Diz-se – provérbio antigo - que “com
papas e bolos se enganam os tolos”, mas parece que não houve grandes
contrapartidas para os tolos… a não ser hoje. O povo sempre foi explorado,
diz-se, e mal ensinado, por cá, mas hoje já tem mais acesso à Educação, com
promessas constantes de aumento do ordenado mínimo, não nos podemos queixar. A tal
corrupção também dava emprego, afinal, e permitiu evolução, com a construção. Hoje,
não sei, sempre há o subsídio que cala as consciências e que, de resto, tal
como o resto, vem da dívida de empréstimo. Por isso hoje, a tal questão da
corrupção não vai matar o regime, bem amordaçado o povo com o subsídio e com a
promessa de aumento de ordenado mínimo. Para mais, o povo hoje é respeitado, e
começa na escola o seu domínio, através das liberdades impunes dos filhos do
povo, sobre os seus mestres intimidados e destituídos de força, que o governo,
generoso com o povo, destituiu os mestres a favor do povo e dos filhos deste,
para poder fazer os seus tratos de corrupção, com empreendimentos ou mesmo sem,
mais tranquilamente, tu cá, tu lá, num reboliço que enriquece todos em
reciprocidade de afectos. Por isso a tese lançada por PAULO DE MORAIS, na sua
página de História, sobre a morte da democracia por conta da corrupção, não
parece muito certa. Eu, é mais a tal dívida que nos pode penalizar. Mas há
sempre uma China para nos erguer, que os chineses vêm sempre a calhar, e até
tivemos uma Macau por conta deles, temos sempre o seu respeito e amizade, nem
se duvide. Eu cá, não.
OPINIÃO: A corrupção mata todos os
regimes
Será também a corrupção a razão da queda
desta democracia moribunda em que vivemos.
PAULO DE MORAIS
PÚBLICO, 29 de Outubro de 2019, 5:45
Da queda da Monarquia, em 1910, ao
fim do Estado Novo, em 25 de Abril de 74, passando ainda pelo fim da Primeira
República, em 1926, há uma causa que une a morte de todos estes regimes: a
corrupção. E será também a corrupção a razão da queda desta
democracia moribunda em que vivemos.
No auge da Monarquia, o tráfico
de influências e a captura de recursos públicos eram generalizados. Em 1882, o
então todo-poderoso banqueiro Henrique de Burnay celebrou um contrato com o Estado, representado
por Fontes Pereira de Melo,
presidente do Conselho, e Hintze Ribeiro,
ministro das Obras Públicas. Um
sindicato bancário, dirigido por Burnay, comprometia-se a construir uma linha
ferroviária em Espanha, que ligava Salamanca a Barca d'Alva e garantiria a
ligação ao Porto. Como contrapartida, o Tesouro pagaria a Burnay uma
renda milionária, 135 contos. Nascia assim a primeira parceria
público-privada portuguesa. Houve
corrupção sem limite, muros desabaram e tiveram de ser refeitos. Prometiam-se
avultadas receitas que nunca se concretizaram. Apesar do descalabro do
negócio, o Rei Luís I agraciou Burnay com o título de Conde e a linha foi
inaugurada em Dezembro de 1887. Mas, volvidos apenas três meses, o projecto
falia, apresentando 4000 contos de dívidas e prejuízo anual de 600 contos.
Desfez-se o acordo? Não! O consórcio privado foi premiado com a duplicação da
renda para 270 contos e ainda com a concessão da exploração do porto de
Leixões. Três anos depois, faliam novamente. O Governo teve de intervir no
consórcio, com enorme prejuízo para a Fazenda.
Outros escândalos se sucederam. De entre os mais ruinosos, destaca-se a atribuição
da concessão do negócio do tabaco à Família Burnay (mais uma vez), por sessenta
anos; do concurso foi ilegalmente afastado o concorrente que oferecia melhores
condições, a Companhia dos Fósforos. Esta questão levou à queda do
governo de Hintze Ribeiro, um dos muitos políticos avençados do Crédito
Predial, banco cuja gestão criminosa constituiu a causa maior da queda da
Monarquia.
A
figura central, a alma negra do Crédito Predial, foi Luciano
de Castro. Como deputado, elaborou a Lei que regulou “a
criação e o funcionamento das sociedades de crédito predial”, para mais tarde
ser ele mesmo o governador do Crédito. Os
empréstimos concedidos eram maioritariamente de favor, a políticos e amigos do
poder vigente, ora do Partido Progressista de Luciano, ora do Regenerador de
Fontes e Hintze, todos membros da administração do banco. Em 1910, detectam-se desfalques sistemáticos desde 1902.
Uma auditoria identifica créditos incobráveis de sessenta contos, cai o
governo em Junho; uma nova auditoria verifica que os incobráveis não eram de
sessenta contos, mas de oitocentos! Vem a bancarrota, esboroa-se a Monarquia e
eclode a República, com milhares a clamar “Matem o ladrão do Crédito Predial”, Luciano
de Castro.
Chegava
finalmente a República, que prometia “eliminar todos os privilégios que, sendo
mantidos à custa da depressão e ofensa dos nossos concidadãos, são para mim
malditos”, nas palavras do primeiro Presidente eleito, Manuel de Arriaga. Mas o
regime que tinha vindo para combater a corrupção viria a sucumbir com mais
um escândalo de corrupção na banca.
Em
1925, tinha lugar a maior falsificação de notas da História, as notas de 500
escudos, efígie de Vasco da Gama, crime
perpetrado por Alves dos Reis. Alves
dos Reis falsificou o seu diploma de
engenheiro, comprou (com cheque sem cobertura) os caminhos-de-ferro de Angola,
fez desfalques, mas mesmo assim foi protegido pela República, tinha o apoio da
elite nacional. Com o produto da falsificação de notas, fundou
o “Banco Angola e Metrópole”. A circulação excessiva de dinheiro provocou a
pré-bancarrota. Em 1926, o general Gomes da Costa instaurava a ditadura. A República sucumbia, sem
honra nem glória. Viriam quarenta e oito anos de ditadura salazarista, também
esta contaminada por casos de corrupção.
Chegou o 25 de Abril, em 1974. Os fundadores
da democracia, os Capitães de Abril, definiam como uma das prioridades do novo
regime “o combate eficaz à corrupção”. Mas
a democracia de Abril incorre agora nos mesmos erros dos regimes anteriores:
concede rendas milionárias em parcerias público-privadas, promove portas
giratórias, assume prejuízos dos bancos, cujos administradores são políticos…
Este regime repete os erros dos anteriores, acabará da mesma forma. “Aqueles
que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo” (Santayana).
Presidente
da Frente Cívica
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