- Não, hoje é só mineiros - considerou a minha amiga, indiferente a quaisquer outros subterrâneos das nossas lucubrações provenientes das transmissões mediáticas diárias, agudizadas em previsões mais catastróficas ainda, que a catástrofe sobre os trinta e três mineiros do Chile, em que todos se salvaram e para mais são reconhecidos como heróis nacionais, tal como outrora os “bourgeois de Calais” que o Rodin esculpiu. Mas estes até foram apresentar-se ao rei inglês, Eduardo VI, descalços, em camisa e com a corda ao pescoço, para salvar os habitantes da cidade, que o rei inglês queria render pela fome. Não chegaram a morrer, mas posteriormente tiveram uma estátua em Calais, o que não aconteceu com o nosso Egas Moniz que também foi com a família nos mesmos trajes humilhantes dos ricos burgueses franceses, para resgatar a palavra que jurara ao rei de Leão, e não lhe conheço nenhuma estátua tão célebre assim, não sei se por falta de Rodin, mas é também porque nem todos acreditam na história da hombridade de Egas Moniz, acham que tudo não passa de lenda, pois os nossos feitos como nação são muitas vezes atribuídos à lenda, também não sei se por termos inveja, já que os nossos feitos de agora são outros, não contêm tanta heroicidade, nem espírito de sacrifício para se honrar a palavra como o nosso Egas, ou para salvar uma cidade como os ricaços de Calais.
As palavras são como as cerejas.
- Mas como foi possível uma coisa daquelas, sem condições de segurança, a tantos metros de profundidade? – perguntei eu que mal tenho podido assistir às reportagens, devido aos muitos afazeres da domesticidade.
A minha amiga não é de cerimónias e largou com imponência:
- Deve ter havido grossa falcatrua. Faltam condições, não posso falar, vão ser averiguadas. Alguma coisa está errada, arriscar daquela maneira! … Aquilo afinal é ouro e cobre. - As coisas que a minha amiga descobre! – E, se fecha, é o ganha-pão daquela gente. Porque ali estavam aqueles. Cá fora estão muitos que trabalham ali.
- Mas foi um feito memorável, com a colaboração dos grandes, sempre os mais generosos e os mais capazes. A Alemanha, a NASA, o homem é um ser fantástico!
- Mas se não fossem os media não teria havido, talvez, um salvamento tão espectacular.
- E talvez sim, que as grandes potências gostam de mostrar o seu poder e a sua bondade.
- Oh! Sempre o seu poder! Nem sempre a sua bondade!
Decididamente a minha amiga hoje está para contrariar.
As palavras são como as cerejas.
- Mas como foi possível uma coisa daquelas, sem condições de segurança, a tantos metros de profundidade? – perguntei eu que mal tenho podido assistir às reportagens, devido aos muitos afazeres da domesticidade.
A minha amiga não é de cerimónias e largou com imponência:
- Deve ter havido grossa falcatrua. Faltam condições, não posso falar, vão ser averiguadas. Alguma coisa está errada, arriscar daquela maneira! … Aquilo afinal é ouro e cobre. - As coisas que a minha amiga descobre! – E, se fecha, é o ganha-pão daquela gente. Porque ali estavam aqueles. Cá fora estão muitos que trabalham ali.
- Mas foi um feito memorável, com a colaboração dos grandes, sempre os mais generosos e os mais capazes. A Alemanha, a NASA, o homem é um ser fantástico!
- Mas se não fossem os media não teria havido, talvez, um salvamento tão espectacular.
- E talvez sim, que as grandes potências gostam de mostrar o seu poder e a sua bondade.
- Oh! Sempre o seu poder! Nem sempre a sua bondade!
Decididamente a minha amiga hoje está para contrariar.
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