segunda-feira, 7 de abril de 2025

Na realidade


Putin, um homem de realização bem explícita, pese embora o irrealismo monstruoso de tanta fealdade moral, Polifemo de atalaia na cadeira do seu covil, que um “Ninguém” de passagem, engana com a coragem da sua perseverança. Mas Polifemo continua de atalaia, na irredutibilidade da sua embriaguez de glória e vã cobiça. Até quando?

Mundo / Guerra na Ucrânia

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Em directo/Zelensky manda ministros intensificar contactos com parceiros em matéria de defesa aérea"

Zelensky deu "instruções ao ministro da Defesa e ao ministro dos Negócios Estrangeiros para intensificarem os contactos com os parceiros em matéria de defesa aérea”, escreveu no Telegram.

MARIANA MARQUES TIAGO:Texto

Actualizado Há 9h

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

OBSERVADOR, 7/4/25

Momentos-chave

Há 12hNúmero de mortos no ataque de ontem em Kryvyi Rih sobe para 20

Há 13hMacron defende “acção forte” se a Rússia continuar a “recusar a paz”

Há 14hZelensky afirma que Moscovo quer manter capacidades de ataque no mar Negro

Há 15hKiev vai enviar equipa aos EUA para negociar novo esboço do acordo sobre minerais

Há 16hZelensky mandou ministros "intensificar contactos com parceiros em matéria de defesa aérea"

Há 16hNovas negociações entre Rússia e EUA poderão acontecer "já na próxima semana"

Há 17hReino Unido encontra sensores russos usados para espiar submarinos

Há 17hEdifício de canais públicos ucranianos ficou destruído com ataque russo

Há 21hAtaques russos "são resposta de Putin aos esforços diplomáticos internacionais", diz Zelensky

Há 21hRússia ataca capital ucraniana durante a madrugada

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MADALENA MOREIRA

O que aconteceu até agora:

Volodymyr Zelensky, Presidente da Ucrânia, anunciou novos ataques com mísseis russos a partir do mar Negro, acusando Moscovo de bloquear deliberadamente um cessar-fogo e de distorcer a diplomacia para manter a capacidade de atacar cidades e portos ucranianos. Zelensky destacou que há duas prioridades principais: a defesa aérea e o reforço dos contingentes militares, o que levou a instruções para intensificar contactos com parceiros internacionais nesta matéria.

O Presidente francês, Emmanuel Macron, condenou os ataques russos recentes sobre várias cidades ucranianas, incluindo Kiev, e pediu uma acção forte se a Rússia continuar a recusar um cessar-fogo. Macron sublinhou a necessidade urgente de alcançar um cessar-fogo e lamentou que a Rússia continue as hostilidades, mesmo após a Ucrânia ter aceite uma oferta de cessar-fogo total e incondicional mediada pelos Estados Unidos.

Um ataque de míssil russo a Kiev resultou na destruição parcial de um edifício que albergava os escritórios de canais públicos ucranianos que transmitem em línguas estrangeiras, embora sem causar feridos. Este é um dos vários ataques registados durante a madrugada, afectando distritos da capital como Darnitsa, Obolon e Solomiansk, e causando incêndios em vários edifícios.

Sensores alegadamente russos foram encontrados no fundo do mar da Grã-Bretanha, aparentemente destinados a espiar os submarinos nucleares britânicos. A Royal Navy britânica localizou alguns destes dispositivos, enquanto outros foram acidentalmente levados para a costa. Esta situação foi revelada por uma investigação do Sunday Times, que apontou Moscovo como responsável por colocar tais dispositivos nas águas britânicas.

Há 12h19:05 Madalena Moreira

Número de mortos no ataque de ontem em Kryvyi Rih sobe para 20

O número de mortos no ataque russo de ontem à cidade natal do Presidente ucraniano subiu para 20, avançou o responsável pela administração militar da cidade, citado pelo Kyiv Independent.

Um homem de 57 anos morreu hoje no hospital. Entre as restantes vítimas mortais do ataque russo com mísseis balísticos estão nove crianças. O ataque feriu ainda 75 pessoas, entre as quais 15 continuam hospitalizadas. Outras duas crianças estão em estado crítico.

Há 13h18:01 Agência Lusa

Macron defende “ação forte” se a Rússia continuar a “recusar a paz”

O Presidente francês, Emmanuel Macron, lamentou hoje os novos “ataques mortais” da Rússia na Ucrânia e apelou a uma “acção forte” se Moscovo continuar a “recusar a paz”.

“Estes ataques russos têm de acabar. Precisamos de um cessar-fogo o mais rapidamente possível. E de uma acção forte se a Rússia continuar a procurar ganhar tempo e a recusar a paz”, defendeu o chefe de Estado francês na rede social X.

Nesta publicação, Macron denunciou que, no sábado à noite, “vários ataques russos tiveram como alvo áreas residenciais” na capital Kiev e em várias outras cidades ucranianas.

“Enquanto a Ucrânia aceitou a oferta do Presidente Trump de um cessar-fogo total e incondicional de 30 dias há quase um mês, e enquanto trabalhamos com todos os nossos parceiros em maneiras de alcançar a paz, a Rússia continua a guerra com intensidade crescente, ignorando os civis”, salientou o Presidente de França.

Há 14h16:51 Madalena Moreira

Zelensky afirma que Moscovo quer manter capacidades de ataque no mar Negro

Volodymyr Zelensky afirmou que a Rússia lançou hoje novos ataques com mísseis a partir do mar Negro e acusou novamente Moscovo de bloquear um cessar-fogo de forma consciente — os Estados Unidos têm estado a mediar uma trégua marítima que impede estes ataques.

“Esta é uma das razões por que a Rússia está a distorcer a diplomacia, por que está a recusar um cessar-fogo incondicional — eles querem preservar a sua capacidade de atacar as nossas cidades e portos a partir do mar”, acusou o Presidente ucraniano no seu habitual discurso diário.

Há 15h16:45 Agência Lusa 

Kiev vai enviar equipa aos EUA para negociar novo esboço do acordo sobre minerais

Kiev vai enviar uma equipa a Washington na próxima semana para iniciar as negociações sobre um novo esboço de acordo que daria aos EUA acesso aos recursos minerais da Ucrânia, anunciou hoje a ministra da Economia ucraniana.

“O novo esboço do acordo dos EUA mostra que a intenção de criar um fundo ou investir em conjunto se mantém”, afirmou Yuliia Svyrydenko à agência Associated Press, durante uma viagem ao norte do país.

A delegação de Kiev incluirá representantes dos ministérios da Economia, dos Negócios Estrangeiros, da Justiça e das Finanças.

“O que temos agora é um documento que reflecte a posição da equipa jurídica do Tesouro dos EUA”, disse Svyrydenko, para quem “esta não é uma versão final, não é uma posição conjunta.”

“É evidente que os parâmetros completos deste acordo não podem ser discutidos ‘online’”, adiantou a ministra, salientando a necessidade de os dois lados se encontrarem presencialmente para avançar com as negociações.

Há 16h15:05 Mariana Marques Tiago

Zelensky mandou ministros "intensificar contactos com parceiros em matéria de defesa aérea"

“Está a ser preparada uma reunião. Dei instruções ao ministro da Defesa e ao ministro dos Negócios Estrangeiros para intensificarem os contactos com os parceiros em matéria de defesa aérea”, detalhou o líder ucraniano no seu canal do Telegram.

Segundo Volodymyr Zelensky, “há duas tarefas principais: a primeira é a defesa aérea e a segunda são os contingentes, aproximando o mais possível todas as decisões, trabalhando todos os pormenores.

Há 16h14:53 Mariana Marques Tiago

Novas negociações entre Rússia e EUA poderão acontecer "já na próxima semana"

Novas conversas entre Rússia e EUA para atingir um cessar-fogo na Ucrânia poderão acontecer “já na próxima semana”.

A hipótese foi colocada em cima da mesa por Kirill Dmitriyev, presidente do Fundo Russo de Investimento Directo (RDIF) e enviado especial de Putin, em entrevista ao Channel One citada pela agência noticiosa TASS.

No entanto, até ao momento não há nenhuma confirmação oficial de que tal vá acontecer.

Há 17h14:42 Mariana Marques Tiago

Reino Unido encontra sensores russos usados para espiar submarinos

Nas profundezas do mar da Grã-Bretanha estavam escondidos sensores alegadamente russos, que teriam como objectivo espiar os submarinos nucleares do Reino Unido, avança o Sunday Times.

Alguns destes aparelhos foram localizados pela Marina Real britânica, enquanto outros terão dado, acidentalmente, à costa.

O Sunday Times levou a cabo uma investigação jornalística de três meses, na qual falou com mais de 12 antigos ministros da Defesa, assim como membros das forças armadas britânicas.

Segundo o jornal — que não cita fontes e não quis detalhar em que locais terão sido colocados os sensores — Moscovo terá sido responsável por colocar os dispositivos nas águas, com o objectivo de obter informações sobre os quatro submarinos britânicos Vanguard, que têm a capacidade de transportar mísseis nucleares.

Há 17h14:07 Agência Lusa

Edifício de canais públicos ucranianos ficou destruído com ataque russo

Um ataque de míssil russo sobre Kiev destruiu parcialmente, durante a noite, um edifício que albergava os escritórios de canais públicos ucranianos que transmitiam programas em línguas estrangeiras, sem causar feridos, noticiou este domingo uma cadeia de televisão.

“Durante a noite de 6 de abril, um ataque de míssil balístico russo sobre Kiev causou uma destruição significativa nos escritórios que albergam espaços editoriais da empresa de difusão estrangeira do Estado da Ucrânia”, anunciou a cadeia de televisão Freedom, em comunicado, acrescentando que a sala da redacção ficou destruída.

Nenhum funcionário ficou ferido neste ataque, segundo a mesma fonte.

Os três últimos andares do centro empresarial onde estavam instalados os canais de televisão ficaram completamente destruídos, existindo uma grande cratera nas imediações, referiu aquele meio de comunicação social.

Há 21h10:09 Mariana Marques Tiago

Ataques russos "são resposta de Putin aos esforços diplomáticos internacionais", diz Zelensky

“O número de ataques aéreos está a aumentar… Durante a última semana, lançaram mais de 1460 bombas aéreas guiadas, quase 670 drones de ataque e mais de 30 mísseis de vários tipos contra cidades e aldeias ucranianas”, escreveu Volodymyr Zelensky no seu canal de Telegram.

O primeiro-ministro ucraniano aproveitou a publicação para confirmar os ataques desta madrugada: “Esta noite usaram mísseis balísticos contra Kiev e drones de ataque na região. Também foram efectuados ataques nas regiões de Mykolaiv, Sumy, Kharkiv, Khmelnytskyi e Cherkasy.”

Para o líder ucraniano, “estes ataques são a resposta de Putin a todos os esforços diplomáticos internacionais”, até porque “cada um dos países parceiros percebeu que a Rússia ia continuar a lutar e a matar”. “Não pode haver um abrandamento da pressão”, rematou.

Há 21h09:53 Agência Lusa

Rússia ataca capital ucraniana durante a madrugada

A Rússia atacou, durante a madrugada, a capital da Ucrânia com mísseis balísticos. Foram registados pelo menos três feridos e vários incêndios em edifícios e lojas, informou hoje o Serviço Estatal de Emergência.

As sirenes antiaéreas começaram a soar depois da meia-noite, em Kiev, e só pararam por volta das 6h (hora local).

No total, três pessoas ficaram feridas, como consequência dos bombardeamentos, duas das quais foram hospitalizadas, disse o Serviço Estatal de Emergência, no Telegram.

No ataque, foram afectados os distritos de Darnitsa, Obolon e Solomiansk, da capital ucraniana.

Ocorreram incêndios num edifício não residencial no primeiro dos três bairros, numa loja de móveis e num armazém, segundo a mesma fonte, e numa fachada de um armazém no terceiro. Houve ainda destruição parcial de três andares de um centro comercial de cinco pisos.

Os sistemas antiaéreos russos derrubaram, durante a noite passada 11 drones ucranianos sobre três regiões russas.

Há 22h09:49 Mariana Marques Tiago Bom dia. Retomamos aqui a cobertura da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Pode rever o que aconteceu no passado sábado no liveblogque agora encerramos. Obrigada por 

Questões pertinentes


Postas por AAA, dos desafios que a conjectura política actual, com uns States glutões e antieuropeístas ou até antihumanistas selváticos sob o comando do seu chefe de brinquedo, a querer alargar o tamanho do seu espaço governativo, desafios que a ausência de escrúpulos desse novo chefe de governo tem revelado pateticamente temerários: não seria de estranhar que os Açores fizessem parte dessas suas ambições de absorção territorial, com a sua Base das Lajes que também a NATO não iria disputar-lhe, com os actuais desafios de ajuda à Ucrânia. De resto, Portugal está habituado a render-se, de há uns tempos a esta parte, não irá disputar com os States, nem talvez os Açores se preocupassem grandemente com mudar de patrono, para mais oferecendo melhores condições de sobrevivência. Quanto à federação europeia… pois é! Tem pouco para participar, Portugal. A menos que a Madeira fique como moeda de troca. De trocos.

Os dois desafios de Portugal

Como é que Portugal vai reagir se os EUA quiserem falar dos Açores? Se a UE contrair dívida para pagar a defesa, como é que Portugal se vai inserir numa possível federação europeia?

ANDRÉ ABRANTES AMARAL Colunista do Observador

OBSERVADOR, 06 abr. 2025, 00:2029

As alterações ao sistema internacional e ao equilíbrio que até há pouco dávamos como certo obrigam a que nos preparemos para o pior dos cenários. Não por pessimismo, mas por cautela. O afastamento dos EUA da Europa altera a posição de Portugal no mapa dos blocos. Se até Janeiro nos encontrávamos no centro do Ocidente, agora estamos na ponta do bloco europeu. E isso pode ter consequências.

Nos anos de 1940 e 1941, enquanto Hitler hesitava em lançar por terra a Operação Félix de tomada de Gibraltar, a invasão da Península Ibérica e a eventual conquista de Portugal. A pretensão germânica era a de dividir o mundo em esferas de influência com os EUA a dominarem o continente americano enquanto o europeu se submeteria a Berlim. Para levar a cabo esta divisão, Hitler teria de derrotar a Grã-Bretanha, tomar a Islândia, os Açores, a Madeira, as Canárias, Cabo Verde e Gibraltar. Só dessa forma garantia a liberdade de navegação no Atlântico, o acesso ao Mediterrâneo e o controlo do Norte de África. Os EUA sabiam o que estava em jogo. Os Açores ficam mais perto da costa leste dos EUA que o Hawai da Califórnia. Roosevelt, que conhecia os Açores, chegou a dar instruções para que se preparasse um plano de ocupação do arquipélago. Se o Atlântico era a fronteira entre os blocos, as ilhas Açores teriam de ficar do lado de lá.

Hitler é uma personagem do passado, mas os interesses mantêm-se. O que referi acima serve apenas para ilustrar como alterações nas alianças ou na confiança entre estados podem mudar fronteiras de zona de influência. Por alguma razão, Trump fala tanto da Gronelândia. Até ao presente não temos quaisquer garantias que, resolvido este problema, o presidente norte-americano não se lembre dos Açores. Até porque os EUA precisam de ter debaixo de olho quaisquer navios que a China e a Rússia tenham no Atlântico. A China já tem um pé em São Tomé e Príncipe e em Janeiro assinou um Acordo de Cooperação Económica e Técnica com Cabo Verde. Se os norte-americanos não confiarem em Portugal, e se sentirem necessidade de agir, não vão pensar duas vezes.

O objectivo primordial de qualquer política externa é garantir a integralidade do território. No que nos diz respeito é que finda esta turbulência, que é a reorganização do equilíbrio mundial, Portugal continue a ser do Minho ao Algarve e a incluir os Açores e a Madeira. É o nosso dever básico enquanto cidadãos: que os que vêm depois de nós recebam o que nos foi entregue.

Portugal é um pequeno país escasso em recursos e com um mercado diminuto. Fosse através das descobertas, pela conquista ou por via da procura e abertura a novos mercados, a expansão foi uma obsessão permanente ao longo dos séculos. Tivéssemos ficado aqui e dificilmente estaríamos à beira dos 900 anos. Portugal acabou por ser uma invenção permanente com vista a se manter vivo. Como salienta João Paulo Oliveira e Costa, em “Portugal na História – Uma Identidade”, o nosso país adaptou-se aos locais onde esteve. Foi peninsular, tornou-se atlântico, asiático, brasileiro, africano e agora é europeu. Renovou-se constantemente e, apesar de ser o mesmo, não é igual ao que foi no passado. Daí que seja natural que se pergunte: como é que vai ser Portugal daqui a 50 anos? E daqui a 100? Continuamos de pedra e cal no projecto europeu? E a União Europeia? Ter-se-á dissolvido ou transformado numa federação?

A necessidade em investir em defesa pode forçar a UE a endividar-se. A margem para a dívida conjunta não é grande porque a União ainda está a pagar a resposta à pandemia. O certo é que dos 800 mil milhões de euros que Ursula von der Leyen disse serem necessários para gastar em defesa, 150 mil milhões serão suportados por empréstimos contraídos pela Comissão Europeia. Aos poucos, a dívida europeia vai crescer e a pressão para uma política fiscal única irá aumentar com ela. Normalmente uma só política fiscal é meio caminho andado para uma federação, ou algo muito parecido. Uma federação tem como consequência os estados federados perderem a sua soberania externa. Será que isso é viável para Portugal? E se for, como é que o espaço e os interesses comuns que partilhamos com outros povos se vai manter?

Não perder território e a nova identidade que vamos ter de forjar são dois dos grandes desafios para os próximos anos. Como sucedeu noutros momentos de transição, a maioria das pessoas está mais preocupada com assuntos mais imediatos. Mas daqui a uns anos, que podem não ser assim tantos, o que vai ser discutido é a resposta que dermos a estas duas questões. Não vai ser Luís Montenegro nem a Spinumviva.

POLÍTICA      ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA      AMÉRICA      MUNDO      UNIÃO EUROPEIA     EUROPA

COMENTÁRIOS (de 29)

Américo Silva: Ninguém conhece o futuro, nem o que vai acontecer à economia com as tarifas, mas sabemos que quem o seu não cuida, o diabo o leva: a União tem andado preocupada com a Sérvia, a Líbia, a Síria, o Irão, a Ucrânia, e alheia de si própria, a factura pode chegar a conta-gotas, mas chega.

Luis Figueiredo > João Floriano: e com estes líderes na Europa e em Portugal, nós nunca estaremos preparados para grandes desafios. A solução é ficar permanentemente dependente das vontades e humores das grandes potências. Seria um pouco sempre assim, mas nunca como agora temos diante dos nossos olhos a perfeita inutilidade de toda esta cam(b)ada de politiqueiros, ou melhor, de verdadeiros ilusionistas.               Francisco Almeida: Tantos, tantos comentários que este artigo me suscita. Mas vou cingir-me aos Açores. Os Açores são um arquipélago de origem vulcânica, povoada maioritariamente por imigrantes originários de fora de Portugal continental. Tal como Cabo Verde. Claro que há diferenças. Um fica a Norte do Trópico de Capricórnio outro a Sul. Um é de população branca outro de população negra (segundo os critérios americanos). Reportando a 1974 nos Açores havia muito mais desejo de independência do que em Cabo Verde. Para refrear a FLA foram enviados meios de marinha e presos numa fragata os principais dirigentes. Para entusiasmar a independência de Cabo Verde, foi desarmada a polícia e entregues as armas a militantes do PAIGC, a maioria vinda da Guiné. À cautela, foram deportados cerca de 300 pessoas que poderiam encabeçar um movimento ou partido político e o MFA - sempre ele! - replicou em Cabo Verde as célebres sessões de esclarecimento (=sessões de intimidação). É verdade que o desejo de independência dos Açores era alavancado, se não motivado, pela perspectiva da instalação de um governo comunista em Lisboa. E agora? Imaginemos uma nova geringonça com PNS e o agravamento da crise atlântica. Depois das brilhantes alterações à lei da nacionalidade - o que seria de nós, portugueses sem o dr. Mamadu Ba! - podem votar até netos de portugueses. Isto é. Com elegibilidade eleitoral há hoje o dobro dos açorianos a viver nos EUA do que nos Açores.              João Floriano: «Se os norte-americanos não confiarem em Portugal, e se sentirem necessidade de agir, não vão pensar duas vezes.» Sem dúvida. E Portugal não terá recursos de defesa para impedir a acção americana, assim como não os terá para impedir a acção russa. Costuma-se dizer que não se deve sofrer por antecipação, nem planear sobre cenários hipotéticos que poderão nem sequer vir a ser concretizados. Mas na presente conjuntura é melhor estar preparado para tudo. A Europa não está e Portugal ainda menos.              António Costa e Silva: Na segunda guerra Salazar lidou com essa questão. Hoje os tempos são outros e os políticos portugueses estão muito baratos.                 Jorge Tavares: Quero este indivíduo para deputado!         Ruço Cascais: Os Açores já são suficientemente norte-americanos para virem a ser reclamados pelos Estados Unidos, a não ser que Trump tenha interesses imobiliários no território. Mesmo assim, os Estados Unidos ainda continuam uma democracia e a possibilidade de os Estados Unidos mudarem de política dentro de 4 anos é muito grande. Quanto à federação, nós, enquanto país mais dependente financeiramente da UE e dos fundos europeus já estamos mais ou menos federados economicamente, tanto, que o OE também tem que ter uma avaliação de Bruxelas. Se queremos financiamento temos que nos sujeitar. A Federação política vai ser mais difícil de engolir. Deixamos de ter um presidente e um primeiro-ministro locais e passamos a ter um presidente eleito para a União Europeia e um primeiro ministro eleito para a Comissão Europeia. Por cá votaríamos para um governador. A Federação política da UE teria que passar por eleições e os governadores da União terem mandatos dados por sufrágio eleitoral. Quanto à estrutura poderia ter muitas variantes, mas, sempre um governo com um presidente ou primeiro-ministro à cabeça. Mais 25 anos no máximo para a Federação da Europa. Uma grande prenda para as gerações pós 25 de Abril que poderão morrer descansadas sabendo que garantiram para os netos um futuro mais risonho nos Estados Unidos da Europa.                    Carlos Chaves: Caro André Abrantes Amaral, agradeço-lhe mais esta excelente crónica onde nos alerta para questões verdadeiramente importantes para a nossa nação, quase a completar novecentos anos. É mais que certo que a União Europeia se quer continuar a ter uma palavra na geopolítica mundial, e continuar a manter o nível de vida dos Europeus e em segurança, terá que evoluir no sentido do federalismo. Esta questão é de crucial importância especialmente para um pequeno e periférico país, como é o nosso caso. Queremos ser uma “roda suplente” de uma União federalizada? Se não o formos teremos futuro fora da União? Conseguiremos manter os Açores e a Madeira, ou a Dinamarca a Gronelândia, sem termos uma verdadeira defesa Europeia? Especialmente quando um membro da NATO promete atacar outro membro (exceptuando o conflito entre os Turcos e os Gregos e Cipriotas)?

 

domingo, 6 de abril de 2025

Herói

 

Hoje: JAIME NOGUEIRA PINTO. Tal como esses outros de há 641 anos, e sobretudo o da chefia, Nun’Álvares. Ou mesmo só o João das Regras do saber desassombrado, defensor de um “Mestre de Avis” para rei de um trono então vazio. Também JAIME NOGUEIRA PINTO será lembrado um dia, pelo seu arrojo de relembrar o passado heróico, na tentativa de fazer o país, hoje amorfo, retomar a via do nacionalismo, mesmo sem o orgulho daqueles outros tempos, de renascimento e glória, de cruzada dilatadora posterior. Ao recordar Atoleiros, JAIME NOGUEIRA PINTO pretende arrojadamente libertar o país do actual atoleiro. Sem esperança, contudo, no seu discurso subentendidamente apelativo, de um patriotismo real, mau grado o cepticismo. Sim, herói verdadeiro. De um hoje pueril e tantas vezes infame.

A batalha pela independência: Atoleiros, 6 de Abril de 1384

O interessante é há seis séculos e meio ter surgido neste extremo da Europa um movimento de gente de todos os grupos sociais e chefes capazes de vencerem nos campos de batalha e nas cortes de Coimbra.

JAIME NOGUEIRA PINTO Colunista do Observador

OBSERVADOR, 05 abr. 2025, 00:1850

Não eram um grande exército, os 300 cavaleiros e os 100 besteiros, mais um milhar de peões. E também não eram muito experimentados na guerra. Mas era o que havia e o novo fronteiro que trouxera aquela hoste de Lisboa não teve dúvidas em, mesmo assim, dar batalha aos invasores.

Os castelhanos eram aí uns mil cavaleiros, mais uns 4000 infantes. E os chefes eram Sancho de Tovar, Juan Alonso de Guzmán, o mestre de Alcântara, e o próprio irmão mais velho do Condestável português – Pedro Álvares Pereira, mestre do Hospital. Os manos mais velhos do novo fronteiro andavam com Castela e não deixavam de mandar tentadores convites a Nuno para que se passasse para o lado correcto, o do direito internacional dinástico, que seria muito bem recebido e recompensado. E isso criara até, para fúria do Condestável, alguma suspeição entre os portugueses sobre a sua lealdade. Eram outros tempos, ainda não tinha raiado a luz do progresso, da razão e da democracia sobre aquela proto-populista “idade das trevas” onde, na percepção dos comuns, os de cima punham os interesses próprios e os da família à frente do bem público; por isso todos estranhavam que Nun’Álvares não integrasse a que parecia, à partida, a facção vencedora.

Os castelhanos preparavam-se para cercar Fronteira, que tomara o partido do mestre de Avis. O Condestável escolheu uma posição vantajosa, próxima da vila. Ali mandou apear a cavalaria e organizou um dispositivo militar, com as lanças e besteiros fechando o quadrado. Teria conhecimento das batalhas em que, nesse mesmo século XIV, os infantes apeados tinham vencido a cavalaria feudal? Havia algumas, como Courtrai (11 de Julho de 1302), em que os plebeus flamengos tinham derrotado os cavaleiros franceses de Filipe, o Belo; e doze anos depois, em 24 de Junho de 1314, os cavaleiros ingleses em Bannockburn tinham sido vencidos pelos lanceiros escoceses apeados de Robert Bruce; no ano seguinte, em 15 de Setembro de 1315, fora a vez do duque Leopoldo da Áustria ver em Morgaren a sua cavalaria massacrada pela infantaria suíça; e depois tinham sido as batalhas decisivas da Guerra dos Cem Anos, a guerra franco-inglesa, em que os ingleses tinham derrotado sucessivamente os franceses, bem mais numerosos, graças às forças de infantaria apeada, mas também, e sobretudo, aos arqueiros, munidos dos arcos grandes ingleses, com uma cadência de disparo muito superior à das bestas – em Crécy, em 1346, e em Poitiers, dez anos depois, combates em que se ilustrara Eduardo, o Príncipe Negro.

Do patriotismo dos historiadores

Nun’Álvares, nos Atoleiros, repetiu a táctica com grande sucesso. As narrativas que temos da batalha cedem aqui e ali ao “partidarismo” dos dois historiadores que as lavram, o castelhano Pedro Lopez de Ayala e o nosso Fernão Lopes (talvez uma outra característica exclusiva da facciosa “idade das trevas”). Ayala mal fala dos portugueses, refere-se a Nun’Álvares por “ele” (“pelearan com él”) e atribui a derrota dos seus à “la mala ordenanza que ovieran”. E chega mesmo a arranjar um expediente para dar a entender que a vitória dos portugueses não fora assim tão grande vitória, pois os castelhanos, no final, tinham reagido, evitando que os perseguissem.

Fernão Lopes é mais explícito: Nun’Álvares tinha o dispositivo defensivo bem articulado e esperou a carga de cavalaria pesada com que os atacantes queriam lançar o terror entre os portugueses. Mas estes permaneceram firmes nos seus postos, de lanças em riste, numa muralha de ferro intransponível, contra a muralha móvel a cavalo. Era o choque clássico a que, ainda durante a cavalgada, os besteiros acrescentavam os disparos de frechadas contra os que “carregavam”. E ao chegarem à parede de lanças que os esperava, os atacantes espetaram-se ali, sem remissão.

Segundo o cronista português, os mortos inimigos seriam 117, entre os quais o mestre de Alcântara. Lopes parece não admitir baixas na hoste portuguesa, omissão de que temos o direito de desconfiar, mesmo sem os sofisticados mecanismos de fact checking e os isentos comentadores de que hoje dispomos.

Lopes continua também a refutar, sem nomear o autor, a versão de Ayala sobre a resistência final dos castelhanos aos ataques portugueses, dizendo que eles “fugiram em vários sentidos e direcções”.

Com a vitória portuguesa dos Atoleiros, em 6 de Abril de 1384 – faz amanhã, domingo, 641 anos –, ficou neutralizada a força castelhana que pretendia avançar pelo Alentejo e envolver Lisboa pelo Sul – Lisboa que, na altura, já estava outra vez a ser cercada.

O trio maravilha

Escrevi, por ocasião da canonização do beato Nuno de Santa Maria, uma biografia do “cavaleiro-monge” e Santo Condestável de Portugal. É uma figura chave da nossa História; um dos integrantes, com o Mestre e João das Regras, do “trio maravilha” a que ficámos a dever a nossa independência política.

Neste tempo em que, depois da vaga globalista e mundialista pós-Guerra Fria, as grandes potências reconstituem uma nova ordem geopolítica assente na Realpolitik dos interesses nacionais, não podemos deixar de reconhecer o pioneirismo e a originalidade da revolução portuguesa de há mais de seis séculos. Porque foi disso que se tratou, de uma revolução que pôs em causa a ordem internacional dinástica – que legitimava como sucessor ao trono de Portugal D. João de Castela, casado com a filha única de D. Fernando, Dona Beatriz –, em nome de um valor novo, de um sentimento de “identidade nacional” que reagia à entronização de “um rei estrangeiro”.

E convém recordar que a revolução foi interclassista. A historiografia marxista, manipulando algumas passagens de Fernão Lopes, tentou passar uma versão “luta de classes” da revoluçãonobreza versus povo, os grandes contra os comuns –, mas José Mattoso e Maria José Pimenta Ferro vieram demonstrar que qualquer dos dois partidos – o “português”, o do mestre de Avis, de Nun’Álvares e de João das Regras, e o “estrangeiro”, o de Castela – tinha apoiantes entre a nobreza, a burguesia e o povo. Talvez em diferentes proporções, mas tinha. Houve, por isso, divisões transversais; regra geral, os chefes das casas, os filhos mais velhos, ficaram com a legalidade, com Castela; e os bastardos e os filhos segundos, com o Mestre de Avis; os burgueses e o povo de Lisboa e do Porto também estavam maioritariamente com o Mestre e outros seguiam o pronunciamento das terras e castelos.

O que é interessante é que há quase seis séculos e meio tivesse surgido na ponta extrema da península hispânica, neste extremo ocidental da Europa, um movimento com gente de todos os grupos sociais que encontrou chefes capazes de vencerem nos campos de batalha e nas cortes de Coimbra.

Depois, conquistada a independência e sob a chefia da dinastia de Avis, os portugueses buscaram um espaço vital nas viagens atlânticas e no controlo do Índico, não se limitando à exploração económica dos recursos mas exportando o Estado, no que foram pioneiros.

E com a desgraça de Alcácer Quibir e o fim da aventura, o trono caía outra vez nas mãos do rei dos vizinhos. Quando acordámos – graças à “espanholização” forçada de Olivares, ajudados pela conjuntura europeia e guiados pela vontade dos conjurados de 1640 – retomámos a independência e consolidámo-la em batalhas que vencemos, outra vez, em desvantagem. E recuperámos parte do Império.

Império que perdemos de vez há cinquenta anos, voltando à “pátria de novo pequena”. Uma pátria em que já poucos, entre as elites, valorizam a independência, e em que a pequenez está cada vez mais longe de ser só geográfica.

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COMENTÁRIOS (de 50)

Carlos Chaves: Muito simplisticamente não fosse gente desta como o “trio maravilha”, e claro quem lutou efectivamente, e há muitos séculos que estaríamos a falar Castelhano e com a capital em Madrid! “Império que perdemos de vez há cinquenta anos, voltando à “pátria de novo pequena”. Uma pátria em que já poucos, entre as elites, valorizam a independência, e em que a pequenez está cada vez mais longe de ser só geográfica.” Epílogo sublime, obrigado Jaime Nogueira Pinto.

Tim do A > Nuno Borges: Sem dúvida. Muitos vendidos à cobiça dos estrangeiros (sobretudo da cobiça dos americanos e dos soviéticos), outros apenas idiotas úteis analfabetos primários.

João Floriano: « ..........e em que a pequenez está cada vez mais longe de ser só geográfica.»

E aqui é que está o verdadeiro problema. Portugal tinha tudo ( não sei se ainda terá, porque ando derrotado pelo pessimismo) para ser um país grande, mesmo que geograficamente pequeno. Tal como os homens, os países não se medem aos palmos. O que nos trouxe até esta pequenez e vil melancolia? Eu diria que foram 50 anos de comunismo e socialismo. Nunca deram bom resultado ou criaram sociedades justas, democráticas e felizes. porque havia de ser diferente aqui no extremo ocidental da Europa?

Nuno Borges > António Costa e Silva: os maiores foram os capitães de abril.

Manuel Lisboa: Excelente memória e ideia recordar a notável vitória portuguesa na Batalha de Atoleiros. No entanto, nota-se desilusão. Amargura. Compreende-se. Principalmente, quando se observam os tempos de hoje e se evocam figuras ímpares portuguesas como Dom Nuno Álvares Pereira (um dos avós da Dinastia de Bragança) ou o João das Regras e, claro, o Rei de Boa Memória, Dom João I (o outro avô da Dinastia de Bragança); e ainda, mais tarde, os "40 conjurados", cuja coragem e capacidade de decisão talvez só encontre paralelo na ficção de Alexandre Dumas nos Três Mosqueteiros. Pois é, o passado dos heróis parece cada vez mais longínquo. E fiquemos por aqui.

Pedro Pereira: Felizmente haja alguém com coragem para afrontar todos aqueles que nos dias de hoje, sob a capa de especialistas ou "pecialistas", deturpam a história e a manipulam em prol de uma ideologia. Não há maior manipulação do que tornar a história ideológica. É como a arte, que nestes dias, é mais uma forma de propaganda mediático-ideológica dos menos capazes e talentosos, seja na literatura, seja na música ou em qualquer outra forma de expressão artística.

António Costa e Silva:  "...Também dos portugueses alguns traidores houve algumas vezes.

Nuno Borges: Venceram porque não estavam organizados em partidos. Nem havia democracia.

Depende

 

Do sítio onde se respira. Se assim fosse, não haveria tantos mortos quer por asfixia, quer por poluição dos ares, quer pela falta de ar, mesmo metaforicamente falando... Não, mesmo em democracia, o ar não é nunca igual – nem, de resto, são iguais os humanos virtuosamente defendidos por palavras, há até quem respire com mais ruído, de acordo com a sua maior potência respiratória. Deus nos livre de tendências tão exclusivistas, que, em plena democracia só admitissem o estudo das Ciências e rejeitassem o das Letras! O Dr. Salles está a ser muito tendencioso. O estudo literário é imprescindível para o conhecimento do Homem e das suas criações, desde os seus primórdios… E por muitas outras razões, é claro, entre as quais a da criatividade. Nunca o Dr. Salles poderia afirmar o que escreve, se se limitasse à decifração e avanços científicos, que servem para modernizar, é certo, mas também para contribuir para a destruição, o que é bem visível por estes tempos de drones e de viagens espaciais. Nem o Homem viveria feliz sem poder exprimir o seu “Alma minha”, ou criar os heróis das suas histórias imaginárias, bonitas ou feias, ou mesmo das suas experiências reais… por falta de um discurso competente, ainda que ínfimo em valores, se comparado com os estudos científicos, de rigor e objectividade tantas vezes áridos, não dando hipótese à criatividade pessoal…

Quanto à lebre dormindo ao relento, será porque tem excesso de calor, pois poderá sempre ocupar uma toca alheia, desde que saiba procurar alguma cujo dono é compincha, ou apenas medroso para a querer disputar... Com os humanos o mesmo acontece, mas com mais drones para a disputa.

Não, o ar nunca é igual para todos, há muitos que se intimidam com os ares alheios, chegando mesmo a entorpecer… E a definhar. Apesar dos drones…

 

O AR QUE RESPIRAMOS É IGUAL PARA TODOS…

HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO, 04.04.25

… MAS AS LEBRES DORMEM AO RELENTO

Em República, todos temos os mesmos direitos e as mesmas obrigações – metaforicamente, o ar que respiramos é igual para todos.

Em Democracia, ao Governo cumpre promover a igualdade de oportunidades mas nem todos querem delas usufruir (em especial na Educação) – metaforicamente, as lebres dormem ao relento.

* * * Para que servirão as terras raras se o homem não lhes souber dar outro uso para além da produção de mandioca ou erva para o gado? E mesmo a actual corrida às terras raras parecerá uma infantilidade quando a síntese industrial desses elementos tão cobiçados estiver economicamente viabilizada. Ou seja, é a pessoa que mede o valor das coisas e estas de nada valem se não houver conhecimento humano que as valorize. Metaforicamente, a lebre dorme ao relento porque não sabe escavar uma toca.

* * * De regresso à realidade humana, reconheçamos que a pessoa é o cerne do desenvolvimento e que elevados índices de formação bruta de capital fixo tão ao gosto do cavaquismo-keynesianismo de pouco valeriam se não se fizessem acompanhar por políticas de educação e formação profissional.

Colhe, assim, perguntar o que fazer para deixarmos a velha modorra em que ciclicamente caímos após poucas mas voluntariosas chicotadas desenvolvimentistas. E, para poupar o enfado de quem me lê, cito apenas essa briosa iniciativa da Rainha D. Maria II que é a Academia das Ciências de Lisboa, hoje em pleníssima letargia e merecedora de epitáfio lacrimoso. Apareça quem a salve! Então, como minha PRIMEIRA SUGESTÃO AO GOVERNO, deixo a ideia de que se salve a Academia das Ciências de Lisboa da inutilidade em que se encontra mergulhada expurgando-a da Secção das Letras e relançando-a nas Ciências, promovendo o estudo das Ciências junto da juventude por via equiparável à Telescola. Tarefa fácil, basta querer.

Na esperança de que alguém com poder de decisão as chegue a ler, sigo com mais SUGESTÕES AO GOVERNO…

(continua)

COMENTÁRIOS

 A P MACHADO 04.04.2025 17:01: Pois é. Mas as mentes políticas vivem obcecadas com a desigualdade na distribuição dos rendimentos individuais. Cismas...

ANTÓNIO PINHO CARDÃO  04.04.2025 19:02: Acontece por uma vez estar em desacordo com o meu amigo. O conhecimento humanístico, da filosofia à história e à ética, é essencial para conceber e enquadrar o desenvolvimento. Pois que se acentue o estudo das ciências e das tecnologias, mas sem prescindir das humanidades.

Anónimo 04.04.2025 23:32: Separar Ciências de Letras não parece ser difícil. Porque não a Academia das Letras?

Adriano Miranda Lima 04.04.2025 19:53: Antes de mais, este texto seduz logo pela beleza da metáfora da "lebre que dorme ao relento por não saber escavar uma toca", mas o seu significado vai a uma profundidade superior à que a lebre consegue imprimir à sua toca. Encerra noções e conceitos que nos dizem da frequência com que dormimos ao relento só porque as mais das vezes preferimos o facilitismo da lebre que não se dá ao trabalho de cavar bem a sua toca. Sim, concordo que a Academia das Ciências tem de ser uma realidade pujante por si só, expurgada das Letras, porque não lhe faltará sarna para se coçar, e mesmo assim terá de contar com a prioridade e a atenção dos governos que o Dr. Salles da Fonseca sugere. Não quer dizer que as Letras não devam merecer, por seu turno, o devido cuidado, porque uma visão alargada, e também profunda (como a toca da lebre) do mundo, advém do conhecimento da condição humana e do mundo que o cerca, implicando fundamentalmente a História e a Geografia. Basta olhar para o actual inquilino da Casa Branca para concluir que ele é pouco mais que um analfabeto naquelas disciplinas.

ANÓNIMO 04.04.2025 23:25: Magnífico. Gostei muito

Henrique Salles da Fonseca 05.04.2025 11:29: Muito bom! ANTÓNIO JUSTO

sábado, 5 de abril de 2025

Um tal

 

De quem se fala, sob a pena de meias tintas – neste caso, por A G.. A verdade é que, ao desculpabilizar as tonterias do Trump – meio cá, meio lá - parece atacar as cobardias europeias, o que Trump também faz, muito mano de Putin. Mas A. G. também é europeu, afinal, certamente que não se exclui do retrato desfavorecedor da Europa, na questão da Ucrânia.

Trump, tarifas e descontos

A América existia antes de Trump e, apesar das previsões dos detractores mais transtornados e das ofensivas insinuações do próprio sobre um terceiro mandato, continuará a existir depois.

ALBERTO GONÇALVES Colunista do Observador

OBSERVADOR, 05 abr. 2025, 00:221

Às vezes dou por mim a pensar. Outras vezes dou por mim a pensar em assuntos muito específicos e fundamentais: é preferível fio dentário ou escova interdental? Quantas horas de filtragem são adequadas a uma piscina no Inverno? O melhor de Mark Twain é a ficção ou o resto? A partir de que ano o jazz deixou de prestar? Será que tolero demasiadas asneiras de Trump por causa das monstruosidades a que ele se opõe? As respostas, necessariamente precárias, são: não sei; duas ou três; talvez o resto; por volta de 1942; sim, tolero.

Em menos de três meses, com resultados razoáveis ou por apurar, Trump tem exercido uma encantadora oposição a inúmeros horrores da vida contemporânea: as políticas de “diversidade” e “inclusão”, a promoção de delírios anticientíficos acerca dos sexos, a imigração desvairada e descontrolada, as fraudes institucionais que são a ONU e em particular a OMS, a rebaldaria dispendiosa da USAID e dos serviços públicos em geral, a descontracção confortável dos demais países da NATO, a actuação solta dos terroristas de Gaza, do Líbano e do Iémen, a legitimação do anti-semitismo nos “campus” americanos, o cinismo do “apoio” internacional à Ucrânia, etc. Sobretudo notável foi o discurso de JD Vance em Munique, vinte minutos de enxovalho da Europa nos pontos exactos em que esta Europa merece ser enxovalhada.

Admito que, em mim, o combate de Trump a tamanhas monstruosidades, seja por convicção ou por cedência aos eleitores, distorce para cima a avaliação objectiva do indivíduo, um faroleiro repleto de defeitos que não se devem ignorar. Obviamente não me refiro às vítimas do Trump Derangement Syndrome (TDS), que não ignoram os defeitos, incluindo os inexistentes. Para os pacientes de TDS, cuja maioria achava Biden um portento de lucidez, Trump é brutalmente estúpido e sinistramente maléfico, virtudes complicadas de conciliar e que se estendem a todos os que o rodeiam, a todos os que votaram nele, a todos os que alguma vez elogiaram moderadamente uma decisão dele –  e àquilo em que ele toca, seja a caneta ou o lenço de assoar.

Mas é preciso sofrer da doença oposta – sugiro Maga Patológica, expressão de que genialmente me lembrei sozinho e de seguida verifiquei que já fora utilizada com conotação distinta pelo meu amigo Tiago Dores – para desprezar completamente a evidência de que não há apenas motivos de celebração. Para os fiéis, Trump é Deus Nosso Senhor, o lenço de assoar é lindíssimo e o espirro que o precede um sinal críptico de que Sua Divindade está a jogar xadrez em 3, ou 4, dimensões com adversários toscos na bisca lambida. Nos EUA e por cá, os devotos de Trump padecem da mesma cegueira que os doentes com TDS: ambos vêem as acções do homem à luz das suas próprias fezadas, que determinam à partida o carácter prodigioso ou catastrófico de cada acção. Os primeiros acharão impecável que Trump atropele uma velhinha, os segundos condenam-no por descobrir a cura do cancro.

Trump, que se saiba, não atropelou velhinhas nem tornou obsoleta a oncologia. Por enquanto, mostrou uma saudável vontade de demolir o edifício “woke”, motivo para que um céptico, perdão, um moderado como eu lhe conceda sucessivos descontos. Estou disposto a descontar as atoardas alusivas ao Canadá e à Gronelândia a título de “bluff” e estratégia de influência. Desconto a enxurrada de bombásticas e exaustivas declarações diárias, que visam dominar a “agenda” e deleitar o autor com os abalos que provocam. Desconto o modo e os modos, um “estilo” que não é novidade e é escusado esmiuçar com detalhe. Em princípio, não desconto as tarifas.

Desde 2 de Abril li e ouvi dezenas, quiçá centenas de especialistas a propósito das tarifas apresentadas por Trump. Custou-me arranjar dois moços que partilhassem uma tese explicativa comum das razões pelas quais são prejudiciais, os prejuízos que podem causar e a identificação dos prejudicados. Os especialistas dedicados a explicar que as tarifas serão benéficas, um grupo bastante minoritário, também não se entendem quanto à essência dos benefícios, ao processo que conduz aos benefícios e aos destinatários dos benefícios. E ainda sobra a questão da justiça: as tarifas são justas ou injustas? É um nevoeiro de palpites. Na dúvida, vou pela certeza: as tarifas alfandegárias, as de Trump, as nossas e as de quem calha, conferem poder e dinheiro aos estados. E eu, que jamais apreciei o reforço da capacidade dos estados em controlarem a economia e açambarcarem o rendimento alheio, não vou desatar a apreciar agora. Porém, até me disponho a descontar as tarifas se, hipótese remota, estas forem um instrumento de negociação para reduzir ou – milagre sublime – acabar com as tarifas. E só aí.

O que não desconto em hipótese nenhuma, e me leva a manter um pezinho atrás, é o narcisismo de Trump, a crença, aparentemente sincera, de que o mundo principiou com ele e acabará com ele. Com ele, é tudo “nunca visto”, “o maior de sempre”, “como ninguém conheceu”. Tirando McKinley, o antecessor que cita a pretexto das tarifas, Trump parece habitar um vácuo histórico, um lugar que a sua inigualável pessoa preenche e esgota. A soberba não lhe permite conceber um tempo que não seja o seu, nem entrar a noção de que a América existia antes de Trump e, apesar das previsões dos detractores mais transtornados e das ofensivas insinuações do próprio sobre um terceiro mandato, continuará a existir depois – um truísmo que a vitória dos democratas em Novembro não garantia.

Nota: Esta crónica vai de férias e eu também. Regressamos ambos a 26 de Abril.

DONALD TRUMP      ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA      AMÉRICA      MUNDO

COMENTÁRIOS

Alexandre Barreira: Pois. Caro AG, Com tarifas ou sem tarifas. A verdade é que. Iste tá mesme tude fedide. E...já agora.....boas férias....!!!             Albino Mendes: Desejo boas férias ao Alberto Gonçalves, espero que, como habitualmente, nos traga novidades censuradas aqui no velho continente (muito pouco democrático, e cada vez mais anti-américa). Quanto ao, continua a ser de alguém que tem pensamento próprio. Obrigado.                Albino Mendes Albino Mendes: *... quanto ao comentário, continua...                 Vitor Batista: Abri o artigo e vislumbrei a palavra "Trump",e nem prosegui, a sério? você não consegue deixar de falar de m*rda nem por um domingo? pobre Vasco Pulido Valente, deve dar voltas no túmulo sem cessar. As suas crónicas adoeceram, vá de férias para os States ou deixe-nos em paz.                 José Paulo Castro: Muitos dos países visados por Trump fazem dumping social e económico porque não permitem sindicatos nos seus países, o que assegura a continuação da mão de obra barata. Nunca poderiam competir economicamente de igual para igual com o resto do mundo ocidental mas nós, ocidentais, deixámos isso acontecer na vã esperança de que acabasse por democratizar internamente esses países. Foi um erro. Principalmente desde 1995, com a China. As tarifas de Trump e consequente 'desglobalização' são uma tentativa de contrapor a esse fenómeno. Sei que os liberais adoram falar da eficiência dos mercados em competição livre, ignorando a externalidades e defendendo a globalização. AG é alguém assim. Só que a falta de controlo das condições internas de cada país gera uma competição que não é livre. E o paradoxo da eficiência ("mais eficiente e barato acaba a incrementar o produto e não a descer os custos gerais") leva à vitória das condições internas mais 'eficientes'. É isso que está a levar à ascensão global das economias baseadas em sistemas autocráticos e aos fenómenos associados (mais migração, mais descontrolo ambiental, etc.). As tarifas de Trump, por absurdas que pareçam teoricamente, são o primeiro passo real e com impacto no travão à globalização. Que ele esteja a utilizar uma fórmula baseada nos défices comerciais, é uma primeira abordagem a um modelo que corrige as externalidades induzidas pelo comércio global. Não há arbitrariedade. Nada disto surgiu sem contexto. Nada disto surgiu sem apoio democrático: ele explicou à exaustão ao povo americano o que iria fazer, chegando a dizer que a palavra mais bela é 'tarifa' e porquê. Vejam a história a acontecer e depois, mais tarde, é que se tiram as conclusões.                Cisca Impllit: Está mesmo a precisar de férias                   Antonio Mendes: Essa do terceiro mandato é o Putin a gozar com o ocidente. Gozaram comigo e com o Medeved como sendo o batman e o robin, pois agora vou fazer o mesmo com o meu baboon amestrado.         Manuel Almeida Gonçalves: AG deve ter enrolado e trincado a própria língua para escrever este artigo; Trump é tão medíocre, que até os seus mais entusiasmados apoiantes concedem que não há ângulo nenhum para o apoiar. Os nacionalismos falham sistematicamente, porque são tão actuais como uma televisão a preto e branco, uma máquina de escrever ou fotográfica de rolo - uma peça de museu, disfuncional para a realidade contemporânea.                 Coronavirus corona > Manuel Almeida Gonçalves: De certeza que não costuma ler as crónicas de Alberto Gonçalves. Inúmeras vezes que criticou Trump. Mas não sei se é ideia genital um europeu criticar Trump por causa das taxas quando ainda há escassos meses (talvez um ano) a UE aplicou taxas brutais aos carros vindos da China sem que tivéssemos assistido a nenhuma comoção.     Liberales Semper Erexitque: Continuo na minha, o Trunfas está pior desta vez, não sei se por ausência de pessoas próximas mais sensatas e que o aconselhem - eu tenho uma desconfiança em relação a Jared Kushner, mas não passa disso. A idade pode contribuir, e a megalomania do cavalheiro está fora de controle. O estado de graça dele quase terminou, e houve um gronelandês que resumiu a coisa num boné MAGA: Make America Go Away!               Maria Paula Silva: Bom retrato. não sei se a Gronelândia será assim tão "bluff" quanto isso. Veremos. Boas férias.                     José Paulo Castro > Maria Paula Silva: A Gronelândia é efectivamente uma questão de segurança para o continente americano. É a primeira linha de defesa possível na trajectória de mísseis disparados através do Árctico com destino ao norte do continente americano. (Isto é mais visível num globo ou num mapa centrado no Árctico.) E a Dinamarca e Europa não a têm visto assim. Os EUA podem e precisam de a ver assim. Tendo em conta que tem 70 mil habitantes, atribuir um milhão a cada um, para passarem a ser cidadãos americanos, não é muito caro assim para os EUA. 70 mil milhões não seria muito diferente do valor de compra do Alaska aos russos (estrategicamente, a melhor aquisição de sempre dos EUA). E os gronelandeses podem votar a independência quando quiserem: eles e a Dinamarca têm um acordo nesse sentido.                Cisca Impllit > José Paulo Castro: Como nem tudo se compra ou vende - a inteligência teria sido um bom aliado                 José Paulo Castro > Cisca Impllit: Os gronelandeses recebem verbas directas da Dinamarca. Querem ser independentes, como mostram os resultados eleitorais dos partidos independentistas, e podem sê-lo desde 2009 mas essas verbas desapareciam... Como tal, a independência está ainda 'comprada', de certa forma. Se calhar, nós com a Madeira temos algo parecido mas não tão explícito.             Cisca Impllit > José Paulo Castro: Entendo no ponto a que quer chegar, não concordando