sábado, 14 de abril de 2012

A hora fatal


Transcrevo um problema de matemática para o 3º ano, copiado do quadro de uma escola pelo aluno:

“No sábado à tarde, a Laura encontrou-se com a Leonor. Às 16h 35, o Francisco juntou-se às duas amigas. Trazia cromos repetidos dos quais deu metade à Leonor. Como ainda tinha metade dos cromos resolveu fazer uma troca com a Laura. Deu-lhe 18 cromos repetidos e recebeu 8 cromos que ainda não tinha. Regressou a casa com 48 cromos. Quantos cromos tinha o Francisco levado?”

Um problema folclórico, cheio de dados para enganar.  A referência inútil ao dia e à hora, a referência a uma Leonor que podia não ter entrado na história, a quem o Francisco deu metade dos cromos repetidos que não são para figurar no raciocínio, mas apenas para o atrapalhar. Os únicos dados que contam são os sublinhados:  Os 48 cromos com que chegou a casa, os 8 que a Luísa lhe deu, que portanto ele não tinha (48-8=40), os 18 que ele deu à Luísa e que portanto ele tinha (40+18=58). Como 58 correspondem a metade dos seus cromos, deduz-se que teria o dobro: (58X2= 116).

E assim, por meio de raciocínios tortuosos se ensinam as crianças, que, naturalmente, a menos que sejam muito bem dotadas, não vão compreender.

O mesmo direi da divisão. No 3º ano não se exige a resolução da operação, com dividendo, divisor, quociente e resto, mas apenas ao nível da compreensão da palavra repartir. O que tem como resultado, por vezes, em números maiores, a decomposição do número em milhares, centenas, dezenas e unidades, cada um desses números de ordem, assim dividido, dificultando mais a compreensão do que pela forma prática da aprendizagem antiga.

Dou um exemplo fácil: 9999 berlindes a repartir por três meninos: Começo por decompor por ordens: 9000+900+90+9; segue-se a repartição de cada ordem por 3: 3000+3000+3000+300+300+300+30+30+30+3+3+3. Soma-se cada parcela diferente: 3000+300+30+3= 3333 berlindes a cada um dos meninos.

É claro que, antes de chegarmos a estas altas especulações, já se tinham usado números mais pequenos, para distribuir por sacos ou meninos igualitariamente.

Não compreendo a insânia destes métodos que pretende desenvolver os raciocínios juvenis complicando, através de um rebuscamento impróprio para as suas idades, quando seria muito mais eficaz a aprendizagem da divisão como processo inverso da multiplicação e com os seus trâmites próprios: em 9 quantas vezes há 3…

Foi, talvez, através destes rebuscamentos do nosso empolamento precioso, que no nosso país as divisões resultaram em multiplicações estrondosas, porque houve tempo para lhes torcer os trâmites, autênticas bacanais de arrojo em todos os níveis. Evoé!

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