Hoje falou-se nas Novas Oportunidades e a minha amiga deu mostras do seu saber:
- As pessoas quando vão responder aos anúncios, com o diploma na mão, não podem dizer as habilitações.
Outras pessoas estavam presentes no café, contaram casos, o da senhora que trabalhara mais de trinta anos, ajudara a formar outros, e depois fora mandada embora, a pretexto de falência da firma - que fora abrir noutro lugar. Apresentara as suas habilitações na instituição encarregada de distribuir trabalho, porque precisava de trabalhar, mas fora recusada a sua admissão, a pretexto de que tinha habilitações excessivas, que não condiziam com a parca dimensão das competências para trabalhos de pouca exigência intelectual que eram os disponíveis na tal instituição.
Falou-se da acusação feita por Passos Coelho a Sócrates sobre a fraudulência dos tais cursos das Novas Oportunidades, e eu comprovei, com conhecimento de causa, como eram mínimas as suas exigências, pelo menos ao nível do nono ano de escolaridade, constando, em língua portuguesa, de um relatório mais ou menos autobiográfico, além do tempo mínimo de aprendizagem exigido.
Mas comentei que o processo não era despiciendo para facilitar a obtenção de cursos a quem não os pudera obter antes, desde que os critérios usados fossem de seriedade. Lembrei a minha experiência no campo de formação em um ano, em 1975, no liceu de S. João do Estoril – creio que nessa altura ainda conservava a designação de liceu.
Eu chegara de África, com família extensa, a ganhar ainda por inteiro o vencimento que duraria uns meses, pois em breve seria reduzido a metade, no quadro dos adidos. Concorri – era no início de 75 - para a docência de um curso nocturno de ensino de adultos, pago pelos próprios alunos, com cedência estatal do espaço escolar desse liceu, próximo do meu espaço habitacional.
Tratava-se de obter em um ano o resultado de três, para o 2º ciclo liceal – 3º, 4º, 5º, pela antiga nomenclatura, 1º, 2º, 3º, segundo a nomenclatura de então, 7º 8º e 9º no actual ensino unificado; ou o resultado de dois anos para o 6º e 7º do Ensino Secundário, 1º e 2º complementares, actuais 10º e 11º. Nas disciplinas de Português e de Francês.
Eram pessoas que trabalhavam e que precisavam dos diplomas de finais de ciclo para efeitos de ascensão nos seus empregos. Assim, três anos foram dados em um só – aliás, em seis ou sete meses - aos alunos do 5º ano, dois anos foram igualmente dados num só, aos alunos do Secundário, em Português e Francês. E os exames finais foram um êxito quase absoluto. Só uma aluna do 2º Complementar falhou no exame de francês da 1ª época, tendo obtido 14 na época de Setembro.
Ditoso tempo esse que não voltou a repetir-se, de alunos cordatos e atentos, desejosos de colher, participando, com os seus objectivos bem definidos, bem diferentes daquilo em que se tornaria um ensino de abuso e indisciplina, de crianças a quem foi proporcionado desrespeitar, enjoar, desprezar, abominar aquilo que os poderia valorizar.
Alguns desses alunos seguiram cursos superiores, pessoas conscientes de um mundo em transformação, e recordo esse ano em que, em Coimbra, às quartas feiras, segui simultaneamente um Seminário de Literatura Portuguesa, que igualmente me enriqueceria.
Os alunos pagaram o seu curso secundário, trabalharam para o obter, nada de semelhante aos cursos apelidados de Unidades Capitalizáveis, leccionados à noite, anos depois, em turmas que se iniciavam com largas dezenas de alunos, as mais das vezes insubordinados, muitos deles adultos, e terminavam com meia dezena, quando não com um ou dois apenas, de resistentes, um pouco mais sérios nos seus intuitos formativos, pois que, segundo se dizia, os alunos nocturnos inscreviam-se apenas para obterem redução nos passes de comboio. Alcançado o objectivo do passe, iam falhando gradativamente a frequência de aulas que não consideravam necessárias, pertencentes que eram a um povo de expedientes, mais do que de rigor e seriedade, que nada lhes diziam. Entretanto, inúmeros horários eram distribuídos pelos professores encarregados de os leccionar, os quais, logo após o início das aulas, de turmas cheias e alunos em pé, as tinham repentinamente às moscas. Largos anos o Estado despejou dinheiros para professores nocturnos de Unidades Capitalizáveis, que a meio do ano não davam para formar uma turma. Eu própria tive essa experiência durante um ano, com uma turma que se iniciou com uns quarenta e seis alunos e terminou com três ou quatro. Seríamos uns oito ou nove professores pagos para leccionar nessa turma, pagos, afinal, para o vazio de um ensino de fraude, que largos anos foi mantido pelas políticas educativas dos nossos Governos, que nada faziam para desfazer tal abominação.
O actual Primeiro Ministro quis favorecer a chamada irrisoriamente auto-estima do seu povo dando-lhe cursos aparentemente valorizadores, para apresentar números menos humilhantes de confronto com outros povos.
Mas o nosso povo teve sempre maus inícios escolares, não foi habituado ao trabalho mental que observamos lá fora, jamais aqui se investiu numa educação séria que contemplasse o total da população.
Por isso esses cursos feitos à pressa para angariar falsos diplomas de falsas competências não só são desonestos, como injustos relativamente aos que os fizeram dentro das normas.
Contou a minha amiga, contudo, que os tais diplomas falsos são preteridos a favor dos verdadeiros, ela conhece casos.
Eu contrapus – e nisso concordou - que verdadeiros ou falsos, neste momento todos são preteridos e irão sê-lo mais, por imposições da Tróika.
Convém mesmo não levar diploma nem currículo, quando se vai pedir emprego, para se merecer a esmola de um empregozito que permita ir sobrevivendo, o povo da caridadezinha. E do esbulho.
- As pessoas quando vão responder aos anúncios, com o diploma na mão, não podem dizer as habilitações.
Outras pessoas estavam presentes no café, contaram casos, o da senhora que trabalhara mais de trinta anos, ajudara a formar outros, e depois fora mandada embora, a pretexto de falência da firma - que fora abrir noutro lugar. Apresentara as suas habilitações na instituição encarregada de distribuir trabalho, porque precisava de trabalhar, mas fora recusada a sua admissão, a pretexto de que tinha habilitações excessivas, que não condiziam com a parca dimensão das competências para trabalhos de pouca exigência intelectual que eram os disponíveis na tal instituição.
Falou-se da acusação feita por Passos Coelho a Sócrates sobre a fraudulência dos tais cursos das Novas Oportunidades, e eu comprovei, com conhecimento de causa, como eram mínimas as suas exigências, pelo menos ao nível do nono ano de escolaridade, constando, em língua portuguesa, de um relatório mais ou menos autobiográfico, além do tempo mínimo de aprendizagem exigido.
Mas comentei que o processo não era despiciendo para facilitar a obtenção de cursos a quem não os pudera obter antes, desde que os critérios usados fossem de seriedade. Lembrei a minha experiência no campo de formação em um ano, em 1975, no liceu de S. João do Estoril – creio que nessa altura ainda conservava a designação de liceu.
Eu chegara de África, com família extensa, a ganhar ainda por inteiro o vencimento que duraria uns meses, pois em breve seria reduzido a metade, no quadro dos adidos. Concorri – era no início de 75 - para a docência de um curso nocturno de ensino de adultos, pago pelos próprios alunos, com cedência estatal do espaço escolar desse liceu, próximo do meu espaço habitacional.
Tratava-se de obter em um ano o resultado de três, para o 2º ciclo liceal – 3º, 4º, 5º, pela antiga nomenclatura, 1º, 2º, 3º, segundo a nomenclatura de então, 7º 8º e 9º no actual ensino unificado; ou o resultado de dois anos para o 6º e 7º do Ensino Secundário, 1º e 2º complementares, actuais 10º e 11º. Nas disciplinas de Português e de Francês.
Eram pessoas que trabalhavam e que precisavam dos diplomas de finais de ciclo para efeitos de ascensão nos seus empregos. Assim, três anos foram dados em um só – aliás, em seis ou sete meses - aos alunos do 5º ano, dois anos foram igualmente dados num só, aos alunos do Secundário, em Português e Francês. E os exames finais foram um êxito quase absoluto. Só uma aluna do 2º Complementar falhou no exame de francês da 1ª época, tendo obtido 14 na época de Setembro.
Ditoso tempo esse que não voltou a repetir-se, de alunos cordatos e atentos, desejosos de colher, participando, com os seus objectivos bem definidos, bem diferentes daquilo em que se tornaria um ensino de abuso e indisciplina, de crianças a quem foi proporcionado desrespeitar, enjoar, desprezar, abominar aquilo que os poderia valorizar.
Alguns desses alunos seguiram cursos superiores, pessoas conscientes de um mundo em transformação, e recordo esse ano em que, em Coimbra, às quartas feiras, segui simultaneamente um Seminário de Literatura Portuguesa, que igualmente me enriqueceria.
Os alunos pagaram o seu curso secundário, trabalharam para o obter, nada de semelhante aos cursos apelidados de Unidades Capitalizáveis, leccionados à noite, anos depois, em turmas que se iniciavam com largas dezenas de alunos, as mais das vezes insubordinados, muitos deles adultos, e terminavam com meia dezena, quando não com um ou dois apenas, de resistentes, um pouco mais sérios nos seus intuitos formativos, pois que, segundo se dizia, os alunos nocturnos inscreviam-se apenas para obterem redução nos passes de comboio. Alcançado o objectivo do passe, iam falhando gradativamente a frequência de aulas que não consideravam necessárias, pertencentes que eram a um povo de expedientes, mais do que de rigor e seriedade, que nada lhes diziam. Entretanto, inúmeros horários eram distribuídos pelos professores encarregados de os leccionar, os quais, logo após o início das aulas, de turmas cheias e alunos em pé, as tinham repentinamente às moscas. Largos anos o Estado despejou dinheiros para professores nocturnos de Unidades Capitalizáveis, que a meio do ano não davam para formar uma turma. Eu própria tive essa experiência durante um ano, com uma turma que se iniciou com uns quarenta e seis alunos e terminou com três ou quatro. Seríamos uns oito ou nove professores pagos para leccionar nessa turma, pagos, afinal, para o vazio de um ensino de fraude, que largos anos foi mantido pelas políticas educativas dos nossos Governos, que nada faziam para desfazer tal abominação.
O actual Primeiro Ministro quis favorecer a chamada irrisoriamente auto-estima do seu povo dando-lhe cursos aparentemente valorizadores, para apresentar números menos humilhantes de confronto com outros povos.
Mas o nosso povo teve sempre maus inícios escolares, não foi habituado ao trabalho mental que observamos lá fora, jamais aqui se investiu numa educação séria que contemplasse o total da população.
Por isso esses cursos feitos à pressa para angariar falsos diplomas de falsas competências não só são desonestos, como injustos relativamente aos que os fizeram dentro das normas.
Contou a minha amiga, contudo, que os tais diplomas falsos são preteridos a favor dos verdadeiros, ela conhece casos.
Eu contrapus – e nisso concordou - que verdadeiros ou falsos, neste momento todos são preteridos e irão sê-lo mais, por imposições da Tróika.
Convém mesmo não levar diploma nem currículo, quando se vai pedir emprego, para se merecer a esmola de um empregozito que permita ir sobrevivendo, o povo da caridadezinha. E do esbulho.
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