Um artigo
de Henrique Neto, «Portugal no centro geográfico e logístico do mundo»,
que saiu no Expresso de 3 de Dezembro, com o subtítulo “O país tem de
ser o local ideal para a integração de
componentes em produtos”, deixou-nos em êxtase, à minha amiga e a mim, pela
sua objectividade e rigor construtivo, e logo nos lembrámos da frase pronunciada
em tempos por Cavaco Silva, de que o destino de Portugal estava no mar, sem,
todavia, ter esclarecido a sua asserção, pelo menos que tivéssemos dado conta
disso, o que motivara então várias chufas da minha amiga, que gosta sempre de
tudo muito esclarecido, e até fizéramos apostas sobre se iriam de caravela para
o tal futuro, ou antes nos actuais submarinos da nossa polémica inextinta, a
minha amiga, a pretexto da nossa situação submersa, achando que só os submarinos
estavam à altura de nos fazer emergir do poço presente. Por isso resolvi
transcrever o texto de Henrique Neto, para compreender finalmente o pensamento
parcimonioso de Cavaco Silva e manter a luz da esperança que deixou na nossa
alma, há muito em apuros, como a maioria das almas dos nossos compatriotas.
«Acredito,
como a generalidade dos analistas, que sem crescimento económico não será
possível cumprir o défice previsto para 2013, como não se cumpriu o previsto
para este ano. Ou seja, além do endividamento excessivo, a década de estagnação
económica é o problema principal. Propor uma solução credível para este
problema é o objectivo deste texto.
Em
primeiro lugar, é essencial saber para onde queremos ir e adoptar uma
estratégia clara e conhecida de todos os agentes económicos, nacionais e
internacionais. Pessoalmente, perfilho a síntese estratégica contida na Carta
Magna da Competitividade, apresentada, em 2003, pela AIP, que coloca Portugal
no centro geográfico e logístico do mundo globalizado, como plataforma
simultaneamente europeia e global. A partir daí a mais importante medida reside
em tornar o Porto de Sines no maior porto europeu de “transhipment”,
vencendo a concorrência espanhola e marroquina de Algeciras/Corunha/Tânger Med,
o que nem é difícil, dada a posição geográfica de Portugal e já deveria ter
acontecido há dez anos.
Trata-se
de uma medida de consequências múltiplas porque permite: (1) que a
economia portuguesa tenha à sua disposição transporte marítimo frequente de
ligação a todos os continentes; (2) como resultado, atrair o investimento
estrangeiro de empresas industriais integradoras, que recebam de todo o mundo e
em condições de custo, os componentes e os sistemas de que necessitam e
exportemos seus produtos finais pelo mesmo porto; (3) as empresas nacionais
produtoras de componentes e sistemas terão assim o seu mercado interno alargado
e melhores condições de exportação; (4) a partir do momento em que Sines
seja o porto de escolha dos novos navios gigantes, Portugal será demandado por
uma multiplicidade de navios mais pequenos, que nos ligarão a todos os portos
da Europa. Ou seja, transformar Portugal no local ideal para a integração de
componentes em produtos.
Paralelamente
a estes objectivos, realizar uma campanha intensa junto dos empresários
portugueses no sentido de transformar os diferentes sectores industriais que
actuam por subcontrato num “cluster” de produtos, aproveitando as
capacidades já instaladas e com o objectivo de subir na cadeia do valor.
Sectores já existentes, como a engenharia de produto, prototipagem, moldes e
ferramentas, robótica e automação, indústrias de plásticos, de estampagem de
metal e de fundição, material eléctrico, vidro e cerâmica, embalagem e
informática, serão alguns dos sistemas envolvidos. Trata-se de replicar o
que aconteceu há quinze anos quando se criaram as condições para que o sector
produtor de componentes e sistemas para a indústria automóvel passasse de
exportar cerca de 300 milhões de euros para os actuais 7 milhões.
Uma das
razões por que as exportações portuguesas, relativamente ao PIB, são metade
das exportações dos países europeus da nossa dimensão, deve-se a que a nossa
indústria está excessivamente concentrada no subcontrato e com uma dimensão
limitada em produtos finais de maior incorporação de valor. Assim, exportar
mais em valor é essencial para nos aproximarmos da produtividade dos outros
países europeus da nossa dimensão.
O espaço
que me é concedido para este texto não me permite tratar muitas outras áreas em
que sem excessivo investimento se pode fazer crescer a economia. Apenas
mais dois exemplos: a criação de linhas de crédito para a execução de
encomendas firmes e a redução em 8% da TSU às empresas dos sectores de bens transacionáveis,
aumentando a taxa no mesmo valor para as empresas produtoras de bens não transacionáveis.
Em resumo, paremos de falar e de escrever sobre a necessidade de fazer crescer
a economia sem dizer como isso se faz.»
Para tranquilizar a minha amiga a respeito da idoneidade profissional de Henrique
Neto, até lhe levei uma informação sobre
ele, colhida na Net:
«Em 1975, com o Engº Joaquim Menezes,
fundou a empresa Iberomoldes que através da aquisição e fundação de novas
fábricas, se tornou numa das maiores organizações mundiais do sector.
Em 1992 fundaram a SETSA, a primeira
empresa nacional de engenharia, especializada no desenvolvimento de novos produtos
e fabrico de protótipos com tecnologia e conceitos mundialmente inovadores.»
Regressámos
ao assunto da nossa perplexidade, sobre se era a estes projectos de Henrique
Neto que Cavaco Silva se referia quando informou sibilinamente que o futuro de
Portugal estava no mar, sem se justificar, mas continuámos perplexas, quer a
esse respeito, quer ao das propostas de Henrique Neto, sabendo como nos
arrastamos por aqui, sem cobertura económica que dê andamento às suas propostas
megalómanas, além de que, a serem viáveis, logo os entraves burocráticos, que
só têm paralelo com a habitual facúndia dos analistas salvadores da pátria,
abafariam os projectos construtivos de homens como Henrique Neto, cujo êxito na
vida parece ter resultado de dinamismo empreendedor e de trabalho real.
E a minha
amiga, sempre derrotista, lembrou ainda os media como factor de travagem ao
êxito das empresas, por se porem logo a investigar as vidas dos seus
empreendedores, sobretudo interessados no escandalozinho sensacionalista que
faz progredir as suas próprias empresas mediáticas.
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