La Fontaine bem sabia
Que o mais que este mundo tem
É discórdia,
Quer seja nos casamentos,
Entre casais ciumentos,
Quer seja nos parlamentos,
Aqui mais por aleivosia
Se não ciúme também,
Que vivemos dia após dia.
E assim foi relembrar
Como erudito que era,
Mais uma quimera
Da mitologia,
A que fizera
A Discórdia distinguir,
Entre as deusas principais,
Vénus, a grega Afrodite,
Como merecedora
Como merecedora
Do pomo dos Imortais,
Por ser mais bela
Que Atena ou Hera
Segundo ela.
Essa razão
O mundo incendiou
Da Grécia e de Tróia.
Dando a Páris Helena,
De Menelau mulher,
De muito bom parecer,
O qual se vingou,
Com seu irmão
Agamemnon…
Vejamos então:
«A Discórdia»
«Tendo a
deusa Discórdia no Olimpo
Armado disputa,
E por causa
de uma maçã provocado
Questão inaudita,
Fizeram-na
desalojar dos céus,
Santo
Deus!
Junto do
animal chamado homem,
Em grandes
apertos
De ajuntamentos,
Foi recebida
de braços abertos,
Ela e
Que-Sim-Que-Não seu irmão
Com O-Teu-E-O-Meu
seu pai.
Ela nos
deu a honra, neste baixo universo,
De preferir
o nosso hemisfério
Ao dos
mortais que nos são opostos,
Que vivem
na selva:
Gentes
grosseiras, pouco civilizadas,
E que, casando-se
sem sacerdote ou notário,
De Discórdia
não entendem nada,
(Segundo o mito
do Bom Selvagem
Que lhes
atribui bondade e coragem
E que
Rousseau definirá com mais requinte
No século
seguinte).
Para se
encontrar a Discórdia
Nos
sítios onde a necessidade
Ordenava que
ela fosse presente,
A Fama tinha o encargo
De a
avisar; e a outra, diligente,
Corria depressa
aos debates para a paz preceder;
Duma
centelha
Fazia fogueira
Difícil
de apagar.
A Fama,
enfim, começou a queixar-se
A melindrar-se
Que nunca
da Discórdia encontrava
Morada fixa
e certa.
Muitas vezes,
a procurá-la,
Perdia tempo
danado.
Era preciso
pois que esta tivesse
Um poiso determinado,
Um poiso
donde se pudesse,
Em todas
as famílias,
Enviá-la
em dia fixo.
Como não
havia então convento de irmãzinhas
Educadinhas,
Foi com
dificuldade que um poiso se achou.
O albergue
enfim do Himeneu
Foi o
sítio onde ficou.»
A impressão daqui
resultante
É que La
Fontaine atribui somente
Às dissensões
familiares
O efeito perverso
Duma
Discórdia mitológica
Exemplificada
Na guerra de
Tróia,
Resultante
Dum casamento
Temporariamente
desfeito
O que foi
muito malfeito.
É verdade que
também no nosso tempo
Tais questões,
sem reverso,
Enlameiam a
nossa sociedade
A cada
passo.
Mas a
Discórdia está de tal modo espalhada
Quer escrita
quer verbalizada,
Para além,
evidentemente,
Da física,
generalizada,
Que esta via
mitológica
É forma
neurológica
Estereotipada,
E bastante pertinente
- Enfim,
Pelo menos
para mim -
De ultrapassar
um pouco
O horror que
vivemos
De nos não
entendermos
Para mais sempre
acompanhados
Como La
Fontaine salientou,
Do Que-Sim-Que-Não,
nosso irmão,
D’O Teu E O
Meu, nosso pai.
Amigos, e assim
nos vai.
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