quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Os totalitarismos como travão



É certo que sempre andou à solta, o maligno, até mesmo entre os deuses criados pelos Homens. Não é de hoje, vem nos livros, já Jeová, de quem ontem se falou, como Deus de Israel, tinha esse poder totalitário, outrora, bem castigador que foi, o Deus dos Cristãos, seguidamente, também assim se mostrando, através dos seus mandatários inquisitoriais, e hoje é mais o Alá muçulmano que faz alastrar impunemente os preceitos islâmicos de uma profunda ambição de poder exclusivista, em termos de teologia, em sociedades monoteístas, os homens que os representam usando bem, em nome da religião, os totalitarismos fanáticos irracionais do seu desprezo humano.
Mas trata de totalitarismo político, desta vez, a mando dos homens, portanto, a argumentação de Salles da Fonseca, neste seu sexto capítulo do seu magnífico trabalho de pesquisa histórica, aligeirada de uma vivacidade comentadora, segundo os parâmetros da sua ética, de sensatez preocupada, condenatória dos atropelos humanos, cada vez mais incontornáveis, a descambar no caos.
E a preocupação mais se estabelece, os totalitarismos passados impondo atrocidades, os totalitarismos de hoje mais mesquinhos do que nunca, as democracias de recente fabricação, no fundo aspirando ao totalitarismo de mais fácil execução governamental, os ideais democráticos sendo apenas uma capa protectora, para “inglês ver”, mas esburacada, de hipocrisia bem à solta, reconhecendo quanto a possibilidade de governar passa, sim, pelas aplicações totalitaristas, que o excesso de partidarismo desorganiza, como bem demonstra Salles da Fonseca, referindo-se às governações de hoje, ansiosas de totalitarismo, que as democracias desconcertam. E José Milhazes, do texto seguinte,  o mostra também, exemplificando as monstruosidades praticadas naqueles tempos de ditaduras, sem contemplação nem  laivos de humanidade.
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 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO,  30.01.19
Foi o académico francês Jean François Revel (1924-2006) que em 1976 glosou o tema da tentação totalitária fazendo-nos recordar, entre outros temas, que todo o político gosta muito mais de mandar sem oposição do que ter que aturar uns quantos «empatas» que só fazem é tolher-lhe a vontade e os feitos. A questão da fiscalização da governação pela oposição democrática é matéria que incomoda todos, por mais democratas que se intitulem e mesmo que neguem a pés juntos tal incómodo.
É muito ténue a fronteira entre a democracia musculada e o totalitarismo e todos estamos recordados do impacto que a teorização democrata teve no combate efectivo aos totalitarismos nos países vergados pelo comunismo. Sim, foi grão a grão que o muro de Berlim foi cavando a sua própria queda – com uma «ajudinha» do lado de cá pois íamos crescendo e eles falindo.
Julgávamos que o totalitarismo morrera mas esquecemo-nos de que a tentação totalitária, sub-repticiamente, persiste. E, donde menos se deveria esperar depois da «vacina lestiana», chega-nos pela mão esquerda sob pretextos tão variados como a necessidade de combate a um putativo desmembramento nacional versus a necessária unidade nacional, como a «vontade popular» de combate aos «abusos capitalistas» em defesa dos explorados, como a introdução de reformas radicais numa sociedade conservadora e avessa a mudanças «fundamentais».
Assim surgem os Partidos únicos nos Estados de constituição recente (por exemplo, Angola, Moçambique, etc. que assentaram praça sob o jugo soviético), as políticas autoritárias (por exemplo, a Venezuela e demais países sul-americanos em confronto mais ou menos aberto com os EUA), a propaganda de base doutrinária se não mesmo religiosa (por exemplo, a Turquia que, entretanto, apesar de membro da NATO, anda de namoro com o novo czar de todas as Rússias).
Tudo pretextos para se justificarem as ditaduras quando já julgávamos que a humanidade delas se tinha libertado.
Inocentes, fomos apenas wishful thinkers, uns tontos.
A diferença está em que a democracia, cúmulo de virtudes dos direitos humanos, tem que ser criada todos os dias e sem limite temporal enquanto as ditaduras, todas malignas sejam elas de que banda forem, são criadas da noite para o dia e apanham os inocentes desprevenidos.
Então, se no caso venezuelano a boçalidade do cenário de desespero humano e falência económica aponta para um final mais ou menos previsível e não muito longínquo no tempo, no caso turco – país de fronteira civilizacional – a coisa «pia muito mais fininho».
E é precisamente esta finura – mais do que o facto de eu conhecer a Turquia melhor do que a maior parte dos turcos – que me preocupa e me leva a orar às forças do bem que travem as suas opostas.
A ver…
COMENTÁRIOS:
Manuel Henriques:   30.01.2019  Meu caro Dr. Salles da Fonseca,  Muito obrigado por partilhar as suas reflexões e enormes preocupações com o que vai acontecendo e o que se prevê, mesmo sem ter uma " bola de cristal". Um abraço 
Anónimo  30.01.2019  A insidiosa, leia-se odiosa, ditadura erdogânica de pretenso cariz religioso (já alguém viu o estafermo rezar?) só é possível pq a U.E. paga mtos milhões ao mesmo para reter os refugiados no território, ou seja, a dita organização, paradigma de todas as virtudes é, por conveniência logística, compadre de um regime criminoso!!!

As datas que devem pôr a Humanidade de guarda /premium
OBSERVADOR, 7/1/2019
27 de Janeiro é o dia das vítimas do Holocausto e também o do fim do Bloqueio de Leninegrado, duas matanças que deveriam ter servido de vacina para sempre, mas cujo prazo de validade está a terminar.

Duas datas trágicas para a Humanidade: no dia 27 de Janeiro, é o dia das vítimas  do Holocausto e o fim do Bloqueio de Leninegrado, duas tragédias que provocaram muitos milhões de vítimas. Duas matanças que deveriam ter servido de vacina, mas, se serviram durante algum, o prazo de validade está a terminar. As forças malignas voltam a levantar a cabeça e ameaçam as sociedades democráticas modernas.
Há muitos descontentes com a situação na Europa, e têm razões para isso, a elite política afasta-se cada vez mais das necessidades reais dos cidadãos, a corrupção alastra, etc., mas, não obstante tudo, é preciso ter em conta que não há receitas rápidas para os problemas. Aqueles que prometeram o paraíso terrestre ao virar da esquina, voltam a fazê-lo de forma “light”, prometendo evitar exageros. Mas o resultado será igual: perseguições, campos de concentração, limpezas étnicas, opressão social. A sociedade europeia encerra ainda muito potencial evolutivo, reformista, e, como mostra a prática, as revoluções conduzem a becos sem saída.
É triste ver na Polónia, país que tanto sofreu devido ao nazismo e comunismo, forças ultraconservadoras, chauvinistas, xenófobas no poder. Mais triste ainda é ver que influentes sectores da Igreja Católica embarcam na onda de apoio a essas forças, não obstante o discurso do Papa Francisco ir no sentido contrário. Partidos extremistas estão no poder na Hungria, na Áustria, em Itália. A extrema-direita bate à porta do poder em países tão importantes como a França e a Alemanha.
Por isso, mais do que recordar o Holocausto, é necessário criar condições para que tal desgraça não se repita não só em relação a judeus, mas a qualquer outro povo.
Na Rússia, as autoridades decidiram assinalaram o 75º aniversário do fim do Bloqueio de Leninegrado com mais uma parada militar. Sobre isto apenas quero dizer que talvez fosse melhor canalizar o dinheiro gasto em paradas para o melhoramento da vida dos poucos habitantes da cidade que ainda continuam vivos. Foram 900 dias de fome e privações, de abandono e morte.
Como não podia deixar de acontecer na Rússia do Presidente Putin, esta data não podia passar sem uma “sábia decisão” dos dirigentes do país. Ainda o filme “Festa” estava a ser filmado, ainda ninguém o tinha visto, mas os “mais fiéis servidores do povo” gritavam para que ele não fosse exibido. Uma das acusações é que se tratava de uma “comédia”, o que seria inconcebível ao abordar um tema tão tenebroso como o Bloqueio de Leninegrado.
O realizador acabou por desistir da exibição em salas de cinema e colocou-o no Youtube para que os espectadores tirassem as suas conclusões. Eu e a minha mulher, alguns antepassados da qual morreram de fome durante o Bloqueio de Leninegrado, vimos esse filme com atenção. Claro que de cómico nem rasto, mas a causa do anátema contra o filme foi outra: o seu realizador tocou um tema sensível, quase tabu, a vida farta dos dirigentes comunistas da cidade de Leninegrado, enquanto que o povo tentava sobreviver à custa de meios impensáveis no século XX como o canibalismo.
Existem documentos com as ementas dos refeitórios especiais para os “camaradas dirigentes”, memórias, mas nada deve estragar a “versão heroica” da história.
“Festa” mostra os festejos de uma passagem de Ano Novo na casa de um professor que trabalhava num laboratório secreto, estava ligado ao Partido Comunista e, por isso, ele e a família tinham direito a produtos como pato, mortadela, champanhe, etc. O filho do professor leva uma jovem simples, por quem se apaixona, para a festa…
Fico-me por aqui para que os que queiram ver todo o filme não se sintam influídos pela minha posição.
O resultado da proibição da exibição do filme nos cinemas foi, como sempre, positivo para o realizador e actores: bem mais de um milhão de pessoas pesquisaram e viram o filme no Youtube.
Em Portugal, a extrema-direita continua a ser uma força marginal, embora a extrema-esquerda faça dela um monstro para justificar a sua própria existência. Veja-se a diferença entre as representações parlamentares de uma e de outra. Por isso, o que nos deve preocupar é a existência de forças de extrema-esquerda tão numerosas e de partidos como o PS as utilizarem como muleta. Os dirigentes socialistas também parecem ter-se esquecido das lições do passado, preocupando-se mais com o poder do que com o país. A oposição de centro e centro-direita perde-se em lutas internas, na criação de grupos e partidos. A democracia está cada vez mais pobre.
PS. Por coincidência, estas duas datas coincidiram com a publicação do meu novo livro “Os Blumthal”, mas trata-se de mero acaso. Os personagens do meu livro, reais, bisavós, avós e tios-avós da minha esposa e dos meus filhos e netos, viveram essas duas grandes tragédias, foram vítimas do nazismo e do comunismo. Por isso, quando decidi escrever esse livro, fi-lo para que a História não se repita e para que as gerações presentes e futuras não se deixem levar por novos/velhos cantos de sereia.

COMENTÁRIO:
Amora Bruegas > José Milhazes:
Lamentável a premeditada confusão que se faz entre o nazismo, socialismo alemão, e o fascismo, "socialismo" italiano, apelidando aquele como se fosse este. Acontece que NÃO foram! Tiveram parecenças? Com certeza que sim, tal como com outros regimes, caso das democracias...ou o genocídio de 3 milhões de indianos pelo "democrata" Churchill, o que foi, que mentalidade revela? Ou o aborto e a eutanásia actualmente, o que  revelam?


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