quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Comentário a “A essência do progresso, 9”

Finalizou Henrique Salles da Fonseca a sua séria empreitada de detectar anomalias na condução do nosso sistema educativo, no seu trabalho de pesquisa e orientação sobre aquilo que é fulcral numa sociedade para que o progresso exista - «A Essência do Progresso”. Ao longo dele, vários foram os comentários dos seus leitores e algumas as lições que deles se colheram também.


Destaco, de ISAIAS AFONSO a 7 de Fevereiro de 2012, o comentário que segue, sobre a crise que atravessamos e todas as que já atravessámos, por conta de uma “praxis”específica, creio que sem ideal nem bom senso, em que se acentua uma espécie de parasitismo endémico com o dinheiro exterior, dos emigrantes, a equilibrar as finanças, como outrora se fazia com o trabalho escravo e as remessas provenientes das terras conquistadas:


«O diagnóstico das nossas endémicas crises está feito. Recorrendo a Marx, o problema reside na "praxis". Sabemos e sentimos que a crise existe, mas como sair dela? O nosso amigo Salles da Fonseca indica alguns dos caminhos, salientando que o factor humano é extremamente importante.
Duarte Ribeiro de Macedo, na sua obra do século XVII, Da Introdução das Artes Neste Reino, que ilustrou a tese de António Sérgio sobre As Duas Políticas Nacionais, a da Fixação e a da Circulação ou Transporte, afirma: NEMO NOS CONDUCIT, ninguém nos conduz, ninguém emprega os nossos braços e daí a mórbida emigração.
Um terço da população total do país encontra-se emigrada, numa espécie de "transumância", na procura de melhores condições de vida, que Sabatino Moscati, na sua obra “L'Orient avant les Grecs”, acrescentou ser a "Primavera dos Povos".
Legitima esta movimentação populacional, a qual esvaziou o país, mas serviu de almofada ao desemprego conjuntural e estrutural. Ganharam-se as remessas dos ausentes, proveitosas para a nossa balança de pagamentos e até comercial, mas o país despovoou-se, criando vácuos no interior e macrocefalias urbanas ao longo do litoral.
Temos um país desequilibrado e aceitámos imigrantes, como "compensação populacional" ou como equilíbrio num sistema de vasos comunicantes. Com eles sustentamos a Segurança Social e também a solução para o nosso deficit demográfico. Nunca conseguimos uma Política de Fixação, nem da riqueza nem das pessoas. Preferimos a Política de Circulação ou Transporte, errando pelo Mundo em constante "Peregrinação", mas transportando para regiões longínquas os produtos doutros países para as trocas comerciais. Transformámo-nos em meros intermediários para prejuízo das nossas manufacturas. Na última década, diz-se, mais de 700.000 portugueses procuraram outras paragens que não Portugal.
Em 2011, foram para o Brasil 52000 e Angola já acolhe 130.000.
No século XVI, com as especiarias, criámos o "Período do Ócio", em que os escravos faziam todo o trabalho em Lisboa e os burgueses passeavam em liteiras, aos ombros dos negros.
O encorajamento à facilidade do crédito, no nosso tempo, levou à compra de casa própria, do automóvel, das férias no Brasil ou nas Caraíbas, na compra de mobiliário, nos aparelhos das novas tecnologias, nos almoços e jantares constantes fora dos lares e hoje e no futuro esmolamos de mão estendida à caridade, porque NEMO NOS CONDUCIT.»


Segue o último texto de Salles da Fonseca, que propõe várias pistas a que, modestamente, chama la palissianas, mas propensas a reflexão, e, provavelmente, com diversidade de pontos de vista:

« Como alcançar os objectivos enunciados anteriormente?

Com vista à discussão, eis algumas pistas bem la palissianas:

• O ensino obrigatório tem que ser gratuito; o que estiver para além dele – público ou privado – tem que ser pago pelos utilizadores com base em propinas cujo nível seja livremente definido.
• Num cenário de analfabetismo adulto tão escandaloso, não se justificaria que a alfabetização fosse alcandorada a objectivo fundamental da República?
• Num cenário de abandono escolar precoce tão grande, que curricula devemos privilegiar – profissionalizante ou generalista?
• Deve a disciplina escolar continuar a ser prejudicada pelo princípio de que é proibido expulsar os vândalos?
• À Escola compete educar ou instruir?
• Deverão as Ordens (profissionais) continuar a condicionar o acesso às profissões ou bastará a homologação governamental dos cursos?

Há que discutir estas questões com a maior seriedade e sem as demagogias a que nos quiseram habituar nestes decénios passados pois são as pessoas que fazem a diferença entre os países ricos e os outros países.»

FIM

E mais uma vez, se aponta a seriedade corajosa de Salles da Fonseca, no seu apelo final: «Há que discutir estas questões com a maior seriedade e sem as demagogias a que nos quiseram habituar nestes decénios passados pois são as pessoas que fazem a diferença entre os países ricos e os outros países.»

E o meu comentário, sem demagogia:

«Os parâmetros propostos no texto “A essência do progresso, 9” de Salles da Fonseca, para um ensino sério, de facto, parecem tão evidentes que dificilmente deverão ser contestados: a gratuitidade do ensino oficial, a alfabetização maciça do mundo adulto – (com o consequente aumento dos níveis de empregabilidade docente, o que seria excelente, para um país a esfarrapar-se).
Em caso de falhanço no ensino generalista, optar pela via profissionalizante mas com critérios de exigência e de rigor, como preparação para a cidadania e respeito pelo trabalho, e mesmo para uma continuidade possível no estudo, em termos de seguimento em cursos superiores, como se fazia dantes com as Secções Preparatórias dos Ensinos Técnicos.
Cremos que o rigor na disciplina exige meios drásticos e uma chamada à responsabilização das famílias, ao invés de se apaparicarem os meninos com os falsos conceitos de uma liberdade, fraternidade e igualdade que não são mais do que abertura para a licenciosidade e a perversão, com o desrespeito pelas normas e o desinteresse pelas matérias do saber, sem o que, a não ser invertido o processo, jamais viveremos numa sociedade construtiva de gente competente e disciplinada.
Quanto ao sentido de Escola, creio que se põe demasiado em causa o papel do professor, na tola pretensão de minimizar o seu trabalho pela relevância dada actualmente aos saberes dos alunos, que muitas vezes trazem como consequência a desestabilização, o desinteresse, o vazio, o ruído e a perda de tempo, que seria mais bem utilizado na exploração e orientação feita pelo professor, com o auxílio dos seus materiais de apoio esclarecedores e a intervenção dos alunos quando solicitados ou quando o desejo de saber os levasse a participar.
Naturalmente que ao papel da Instrução se aliará o da Educação que a Escola não deve minimizar, mas que não pode sobrepor ao objectivo fundamental de abrir caminhos culturais.
Ideal seria que tais condicionalismos no acesso às profissões se não fizessem sentir, desde que as provas dadas pelos formados fossem suficientemente explícitas de valor pedagógico e científico positivos, descontados, evidentemente, os factores exteriores de influência negativa, tantas vezes castradores das actuações docentes.»

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