Já tinha
lido o texto de Henrique Raposo sobre Mário Soares, mas achei um nobre texto
para o meu blog, a dar-me razão naquilo que há muito penso dele, de um “Esteves
sem metafísica”, como tantos de nós por aí, e o escrevi em livros da minha
reacção. Entre eles, o texto “Mesa Redonda na Têvê”, de Cravos Roxos
(1981) que termina da seguinte forma: “Deus Nosso Senhor dê muita vida para
as justificações ao Dr. Mário Soares”.
Agora rio-me
desses desejos. Mário Soares não precisa de se justificar, inimputável –
segundo Henrique Raposo – numa sociedade de mentecaptos que não se envergonha
das figuras que ele fez ao longo de uma vida de serenidade lorpa a repisar o
velho estribilho de liberdade e democracia, enquanto era levado no palanque do
seu nudismo real.
Transcrevo,
do mesmo velho artigo, o seguinte passo de um retrato amarelecido de verdade
inútil: “Preocupado com uma definição exacta, o meu amigo doutor juiz
repetiu conscienciosamente a de “saloio espertalhão” atribuível à sua personalidade
de “leader” com muitas viagens embora de visão moderada, no seio de uma
população com escassez das duas, o que justificava o provérbio sobre a realeza
do zarolho na terra dos cegos.”
Henrique
Raposo o define com mestria, eu apenas recordo alguns factos do meu desprezo,
entre os quais uma entrevista a ele feita e ao seu comparsa espanhol Filipe
González, creio, em que este falou de reformas e trabalhos no seu país de
progresso, com argumentação de quem estudou e conhece, e Soares apenas se
limitou aos velhos slogans da democracia, igualdade e liberdade, por, de reformas
para o progresso do seu país não ser minimamente conhecedor, definitivamente e
exclusivamente embasbacado para o seu umbigo que o alcandorou ao palanque de
uma realeza de bobo, que resolve prolongar para além do tempo, com a conivência
dos que precisam das suas palhaçadas para mais facilmente atingirem o estado da
anarquia, nos seus falsos pruridos de generosidade soez e em alarido.
«D. Mário Soares I, o Inimputável» de Henrique
Raposo
O
ocaso de Mário Soares está a ser uma espectáculo lamentável. Durante os anos
Sócrates, Soares não se distinguiu dos demais capangas socráticos na defesa do
chefe. Ante as trapalhadas e mentiras de Eng., o ex-Presidente usou a cassete
dos Lellos desta vidinha. Um pouco triste, não? Soares não se comportou como
“pai da democracia” (uma contradição em termos, diga-se), mas como pai do PS.
Não mostrou a dignidade do senador, mostrou os dentes do jotinha. Porquê? Para
Soares, a democracia é o PS e o PS é a democracia; o PS é a única linha
dinástica legítima nesta monarquia republicana chamada III República. Aliás,
naquela cabeça, o regime é o ele mesmo, o regime é o próprio Soares, D. Soares
I.
Esta
presunção de superioridade dinástica subiu de tom após a subida ao poder do
actual governo. Numa linguagem arruaceira, Soares tem sugerido um incremento da
violência social. Qual miguelista invertido, Soares anda a sonhar há meses com
várias Marias da Fonte. E, neste fim-de-semana, passou dos limites quando disse
o seguinte sobre Cavaco: “por muito menos do que isto foi D. Carlos morto”.
Isto é a linguagem de taberna arsenalista, é uma linguagem vergonhosa para um
ex-Presidente de uma democracia. Mas, claro, D. Soares I não se sente numa
democracia onde ninguém está acima de crítica. D. Soares I julga que está no
seu reino, a monarquia republicana onde todos lhe devem respeitinho.
Mas
o pior é o silêncio dos média. Soares pode dizer o que quiser. Pode ter atitudes
machistas perante eurodeputadas, pode lançar snobeira contra o homem de
Boliqueime, pode gozar com os contribuintes quando o seu carro é multado, pode refazer à vontade a sua biografia
, pode ser um mero apparatchik do PS, pode até acenar com violência política,
pode tudo isto porque passa sempre entre os intervalos da chuva. Ele é o Rei, e
o Rei, como se sabe, nunca se molha mesmo quando vai nu. Enquanto esteve no
poder, D. Soares nunca se molhou porque recebeu sempre um tratamento
principesco nas redacções (Joaquim Vieira explica
). Agora, depois da reforma, é tratado como um ser inimputável. Ou seja, Mário
Soares passou as últimas décadas numa redoma situada acima do bem e do mal.»
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