Pinceladas coloridas no matraquear
diário a respeito das políticas que vão pelo mundo, num bate e foge, directo e
breve e simples, sobre as carapuças dos pobres mortais, arlequins em bolandas,
enquanto VPV se instala na superioridade fria do seu saber de cátedra.
Quanto a João Miguel Tavares,
a prosa chã das suas pulsões nervosas, geralmente ditadas por um pensamento
justo, caso da análise que faz do racismo. Quanto a Assunção Cristas, não a
defendo como, aparentemente, faz JMT. Parece-me esta uma figura gratuitamente
provocatória quando se dirige ao ministro, em alegações geralmente de
banalidade discursiva, papagueante, não convincente, de menina aplicada mas sem
chama, a chama que tinha, naturalmente, o saudoso Paulo Portas.
I - OPINIÃO: DIÁRIO
Armando Vara, o Novo Banco, a CGD, o
e-Toupeira, o pirata informático, o genro de Jerónimo: a vida pública
portuguesa transformou-se numa história de polícias e ladrões.
VASCO PULIDO VALENTE PÚBLICO, 26
de Janeiro de 2019
Décima semana dos “coletes” por toda a França, de Rennes a Toulouse. Entretanto, o putativo de Gaulle,
Macron, esse patético homenzinho, anda pela
paisagem a pedir um “debate nacional”. Exercício vão.
Os franceses pagam 49% do PIB em impostos e o Estado gasta 56% do PIB com os
franceses. A França está imobilizada na mediocridade e é irreformável.
Se o dr. António Costa ficar por cá muito tempo, acontece o mesmo a Portugal. O
que, de resto, não nos desviava de uma longa tradição.
Notícia
dos jornais: o “coordenador regional do Porto da secção temática de Relações
Exteriores do Conselho Estratégico Nacional... renunciou ao cargo”. Nem sequer
me espanta, há muito tempo que sei como é a cabeça do inventor desta maravilha.
20 de Janeiro
Armando
Vara, o Novo Banco, a CGD, o e-Toupeira, o pirata
informático, o genro de Jerónimo: a vida pública portuguesa transformou-se numa
história de polícias e ladrões. Percebo
que a alma persecutória que mora em cada um de nós se alegre com estas coisas.
O espectáculo não deixa por isso de ser lúgubre – ver jornalistas transformados
em peritos de Processo Penal e delatores furando por todo o lado. Chama-se a
este género de actividades “combater pela transparência”. O sermão semanal de
Ana Gomes é de pôr os cabelos em pé. António Costa não se pode esquecer de a
nomear ministra da Polícia no próximo governo.
21 de Janeiro
A
frase de Luís Montenegro sobre “acordar o gigante adormecido” adquiriu o estatuto de uma frase “original” e
“polémica”. De facto, é uma frase de um almirante japonês (julgo que
Yamamoto) sobre Pearl Harbour e o gigante é a América. Ninguém notou. E
ninguém sequer se lembrou de um filme popular chamado Tora! Tora! Tora!. Este país é um mar de ignorância.
22 de Janeiro
Merkel
e Macron assinaram um tratado para
fortalecer a defesa da UE. Os senhores da UE estão contra a Inglaterra. Mas
falam inglês para se entender entre si. É a vida. Também o hipotético exército
da Europa só pode ser alemão; e ninguém, se tiver dinheiro, compra um carro
francês.
23 de Janeiro
Um
belo dia, o coronel Hugo Chávez descobriu a maneira de governar a Venezuela.
Era simples: com o dinheiro do petróleo, comprava generais e, a seguir,
comprava “igualdade” para o lumpen proletariado
dos bairros suburbanos de Caracas e de mais três ou quatro cidades. Chamava-se
a esta originalidade “revolução
bolivariana” e durou enquanto durou o petróleo caro. Quando o preço do
petróleo desceu, já com Chávez moribundo, veio Maduro e, com ele, a doença e a
fome.
A
esquerda portuguesa, e a europeia, gostaram muito do “chavismo”. Não foi só Sócrates, foram também os ministros do
seu governo e a torpe “inteligência” cosmopolita. Estavam habituados a
gostar de ditaduras e mentiras. Agora mesmo, perante o levantamento
popular, a Europa ainda se refugia em argumentos constitucionais para
aconselhar uma transição pacífica. De Trump a Marcelo e aos comentadores da
televisão não há quem não peça paz. Naquele mundo de violência não há paz
possível. Estas piedades só servem para entreter as consciências e não mexer um
dedo.
De
qualquer maneira, excepto em Portugal, por causa dos portugueses que vivem na
Venezuela e daqueles que fugiram para cá, ninguém deu grande atenção ao assunto. A CNN estava ocupada com o shutdown. E a BBC e a Euronews não acharam a coisa
particularmente interessante: não leram com certeza os lancinantes artigos
deste jornal, reconhecendo à contre-coeur que
a Venezuela de Maduro não era propriamente um exemplo de perfeição democrática.
Verdade
que a Venezuela, com a sua extraordinária bandeira, a sua orquestra
(“bolivariana”, claro) e os caracóis do seu Dudamel, não é propriamente uma
nação, nem o Estado venezuelano é propriamente um Estado. Basta ver o uniforme
dos generais que vieram dar o seu apoio ao regime e uma pessoa sente-se logo
transportada para uma história do Tintim. Maduro, ainda por cima, tem qualquer
coisa de general Alcazar.
25 de Janeiro
Gostei
imenso de ver os cozinheiros da Galiza no congresso do Porto. Em 2003,
quando estava doente no Hospital Amadora-Sintra, um enfermeiro galego dizia-me
sempre, para me espevitar, que havia uma auto-estrada contínua do IC19 ao
melhor restaurante de Vigo. E que íamos lá os dois comer peixe e mariscos.
II – OPINIÃO: A cor da pele de António Costa
A ideia de que se formos de direita
temos de estar do lado dos polícias, e se formos de esquerda temos de estar do
lado do Bairro da Jamaica, não pode passar.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 25 de Janeiro de 2019
A resposta do primeiro-ministro a Assunção Cristas,
que vá lá saber-se porquê tem o condão de fazer perder as estribeiras ao
habitualmente fleumático Costa, não tem pés nem cabeça. Qualquer alusão de
racismo dirigida à bancada do CDS é absurda, tendo em conta nomes históricos do
partido como Narana Coissoró ou Hélder
Amaral, e, sobretudo, por insinuar a existência de vestígios de
discriminação no percurso de Costa, coisa que dificilmente terá acontecido
a um descendente da elite goesa.
A única vez que associei a cor da pele de António Costa a qualquer coisa
vagamente parecida com racismo foi nas legislativas de 2015, por causa de uns
cartazes produzidos pelo próprio PS, onde ia jurar que a sua pele foi clareada
de propósito. Aí, sim, pensei que ainda estávamos no Portugal de 1950.
Dito
isto, a insistência do CDS numa retórica do tipo “diga lá, senhor
primeiro-ministro, se está do lado de quem bateu ou de quem levou” é
absolutamente inadmissível, porque deseja à força traçar uma linha entre o
“nós” e o “eles” que é muito perigosa num tema como este. A ideia de que se
formos de direita temos de estar do lado dos polícias, e se formos de esquerda
temos de estar do lado do Bairro da Jamaica, não pode passar. Marta Mucznik, assessora do PSD na Câmara de
Lisboa, escreveu um óptimo texto no Observador (“O que a polémica do Bairro da Jamaica abafa”) sobre isso: “Enquanto o centro direita
não evoluir para além do discurso securitário e de uma postura
estritamente defensiva para denunciar clara e inequivocamente a injustiça
social que representa o racismo, esta questão ficará sempre refém da esquerda.”
Claro
que, como tentei explicar no meu último texto, teríamos de nos sentar a debater
o que significa exactamente a palavra “racismo” neste contexto. Mas se eu tiver
de escolher entre Mamadou Ba e os dois
energúmenos de extrema-direita que o perseguiram na rua com um
telemóvel e argumentos do género “os portugueses estão a pagar o teu salário,
vê lá mas é se tens respeitinho”, garanto que estarei sempre ao lado de Mamadou
Ba. Uma coisa é eu discordar profundamente da forma como ele
aborda o problema do racismo. Outra coisa é negar-lhe o direito,
numa sociedade livre, de defender o que quiser da forma que bem entender, ou
negar a existência de um gravíssimo problema social no Bairro da Jamaica.
Ou, já agora, pretender dissimular o problema igualmente grave que existe na polícia
portuguesa em termos de violência, prepotência e camuflagem de
actuações ilegais.
Sim,
a palavra “racismo” tem hoje significados diversos e é usada por muitos
afrodescendentes como o santo-e-senha de todas as injustiças. Se o
adepto que em 2015 foi agredido por um polícia em Guimarães, à
frente do filho, fosse negro, teria sido um caso de racismo. Como era branco,
foi apenas violência policial. Aquilo a que se chama “racismo” é uma
mistura de cor da pele com pobreza, porque se a pobreza for retirada da
equação, os negros já podem visitar à vontade a Avenida da Liberdade. Essa
pobreza não deriva do racismo – deriva, em primeiro lugar, da iliteracia, da
desestruturação das famílias, da maternidade na adolescência. Contudo, se as
mulheres negras de 40 anos estão a limpar as casas da classe média portuguesa,
e se as suas filhas de 20 anos continuam a limpar exactamente as mesmas casas,
então isso significa que o elevador social não está a funcionar para os
afrodescendentes. E esse é um problema sério, que merece mais atenção e menos
gritaria.
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