quinta-feira, 2 de junho de 2011

Corridas

- Ferreira Leite disse que não estava ali para escolher um primeiro ministro, mas sim para correr com este. Ela foi muito franca. Eu tenho a impressão de que toda a gente ficou espantada. Ninguém esperava que ela fosse dizer aquilo. Ela até pediu desculpa ao Passos Coelho. Evidentemente que lhe deu um grande apoio. Ela disse isso tudo, não era preciso dizer mais nada. Que ele tem apoio dela, tem.
Aí, eu rebati. Achei que não tinha tanto apoio assim, que se eu fosse o Passos Coelho até me sentiria enxofrado com a deselegância de ouvir dizer na minha cara que ela não vinha para me eleger ministro mas para correr com o outro, se possível fosse, até da oposição.
Foi muito brutal quanto a mim, Manuela Ferreira Leite, mas viu-se que tem fibra, ao mostrar-se tão sincera diante de tantas pessoas, não só relativamente a José Sócrates, que, aliás, há muito o tem revelado, mas agora relativamente a este moço em ascensão, não sei se pela mão de algum poderoso do seu partido. Que as promoções são coisa da nossa natureza, desde que possa, e por isso até se diz que Sócrates fez uma data delas, à sorrelfa.
O Passos Coelho ouviu educadamente, sorrindo, já que ele aparenta ser educado e saber ouvir, pelo menos agora, enquanto está a pedir que o escolham, mas não sei se quando for ministro não votará a Manuela Ferreira Leite ao ostracismo, para castigo da brutalidade verbal desta antes de ele ser aquilo a que aspira, brutalidade reveladora de que há aspectos na personalidade de Passos Coelho que ela aceita mal, inteligente como é, tal como outros do seu partido, como Pacheco Pereira, o que eu acho mal, agora que precisamos de unir esforços, mesmo que não seja tão para bem da Nação como se desejaria, porque há muitas lacunas, por todo o lado.
Era, de facto, preciso que todos se unissem e guiassem o Passos Coelho, em vez de o agredirem, pois ele diz-se honesto, que é do que se precisa por cá. Para que não se deixe corromper pelo fascínio do poder ter, coisa que mais tem acompanhado os governantes daqui, de há trinta e tal anos para cá, como lepra que nos vai roendo, carcomendo, desfigurando, desfibrando , desfeando, golpeando, sem parança.
Eu preferia, todavia, que, em vez de ostracizar Ferreira Leite futuramente, para castigo do seu atrevimento discursivo, ele a escolhesse para um bom cargo ministerial, que a fizesse tomar conta da nossa nau, carregada não de ouro, canela, marfim, e menos de florete de espadachim, por falta de mosqueteiros, mas carregada de dívidas difíceis de saldar, se não escolherem alguém decente que cumpra os compromissos e saiba como fazê-lo, preferivelmente sem tanto desfalque sobre o povo.
Mas reconheço que tais desejos não passam de pobres miragens que logo se desvanecerão, segundo a minha amiga que insiste na sua frustração e que continuou no seu comentário:
- Ninguém quer largar o tacho, e a maior parte das pessoas não examina o cancro da governação de mentira. Agora, quando os economistas falam, assustam a gente até à quinta casinha. Eles dizem o pior, dizem o que nós nunca tínhamos ouvido. Aquela minha amiga, que nunca falou destas coisas disse-me : “Mas olha lá, a gente vai parar onde?” Ora, mas aquelas almoçaradas… Eu se fosse ao Passos Coelho, fazia exactamente o contrário do Sócrates, que arrebanha o povo e oferece umas prendas. Ofereceu aos miúdos uma mochila com comida lá dentro.
Eu ainda comentei que isso da mochila era uma coisa mais palpável do que a promessa dos duzentos euros no banco para os dezoito anos dos nascituros de agora, e que até podia servir para os recolher do banco, nessa altura, ou os dos filhos deles, mas a minha amiga cortou-me a palavra, que ela é que lê estas notícias dos escândalos de aliciamento e trapaça:
- São todos iguais. Menos o Portas. Também não tem estatuto. Comeu sardinhas. O povo deve pensar assim: “Se eles comem à fartazana, a gente também tem direito.” Dá vontade de dizer: “Já basta tanto arraial!”
Mas eu redargui que o arraial nos estava no sangue. E assim o fado, também já muitas vezes o frisei.

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