O livro de Maria do Carmo Vieira “O Ensino do Português”, na seriedade com que ousa desmascarar um edifício educativo implantado gradualmente desde a Revolução dos Cravos num país de uma maioria de gente com pouca qualidade intelectual e que por isso facilmente se deixou manipular para colher as benesses a que se julgou com direito, movida pelo sentimento do despeito, da inveja, da ambição, da vaidade de obter louros sem esforço, lembrou-me velhas lutas com que também ousei, mais jovem, denunciar a burla e o burlesco, assustada, é certo, com o efeito pernicioso que esse novo edifício educativo iria ter sobre as gerações futuras no nosso país.
Chegámos a um ponto cimeiro da falácia, ou seja, chegámos a uma falésia alcandorada sobre fundo abismal de incompetência previsível, aonde se despenharão irreparavelmente os jovens cidadãos sem princípios, a que uma sociedade cada vez mais pervertida e destituída os jogou, a não pensarmos rapidamente em modificar comportamentos, num volte-face impreterível.
Antes de transcrever excertos do capítulo I do livro de Maria do Carmo Vieira, cito alguns títulos de textos contidos em “Anuário – Memórias Soltas” (1999, Ed. Minerva), onde fui marcando, embora inutilmente, a minha posição de contestação à perversão de que a “Educação” foi palco desde o 25 de Abril: “Estratégias do Ensino: Não à coisificação do aluno?”; “Pedagogia por Objectivos”; “Profissionalização”; “Professores em Estágio”; “Unidades Capitalizáveis”; “Reforma do Ensino”, “Leitura Silenciosa”, entre outros.
Vejamos, pois, alguns passos desse I Capítulo que tem por título “Nova Concepção de Escola e Novo Perfil do Professor”:
Chegámos a um ponto cimeiro da falácia, ou seja, chegámos a uma falésia alcandorada sobre fundo abismal de incompetência previsível, aonde se despenharão irreparavelmente os jovens cidadãos sem princípios, a que uma sociedade cada vez mais pervertida e destituída os jogou, a não pensarmos rapidamente em modificar comportamentos, num volte-face impreterível.
Antes de transcrever excertos do capítulo I do livro de Maria do Carmo Vieira, cito alguns títulos de textos contidos em “Anuário – Memórias Soltas” (1999, Ed. Minerva), onde fui marcando, embora inutilmente, a minha posição de contestação à perversão de que a “Educação” foi palco desde o 25 de Abril: “Estratégias do Ensino: Não à coisificação do aluno?”; “Pedagogia por Objectivos”; “Profissionalização”; “Professores em Estágio”; “Unidades Capitalizáveis”; “Reforma do Ensino”, “Leitura Silenciosa”, entre outros.
Vejamos, pois, alguns passos desse I Capítulo que tem por título “Nova Concepção de Escola e Novo Perfil do Professor”:
«A “nova concepção de escola” que a Reforma, implementada em 2003-2004, impôs, sem que houvesse um debate sério, e após anos de cauteloso e persistente trabalho, realizado pelos seus dinamizadores e apoiantes, é a representação meticulosa do espectáculo do Absurdo, sobre o fundo de cantos sedutores que atraem para a Ignorância, para a Inércia e para a preguiça de pensar, no desprezo pela educação da sensibilidade. Na base de teorias pedagógicas polémicas, já avaliadas e ultrapassadas, mas aceites acriticamente, se foi alicerçando o vício da facilidade, da ausência de reflexão e de criatividade, bem como a crença no êxito imediato e sem esforço, em tudo contrário à experiência da própria vida, do saber e da arte....»
«... As escolas que então optaram servilmente pela experimentação dessas inovações pedagógicas, descritas como verdades definitivas e incontornáveis, foram-nas integrando no seu quotidiano, numa aceitação acrítica e alheia às consequências. Nesse processo, pacientemente aguardado pelos seus mentores, que com subtileza o iam orientando, foram surgindo sugestões cuja concretização dependeria essencialmente da “sensibilidade do professor”, expressão com que se procurou, de forma condescendente, atrair os dissidentes. Inserem-se nesse discurso a indicação programática de “conhecimento activo/conhecimento passivo” e a possibilidade de definição de objectivos mínimos, que os alunos mais fracos deveriam cumprir para não serem reprovados. A atitude “miserabilista”, encarando os alunos como “os coitados”, fez também a sua aparição e, não raro, receberam os professores reunidos em conselhos de turma, na avaliação final do 3º período, indicações remetendo para a situação traumática de um aluno que sofrera a separação dos pais, ou qualquer outra vivência negativa; (...)»
“... Ao longo dos anos, proliferaram muitas outras orientações pedagógicas defensoras da facilidade e do consequente discurso infantilizante para a obtenção de um êxito escolar imediato, na expectativa do momento em que se tornariam imposições indiscutíveis, o que aconteceu com a implementação da reforma em 2003-2004. Temos de admitir que nós, professores, nos desleixámos, com alguma ingenuidade, quando reagimos apenas pontualmente às mudanças que se anunciaram ao longo da década de 80 e se prolongaram, com maior insistência, nos anos posteriores, não perseverando nessa reacção crítica. No fundo, não acreditávamos ser possível que o Absurdo se pudesse introduzir e impor, sob a capa de democracia e de progresso, em programas, manuais, encontros, debates e acções de formação, negando-nos a liberdade e a capacidade de intervir e alcunhando-nos publicamente de “resistentes à mudança, como se a mudança fosse em si um valor positivo, e não se pudesse mudar para pior, o que de facto veio a verificar-se. Assim se foi preparando o terreno para a sementeira da estatística e da verdadeira exclusão que vem associada à ignorância que hoje impera na escola, imagem elucidativa da deterioração da qualidade de ensino. (...)»
«(...) Da deterioração do acto de ensinar adveio, em simultâneo, o menosprezo pelo dever da exigência e pela competência do professor. Privilegiando-se quase exclusivamente a componente pedagógica, a sua formação científica foi sendo desvalorizada de modo gradual. (...)»
«(...) Os mentores desta “nova escola”, assente numa pedagogia traiçoeiramente sedutora, tentaram inicialmente convencer-nos da legitimidade das mudanças anunciadas invocando a “educação e o êxito dos alunos” e a “democratização do ensino”. Mas porque pressentiram que o gesto de “convencer” não resultaria fecundo, optaram pela imposição, mais imediata e garantida nos seus efeitos. Assim se substituiu, por exemplo, a exigência pela facilidade e o dever da assiduidade pela compreensão da “gazeta” no menosprezo pelo acto de ensinar. A coberto da protecção se vai efectivamente desprotegendo, descurando ao mesmo tempo a instrução e a educação. Na verdade, justifica-se, e com alguma hipocrisia, que desse modo se ajudam os pais, quando afinal os estão a demitir da sua obrigação de educadores, facilitando simultaneamente a existência de trabalhos, quantas vezes sem horário, que lhes negam o tempo livre para a privacidade familiar e para os seus interesses pessoais. Nesta postura esconde-se a vontade de concretizar o desenvolvimento de uma sociedade de consumo que aliena e contribui para “enfraquecer o papel da família como suporte da tradição e da educação.”
É longo o texto deste primeiro capítulo, a merecer uma “revisita”, de continuação da matéria, que o bom senso exige que se leia na íntegra.
Entretanto, estou ouvindo as notícias sobre o encerramento de mais 700 e tal escolas, a acrescentar às mais de 2000 já encerradas, para bem do Ensino e da Aprendizagem. Da Nação.
(Continua.)
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