Mais um
texto poderoso de Vasco Pulido Valente, saído na Opinião do Público de
26 de Maio, historiando os factos de decomposição de um país desde os tempos do
Ultimato, que a revolta badaleira do povo, a acrescentar à degradação
financeira, conduziria ao regicídio e ao governo republicano caótico, de
sucessivas mudanças governativas, durante
dezassete anos, com mais quarenta e
poucos de prudente estabilidade, e já quase quarenta a retomar o caos da falta
de união e do interesse de todos em volta do osso pátrio, por descarnado que esteja.
É uma lição
de história em que se deve atentar:
«O
Ultimato da Inglaterra de 1890 e a crise financeira que veio logo a seguir em
1891-1892 fizeram cair a monarquia. Talvez que, por si só, passada a histeria
do momento, o ultimato não tivesse chegado. Mas, pouco a pouco, a crise financeira
desmantelou o regime. Primeiro, houve anos de governos constitucionalmente
irregulares (como agora na Grécia e na Itália). E, dali em diante, quando se
tentou voltar à “normalidade”, com um ou outro pretexto, os dois partidos “dinásticos”
(o equivalente ao “centrão” desta nossa República) não conseguiram aguentar a
sua velha coesão e acabaram por se dividir em facções, que tornaram Portugal
ingovernável e a república certa. Quem julga que, passada a crise, em 2020 ou
2030, tudo voltará, como devia, ao seu sítio próprio, está muito enganado.
Os
sinais já se vêem no comportamento do PS. Influenciado ou entusiasmado pela
eleição de Hollande, o PS resolveu adoptar a retórica do “crescimento”: e
proclama o “falhanço” da troika como se ele fosse uma espécie de triunfo
privado, enquanto gaba os méritos de um “crescimento” imaginário, de que, de
resto, não dá o mais leve pormenor e que, a existir, no essencial não depende
dele. Mas nada disso aparentemente incomoda o sr. Seguro, que não hesitou em
entrar numa pequena guerra com a maioria, para se decorar com uma vantagem “táctica”
e em “descolar” da troika para exibir a sua independência. O sr. Seguro
anda com certeza muito feliz, porque não percebeu ainda que prejudica o país
com estas ridículas manobras e que, além disso, põe em causa a existência do PS ou, se preferem, a
estabilidade da República.
As
grandes coisas nascem das pequenas. Uma inclinação, ou mesmo uma simples
vacilação, do PS para a esquerda pode provocar (e até já provocou) dissidências,
não inteiramente inócuas, que tarde ou cedo tornarão a esquerda caótica e, na
prática, impotente e que forçarão uma parte da direita para um populismo de
sobrevivência. Nessa altura, Portugal não negociará com a troika, porque
ninguém quererá negociar com ele. O Syriza é uma festa como foi o PREC, não é
uma solução política. E os portugueses que sofrem, não apreciam com certeza as
manobras de partido ou os puros sentimentos da “inteligência”, quando, em
última análise, eles só servem para complicar a situação e não resolvem nada. A
crise é um problema sério para pessoas sérias.»
Infelizmente,
seriedade é o que menos se vê cá por casa. Muita lamúria, muita gritaria, pouca
reflexão. A vitória de Hollande não contentou só Seguro que, levianamente, e
usando sempre os mesmos discursos redondos, em torno dos mesmos motivos de
compaixão e ataque, parece estar a libertar-se das amarras do compromisso a que
fora forçado pelas próprias responsabilidades no desastre nacional. E os outros
partidos, igualmente com leviandade e falsa piedade, deitam achas na fogueira
das virtudes de defesa do pobre povo desarrimado, cinicamente libertos da
responsabilidade governativa e por isso férteis em truques de promessas ou de
levantamento de elementos condenatórios dos que governam.
Esperava-se
que este Governo se comportasse como prometera, com hombridade, seriedade,
trabalho, eficiência, desejo de vencer. Mas a cada passo vêm à tona informações
de erros, lapsos, arrogâncias, mentiras, vaidades, tal como se detectara nos
governos anteriores.
E embora
desejando confiar nele, por aqui andamos, às voltas, querendo manter uma luz de
esperança, mas, como há 38 anos, apenas vibrando com os articulados críticos de
jornalistas ou de historiadores de bom senso, enquanto assistimos ao resvalar
de um país que, aparentemente melhorado nas suas estruturas físicas, foi perdendo
em sentido pátrio e humano, em degradação espiritual que, provavelmente será o
aspecto mais vilmente atraiçoador da nossa existência como nação.
Resta-nos confiar
no bom senso dos professores, para irem segurando o barco do aparelho
educativo, mau grado as péssimas condições em que se efectua a sua orientação
pedagógica.
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