quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

«Alguém devia mandá-lo calar»


Comecei por apontar o paralelismo entre a linguagem verbal e gestual no discurso do dirigente Seguro do PS, a sua seriedade comedida resultante do perfeito equilíbrio entre os dizeres sobre o prolongamento dos prazos de pagamento da dívida troikista para os naturais amortecimentos da nossa dor populista e a posição dos dedos e das mãos de Seguro explicando simultaneamente o fenómeno da filosofia por si expendida, os dedos polegar e indicador em via paralela inicial, progressivamente as mãos afastando-se e finalmente unindo-se no aprumo das conclusões, lantejoulas assinalando o compasso.

Parece que a minha amiga não se sensibilizara com essas imagens etéreas, que a mim pareceram sintomáticas de uma certa categoria mental por Eça bem caracterizada nos seus conselheiros Acácios, não já só na sua respeitabilidade, convencionalismo e vazio formais, mas “enriquecido” numa gestualidade não para surdos-mudos mas para “ceguinhos” (intelectualmente falando) necessitados de apoio figurativo, específico dos novos tempos de animação pedagógica.

A minha amiga despejou o seu parecer, com iracúndia:

- Já devia estar calado. Alguém devia mandá-lo calar. Ele quer ser primeiro ministro. O que ele pede é que seja alargado o tempo, esquecido de que eles autorizaram a entrada da Troika.

               E continuou rapidamente, que o nosso tempo é escasso e ela tinha as medidas cheias das novidades :

            - A Ferreira Leite ontem falou desse Seguro, para ver se ele se cala. Está a fazer a promoção para ver se nas próximas eleições vai lá. Mas parece que vivemos num filme de terror. A corrupção faz-se com o maior descaramento e no entanto há políticos que vêm contar tim-tim por tim-tim. Estes novos parece que querem pôr o país normal. Em milagres não acredito.

            E acrescentou com ênfase:

- Agora eu pergunto: Porquê vocês políticos deixaram chegar o país a tal miséria da corrupção? É porque, se falassem, iam para a rua! Hoje os da Justiça já se atrevem a dizer que há corrupção nela!

Eu gravava afanosamente as frases num guardanapo do café, pois esquecera o bloco, na pressa de ir apanhar o ar diário do meu convívio habitual! E a minha amiga citava imparável:

- O Correio da Manhã transcreve a conversa entre Sócrates e Arouca sobre a forma de definição do curso do PM. Parecem dois anormais! O Arouca reitor de uma Universidade! A forma como se baixa ao pedido do Sócrates e cozinham o currículo! Só porque é ministro! E a forma malcriada com que Sócrates se refere aos investigadores da conclusão desse curso! Depois há os outros casos miseráveis, que foi tudo parado. Então um país vai viver assim? É miserável! Os cartões de crédito dos ministros para usarem na sua vida social… Há de ver as importâncias! O direito que eles têm de gastar! Dão-lhes uma pequena fortuna! A Ferreira Leite diz que o mal do país é que, quando chegou o euro toda a gente ficou a pensar que o país era rico. Mas o mal não está aí! O mal está no roubo. Foi qualquer coisa de extraordinário: "Vamos aproveitar ao máximo!" Criaram-se empregos fictícios – assessor de imagem! Mulheres criadas à moda! Mas isto é um país de quê? E porque é que estes economistas não tinham antes esta percepção?

- Com efeito! – arranquei eu finalmente, já levantada, na pressa dos afazeres domésticos. - Tanto Ferreira Leite como Medina Carreira da entrevista de Judite de Sousa já tiveram cargos no governo. Como foi com eles?

De longa data se vira o disco que toca o mesmo. Dalida o disse: “Parole! Parole! Parole!”




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