Reino Unido – Japão: Comportamentos a considerar, no Continente Europeu? C’est là où le bât nous blesse? Pois! O
busílis da questão. Uma parte, pelo menos, que tem a ver com radicalismos ou
fanatismos opressores, quem sabe?
I – BREXIT: Um
‘Ovni’ britânico? Chama-se democracia… /premium
No debate britânico, não há violência nas ruas, nem ‘coletes amarelos’.
Tudo tem ocorrido ordeiramente no Parlamento — a mãe de todos os Parlamentos,
desde pelo menos a Magna Carta de 1215.
Tem
sido alvo de grande sarcasmo a sucessão de episódios e votações contraditórias
no Parlamento britânico na semana passada. Comentadores dos mais variados
quadrantes políticos concorrem entre si na nova grande competição politicamente
correcta: quem consegue ridicularizar mais o que se está a passar no Reino
Unido? Quem consegue sublinhar mais as ‘terríveis consequências’ da decisão
britânica de sair da União Europeia?
Talvez
um ténue conhecimento da história política europeia e das ilhas britânicas
pudesse ao menos gerar um prudente cepticismo face ao que se está a passar no
Reino Unido. E, já agora, uma prudente curiosidade comparativa com o que se
está a passar na maior parte dos países da União Europeia continental.
Primeiro aviso de prudência: no
debate britânico, não há violência nas ruas, nem ‘coletes amarelos’. Tudo tem
ocorrido ordeiramente no Parlamento — a mãe de todos os Parlamentos, desde pelo
menos a Magna Carta de 1215, cuja soberania foi reafirmada pela relutante
revolução conservadora-liberal de 1688 (a mais recente revolução ocorrida nas
ilhas britânicas).
Segundo aviso de prudência: não há nenhum ‘partido populista’ a protagonizar o
debate britânico. A grande divisão de opiniões e votações tem ocorrido
sobretudo no seio do mais antigo partido parlamentar britânico — o Partido Conservador.
Certamente por acaso (dirão os comentadores continentais), é também o mais
antigo partido da Europa, do Ocidente e, consequentemente, do mundo (que me
perdoem os defensores politicamente correctos da originalidade do Terceiro
Mundo).
Terceiro aviso de prudência: em contrapartida, na maior parte dos países
da Europa continental, os partidos clássicos (ainda que comparativamente
recentes, por padrões britânicos) estão a desaparecer e a ser substituídos por
novos partidos — sem memórias comuns, sem tradições, sem referências
ancestrais. O que eles defendem realmente ninguém sabe ao certo. E ninguém pode
seguramente saber, precisamente porque eles são recém-criados, são
tendencialmente revolucionários (da esquerda ou da direita), e não têm tradições.
Isto leva muitos analistas continentais a avaliar o eurocepticismo
britânico pelos padrões revolucionários continentais. Dizem que o ‘Brexit’ é
fundado no proteccionismo, na xenofobia e no ‘fechamento’ intelectual —
características que em parte podem ser atribuídas aos novos partidos
(designados de populistas) na Europa continental.
Nunca
fui defensor do ‘Brexit’ (porque acho que o Reino Unido faz muita falta à União
Europeia), mas também nunca acreditei nessas fábulas continentais contra os
‘brexiteers’ britânicos. Quem acompanhou a campanha do referendo no Reino
Unido, sabe muito bem que a campanha pelo ‘Brexit’ foi fundamentalmente
sustentada nos princípios da soberania do Parlamento nacional e da chamada
‘Global Britain’ — capaz de soberanamente praticar comércio livre com o resto
do mundo, não apenas com a União Europeia. Eram, basicamente, os princípios
defendidos pelo europeísmo céptico de Margaret Thatcher.
Parece
ser um facto, no entanto, que há pelo menos um ponto comum entre os
‘brexiteers’ britânicos e os novos partidos eurocépticos (chamados de
populistas ou nacionalistas) continentais. Poderíamos designar esse ponto comum
como ‘orgulho nacional’ ou ‘sentimento nacional’. Todos
eles parecem querer sublinhar a soberania nacional em contraposição a um
entendimento supranacional da União Europeia.
Quarto aviso de prudência: a
hostilidade contra o sentimento nacional é uma inovação gerada por um
entendimento particular (a meu ver sectário) do projecto europeu. ‘Mais Europa’ (no sentido de mais integração
supranacional) tornou-se o dogma comum de um certo tipo de alegados defensores
do projecto europeu. Trata-se de uma ilusória utopia dogmática, com raízes na
especificidade dogmática do Iluminismo continental.
Em boa parte, foi o dogmatismo supranacional que empurrou os britânicos
para o ‘Brexit’. Em grande parte, é o dogmatismo supranacional que está a
empurrar os eleitores continentais para os novos partidos ditos populistas. Aos
olhos do vanguardismo supranacional, o debate britânico no Parlamento parece um
‘Ovni’ (objecto voador não identificado) incompreensível. Mas o ‘Ovni’ tem
um nome que o vanguardismo supranacional tem dificuldade em identificar: chama-se
democracia…
II - JAPÃO:
Pegar o touro pelos cornos
Não
deixa de ser irónico que as potências por detrás da intransigência doutrinária
da Comissão Baleeira Internacional sejam as mesmas que, no século 19, exigiram
ao Japão que lhes abrisse os portos...
Foi
recentemente noticiado (aqui) que o
governo japonês decidiu pegar o touro pelos cornos, isto é, face à
intransigência da Comissão Baleeira Internacional na recusa da possibilidade de
coexistência da actividade baleeira comercial com as actividades de
conservação, o país decidiu, finalmente, abandonar a dita Comissão. Não se espera que a actividade baleeira nipónica,
que será limitada à zona económica exclusiva do país, venha ter qualquer
impacto negativo na conservação das espécies cuja captura passa a ser
permitida. Esta medida é, no entanto, importante do ponto de vista
civilizacional, na medida que é a recaptura de direitos ancestrais por um povo
insular que, desde que há memória, sempre caçou a baleia, direitos esses que
lhe vinham sendo negados desde 1986 por uma pequena camarilha de radicais e eco
terroristas coadjuvados por uma ainda mais minúscula clique de burocratas
incrustados em organizações internacionais e imbuídos de uma mentalidade
neocolonialista retrógrada e obscurantista.
Embora
a tradição japonesa seja muito antiga e rica em narrativas acerca de baleias,
tubarões, sakanas [nota 1] e outros entes aquáticos e bichos
costeiros, a seguinte narrativa publicada por um anónimo do século 19 ilustra
bem os perigos de tentar pegar uma flor pelos espinhos (o floricídio é agora
desavergonhadamente promovido pelos defensores das cobras e lagartos [nota 2])
e as vantagens de se usar papel de alumínio no seu manuseio.
“De
entre todos os juristas da Nação e por todo o número dos magistrados do
Império, nenhum ganhou tanta fama – no domínio da minúcia de processo e de
precedente, de argúcia na investigação e no interrogatório, na dispensa de
clemência para com os arrependidos, de compaixão para com os ludibriados e
despojados dos seus direitos, de severidade para com os malfeitores
empedernidos, de sabedoria no julgamento e bondade na decisão –, do que Ōoka
Echizen no Kami Tadasuke [1677—1752], aquele que viria a ser o mais famoso Machi Bugyō, da cidade de Edo, de que há memória. Nunca se
recusou a ouvir nenhum caso, por mais estranho ou trivial ou difícil que
pudesse parecer, nem nunca deixou de punir o crime e o vício e a mentira nem de
recompensar a bondade e a virtude e a veracidade. Mesmo antes de se tornar
magistrado na capital xogunal, fez alguns julgamentos que marcaram a história
judicial do Império. O seu primeiro caso ocorreu pouco depois de se ter
tornado bugyō, isto é, magistrado, de Yamada, em Ise.
(…..)
(O autor não segue a grafia do novo Acordo
Ortográfico. Nem a do antigo. Escreve como lhe apetece.)
[nota 1] Sakana . 1. Peixe.
2. Quem
age com esperteza ou malandrice. 3. Político, especialmente da espécie que
tem por habitat natural as regiões ocidentais da Península Ibérica (sakana
lusitanae) e que substituiu o piolho (pediculus capitis) na estima das
populações. [nota 2] Uma recente campanha de conspurcação ideológica da
linguagem (noticiada aqui), promovendo o ódio anti-floral, demonstra bem os
preconceitos e a sanha selvanária que alguns animais nutrem contra esses seres
sensíveis, belos e pacíficos que são as flores (e as plantas em geral).
Espera-se que surja em breve, no nosso país, um movimento da defesa da flora
que pugne pela abolição imediata desses antros de opressão e morte que são as
floristas e os campos de pasto: que qualquer vaca apanhada em flagrante a comer
erva (i.e., pelo crime de herbicídio) seja morta e esquadrejada (e vendida para
bifes! — enquanto o sushi de baleia não chega às nossas casas de pasto).
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