segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Quaternário


Estamos numa era de uxoricídios
Um palavrão de graves vícios
Que implica má preparação
Cívica e cultural
Que nos é muito natural
Como uma condenação
Pouco abonatória
 – Direi mesmo vexatória -
Da nossa condição social,
Em Portugal.
Ela justifica outros maus tratos
De crianças e de velhos, de animais,
E tantos mais,
O que nos penaliza em inúteis exaltações
De comoções
Sem resultados práticos.
O tema dos conflitos familiares, afinal,
- De violência doméstica, como consta -
É universal
Já o disse Florian, um fabulista
Novecentista
A propósito de pássaros
De oposta compleição:
«A pega e a pomba»
«Uma pomba tinha o seu ninho
Ao pé do ninho de uma pega.
Chama-se a isso, sem descortesia,
Arranjar fraca companhia,
Mas, por ora, não é
Dessa anomalia que vos damos fé.
Na casa da rolinha era tudo
Felicidade e amor;
No outro ninho, eram só questões,
Ovos partidos, discussões,
Rumor.
Quando do seu esposo ela levava pancada
- Bicada, para maior precisão -
A casa da vizinha ela logo vinha,
Falava, chorava,  gritava danada,
Passava em revista
Os defeitos do seu esposo sacrista:
“ - Ele é altivo, exigente, duro, violento,
Ciumento,
Além de que eu sei muito bem
Que ele vai visitar umas gralhas
Ao calhas”;
E cem outras coisas parelhas
Ela dizia na sua raiva despeitada,
Desgraçada…
“ - Mas vós, responde a rolinha,
Sensata e boazinha,
Não tendes também defeitos?”
“- Claro que tenho, isso que fique  entre nós.
Em conduta, em propósitos, sou de grande ligeireza,
Coquete até mais não, irosa, com certeza,
E divertindo-me a valer
A fazê-lo enraivecer.”
“ – Mas isso é um exagero, minha cara,
Começai por vos corrigirdes,
O vosso humor poderá irritá-lo…”
“ –Chamais-me minha cara?
Logo a interrompe a pega bera:
« Eu ? Mau humor? Como? Conto-vos os meus males
E  vós injuriais-me?
Acho-vos uma graça irritante,
Se não, pedante!
Adeus, impertinente;
Ocupai-vos dos vossos filhotes,
Esses rolinhos franganotes;
Concordámos na questão dos defeitos,
Mas apenas para que sejam desmentidos,
Com todos os preceitos,
Não para que nos sejam criticados
Com tais trejeitos
Atrevidotes.”»
 
Ninguém gosta, com efeito,
De ser assacado de defeito,
Mesmo que sejamos às vezes os primeiros,
Modestamente,
A levantar a lebre dos nossos argueiros,
Para seguidamente,
Iradamente,
Apontarmos as trancas
Nas carrancas
Que temos defronte,
Que não merecem perdão,
Isso não!












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