O texto de Salles da Fonseca – HISTÓRICA VELHACARIA –
mereceu-me o seguinte comentário:
Excelente resumo que nos dá uma das
possíveis respostas para a origem das desigualdades, segundo já dizia o
Rousseau: "Le premier qui ayant enclos un terrain s'avisa de dire:
"Ceci est à moi", et trouva des gens assez simples pour le croire,
fut le vrai fondateur de la société civile.» Eduardo I não cercou o
terreno com muros de pedra mas de bela astúcia, coisas que também se
diziam da raposa da fábula.
Eis
o texto:
HISTÓRICA VELHACARIA
Após o período de domínio romano na
Bretanha, o País de Gales foi fragmentado em vários Estados menores.
Antes da Conquista normanda da Inglaterra, o proprietário mais influente e
poderoso era conhecido como Rei dos Bretões, título que entretanto evoluiu para
Prince of Wales.
Llywelyn,
o Grande, não fez uso do título, intitulando-se apenas de Prince of Aberffraw.
Com a invasão inglesa, Eduardo I de Inglaterra não aceitou o uso do
título pelos descendentes de Llywelyn e, notando grandes receios entre os
proprietários galeses, prometeu que lhes nomearia um Príncipe que não sabia
falar uma única palavra de inglês. Nomeando o seu primogénito que então tinha
dois ou três meses de idade, cumpriu a sua promessa ficando desde então o
putativo herdeiro da coroa britânica investido na honra de Príncipe de Gales.
Rolava
então o ano de 1301.
Setembro
de 2014
A verdade é que o texto me obrigou a procurar
afanosamente na Internet e na minha Histoire Universelle em 3 volumes,
da Librairie Gallimard, dados sobre a História das Îles Britanniques e a de Eduardo
II. Revi que os Romanos abandonaram as Ilhas pelo Continente aquando da invasão
bárbara, e que àquelas chegaram não Vândalos, Suevos ou Francos, mas Anglos (do
vale do Elba), Saxões (do Sul) e Jutos, da península da Jutlândia (parte
continental da Dinamarca e norte da Alemanha), contra os quais os Bretões da
ilha tiveram que lutar, resistência que lendariamente foi protagonizada pelo
Rei Artur e seus camaradas da távola redonda. E os Bretões rechaçados
instalaram-se no País de Gales e na Cornualha, ou ficaram como escravos dos invasores.
E assim se formaram sete reinos (a heptarquia anglo-saxónica). Mais tarde (fim
do século IX), vieram os Dinamarqueses para a costa leste, a seguir os
Escandinavos, até que no século XI se forma um vasto império, com as coroas da
Inglaterra, Dinamarca e Noruega, de pouca duração, o reino anglo-saxão
retomando a sua independência, até à invasão dos Escandinavos do continente,
instalados a Noroeste do Reino dos Francos (Normandia). Uma história recheada
de invasões estrangeiras e de lutas intestinas, o mesmo se passando na Escócia,
País de Gales e Irlanda, esta última foco de zelo missionário erudito, que
evangelizou a Escócia, as Órcades, as Shetlands, a Islândia. Até que o duque da
Normandia, Guilherme o Conquistador, se fez rei da Inglaterra, por conquista e
sagração, no século XI, organizando o país e a sua realeza numa base militar
poderosa, respeitando, no entanto a liberdade da Escócia e do País de Gales, e
iniciando uma era de paz, perturbada posteriormente, pelo facto de o rei de
Inglaterra e simultaneamente duque da Normandia ocupar grandes domínios do
Reino de França. Entretanto, o País de Gales e a Escócia mantiveram longos anos
a sua independência, apesar de as lutas de Eduardo I referidas no texto
“Histórica Velhacaria” terem iniciado o processo da “absorção” inglesa.
Tal absorção é comum nos povos. Nós próprios, ínfimos
que somos, também reivindicámos a coroa de Castela, quer no reinado de D.
Fernando quer no de Afonso V. O mesmo fizeram Afonso VII de Leão, ou outros
reis espanhóis em relação a nós. Com mais ou menos esperteza, com ambição
sempre.
E por isso me lembrei do magnífico historial que nos é
feito por Vasco Pulido Valente, sobre os interesses e melindres da
primeira Guerra Mundial, de regresso ao que afirmou Rousseau sobre a sociedade
fundada nas ambições e no poder do mais forte. Só que, nos tempos de antanho a
valentia dos próprios reis conquistadores era real. Agora a guerra é
extremamente traiçoeira, não inspira simpatia. É por isso que Obama não quer
sacrificar os seus homens, conservando-os no ar, com possibilidades de impor e
se impor sem danos para os seus.
«… como um lagarto a
quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.» (Álvaro de Campos -Tabacaria):
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.» (Álvaro de Campos -Tabacaria):
«Erros»
06/09/2014
– Público:
«É esta a semana apropriada para falar da I Guerra Mundial. Há
cem anos, quase dia a dia, a Europa estava praticamente toda em guerra.
Quem ler os livros feitos para a ocasião, fica impressionado, ou devia ficar,
com a quantidade de erros que determinaram a eclosão e a forma que ela tomou.
Hoje,
em reacção ao Tratado de Versailles, a culpa da catástrofe que destruiu o Velho
Mundo, o seu poder e a sua glória foi dissolvida numa nuvem de inocência geral,
talvez para propiciar a boa vontade e harmonia entre os “28”. Mas, na
realidade, esta tábua rasa não deve ser levada a sério. Houve claríssimas
responsabilidades de alguns países, principalmente da Áustria-Hungria, da
Alemanha e da Rússia, e houve responsabilidades de um pequeno grupo de
indivíduos, que não sabiam ou não percebiam as consequências do que estavam a
fazer.
A
Alemanha imaginou sem qualquer razão que a Europa a queria “cercar” e liquidar.
E para se proteger trocou uma aliança com a Rússia, que lhe garantia a
segurança a leste, por uma aliança com o Império Austro-Húngaro em
dissolução, que tarde ou cedo a iria envolver nas suas querelas domésticas.
A Rússia, ainda convalescente da derrota que sofrera com o Japão (1905),
começou a reforçar a sua frente ocidental (com dinheiro francês) e prometeu a
sua solidariedade à Sérvia, que no Sul era a cabeça do nacionalismo eslavo.
O papel de chefe do nacionalismo eslavo convinha ao Czar e ameaçava a Europa
inteira. A Áustria-Hungria queria destruir e assimilar e, quando o
herdeiro do trono, Franz Ferdinand, morreu assassinado em Sarajevo,
pediu à Alemanha um apoio incondicional – o célebre “cheque” em branco
– para resolver o assunto à sua maneira. O Kaiser Guilherme II, apoiado pelo
Exército, cedeu, ou acompanhou, a insanidade do Império.
Os
militares também não se distinguiram pela lucidez. Tinham um plano, o
plano Schlieffen, do nome de um general que entretanto morrera e fora
substituído por Moltke. O plano no seu estado originário era inexequível
pelo Exército alemão. Moltke acabou por o enfraquecer em pontos decisivos,
transferindo tropas do eixo essencial do ataque (a ala direita ou ocidental)
para a ala esquerda (contra um possível ataque dos franceses) e para a Prússia
Oriental contra os russos. O comando alemão julgava que entraria em Paris em
seis semanas. Não entrou e perdeu a batalha do Marne, o que o obrigou a
retirar para uma linha de trincheiras muito a norte, de onde não se mexeu até
1918. Moltke, logo em 1914, foi para casa com uma crise de nervos. Outros
preferiram a matança.»
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