sábado, 19 de janeiro de 2019

Barco à vela a naufragar


Imagem de um pobre país sem navio, correspondente à imagem de um pobre Rio “poluído”, em mais um retrato magistral de Alberto Gonçalves, anotada também a defesa puritana do comentador Quartel, como ancoradoiro falsamente optimista, perversamente eufórico.
Onde vais Rio que eu canto /premium
OBSERVADOR, 19/1/2019
O dr. Rio passou pelo Colégio Alemão, pela Faculdade de Economia e pela vida em geral e, não obstante, conseguiu chegar aos 60 anos convencido de que o PSD é um partido de esquerda.
Havia, não sei se ainda há, uma deputada do PCP que desconhecia por completo a existência do Gulag. Interrogada a propósito, explicou que nunca estudara ou lera nada sobre o assunto. Sobre os presos políticos na China, confessou que não dominava “a fundo essa situação de modo a dar uma opinião séria e fundamentada”. Se tivessem continuado a questionar a senhora acerca de cada maravilha marxista, suspeito que a senhora teria continuado a professar ignorância acerca de todas, o que sugere que, para se ser comunista, ajuda não se fazer a mínima ideia do que é o comunismo.
Mas tamanho analfabetismo, deficiência cognitiva ou o que quiserem sugere também outras coisas. Lembrei-me da lendária entrevista à deputada Rita Rato (decerto um pseudónimo), ao ler, no Observador, a recente entrevista a Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda. Diz dona Catarina que no BE não se encontram sequer vestígios dos totalitarismos, das perseguições e do ódio normalmente associados à extrema-esquerda. Como não ousaria presumir que dona Catarina é mentirosa, deduzo que é portentosamente distraída: a julgar pelas atitudes das suas figuras ou através dos regimes que as suas figuras veneram e dos regimes que as suas figuras execram, o BE alimenta-se quase em exclusivo dos totalitarismos, das perseguições e do ódio. O BE, portanto, é de extrema-esquerda e a respectiva chefe não sabe.
Em Portugal, os profissionais da política ocupam tanto tempo a falar da importância da educação alheia que nunca arranjaram vagar para cuidar da própria. É provável que a dona Rita tenha reduzido a sua aprendizagem à leitura do “Avante!”, das obras completas de Alice Vieira e dos livros da Anita (“Anita Vai a uma Sessão de Esclarecimento” e “Anita Não Vai Procurar Emprego no Sector Privado” são clássicos óbvios). E a dona Catarina já afirmou que prefere cirurgiões especializados nos Monty Python do que formados em Medicina. Em lugar de organizarem “universidades” de Verão, as cúpulas partidárias fariam melhor em enfiar-se o ano inteiro numa. Ou pelo menos em explicações de português, no caso do dr. Costa. Ou num “workshop” de culinária, no caso da dra. Cristas.
O caso do dr. Rio – de que o longo mas desnecessário texto acima serve de introdução – é mais grave. Por norma, os políticos desfilam incultura para favorecer a sua agremiação. Aqui, é ao contrário. O dr. Rio passou pelo Colégio Alemão, pela Faculdade de Economia e pela vida em geral e, não obstante, conseguiu chegar aos 60 anos convencido de que o PSD é um partido de esquerda. Pior: todos os “notáveis” apoiantes do dr. Rio acham que o PSD é um partido de esquerda, que pertence à exacta esquerda representada pelo PS e que não deve obter nenhum voto que não se destinasse originalmente ao PS, cujo eleitorado aliás não desejam beliscar.
No fundo, o dr. Rio e o seu séquito não imaginam qual a utilidade do partido que conquistaram e, depois de reflectidamente renunciarem a constituir-se alternativa ao socialismo, concluem que a utilidade é nula. Não exagero: divagando em nome desta extravagante seita, a célebre pensadora Ferreira Leite prefere que o PSD encolha para valores residuais do que mereça a simpatia dos dois ou três milhões de reaccionários que o têm sustentado desde 1975. Não me lembro, em toda a História Universal dos Projectos Obtusos, de uma rapaziada tomar conta de um partido com o propósito de o afundar de seguida.
Para cúmulo, e por ironia, o dr. Rio e companhia (moralmente) limitada vão acabar com o PSD em nome do homem que o inventou. É claro que a interpretação póstuma da vontade de Sá Carneiro dá emprego a centenas de médiuns há décadas. Porém, não querendo concorrer com estes, não me recordo de Sá Carneiro defender a submissão do partido aos apetites de qualquer laparoto que mandasse no PS, a troco de uns cargos avulsos e humilhantes. Os actuais donos do PSD, que ouvem vozes do Além, garantem que sim. Quando se despreza o bom senso em prol de burlas paranormais, o resultado está à vista. Ou estará em Outubro.
Notas de rodapé:
Um relatório da OCDE considera-nos um país corrupto, em competição renhida com o Iraque e a Nigéria. Num ápice, o governo entrou em acção. Para reduzir a corrupção? Não: para censurar o relatório. É por estas e por outras que o Iraque e a Nigéria não têm hipótese connosco. Se duvidam, esperem pelos relatórios futuros. E pelo governo presente.
Nas ruínas do Waldorf-Astoria original, em cujo salão de baile passou seis meses como repórter de banquetes, congressos e palestras, o grande Robert Benchley proclamou: “Se estas paredes falassem, muito nos aborreceriam”. Se o cenário da recentemente cancelada (pela SIC) “Quadratura do Círculo” tivesse o dom da fala, o resultado seria um suicídio em massa. Ao longo dos anos, que pareceram séculos, de duração do programa, a irresponsabilidade do “zapping” levou-me a espreitar aquilo no máximo meia-dúzia de vezes. De cada vez, demorei-me apenas o tempo suficiente para perceber a cilada em que caíra e carregar desesperadamente no botão de avançar. Mesmo assim, foi tempo a mais. A parlapatice, o compadrio, o mofo e o vazio do exercício chegam para um indivíduo perder a réstia de esperança na humanidade. E sobram para a RTP ameaçar ressuscitá-lo.
COMENTÁRIOS:
Luisa Nunes Lourenço: As declarações da Manuela Ferreira Leite e a postura do PSD actualmente só justificam o porquê de desde o 25 de Abril não termos avançado nada e as melhorias no país ocorrerem quando vamos a reboque da economia mundial. Não há discussão política. E até pode haver confronto político e insulto mas não há discussão de ideias. Somos todos esquerda e vivemos na ditadura da ideologia de esquerda. Não sei como era antes do 25 de abril mas o que temos agora é pouco. 
Dr. Feelgood > Luisa Nunes Lourenço:  Era do melhor, antes da Abrilada. Havia respeito, acima de tudo, e como sabeis este é impagável. Agora é tudo uma autêntica tanga.
Carlos Quartel: Rio tem direito às suas convicções. Ele e o grupo que representa podem intitular-se de esquerda e insistir na paz podre que um "centro" proporcionaria.  Essa paz é a paz dos 48 anos de ditadura, com a pretensão de meter conflitos e problemas debaixo do tapete, é o ideal da sociedade harmoniosa, com toda a gente a sorrir. Só que essas sociedades não existem em liberdade. Existem no comunismo ou no fascismo, impostas pelo medo e pelo chicote. A liberdade implica confronto de ideias e de interesses, objectivos e anseios diferenciados. Vem isto a propósito da cegueira e da irracionalidade de querer impor a mais de 80% dos portugueses uma visão socializante, com um estado protector e mandão, que cuida dos cidadãos, como se fossem filhos. É o caminho certo para a estagnação, o oportunismo, a sorna, a esperteza saloia. O PSD de Rio será sempre uma extensão do PS de Costa e o seu objectivo é marginalizar quem saia dessa guião da felicidade eterna.  Com Rio, crescerão PC e BE, transformados em refúgio de quem não aceita a canga. Mas isto é muita areia para algumas cabeças ....
Estevão Vao: Porque é que Santana Lopes, que tinha +/- 50% do Conselho Nacional e apoio/reconhecimento de grande maioria dos militantes, preferiu sair do PSD e fundar a ALIANÇA?  Porque é que não aguardou pela sua vez desta vez e preferiu "desertar"? (Será que isto faz parte de um plano para derrubar a geringonça? Hipótese bondosa...) Será que a desilusão de Santana Lopes foi tão grande e imensa, foi insuportável, logo sentida no dia em que perdeu para Rio, e a solidão em que ficou foi superior a tudo? Pacheco Pereira não tem a grandeza de uma Zita Seabra. É uma pessoa oportunista que vive das so(m)bras do sistema. A ele se deve a situação actual.
Dr. Feelgood: RR foi, é e será o MAIOR flop no quadro politiqueiro deste país desde a pérfida Abrilada, seguindo na senda da desgraça que foi a criação do Condado Portucalense à porrada com a  correspondente continuidade em Abril.74 com a fantochada dos milicianos em África traidores à Pátria e arautos do comunismo que aqui vigora desde então. Rio, do alto da sua bimbalhice e incapacidade do tamanho dos Clérigos que o pariu, em vez de ser radical perante o PS, não - utiliza a velha máxima do " não podes vencer, junta-te a eles ". Dizem que se trata de uma nova atitude e nova forma de fazer política - só se for à moda do Porto onde no fim cada um paga o seu em vez da conta ser a dividir por todos. Quanto às damas das esquerdas, o meu pudor não me permite qualquer pronunciamento acerca de. Prefiro falar das verdadeiras profissionais do alterne MAS com as " mães de Bragança " a distância considerável.


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