mais de 100 pessoas. Grandes defensores da Democracia, mas sempre com dois pesos e duas medidas.
AndradeQB, 06.10.2019: Atrasado ouvi dizer a, salvo erro, um professor da UTAD que se tivessem sido tomadas medidas conhecidas quando começaram a aparecer vespas asiáticas, a situação não teria chegado ao que chegou. Quando a China ocupou Macau e Hong Kong, também houve quem avisasse. Quando a China começou a criar aeroportos em ilhéus submersos para tomar conta do mar a sul da China, também ninguém abriu o bico. Teve que aparecer Trump para dizer " o Rei vai nu". Vir agora dar falsas esperanças aos que se manifestam, é repetir o que se fez na Síria, ou na Venezuela. É empurrar heróis para a fogueira a ver se ganham alguma coisa com isso.
Conta desactivada por violação das regras de conduta, 06.10.2019:  O propagandista pafioso está desejoso para que comecem a chover bombas democráticas made in USA em Hong Kong, tudo pela "democracia", claro...... Já a Comissão Totalitária €uropeia devia ir a Pequim dar lições sobre "democracia", e que leve o Manuel Carvalho para ensinar aos chineses como passar anos a fio na comunicação social a regurgitar propaganda e fazer-se passar por especialista em economia!!
Julio, 06.10.2019: Em Hong Kong há problemas? Claro que os há! Onde é que não há problemas? Todavia, o articulista não refere um único - que Hong Kong tem um PIB que é 30 hoje em dia vezes inferior ao "pobre continente"; que é uma cidade extremamente cara para se viver e, em especial, para um estudante, se torna impossível, pois não tem dinheiro ... nem quarto; que a sua praça financeira já pouco interessa à China; Uma cidade que tem de mudar de paradigma de vida pois a sua herança colonial - em todos os aspectos - já não se adapta aos tempos modernos. Não, o articulista nada refere. Prefere concentrar-se naquilo que entende ser democracia - a democracia da cartilha que segue - que, como no caso Venezuela, preconiza e defende a completa perversão das instituições onde, para isso, vale tudo.
E como vale tudo, o articulista está decepcionado - o Trump não larga uma das "mães das bombas". Só isso. De resto ninguém está em silêncio muito menos deixa de agir na subversão, nos motins na sua organização e financiamento. É pública a acção da Nulland lá para o sítio como é público o financiamento de tais grupelhos. Do mesmo modo é pública a intervenção desse baluarte da democracia, paz e defesa dos direitos humanos que dá pelo nome de Rubio. Tudo porque, atrevo-me a dizer também para o articulista, os cidadãos de Hong Kong nada interessam. Não passam de peões no tabuleiro de xadrez. Aí, o que está em causa é a manutenção do domínio do Império que deve ser defendido a todo o custo. Isso reflecte-se em todo o lado. Até o Irão tem a ver com o torpedear a China . Isso é a democracia...
... a democracia que, como outra "esperta" no assunto em artigo hoje publicado denuncia : " a China põe em causa a presença militar dos EUA" como se tal presença militar fosse a coisa mais normal do mundo. No fundo é o mesmo que se diz relativamente à Rússia que, rodeada por todos os lados por forças militares dos EUA e NATO " se aproximou agressivamente " de tais forças. O "normal" seria abandonar o seu próprio território! Haja paciência para aturar isto..
Raquel Azulay, 08.10.2019: Julio, o q é q aconteceu à máxima "o povo é quem mais ordena"??????? Pelos vistos o povo de HK não importa.
Jose Saraiva: 06.10.2019 Tiros contra manifestantes em Hong Kong, de cara tapada e reivindicações sortidas? Inaceitável! Tiros de um exército poderoso sobre palestinianos a quem a terra é roubada todos os dias? Não se fala nisso, é normal, e viva a democracia... Responder
Raquel Azulay, 06.10.2019: Não se fala nisso?? Em que planeta vive V Exa?
bento guerra, 06.10.2019: Não é verdade. A insurreição da juventude de Hong Kong é ampliada pela comunicação ocidental. Mas a China é a segunda potência mundial e como diz o Costa, foram eles que vieram com capital, depois da "troika", não os europeus. Mais "democracia"do que a de um partido comunista? Espectro, 06.10.2019: E o que é que Manuel Carvalho defende? Vamos invadir a China para implementar uma democracia igual à dos EUA (de Trump) ou do RU (de Boris)?! Vamos repetir, portanto, a invasão do Iraque e obrigar a China a ajoelhar perante os valentes soldados lusos comandados por Durão Barroso! Já ouviu falar em pragmatismo? E em Realismo? E em bom senso? Pois é, é mesmo com todos esses ingredientes que teremos que viver, e conviver, com a história que se vai desenhando nos nossos dia, embora sem abdicar de afirmar os nossos valores e princípios - mas com calminha! LOL 
Conta desactivada por violação das regras de conduta, 06.10.2019: "democracia igual à dos EUA (de Trump) ou do RU (de Boris)" --- Era tudo uma maravilha com Obama e anteriores, os EUA eram uma democracia fulgurante veio Trump (com a ajuda de Putin) e ela acabou num ápice! Demagogia reles!!
Animação e descanso, 06.10.2019: Na China é a defesa da Democracia, em França já são uns vândalos.. O Ocidente hipócrita bem representado pelos seus editorialistas. Deixem a China mandar na China. Esta já percebeu que não pode confiar no Ocidente e nas suas falsas democracias. Os Estados Unidos envolvidíssimos neste movimente em HK claro. A China também devia patrocinar o BLM ou os coletes amarelos.
Raquel Azulay, 06.10.2019: Na China, um sistema totalitário brutalmente repressivo. Na França, uma democracia liberal.
Excelente artigo, Manuel. Preservar o acesso ao gigantesco mercado chinês é a razão de ser deste silêncio ensurdecedor e hipócrita.
Chan Chan, 06.10.2019:  Em nome da democracia pode se matar tudo e mais alguma coisa e isento de responsabilidades. Por favor viaje um pouco para conhecer um bocado do mundo exterior.
Conta desactivada por violação das regras de conduta, 06.10.2019: O silêncio sobre a repressão que está a ocorrer no Equador, por parte do Público, é que continua a ser bem representativo da sua linha editorial de "defesa da democracia" selectiva. Fosse na Venezuela e haveria já uma infindável série de artigos. A voz do dono no melhor, como sempre.


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