Levei à
minha amiga um artigo chegado por email, apelidado de “China behind the Gold
Medals” com texto basto de informações sobre a ambição chinesa pelo ouro olímpico
e com imagens de crianças treinadas desde infantes, algumas de carinhas
desfeitas pelo choro, na violência dos exercícios da trave ou outros aparelhos que vão
possibilitar os contorcionismos da agilidade futura dos atletas chineses.
Falei em
monstruosidade ao serviço do ouro, mas a minha amiga, que admira a perfeição, não,
certamente motivada pelo conto do Eça, que termina com o brado poderoso de
Ulisses, fugindo das perfeições inalteráveis da ilha Ogígia e da imortal embora
também sensível ninfa Calipso, de regresso aos rudes trabalhos e ao envelhecimento da
sua humana condição: “Oh Deusa, o irreparável e supremo mal está na tua
perfeição”
A minha
amiga, que admira a perfeição, expôs com o donaire de sempre:
- “Tudo
na China está programado. E aquelas tropas! Não há um movimento que não seja a
condizer.
Foi motivo para se voltar a comparar a apresentação
rigorosa, impecável, dos Jogos Olímpicos em Pequim, há quatro anos, e a deste
ano em Londres, basta em potencialidades de artifícios, humor e riqueza, mas sem
a rigidez da impecabilidade e graciosidade chinesas, porque de antípodas
civilizacionais e políticos, de uma abertura democrática inexistente na
poderosa China.
Mas eu fiquei horrorizada com o email recebido, de que
transcrevo alguns passos:
“As crianças são treinadas para ganhar medalhas desde a
mais tenra idade. Elas vêem os pais apenas uma vez por ano, desde os três anos
de idade, quando o Estado coloca as crianças num programa de treinamento.”
“Na busca do ouro, muitos atletas chineses deixaram de
lado a sua educação, controle financeiro pessoal, e até mesmo a sua saúde.
Crianças são recrutadas a partir de uma idade muito jovem, a nível nacional, de
acordo com o tipo de corpo.”
“Centenas de milhares de jovens são colocados em sistemas
de nível provincial de formação e são sucessivamente filtradas de acordo
com o desempenho. Os melhores atletas movem-se através do sistema de competir a
nível nacional, onde são colocados sob pressão intensa para executar.”
“Treinadores são enviados por toda a China para procurar
crianças promissoras, em creches e escolas. Eles olham para as crianças com o
físico certo, que parecem particularmente ágeis em correr e saltar. Os melhores
são removidos de suas famílias e enviadas para internatos, onde tudo gira em
torno da sua formação.” (…)
As crianças ou adolescentes apresentados nas fotos têm praticamente a
mesma altura, são crianças bem alimentadas, certamente que rodeadas dos
cuidados materiais e médicos indispensáveis para constituírem os corpos belos que
formarão aquelas equipas deslumbrantes, medidas ao milímetro, que vimos nos
jogos olímpicos de Pequim. Apesar das carinhas desfeitas pelo choro de alguns
daqueles meninos e meninas sem infância, violentados nos seus corpinhos por
instrutores algidamente competentes.
Falámos dos dançarinos ocidentais, assim formados porque
escolheram essa via, tais como os pianistas e outros músicos que as formações
culturais dos países preparam, com ea xigência necessária, desde que lhes reconheçam
a vocação.
Comparámos essa forma de preparação dos chineses, já
preconizada no tratamento dos pés das mulheres chinesas bem apertadinhos, numa
imagem de fragilidade feminina e de poderio masculino, que a Pearl Buck das
minhas lembranças da adolescência ledora criticara no seu romance “Vento do Oriente,
Vento do Ocidente”, à exigência europeia de calibragem da fruta para que esta seja
exportável, concluindo, melancolicamente, pela asserção vulgarizada sobre as
nossas deficiências de portugueses sem calibre que preste, nem de fruta nem de
atletas.
Mas resignámo-nos, que não precisamos de aprender nada com
os outros. Preferimos atribuir as nossas falhas ao nosso fado triste e esperar
na nossa fé, que pode ser no “Dom Sebastião, quer venha ou não.”.
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