O
artigo, saído no blog “A Bem da Nação”, Verdades incómodas», de João
César das Neves, é mais um daqueles textos de que se poderá dizer, se não
usarmos de sofisma, que é claro como a água dos rios que escorrem das serras,
gelada e transparente. Demonstra matematicamente que nunca os reformados
descontaram o suficiente para auferirem os vencimentos que a dada altura lhes
foram concedidos, demonstra que a reivindicação dos direitos dos trabalhadores
é algo igualmente utópico, sobretudo porque muitas vezes tais direitos não
tiveram como contrapartida o cumprimento dos deveres de competência e
assiduidade que seriam normas exigíveis a verdadeiros profissionais, demonstra
que a dívida particular é, no mínimo, tão desequilibrada quanto a estatal,
embarcados os cidadãos na mesma onda de empenhamento desregrado que tudo ceifou
do país, por largos anos.
Mas
só sabemos gritar contra os carrascos que nos impõem o dever de pagar a dívida
e nos vão ao bolso injustamente.
O
caso é que os nossos pecados foram redimidos por Cristo. Daí a reivindicação usual
da nossa inocência em qualquer crise. Cristo é quem tem a culpa:
«VERDADES
INCÓMODAS»
«Existem algumas verdades
sobre a crise que muitos tentam esconder. Elas perturbam o mito confortável de
que as culpas pertencem a um grupo de malfeitores, quase todos políticos. O
melhor é deixar as coisas como estão, pois assim todos podemos considerar-nos
vítimas, sem arrependimento ou remorso. Recomenda-se então que não leia o resto
deste texto, revelador de factos subversivos.
Os reformados estão
hoje entre os críticos mais vociferantes. Mas seria bom que notassem que não
descontaram o suficiente para as reformas que agora gozam. Basta uma continha
simples para perceber que a contribuição de uma pequena parcela do ordenado
nunca permitiria vir a receber um montante quase igual a essa remuneração
durante um período quase igual ao do desconto. Isto chama-se "crise da
segurança social" e é tema de estudos e debates há décadas.
Pode dizer-se que têm
direito a receber o que diz a lei, aliás escrita pela geração agora reformada.
Mas o que não faz sentido é protestar abespinhado contra o corte como se fosse
um roubo dos montantes acumulados. Desde 1974 que o nosso sistema de pensões
não é de capitalização, sendo pagas as reformas pelos descontos dos
trabalhadores do momento. Quando uma geração concede a si própria benesses
superiores ao que pôs de parte, não se deve admirar que mais tarde isso seja
cortado, por falta de dinheiro. Se alguém pode dizer-se roubado, não são os
actuais pensionistas, mas os nossos filhos e netos, que suportarão as enormes
dívidas dos últimos 20 anos, e não apenas na segurança social.
Outro mito cómodo é o que
diz que os direitos dos trabalhadores e o Estado social estão a ser
desmantelados. De facto, os direitos que a lei pretendeu conceder nunca
foram dos trabalhadores, mas de alguns trabalhadores. Muitos empregados no
privado nunca tiveram aquilo que agora cortam aos funcionários públicos. Além
disso, a percentagem média de contratados a prazo é, desde 1983, quase 18%,
ultimamente sempre acima dos 20%. Somando isto aos desempregados, inactivos,
clandestinos, etc., vemos a larga privação dos supostos direitos. Os
exageros das regulamentações neste campo são só benefícios que um grupo
atribuiu a si mesmo. Como isso aumenta os custos do trabalho, prejudica
fortemente o crescimento e o emprego, agravando as condições dos mais
necessitados.
Quanto ao Estado
social, ele teve como principais inimigos aqueles que durante décadas acumularam
supostos direitos sem nunca se preocuparem com o respectivo financiamento.
Aproveitaram os aplausos como defensores do povo, receberam benefícios durante
uns tempos e, ao rebentar a conta, zurzem agora aqueles que limpam a sujidade
que eles criaram. Em todos os temas políticos, como no campo ambiental, esquecer
a sustentabilidade é atentar contra aquilo mesmo que se diz defender.
Finalmente, no que toca à
dívida, é importante considerar que a maior parte não é do Estado. As
empresas estão descapitalizadas, as famílias endividadas, os bancos
desequilibrados. Todos participámos da loucura dos últimos 20 anos; não apenas
os políticos. As maiores responsabilidades são dos dirigentes, mas o povo
não foi só vítima inocente de uma festa de que gozou durante décadas.
A culpa
até é dos credores, que alimentaram a mesma loucura. Esta é a
última verdade incómoda. A nossa dívida, das maiores do mundo, nunca poderá ser
paga. Assim, todos os envolvidos terão de suportar algum custo, devendo
encontrar-se uma partilha razoável. Mas para isso Portugal não deve fazer de
galaró arrogante, repudiando o débito ou exigindo renegociações. Prudente é uma
atitude serena e negociada, mostrando que estamos dispostos a assumir culpas
e suportar sacrifícios, mas pedindo que se encontre um equilíbrio que,
aliviando parte da carga, nos permita limpar o longo disparate e abrir um novo
ciclo de progresso e prosperidade que beneficiará tanto credores como devedores.
Estas são algumas
verdades do momento. Indiscutíveis, mas incómodas, que muitos preferem ignorar.
Por isso foi avisado que não devia ler este texto.» 27 de Maio de 2013
E o meu comentário no “A Bem da Nação:
«Li,
com muito gosto e concordo em absoluto com as verdades nele expostas e que há
muito penso, sentindo-me um peso com um vencimento que, embora sinta que
mereci, neste momento, como reformada, não tenho direito ao mesmo que os que
trabalham, até porque, quando me aumentaram, foi com dinheiro alheio e isso
sempre senti que foi uma tremenda fraude contra a nação. Com encargos desses
(para além de outros despropósitos), não há nação que resista. »
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