Falou-se do seu discurso bem talhado, tal como era “bem talhada” a donzelinha da cantiga paralelística do poeta Afonso Sanches, filho bastardo de D. Dinis, a qual “estava d’amor ferida” porque “o que bem queria” não lhe aparecia, fazendo-a dirigir-se em refrão a Nosso Senhor para que lhe valesse: “Ai Deus, val!”, coitadinha, embora ela só se denunciasse como “coitada”: "Com’estou d’amor coitada”, ou seja a sofrer da coita de amor por quem lhe faltava aos encontros, apesar de tão “fremosinha”.
A minha amiga apreciou, pois, o discurso oratório bem talhado do nosso ex P.M., e eu, cautelosamente, não o depreciei, pois até gosto de admirar nos outros uma arte que em mim falha, além de outros dados negativos dos meus falhanços biográficos que não vêm ao caso, mas sempre fui lembrando o cansaço do repetitivo, do “déjà vu”, do muito gasto, no seu poder comunicativo, vibrando ora em insolências ofensivas aos adversários políticos, ora em requebros de vitimização, ora - como anteontem, dia da sua derrota eleitoral – em argúcias sentimentais, de renúncia a cargos e promessa de exemplaridade familiar, sempre de muito efeito na nossa população de pendor virtuoso e até melodramático, como o provam o nosso fado e os heróis de vida errante que tanto prezamos, do tipo Zé do Telhado, com quem em tempos se comparara o nosso ex P.M., só por aquele ser - ao que se diz, por influência das memórias analistas do cárcere do nosso romântico Camilo – uma alma caritativa e não só em proveito próprio, pois muito repartiu pelos pobrezinhos, depois de ter extraído as economias, geralmente pela força, aos mais abastados.
Aliás, também se falara no Robin dos Bosques, pela mesma altura, como paralelo de muito maior distinção tanto para o nosso P.M. como para nós, seu povo extremoso. Ultimamente, porém, não se falou mais em paralelos enaltecedores da caridade ministerial, por outros percalços do seu arrojo governativo. E hoje ele assumiu a responsabilidade da derrota do PS face ao PSD e foi bonito de ouvir, fez parte da sua arte comunicativa, devidamente posta em relevo pelos seus adeptos comovidos.
Mas, de facto, o que a minha amiga acentuou foi a oportunidade que o nosso ex PM teve de se safar em boa altura, com a carne que recolhera fartamente, e deixando os ossos duros de roer para os que não se poderão furtar a roê-los, se tiverem dentes para isso.
- Ele saiu na hora H, disse ela. Saiu contente, sem pesos na consciência, segundo informou.
Mas imediatamente lembrou que não podia alargar-se neste tipo de comentário, receando que um céu sinistro lhe caísse em cima da cabeça, tal como Abracourcix receava, e devemos prever todas as possibilidades do destino e acreditar no previdente chefe gaulês dos queridos Uderzo e Goscinny, que preencheram de encanto as adolescências dos nossos filhos, e as nossas idades adultas por arrastamento.
Por isso, escrupulosamente, a minha amiga mudou de assunto. E eu mudei com ela, que também às vezes jogo à defesa, não a cantar o fado, como fazia o Carlos Ramos com a sua linda voz, quando a tristeza o invadia. Preferimos rir.
Em jeito de auto-estima, enquanto não chegam mais ossos descarnados às nossas vidas e às dos que amamos.
A minha amiga apreciou, pois, o discurso oratório bem talhado do nosso ex P.M., e eu, cautelosamente, não o depreciei, pois até gosto de admirar nos outros uma arte que em mim falha, além de outros dados negativos dos meus falhanços biográficos que não vêm ao caso, mas sempre fui lembrando o cansaço do repetitivo, do “déjà vu”, do muito gasto, no seu poder comunicativo, vibrando ora em insolências ofensivas aos adversários políticos, ora em requebros de vitimização, ora - como anteontem, dia da sua derrota eleitoral – em argúcias sentimentais, de renúncia a cargos e promessa de exemplaridade familiar, sempre de muito efeito na nossa população de pendor virtuoso e até melodramático, como o provam o nosso fado e os heróis de vida errante que tanto prezamos, do tipo Zé do Telhado, com quem em tempos se comparara o nosso ex P.M., só por aquele ser - ao que se diz, por influência das memórias analistas do cárcere do nosso romântico Camilo – uma alma caritativa e não só em proveito próprio, pois muito repartiu pelos pobrezinhos, depois de ter extraído as economias, geralmente pela força, aos mais abastados.
Aliás, também se falara no Robin dos Bosques, pela mesma altura, como paralelo de muito maior distinção tanto para o nosso P.M. como para nós, seu povo extremoso. Ultimamente, porém, não se falou mais em paralelos enaltecedores da caridade ministerial, por outros percalços do seu arrojo governativo. E hoje ele assumiu a responsabilidade da derrota do PS face ao PSD e foi bonito de ouvir, fez parte da sua arte comunicativa, devidamente posta em relevo pelos seus adeptos comovidos.
Mas, de facto, o que a minha amiga acentuou foi a oportunidade que o nosso ex PM teve de se safar em boa altura, com a carne que recolhera fartamente, e deixando os ossos duros de roer para os que não se poderão furtar a roê-los, se tiverem dentes para isso.
- Ele saiu na hora H, disse ela. Saiu contente, sem pesos na consciência, segundo informou.
Mas imediatamente lembrou que não podia alargar-se neste tipo de comentário, receando que um céu sinistro lhe caísse em cima da cabeça, tal como Abracourcix receava, e devemos prever todas as possibilidades do destino e acreditar no previdente chefe gaulês dos queridos Uderzo e Goscinny, que preencheram de encanto as adolescências dos nossos filhos, e as nossas idades adultas por arrastamento.
Por isso, escrupulosamente, a minha amiga mudou de assunto. E eu mudei com ela, que também às vezes jogo à defesa, não a cantar o fado, como fazia o Carlos Ramos com a sua linda voz, quando a tristeza o invadia. Preferimos rir.
Em jeito de auto-estima, enquanto não chegam mais ossos descarnados às nossas vidas e às dos que amamos.
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