Coisas de muito interesse conta SF, prova dos seus interesses vastos – agora
pela história dos Estados Unidos e das relações com o mundo árabe, da religião
desordeira e do petróleo como faísca importante da desordem. Um prazer de
leitura.
HENRIQUE SALLES DA FONSECA A BEM
DA NAÇÃO, 20.10.19
A HISTÓRIA ESQUECIDA
Quando os EUA nasceram, no final do
séc. XVIII, havia uma grave crise com os muçulmanos do norte da África. Eram povos oficialmente muçulmanos, que viviam sob as
leis do Corão.
-
Estes islâmicos atacavam os navios
que passavam pelo Mediterrâneo, incluindo os americanos, sequestrando,
escravizando e matando ocupantes, além de saquear a carga. Os navios americanos
eram normalmente protegidos pela marinha inglesa antes da independência dos
EUA, mas depois de 1776, era cada um por si. - Os piratas muçulmanos cobravam fortunas para resgate
dos reféns e os preços subiam sempre a cada sequestro bem sucedido. Thomas Jefferson opôs-se
veementemente aos pagamentos, mas foi vencido pelo voto. Os EUA e as outras
nações com navios sequestrados, aceitavam pagar os resgates e subornar os
piratas. O Presidente americano era George Washington. - Por volta de 1783, Thomas Jefferson, Benjamin Franklin e John
Adams vão para a Europa como Embaixadores,
para negociar tratados de paz e cooperação. Os EUA nasceram em 1776 e desde então, estavam
mergulhados na Guerra de Independência.
Assim que a situação acalmou, essas três grandes figuras saem em missão
diplomática para representar o país. - Em 1786, depois de dois anos de conversações diplomáticas
com os islâmicos, Thomas Jefferson e
John Adams
encontraram-se com o embaixador dos povos que ficavam na região de Trípoli, actual Líbia,
chamado Sidi Haji Abdul Rahman Adja. Jefferson estava incomodado devido aos ataques que não
acabavam, mesmo com todos os esforços de paz. Quis saber por isso, com
que direito os muçulmanos continuavam a sequestrar e a matar os americanos.
- A resposta que ouviu, marcou Jefferson
para sempre: "o Islão
foi fundado nas Leis do Profeta, que estão escritas no Corão, e diz que todas
as nações que não aceitarem a sua autoridade são pecadoras, que é direito e
dever declarar guerra contra os seus cidadãos onde puderem ser encontrados e
fazer deles escravos; e que todo o muçulmano que for morto na batalha irá de
certeza para o Paraíso." Jefferson ficou
chocado. Ele não queria acreditar que uma religião literalmente
mandava matar todos os que considerava infiéis e que quem morresse na batalha
iria para o paraíso.
- Durante
15 anos, o governo americano pagou os subornos para poder passar com seus
navios na região. Foram milhões de dólares, uma quantia que representava 16% de
todo orçamento do governo federal. O primeiro presidente do país, George
Washington, não queria ter forças armadas permanentes, por não ver
riscos de ataques ao país, mas os muçulmanos fizeram mudar esta ideia. Os subornos serviriam para evitar a necessidade de
ter forças militares permanentes, mas não estavam a funcionar porque os ataques
continuavam. Quando John Adams assume a Presidência dos EUA, as
despesas sobem para 20% do orçamento federal. - Em 1801, Jefferson
torna-se no terceiro presidente americano e, mal tinha esquentado a cadeira,
recebe uma carta dos piratas aumentando o preço da autorização para navegar naquela
área. Jefferson fica louco
e, agora como presidente, diz que não vai pagar nada.
- Com
a recusa de Jefferson, os muçulmanos de Trípoli tomaram conta da embaixada
americana e declararam guerra aos EUA. Foi a primeira
guerra da América após a independência. A marinha
de guerra americana foi criada exactamente para esse conflito. As actuais regiões da Tunísia, Marrocos e Argélia juntaram-se aos líbios na guerra contra os americanos,
o que representava praticamente todo norte da África com excepção do Egipto. - Jefferson
não estava para brincadeiras. Mandou os seus navios para a região e o conflito durou até 1805, com a vitória americana. O presidente americano ainda colocou tropas ocupando
o norte de África, para manter a situação sob controle. Thomas Jefferson ficou realmente impressionado com o que aconteceu. Ele era
contra as guerras e escreveu pessoalmente as leis de liberdade e tolerância
religiosa que estão na origem da Constituição americana, mas entendeu que
o Islão é totalmente diferente, era uma religião imperialista, expansionista e
violenta. Jefferson
mandou publicar o Corão em inglês em 1806, lançando
a primeira edição americana. Ele queria que o povo americano conhecesse o Corão
e entendesse aqueles povos do norte da África que roubavam, saqueavam e matavam,
cobravam resgates e que declararam guerra quando os pagamentos cessaram.
Durante
15 anos, um diplomata de Jefferson
chegou a dizer, que os americanos eram atacados porque não atacavam de
volta, sendo vistos como fracos. A fraqueza americana foi um convite para os
muçulmanos daquela época, como é hoje para o ISIS.
Só
houve paz na região quando Jefferson atacou e venceu a guerra, ocupando depois o
território. Só assim foi conseguida a paz. Eles estão como os motivadores da
primeira guerra; foram eles que forçaram a criação das forças armadas que nem
existiam, e fazem parte até do hino dos marines que começa com "From the
Hills of Montezuma / To the shores of Tripoli".
(por
amabilidade de D. Martinho Pereira Coutinho)
COMENTÁRIOS
Anónimo, 20.10.2019: Interessantíssimo, desconhecia de todo, Henrique. Agora há que ter algum
cuidado em tirar conclusões, sem se ter em atenção o contexto, a época e o
enquadramento histórico. Infelizmente, nunca me dediquei (e já é tarde para
isso) ao estudo das Religiões, mas possivelmente das outras duas Religiões,
chamadas do Livro (Judaica e Cristã), vamos encontrar citações no Tora e na
Bíblia, respectivamente, que actualmente nos chocam tanto ou quase tanto
quantas as referidas no Alcorão. Infelizmente, encontram-se sempre seguidores
religiosos extremistas que interpretam os textos sagrados da forma que melhor
acham para tentar justificar os seus actos injustificáveis. Sou amigo desde há
quase 60 anos do nosso colega Abdool Karim Vakil, que ocupou (não sei se ainda
ocupa) lugares cimeiros na Comunidade Muçulmana em Portugal. Ele tem-me
garantido, e acredito nele, que a Religião dele é de Paz. Religiões,
Civilizações e Países não estão isentos de culpa. Por exemplo, o que dizer da
pirataria, levada à categoria de Estado, praticada pelo corsário Sir
Francis Drake,
vice-almirante da esquadra isabelina? O que dizer, por exemplo, da escravatura de
que fomos tão bons praticantes?Forte abraço. Carlos Traguelho
Henrique Salles da Fonseca, 20.10.2019: Uma nota prévia
relativamente à pirataria: pirata é empresário em nome individual; se “trabalha”
por conta do seu Chefe de Estado, é corsário. E, já que estamos com
eufemismos, também podemos ir à ironia dizendo deles «tutti buona gente». O
Islão divide-se fundamentalmente em três ramos: o sunita, o xiita (sobretudo, o
Irão) e o ismaelita (do Aga Kahn). Dentro do sunismo há certas sub-divisões
sendo a mais radical a wahhabita (de Ibn al Wahhab) e a mais «suave»
o Ibadismo (sobretudo do Sultanato de Omã). De um modo geral, os sunitas
não fazem a exegese dos textos sagrados e fazem uma leitura literal dos seus
termos. A excepção a este imobilismo são o Ibadismo e o sunismo
bangladeshiano (do nosso Martim Moniz). De um modo geral, no sunismo nem sequer
há uma hierarquia religiosa que defina regras de conduta e muito menos que
aborde criticamente questões dogmáticas. Cada mulah está por si e só
responde perante Alá. Pelo contrário, o xiismo tem uma rígida hierarquia
que interpreta os seus textos e dita procedimentos. Mas nenhum deles
separa a religião do Estado. Só os ditadores laicos praticam essa
separação fazendo com que os religiosos temam mais a ira terrena do que a
Divina. Só que a Hillary Clinton, desconhecendo
tudo isto (???) optou por provocar a “Primavera árabe” com os resultados que
estão à vista. Julgaria ela que, lançando o caos, ficaria a reinar sobre o
petróleo. Mas regressemos ao que interessa agora, a essência da religião. Assim,
se o cristianismo e o budismo pregam, respectivamente, o amor e a compaixão, o islamismo
segue a regra de Talião – olho por olho, dente por dente. Ou seja, se uns
são pelo perdão, os outros são pela vingança. Ainda em relação ao teu
comentário, permito-me chamar a atenção para o facto de, desde os tempos do
nosso obscurantismo, muita água ter corrido por baixo das pontes, ou seja, em
termos religiosos, muita exegese foi entretanto feita. E no caso do
catolicismo, o Concílio Vaticano II assumiu figura de fronteira. Mais: como
podemos testemunhar nos dias actuais, essa fronteira move-se…
Pêro Pedroso,
20.10.2019: Ficaria
mais completo e quiçá mais engraçado juntar o excerto musical seguinte ao final
do texto. https://youtu.be/oFNfdBnd
Henrique Salles da Fonseca 21.10.2019, Caro
Salles: Texto muito interessante sobre um assunto ainda bem actual. António
Benoliel de Carvalho.
Henrique Salles da Fonseca 21.10.2019, Caro Henrique: Fiquei muito satisfeito que tivesse
podido ler, e mais ainda, fiquei muito honrado que tivesse integrado o texto no
seu blog, pois como sabe desde há muito que venho seguindo sempre com interesse
o que produz, pela alta qualidade que revela. Assim sendo vou procurar com
redobrado entusiasmo entre o que tenho guardado, algo que lhe possa interessar.
Abraço Martinho Pereira Coutinho
Henrique Salles da Fonseca, 21.10.2019: Caro Henrique Obrigado. Muito interessante. Abraço Manuel Veloso
Anónimo, 22.10.2019: Se os Pais
Fundadores conhecessem um pouco da história europeia, se calhar teriam descoberto
que havia um pequeno país, virado para eles, do outro lado do mar, que pelos
mesmos motivos, já no séc XV começaram sozinhos a fazer o mesmo, começando com
a conquista e ocupação de Ceuta !! Quem não sabe de história ( e os americanos
persistem ) arrisca-se a errar !! Os moiros, desde a queda do império romano do
ocidente e tendo ocupado todo o norte de África, não penso que se tenham
dedicado a plantar batatas ou à criação de vacas nos seus desertos!! Era
pirataria mesmo, e comércio de escravos e resgates. Pois se nos seus vai vens
pelo Mediterrâneo tivessem parado em Lisboa os yankees teriam poupado muitos
amargos de boca aqui nestas bandas... V v Z
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