segunda-feira, 7 de abril de 2025

Questões pertinentes


Postas por AAA, dos desafios que a conjectura política actual, com uns States glutões e antieuropeístas ou até antihumanistas selváticos sob o comando do seu chefe de brinquedo, a querer alargar o tamanho do seu espaço governativo, desafios que a ausência de escrúpulos desse novo chefe de governo tem revelado pateticamente temerários: não seria de estranhar que os Açores fizessem parte dessas suas ambições de absorção territorial, com a sua Base das Lajes que também a NATO não iria disputar-lhe, com os actuais desafios de ajuda à Ucrânia. De resto, Portugal está habituado a render-se, de há uns tempos a esta parte, não irá disputar com os States, nem talvez os Açores se preocupassem grandemente com mudar de patrono, para mais oferecendo melhores condições de sobrevivência. Quanto à federação europeia… pois é! Tem pouco para participar, Portugal. A menos que a Madeira fique como moeda de troca. De trocos.

Os dois desafios de Portugal

Como é que Portugal vai reagir se os EUA quiserem falar dos Açores? Se a UE contrair dívida para pagar a defesa, como é que Portugal se vai inserir numa possível federação europeia?

ANDRÉ ABRANTES AMARAL Colunista do Observador

OBSERVADOR, 06 abr. 2025, 00:2029

As alterações ao sistema internacional e ao equilíbrio que até há pouco dávamos como certo obrigam a que nos preparemos para o pior dos cenários. Não por pessimismo, mas por cautela. O afastamento dos EUA da Europa altera a posição de Portugal no mapa dos blocos. Se até Janeiro nos encontrávamos no centro do Ocidente, agora estamos na ponta do bloco europeu. E isso pode ter consequências.

Nos anos de 1940 e 1941, enquanto Hitler hesitava em lançar por terra a Operação Félix de tomada de Gibraltar, a invasão da Península Ibérica e a eventual conquista de Portugal. A pretensão germânica era a de dividir o mundo em esferas de influência com os EUA a dominarem o continente americano enquanto o europeu se submeteria a Berlim. Para levar a cabo esta divisão, Hitler teria de derrotar a Grã-Bretanha, tomar a Islândia, os Açores, a Madeira, as Canárias, Cabo Verde e Gibraltar. Só dessa forma garantia a liberdade de navegação no Atlântico, o acesso ao Mediterrâneo e o controlo do Norte de África. Os EUA sabiam o que estava em jogo. Os Açores ficam mais perto da costa leste dos EUA que o Hawai da Califórnia. Roosevelt, que conhecia os Açores, chegou a dar instruções para que se preparasse um plano de ocupação do arquipélago. Se o Atlântico era a fronteira entre os blocos, as ilhas Açores teriam de ficar do lado de lá.

Hitler é uma personagem do passado, mas os interesses mantêm-se. O que referi acima serve apenas para ilustrar como alterações nas alianças ou na confiança entre estados podem mudar fronteiras de zona de influência. Por alguma razão, Trump fala tanto da Gronelândia. Até ao presente não temos quaisquer garantias que, resolvido este problema, o presidente norte-americano não se lembre dos Açores. Até porque os EUA precisam de ter debaixo de olho quaisquer navios que a China e a Rússia tenham no Atlântico. A China já tem um pé em São Tomé e Príncipe e em Janeiro assinou um Acordo de Cooperação Económica e Técnica com Cabo Verde. Se os norte-americanos não confiarem em Portugal, e se sentirem necessidade de agir, não vão pensar duas vezes.

O objectivo primordial de qualquer política externa é garantir a integralidade do território. No que nos diz respeito é que finda esta turbulência, que é a reorganização do equilíbrio mundial, Portugal continue a ser do Minho ao Algarve e a incluir os Açores e a Madeira. É o nosso dever básico enquanto cidadãos: que os que vêm depois de nós recebam o que nos foi entregue.

Portugal é um pequeno país escasso em recursos e com um mercado diminuto. Fosse através das descobertas, pela conquista ou por via da procura e abertura a novos mercados, a expansão foi uma obsessão permanente ao longo dos séculos. Tivéssemos ficado aqui e dificilmente estaríamos à beira dos 900 anos. Portugal acabou por ser uma invenção permanente com vista a se manter vivo. Como salienta João Paulo Oliveira e Costa, em “Portugal na História – Uma Identidade”, o nosso país adaptou-se aos locais onde esteve. Foi peninsular, tornou-se atlântico, asiático, brasileiro, africano e agora é europeu. Renovou-se constantemente e, apesar de ser o mesmo, não é igual ao que foi no passado. Daí que seja natural que se pergunte: como é que vai ser Portugal daqui a 50 anos? E daqui a 100? Continuamos de pedra e cal no projecto europeu? E a União Europeia? Ter-se-á dissolvido ou transformado numa federação?

A necessidade em investir em defesa pode forçar a UE a endividar-se. A margem para a dívida conjunta não é grande porque a União ainda está a pagar a resposta à pandemia. O certo é que dos 800 mil milhões de euros que Ursula von der Leyen disse serem necessários para gastar em defesa, 150 mil milhões serão suportados por empréstimos contraídos pela Comissão Europeia. Aos poucos, a dívida europeia vai crescer e a pressão para uma política fiscal única irá aumentar com ela. Normalmente uma só política fiscal é meio caminho andado para uma federação, ou algo muito parecido. Uma federação tem como consequência os estados federados perderem a sua soberania externa. Será que isso é viável para Portugal? E se for, como é que o espaço e os interesses comuns que partilhamos com outros povos se vai manter?

Não perder território e a nova identidade que vamos ter de forjar são dois dos grandes desafios para os próximos anos. Como sucedeu noutros momentos de transição, a maioria das pessoas está mais preocupada com assuntos mais imediatos. Mas daqui a uns anos, que podem não ser assim tantos, o que vai ser discutido é a resposta que dermos a estas duas questões. Não vai ser Luís Montenegro nem a Spinumviva.

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COMENTÁRIOS (de 29)

Américo Silva: Ninguém conhece o futuro, nem o que vai acontecer à economia com as tarifas, mas sabemos que quem o seu não cuida, o diabo o leva: a União tem andado preocupada com a Sérvia, a Líbia, a Síria, o Irão, a Ucrânia, e alheia de si própria, a factura pode chegar a conta-gotas, mas chega.

Luis Figueiredo > João Floriano: e com estes líderes na Europa e em Portugal, nós nunca estaremos preparados para grandes desafios. A solução é ficar permanentemente dependente das vontades e humores das grandes potências. Seria um pouco sempre assim, mas nunca como agora temos diante dos nossos olhos a perfeita inutilidade de toda esta cam(b)ada de politiqueiros, ou melhor, de verdadeiros ilusionistas.               Francisco Almeida: Tantos, tantos comentários que este artigo me suscita. Mas vou cingir-me aos Açores. Os Açores são um arquipélago de origem vulcânica, povoada maioritariamente por imigrantes originários de fora de Portugal continental. Tal como Cabo Verde. Claro que há diferenças. Um fica a Norte do Trópico de Capricórnio outro a Sul. Um é de população branca outro de população negra (segundo os critérios americanos). Reportando a 1974 nos Açores havia muito mais desejo de independência do que em Cabo Verde. Para refrear a FLA foram enviados meios de marinha e presos numa fragata os principais dirigentes. Para entusiasmar a independência de Cabo Verde, foi desarmada a polícia e entregues as armas a militantes do PAIGC, a maioria vinda da Guiné. À cautela, foram deportados cerca de 300 pessoas que poderiam encabeçar um movimento ou partido político e o MFA - sempre ele! - replicou em Cabo Verde as célebres sessões de esclarecimento (=sessões de intimidação). É verdade que o desejo de independência dos Açores era alavancado, se não motivado, pela perspectiva da instalação de um governo comunista em Lisboa. E agora? Imaginemos uma nova geringonça com PNS e o agravamento da crise atlântica. Depois das brilhantes alterações à lei da nacionalidade - o que seria de nós, portugueses sem o dr. Mamadu Ba! - podem votar até netos de portugueses. Isto é. Com elegibilidade eleitoral há hoje o dobro dos açorianos a viver nos EUA do que nos Açores.              João Floriano: «Se os norte-americanos não confiarem em Portugal, e se sentirem necessidade de agir, não vão pensar duas vezes.» Sem dúvida. E Portugal não terá recursos de defesa para impedir a acção americana, assim como não os terá para impedir a acção russa. Costuma-se dizer que não se deve sofrer por antecipação, nem planear sobre cenários hipotéticos que poderão nem sequer vir a ser concretizados. Mas na presente conjuntura é melhor estar preparado para tudo. A Europa não está e Portugal ainda menos.              António Costa e Silva: Na segunda guerra Salazar lidou com essa questão. Hoje os tempos são outros e os políticos portugueses estão muito baratos.                 Jorge Tavares: Quero este indivíduo para deputado!         Ruço Cascais: Os Açores já são suficientemente norte-americanos para virem a ser reclamados pelos Estados Unidos, a não ser que Trump tenha interesses imobiliários no território. Mesmo assim, os Estados Unidos ainda continuam uma democracia e a possibilidade de os Estados Unidos mudarem de política dentro de 4 anos é muito grande. Quanto à federação, nós, enquanto país mais dependente financeiramente da UE e dos fundos europeus já estamos mais ou menos federados economicamente, tanto, que o OE também tem que ter uma avaliação de Bruxelas. Se queremos financiamento temos que nos sujeitar. A Federação política vai ser mais difícil de engolir. Deixamos de ter um presidente e um primeiro-ministro locais e passamos a ter um presidente eleito para a União Europeia e um primeiro ministro eleito para a Comissão Europeia. Por cá votaríamos para um governador. A Federação política da UE teria que passar por eleições e os governadores da União terem mandatos dados por sufrágio eleitoral. Quanto à estrutura poderia ter muitas variantes, mas, sempre um governo com um presidente ou primeiro-ministro à cabeça. Mais 25 anos no máximo para a Federação da Europa. Uma grande prenda para as gerações pós 25 de Abril que poderão morrer descansadas sabendo que garantiram para os netos um futuro mais risonho nos Estados Unidos da Europa.                    Carlos Chaves: Caro André Abrantes Amaral, agradeço-lhe mais esta excelente crónica onde nos alerta para questões verdadeiramente importantes para a nossa nação, quase a completar novecentos anos. É mais que certo que a União Europeia se quer continuar a ter uma palavra na geopolítica mundial, e continuar a manter o nível de vida dos Europeus e em segurança, terá que evoluir no sentido do federalismo. Esta questão é de crucial importância especialmente para um pequeno e periférico país, como é o nosso caso. Queremos ser uma “roda suplente” de uma União federalizada? Se não o formos teremos futuro fora da União? Conseguiremos manter os Açores e a Madeira, ou a Dinamarca a Gronelândia, sem termos uma verdadeira defesa Europeia? Especialmente quando um membro da NATO promete atacar outro membro (exceptuando o conflito entre os Turcos e os Gregos e Cipriotas)?

 

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