De La
Fontaine “Os dois galos”
São exemplo
de feição
Para este
ano começar
Em boa
meditação
Após os
apontados,
Como talismã,
No ano que
terminou,
De Esopo e
Florian
A toda uma
grei irmã,
- Que assim
o determinou
A lei cristã
Que homens e
bichos irmana
Na reflexão
humana:
«Dois
galos viviam em paz; uma galinha apareceu,
Eis que a
guerra começou.
Amor, tu
perdeste Tróia; e foi dest’arte
Que se
formou
A questão
envenenada
Em que o
próprio Xanto, rio troiano,
(Juntamente
com o Escamandro)
Foi tingido
Com o sangue
dos deuses Vénus e Marte.
A notícia
corre pela vizinhança.
A gente
de crista ao espectáculo acorreu
Com prestança.
Mais de
uma Helena da mais bela plumagem
Foi o
prémio do vencedor; o vencido desapareceu
Falho de
coragem.
Foi
esconder-se no fundo do seu retiro,
Chorou, em
fartas dores,
A sua
glória e os seus amores.
Os amores, que, ante a sua derrota,
O rival
vaidoso
Exibia à vista dele.
Cada dia
ele mirava, furioso,
A
venerada imagem
A reacender
o seu ódio e a sua coragem.
Afiava o
bico, batia o ar e os flancos,
E, exercitando-se
contra todos os ventos,
Armava-se
de uma ciumenta raiva.
Mas não
precisava disso. O seu vencedor
Sobre o
tecto se foi empoleirar; e cantar a sua vitória.
Um abutre
ouviu a sua voz de estentor:
Adeus
amores, adeus glória.
Todo esse
orgulho pereceu sob a garra do abutre.
Enfim, por
um fatal retorno,
O seu
rival venturoso voltou
A
coquetear-se em torno daquela franga.
Deixo a
pensar na sua lábia,
Porque houve
damas aos montes.
A Fortuna
entretém-se a pregar destes golpes:
Todo o
vencedor insolente trabalha para sua perda.
Desconfiemos
da sorte de grande porte,
E tomemos
cuidado connosco, sem falha,
Após o
ganho de uma batalha.»
Por isso se
fala em roda da fortuna
Ou nos alcatruzes
da nora que ora
Estão no
alto ora lá por baixo.
Ora dentro
ora fora
Do poço de
água clara.
Mas eu não
acho
Que quando
se obtém
O tacho de
qualquer luxo
Seja necessária
tanta prevenção
Contra o
desvio provável
Verdadeiramente insuportável,
E de decepção
Dessa roda
da sorte forte
Em azar de
morte.
Aqui, pelo
menos,
Não vemos
disso, não.
Que abutres
somos
Os que
subimos.
Sempre isso
vimos.
Sem excepção.
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