«Um homem pescava num rio.
Depois de ter estendido a rede
De maneira a barrar a corrente
De lado a lado, eficazmente,
Logo agarrou
Numa pedra e a ligou
A uma corda de linho
E se pôs
A bater na água fortemente
A fim de forçar
Os assustados peixes
Contra as malhas da rede
Da sua fome e da sua sede.
Um dos habitantes
Da vizinhança,
Vendo-o proceder
Com tal segurança
Censurou-o por turvar
A água do rio e os privar
Da habitual água potável.
“Sem dúvida” - retorquiu
O pescador imperturbável,
Mas se o rio eu não bater
Sou eu que de fome irei morrer.”
O mesmo acontece nas cidades:
Os negócios dos demagogos
Nunca são tão florescentes
Como quando em guerra civil
Mergulham de forma vil
A pátria dos antepassados
E dos presentes.»
Deste fabulista Esopo,
Tão promissor
Que parece que adivinhava
Que na contemporaneidade
Desta nossa cidade
Vivemos iguais andanças
Causadas pelas trapaças
Dos que preferem mergulhar
Nas turvas águas do seu viver,
Só para comer
E beber
E assim fazer minguar
A capacidade de sobreviver
Dos que, querendo viver
Como toda a gente,
Só encontram pela frente
A muralha indecente
De um país que nem sequer sente
As dores da sua gente.
Por isso até já assistimos,
Atónitos,
Ao espectáculo indizível
Dos que têm morrido
Sozinhos e apodrecidos,
Nas suas casas, a condizer
Com a podridão
Dos tais que remexem,
Sem mágoas,
Em turvas águas,
Sem que isso seja punível
Embora seja intragável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário