Num mundo de
manigância
Até o cabelo
tem importância.
É o caso do
sujeito
Que quis
casar a preceito,
Embora já
com idade
Para opção
de mais qualidade.
Mas só
quando se viu pelado percebeu
A vil
falcatrua em que se metia,
E é claro
que do casamento desistiu,
Segundo La
Fontaine escreveu
Sem qualquer
fantasia:
«O
homem de meia idade e as suas duas conquistas»
«Um homem
de meia idade,
Já a
puxar para o grisalho,
Julgou chegado
o momento,
De pensar
em casamento.
Ele possuía
bom metal sonante
E por
conseguinte
Tinha por onde
escolher.
Todas
faziam por lhe agradar;
Daí que o
nosso pinga-amor,
Desconfiado,
Não tivesse
pressa em se definir.
Não é
pequena coisa
Esta coisa
de bem acertar.
Duas
viúvas, finalmente,
Se impuseram
no coração amante:
Uma de verde
idade,
A outra um
pouco mais madura,
Mas que
reparava, com arte,
O que
destruíra a mãe-natura.
As duas
viúvas brincando,
Rindo, acarinhando,
Iam-no penteando,
A cabeça
ajustando.
A cada
momento a velha levava
Um cabelo
preto que restava
A fim de
que o amante ficasse
Mais à
sua maneira.
A nova,
por seu turno, retirava
Os pelos brancos
Para que
com ela ele melhor emparelhasse.
Ambas
fizeram de tal maneira
Que a cabeça
grisalha
Ficou sem
cabelos.
Duvidou
da partida canalha.
“Dou-vos
as minhas graças, senhoras,
Que tão
bem me tosquiastes,
Ganhei mais
do que perdi, eu vos garanto:
Porque não
há mais casamento.
Aquela que
eu escolhesse
Quereria que
eu vivesse
Ao modo
dela e não ao meu
Pelo Céu!
Não há
cabeça calva que suporte tal decisão.
Estou-vos
grato, senhoras, pela lição.»
Só La
Fontaine, de facto, para nos fornecer
Uma tal
história de esperteza
De gente que
aproveita qualquer meio
Para comer até
à custa do cabelo alheio.
Pela mesma
época o nosso Vieira
Lançava uma
diatribe estridente,
Contra os
comedores dos próprios defuntos,
A o explicar,
em anáfora estridente,
De frases
paralelas em ironia insistente,
De
trocadilho mais que penetrante,
No “Sermão
de Santo António aos Peixes”
Que “ainda
o pobre defunto o não comeu a terra
E já o
tem comido toda a terra.”
Hoje em dia
nem é bom falar,
Nessa coisa
do comer,
Tal o
regabofe e os meios de espoliar
De alguns,
que outros há
Que não têm comer
nenhum,
Diz-se por
cá.
Até só
apetece adormecer,
Ou o “Columbo”
ver,
Ou como diz
Antero, “deixá-la ir, a vida”.
Mas só como
piada despida
De fundamento,
Santíssimo
Sacramento!
Nenhum comentário:
Postar um comentário