terça-feira, 4 de junho de 2013

Dominique nique nique


Para animar a minha amiga que sofre , como todos nós, as dores destes tempos tenebrosos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas, sobretudo quando desbobina os ditames dos seus saberes audiovisuais diários, descarregando-os sobre o meu mutismo atento, lembrei-me de lhe entoar a canção dos anos sessenta que costumava cantar com as minhas alunas, como forma de aprendizagem motivante, a par de “Et maintenant” , “La Marseillaise”, etc.

A minha amiga, apenas com uns laivos de reconhecimento da música, desistiu, após as tentativas da minha garganta completamente desfocada dos tons agudos que a Soeur Sourire tão limpidamente entoava, e em inesperada voz de cana rachada que me surpreendeu e atribuí ao facto de estar há muito tempo sem uso, desmotivada, mesmo para a Grândola da fraternidade.

Ainda se riu a minha amiga, trocista, no orgulho dos seus volteios cantantes em velhas canções do seu repertório, em que o “Ai quem me dera ter outra vez vinte anos” faz parte das minhas exigências deslumbradas de ouvinte, em datas assinaláveis. Mas na Internet procurei o “Dominique nique nique” da Soeur Sourire e pude recordar na íntegra a velha canção de que tantas quadras repentinamente reproduzira, no espanto – meu e da minha amiga - de uma memória que cada vez mais vai esquecendo a quantas anda.

            Levei-lhe a letra, que escrupulosamente retirei da voz lesta da Irmã Sorriso, e comentámos o quanto nos ajudaria um santo com as características deste, de doçura, modéstia, simplicidade, desprendimento dos bens terrenos e alegria de viver, espalhando o nome de Deus. Um santo Dominique que nos mandasse dois anjos a providenciar para que não nos faltasse o pão dourado. E que nos guardasse simples e alegres, em busca da Vida e da Verdade.

            Eis o texto da Soeur Sourire:
 
Dominique nique nique
Dominique nique nique
S’en allait tout simplement
Routier, pauvre et chantant
En tous chemins en tous lieux
Il ne parle que du Bon Dieu
Il ne parle que du Bon Dieu.

À l’époque où Jean-sans-Terre
D’Angleterre était le Roi
Dominique notre Père
Combattit les Albigeois.

 Dominique….

 Certain jour un hérétique
Par les ronces le conduit
Mais notre père Dominique
Par sa joie le convertit.

 Dominique….

 Ni chameau ni diligence
Il parcourt l’Europe à pied,
Scandinavie ou Provence
Dans la sainte pauvreté.

 Dominique….

Enflamma de toute école
Filles et Garçons pleins d’ardeur
Et pour semer la parole
Inventa les Frères-Prêcheurs

 Dominique….

Chez Dominique et ses Frères
Le pain s’en vint à manquer.
Et deux anges se présentèrent
Portant de grands pains dorés.

 Dominique…..

 Dominique vit en rêve
Les Prêcheurs du monde entier
Sous le Manteau de la Vierge
En grand nombre rassemblés.

 Dominique…..

Dominique, mon bon Père,
Garde-nous simples et gais.
Pour annoncer à nos frères
La Vie et la Vérité.

 Dominique…..»
 
Mas como diria tão intelectualmente Álvaro de Campos, no poema "Tabacaria",

 «...Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordámos e ele é opaco,
 Levantámo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido...»
 
Somos, de facto ambiciosos, os versos da Soeur Sourire já não contagiam ninguém. Não há santo, Dominique que seja, que até percorreu a Europa a pé, que nos livre das nossas embrulhadas europeias e nacionais, mostrando-nos o caminho.

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