Mais um
retrato em tom caricatural saído da pena de Vasco Pulido Valente sobre esta
geração de gente nova a conduzir com mais estrondo do que sabedoria os destinos
de uma nação há muito desgovernada por outros novatos ou mesmo por gente mais
velha – para o caso tanto fez – que, com belos discursos de salvação nacional –
conduziram o país à perdição. Parece que irremediavelmente.
Recordo
medidas como a Reforma Agrária e outras ocupações ilícitas com que os
esbanjadores da fraternidade democrática iniciaram os atropelos judiciários
para usufruto pessoal e dos amigos. Foi isso, salvo erro, em tempos do PREC,
mas outras medidas se foram tomando, ao longo destes 39 anos, de alargamento da
bolsa e de cuidados de saúde para colmatar, aparentemente, anteriores mesquinhezes
salazarentas de salários baixos e deficientes cuidados sanitários num país que,
aliás, sempre assim vivera - e não só na ditadura - ressalvando é claro, os
altos salários e bem-estar de outras grandezas que tanto marcaram os nossos
desequilíbrios sociais ao longo dos quase nove séculos da nossa existência como
nação. Distribuíram-se pensões e vencimentos mais elevados e mesmo reformas
antecipadas com grande largueza, que possibilitou que a auspiciosa classe dos
deputados, por exemplo, auferisse de reformas chorudas ao fim de meia dúzia de
anos de sonolência no hemiciclo parlamentar.
Tivemos,
é claro, que estender a mão a uma Europa Unida, para podermos ser generosos com
os nossos e para criarmos aqui estruturas modernizadoras, e nos habituarmos a
um estatuto de novos-ricos com dinheiros emprestados. Fartámo-nos de viajar, no
“faça férias e pague depois”, tivemos mais carros que mais nenhum país
que trabalhe para viver decentemente. E telemóveis… E acabámos com a produção.
Abandonámos os campos, abandonámos as pescas, deixámos de produzir, por
imposição, ao que se diz, da solidária Europa.
Construíram-se
muitas rodovias, muitas casas também, os bancos insistiam para que comprássemos
casa, a pagar numas dezenas de anos. Nunca tivéramos nada, passámos a ter casa,
carro, telemóvel, férias no estrangeiro, mostrámos que somos alguém. E quem nos
meteu nisso ganhou muito mais, é certo, a corrupção alastrou, numa teia de
incalculável força que liquidava o país, para o que contribuíam umas políticas
de ensino permissivas de mândria, de indisciplina, de desrespeito pelos saberes
e pela autoridade do professor.
E tendo
manifestamente razão no retrato que faz Vasco Pulido Valente sobre os actuais
governantes ou outros chefes políticos, não posso deixar de considerar o quanto
outros chefes anteriores foram tanto ou mais responsáveis do que estes, que
pretendem agora liquidar, numa terapia talvez maniqueísta e precariamente unilateral,
mas esforçadamente honesta, na dureza e aparente insensibilidade das suas
medidas, uma dívida monstruosa, em que todos colaborámos, sem que vozes se
elevassem, dos mais responsáveis, apelativas do bom senso. Que vozes discordantes
e sabedoras são agora praticamente todas, até de governantes anteriores que
colaboraram nas progressivas medidas da ruína nacional.
Mas
mais ainda que a destruição do emprego e o empobrecimento em que, afinal sempre
vivemos, o que assusta deveras é uma mocidade sem vitalidade a não ser para a “curtição”
física, para que as regras actualmente impostas de proibição do álcool para
menores de 16 anos chamam a atenção. Não sendo, felizmente, geral, esse factor
de miséria moral e física que tão bem denuncia o desprestígio da família e do
próprio ensino na nossa sociedade, ele é suficientemente trágico para a nossa
ruína como nação.
Por
isso, os actuais chefes, formados à sombra dos respectivos partidos, se falham
em termos de competência política, demonstram uma determinação que talvez os jovens
actuais, indecisos e abúlicos, educados sem motivações de trabalho, nem cheguem
a manifestar algum dia. Mas as ambições daqueles nem sequer diferem das
ambições e incompetências dos chefes anteriores. No caso de Passos Coelho, pelo
menos, há uma ponderação de honestidade, no desejo de saldar a monstruosa dívida
que se impunha, para bem da nação, se a nação tiver vergonha.
O que parece mal é que, havendo tantos que
contribuíram para a dívida, esses não sejam chamados a terreiro para pagar o
que sacaram. O povo, como sempre, é que paga.
Como
diria o saudoso António Variações, “Quando a cabeça não tem juízo…”
Eis o artigo
de Pulido Valente, A Nova Geração, saído no Público de Domingo, 28 de
Abril:
«O
discurso inaugural do dr. Seguro no Congresso do PS deu à coisa um tom de
resignação e melancolia quase de fazer chorar. Muito bem vestidinho e
penteadinho, imberbe e respeitoso, o dr. Seguro tem o ar inescapável de um
eclesiástico de fresca data. Parece um padre novo, ainda ignorante dos pecados
da congregação, mas com as lições do seminário na ponta da língua. Recitou
aplicadamente uma longa homilia, com uma voz monocórdica e um ou outro acesso
de exaltação, destinado a entusiasmar os crentes. Só que os crentes não se
entusiasmaram; responderam sempre com indiferença e umas palmas fracas para não
estragar a liturgia. Sem uma vaia a Cavaco e a pequena agitação quando se falou
de António Costa e Francisco de Assis, ninguém acreditava que a maioria daquela
gente não estava a dormir.
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