Esta é uma história de
expedientes,
Ou seja, de truques de
duas mentes
Que La Fontaine retirou de Esopo
E de outros investigadores
de topo
Dos tempos de antigamente,
Em que os animais falavam
E se comportavam
Tão bem ou tão mal como a
gente,
O que prova que eram tão
evoluídos
Como nós, que até somos
instruídos.
Chama-se “O Gato e a
Raposa” e eu não sei
Se de facto mais vale um só
truque dos bem engendrados
Do que muitos truques menos
bem alinhavados
Com que pessoas de mentes
inteligentes
Se vão safando nas suas
vidas diligentes.
«O Gato e a Raposa,
santos de fantasia,
Iam em peregrinação.
Eram dois Tartufos de
falsa devoção,
Dois arquipatelins,
pois, de lisonja e hipocrisia,
Como o Maître Pathelin
da farsa medieval
Manhoso como poucos, mas
que até acabou mal,
Dois “Patas-Peludas”
que comparticipavam
Nas despesas da viagem,
Um, aves da capoeira
abocanhando,
Outro, muito queijo surripiando,
E assim reciprocamente
se indemnizando
Em camaradagem.
O caminho era longo e
maçador,
Para o abreviarem,
disputavam.
A discussão é de grande
importância
Para evitar que o sono
nos vença.
Os nossos Peregrinos se
esganiçavam
Com toda a força.
Tendo assim discutido,
falaram do próximo,
Que é sempre um
maravilhoso instrumento
De entretenimento.
A Raposa, sem mais
recato,
Disse ao Gato:
“Tu, que pretendes ser
hábil,
Serás tão capaz como
eu?
Na minha sacola cem
ardis eu tenho
Cada qual melhor.”
“Não, disse o outro,
tenho apenas um,
Mas garanto-te que vale
por mil.”
Uma matilha apaziguou a
discórdia.
O Gato disse à Raposa:
“Procura no teu saco,
amiga,
Na tua cabeça
habilidosa,
Estratégia valiosa.
Eu tenho a minha.”
A estas palavras, sobe
a uma árvore,
Trepa rapidamente.
A outra deu cem voltas
inutilmente,
Entrou em cem covis,
Cem vezes fez falhar
Os compadres de
Brifaut, chefe da matilha.
Por toda a parte asilo procurou
Sem sucesso.
O fumo providenciou,
Os cães basset
farejaram.
Ao
sair duma cova,
Dois
cães de patas ágeis
De
um salto a estrangularam.
Os
muitos expedientes podem
Um
negócio liquidar.
Perde-se
tempo em pesquisar,
Em
tentar, em projectar.
Basta
um só expediente
Mas
que seja eficiente.»
Não, não é tão óbvia a
razão
Que promove um só
expediente
Em vez da sua
multiplicação
Para nossa mistificação,
Como acontece igualmente
Com os truques de magia
Que nos deixam, todavia,
Sem respiração,
Tão grande é a ilusão.
Mas os mais
extraordinários
Não são os mistificatórios.
São os que se praticam na
arte, no desporto,
Os que resultam do
esforço, da dedicação,
Bem à vista de toda a
gente.
Merecem a nossa homenagem.
Eram os truques que
Eusébio fazia
No tempo em que vivia,
Pantera Negra de salto
felino,
De corrida ágil, de domínio
da bola,
De ampla passada,
De dedicação, de amor à
sua camisola
De grande Senhor…
Sem truques na manga, mas
sim nos pés,
Figura de herói cortês
Na sua eterna glória de “Era
uma vez”…
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