segunda-feira, 29 de abril de 2013

Nossa!

La Fontaine, ao que parece,

Leio na Internet,
Colheu no italiano Astémius,
Fabulista quatrocentista,
O tema da sua fábula “A Aranha e a Andorinha”,
Segundo a qual,
A Aranha pretendia,
Sem qualquer ironia,
Caçar também a Andorinha
Na sua teia infernal.
Mas como se saiu mal,
Logo se impôs a lição
Sobre o excesso de ambição
Que destrói incautos pedantes,
Que as forças não meçam antes.

«A Aranha e a Andorinha»
«”Ó Júpiter, que do teu cérebro soubeste
Por um inédito parto secreto,
De discutível acerto,
Gerar Palas Atena, minha inimiga outrora
Por, de pura inveja,
Eu bordar tão bem como ela,
Escuta o meu pranto, por uma vez que seja.
Progne, a andorinha, irmã de Filomela,
- Esta em rouxinol transformada,
Sem culpa formada -
Vem sempre à minha porta
Roubar-me os meus pedaços de sustento,
Girando em caracol, fendendo o ar e as águas.
Ela tira-me as moscas da minha horta,
Minhas, posso dizê-lo; e a minha teia
Estaria delas cheia, não fora
Esta maldita Ave,
Pois teci-a de matéria resistente.”
Assim, com um discurso insolente,
Se não mesmo imprudente,
Se queixava a Aranha, tapeteira outrora,
E que, agora fiandeira,
Pretendia apanhar com bastante ardor
Qualquer insecto voador
Para comer.
A irmã de Filomela, atenta à sua presa,
Apesar da bestazinha, a Aranha,
- De atalaia, perto da sua teia -
Apanhava, para os seus filhotes,
Alegria impiedosa para ela,
Sempre de vela,
As moscas no ar,
Que, com os bicos sempre abertos, os seus filhos glutões,
Em tom meio formado, ninhada pipilante,
Pediam com os seus gritos, ainda indistintamente.
A pobre Aranha não tendo mais
Que cabeça e pés,
Supérfluos artesãos,
Foi ela própria apanhada na bicada.
A Andorinha ao passar, levou a teia e tudo,
E o animal pendente
Na ponta da sua conta.
Júpiter para cada estado , ou seja,
Condição social,
Pôs duas mesas no mundo,
Mas não foi por mal,
Antes, como distribuição natural:
O hábil, o vigilante e o forte estão sentados
À primeira mesa;
E os pequenos, mal alimentados,
Comem, com presteza,
Mas com agonia funda,
Os restos daqueles, na segunda.»

 La Fontaine, como se vê,
Seguiu outra indicação
Na sua lição,
Mais cá à nossa maneira:
Trata-se da distribuição
Dos bens deste mundo
E do requinte das mesas
Segundo a mesma condição
De usarmos ou não
Bem as cabeças.
Mas também os pés e as mãos
São auxiliares profundos
Nos desvairos deste mundo.
La Fontaine não o disse
Porque apesar de tudo o que disse,
Não era tão bera
O tempo de outrora
Como é o de agora.

Mas é tempo de dizer - fora!
A tanta discrepância,
A tanta violência
A tanta ânsia
De abundância,
Mesmo quando não fosse nossa
A massa.
Poça!
Não há quem o impeça?
 

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